Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna Curso de Mestrado em Ciências Policiais Área de Especialização em Criminologia e Investigação Criminal UC de Criminologia I Cesare Lombroso: Vida, Obra e Principais linhas de Investigação Cesare Lombroso: Life, Work and Main ResearchLines Inês Sofia Vaz Teixeira N.º: 2022/18 Docente: Prof. Doutor Nuno Caetano Lopes de Barros Poiares Lisboa, janeiro, 2023 Índice Resumo .............................................................................................................................. i Abstract ............................................................................................................................. ii Introdução ......................................................................................................................... 1 1. Dados Biográficos do Autor ......................................................................................... 2 2. Linhas de investigação.................................................................................................. 2 3. Produção Científica ...................................................................................................... 4 4. “O homem delinquente” de Cesare Lombroso ............................................................. 5 4.1.Resumo do Capitulo II ............................................................................................ 5 5. A obra e a Criminologia ............................................................................................... 8 6. Críticas à Obra .............................................................................................................. 8 Conclusão ....................................................................................................................... 10 Referências Bibliográficas .............................................................................................. 11 Resumo O presente trabalho escrito surge no âmbito da unidade curricular de Criminologia I do curso de Mestrado em Ciências Policiais, área de especialização em Criminologia e Investigação Criminal, do Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, sob a regência do Senhor Professor Doutor Nuno Caetano Lopes de Barros Poiares. Cesare Lombroso foi um importante médico psiquiatra, mas também jurista e antropólogo, considerado por muitos o “pai da Criminologia”. Este trabalho pretende estudar a sua vida e analisar um capítulo de uma das suas obras considerada por muitos a obra primária da Criminologia do Período Científico, o “Homem Delinquente’’ (1876). Desta forma, o trabalho inicia-se com a exposição dos seus dados biográficos, das suas linhas de investigação e da sua produção científica. O presente trabalho pretende analisar o capitulo II da obra, intitulado “Tatuagem nos Delinquentes”, para isso serão apresentadas as perspetivas de Lombroso em relação às tatuagens nos criminosos, delinquentes e militares, sendo estes os grupos com os quais mais interagiu ao longo da sua vida profissional, enquanto médico militar e responsável por alas psiquiátricas em Itália. É, ainda, analisado criticamente, para que seja possível entender a relevância do mesmo para a área da Criminologia e são feitas algumas críticas. Palavras-chave: Lombroso, Positivismo, Delinquente, Tatuagens, Atavismo, Período Científico i Abstract This paperwork is part of the curricular unit of Criminology I of the Master's Degree in Police Science, specialization in Criminology and Criminal Investigation, of the Higher Institute of Police Sciences and Homeland Security, under the supervision of Professor Nuno Caetano Lopes de Barros Poiares. Cesare Lombroso was an important psychiatrist, but also a jurist and anthropologist, and is considered by many to be the "father of Criminology". This paper intends to study his life and analyze a chapter of one of his works considered by many to be the primary work of Criminology of the Scientific Period, "The Delinquent Man" (1876). Thus, the work begins with the exposition of his biographical data, his lines of investigation, and his scientific production. The present work intends to analyze chapter II of the work, entitled "Tattoos on Delinquent". To this end, Lombroso's perspectives on tattoos on criminals, delinquents, and military personnel will be presented, these being the groups with whom he most interacted throughout his professional life, as a military doctor and responsible for psychiatric wards in Italy. It is also critically analyzed to understand its relevance to the field of Criminology. Keywords: Lombroso, Positivism, Delinquent, Tattoos, Atavism, Scientific Period ii Introdução Este trabalho propõe-se estudar o autor Cesare Lombroso, um dos nomes mais falados do período científico da Criminologia, sendo “O Homem Delinquente” (1976) , apontado como a primeira obra a abordar a Criminologia enquanto estudo científico. Embora exista a dúvida relativamente à obra mãe da Criminologia e ao autor, o pai da mesma, os escritos de Lombroso e outros dos seus contemporâneos marcaram o início do período científico da criminologia. No período pré-científico, que permaneceu até ao século XIX, os fatores que levavam um indivíduo a cometer um crime eram consideradas causas sobrenaturais ou determinadas predisposições deste a proceder de modo menos próprio. Com o século XIX, no período científico, muda-se a perspetiva face ao delinquente e à prática do crime. O foco do “estudo” deixa de ser os fatores sobrenaturais afetos ao delinquente e passa a ser o delinquente em si. Desta forma, o trabalho inicia-se por abordar os principais dados biográficos do autor, a seguir, são apresentadas as linhas de investigação a que Cesare Lombroso se dedicou e é exposta parte da produção científica do autor. No que toca à obra em si, falar-se-á da obra em geral, dando maior ênfase ao capítulo II referente à tatuagem no delinquente. A abordagem do autor face aos criminosos e aos delinquentes é semelhante à utilizada pelos antropólogos, no entanto, há que salientar que o mesmo é, em primeiro lugar, médico e psiquiatra. O principal objetivo deste trabalho será entender de que modo Lombroso (1876) via a tatuagem no delinquente, tendo em conta que a perceção científica da criminologia dita que o delinquente carece de qualquer livre-arbítrio nas suas ações. Além disso, procura-se aprofundar o conhecimento sobre as características intrínsecas dos delinquentes e entender como estas afetam ou não aquilo que perpetuam na sua pele. Acredito que seja uma obra com enorme relevância para a área e, em especial, para a unidade curricular em que se insere este trabalho. Entender a relevância da obra para a Criminologia é um dos grandes objetivos do trabalho e as críticas que esta teve, é com essa reflexão que se o pretende terminar. 1 1. Dados Biográficos do Autor Ezequías Marco César Lombroso Levi mais conhecido pelo pseudónimo Cesare Lombroso nasceu a 6 de novembro de 1835 em Verona, Itália e morreu a 19 de outubro de 1909 em Turim, é ainda hoje considerado um dos autores e teóricos mais importantes da Criminologia, do Direito e da Antropologia. Considerado por muitos o pai da Criminologia, no entanto, o próprio Cesare Lombroso não se dizia criminólogo e sustentava ser adepto da escola antropológica italiana. Estudou medicina na Universidade de Pavia, estudando também em Pádua, Viena e Paris, entre 1852 e 1858. Após concluir os estudos, começou a exercer como médico voluntário do exército nacional. Na medicina, o seu foco inicial foi na área da psiquiatria, sendo mais tarde nomeado diretor do manicómio da cidade de Pesaro. Foi ainda responsável pelos pacientes dos hospitais psiquiátricos de Pavia e Reggio Emilia. Iniciouse, então, um longo percurso de vida de observação e estudo dos delinquentes e doentes mentais. Lecionou nas Universidades de Pádua e Turim, enquanto professor de Psiquiatria e Medicina, esteve vinculado à Universidade de Turim desde os seus 30 anos, até ao final da sua vida. Ao longo do seu percurso académico teve vários contactos com diferentes perspetivas teóricas a nível do Direito, nomeadamente a inspiração no positivismo de Auguste Comte. Ao longo da sua vida dedicou-se intensamente à investigação na área da antropologia criminal e a sua ideia central nesta área, surgiu em 1871, quando realizou a autópsia ao corpo de Giuseppe Villella. Ao observar o seu crânio, acreditou ter descoberto a natureza do criminoso. Pois, este apresentava características distintivas dentro de uma época civilizada, não se assemelhando somente aos «selvagens primitivos», como também aos animais inferiores como consagra Agra, 2018. 2. Linhas de investigação Foi um dos principais representantes da escola positivista, que tem como objeto de estudo o delinquente sem livre arbítrio, deixando a preocupação da investigação de ser o crime em si, passando a ser o criminoso. Tendo isto em conta, Lombroso procurou encontrar e explicar a relação entre psicopatologias criminais e defeitos físicos no delinquente. 2 A principal teoria de Lombroso, baseava-se na existência de características hereditárias ou atávicas (atavismo) que fossem uma representação das formas mais primordiais do ser humano, ou seja, características que fizessem com que o homem delinquente se parecesse mais com os antepassados evolutivos do mesmo. Baseou-se na inspiração Darwinista, a nível da antropologia biológica e do evolucionismo. Ao referir que o homem teria características atávicas, infere-se que este se assemelharia aos primatas e, por conseguinte, ao ancestral comum entre estes e o homem. Traçou esta relação entre o delinquente e tais características através de uma metodologia de trabalho empírica. Estudou determinados aspetos e medidas cranianas de delinquentes já falecidos, trançando semelhanças entre os mesmos. Procurou primeiramente se haveria de facto alguma característica que o permitisse dizer, com base numa análise amétrica e puramente visual se haveria traços cranianos semelhantes ou aparentemente iguais entre o universo de delinquentes que estudara. Além dos estudos e da relação entre o atavismo e a delinquência, Lombroso também concluiu que há determinados traços comportamentais e da linguagem corporal de um indivíduo que podem auxiliar a identificar o criminoso delinquente. De entre alguns desses traços comportamentais temos o cinismo, vaidade e falta de senso moral. A nível sensorial, a característica que sobressai é a insensibilidade à dor, a qual pode explicar o motivo de os delinquentes terem mais tendência para fazer tatuagens. É importante relembrar, que até ao início do século XIX as tatuagens realizavam-se com instrumentos manuais, nomeadamente agulhas singulares. Sendo apenas uma agulha, esta era inclinada para que raspasse parte da epiderme, de modo a que a tinta se colocasse diretamente na derme. Lombroso tem como principais sucessores a nível teórico e ideológico Raffaele Garofalo e Enrico Ferri. Foram os três fundadores da escola positiva do Direito Penal e da Criminologia. Garofalo focava-se na Psicologia Criminal e Ferri na Sociologia Criminal (nome da sua obra mais importante). Embora as suas teorias tenham inicialmente, influenciado a Europa, a ênfase que Lombroso colocou nas causas hereditárias para a delinquência foram mais tarde rejeitadas, passando-se a entender que o crime tinha causas ambientais e não somente hereditárias. 3 3. Produção Científica Relativamente à sua bibliografia, ao nível de obras, começa em 1872 com a obra Génio e Loucura, baseada nas experiências iniciais da sua carreira. Nesta obra traça analogias fazendo uso da lógica dos Gregos Antigos, por exemplo para definir o que é realmente um homem genial. Aqui podemos ver algo que Lombroso aborda e adota noutras obras, o que diferencia todos estes homens é o ambiente que os rodeia. Em 1876, Lombroso publicou a obra que mais à frente será abordada neste trabalho, O Homem Delinquente, teve várias edições, da primeira edição publicada no ano de 1872 com 252 páginas, até à quinta edição, composta por três volumes e quase 1900 páginas, passaram-se vinte anos. Esta obra vai, em detalhe delinear comportamentos, aspetos físicos e emocionais, causas, paixões dos delinquentes distanciando-os do homem civilizado e social. Lombroso, entre outros, recolheram relatos e estatísticas em Itália, relativamente à incidência do delinquente nesses contextos. Para além disso, distingue ainda os dementes ou delinquentes morais dos delinquentes natos. O Delito (1891) é uma obra ligada a uma perspetiva jurídica. De entre as valências evidenciadas por Lombroso, ao longo da sua vida, o seu forte entendimento jurídico e do Direito Penal permitira-lhe enquadrar melhor as posições dos delinquentes e dos criminosos nesse mesmo contexto. Lombroso publica também algumas obras com um maior foco na relação das origens do indivíduo com o meio social em que se encontra inserido, nomeadamente O Anti-semitismo e as Ciências Modernas (1891), A mulher delinquente, a prostituta e a mulher normal (1893) e Os Anarquistas (1894). Para além destas, as mais recentes descobertas e aplicações da psiquiatria na Antropologia Criminal (1893) e O crime, causas e remédios (1894) apresentam teorias interdisciplinares à procura de soluções para a delinquência, bem como insight para a Antropologia Criminal. 4 4. “O homem delinquente” de Cesare Lombroso Esta obra é considerada a que assinala o início do período científico da Criminologia. Lombroso (1876) ao longo da sua obra refere determinadas características físicas, psicológicas e comportamentais geralmente observadas na grande maioria dos delinquentes, as quais raramente eram observadas naqueles que ele considera serem o homem e a mulher “normais”. Desta forma, ao qualificar o ser humano, coloca o delinquente numa posição inferior à dos demais seres humanos. A nível do delinquente nato, aponta alguns aspetos físicos que o distanciam do restante Homem: assimetria craniana bastante pronunciada, fronte baixa e fugidia, orelhas em forma de asa, zigomas, lóbulos occipitais e arcadas superciliares salientes, prognatismo (maxilar proeminente), crânio pequeno, mas uma face longa, pilosidade capilar abundante, embora pouco pelo facial e rosto pálido. Outras características apontadas ao criminoso nato era a sua insensibilidade, moral, física e psíquica. A ambidextria ou o mancinismo eram outras anomalias comummente associadas a estes indivíduos. Era também habitual que estes indivíduos sofressem de determinados distúrbios ao nível dos reflexos vasomotores e dos sentidos em geral, o que poderia justificar o tom de pele habitualmente mais pálido. Lombroso (1876) dá mais destaque à insensibilidade física, considera que o delinquente se encontrava mais propenso à prática da tatuagem na sua pele. Dada esta insensibilidade e o seu contexto psicossocial atávico e de selvajaria, aproveitava o delinquente para realmente se marcar, no sentido literal da palavra, como um selvagem. 4.1.Resumo do Capitulo II Este livro foi publicado em 1872 e está dividido em 17 capítulos. No segundo capítulo, intitulado “Tatuagens nos Delinquentes”, Lombroso (1876) observou um universo de 9234 indivíduos, 3886 soldados, dos quais considera “soldados honestos”, 5348 criminosos, meretrizes ou “soldados delinquentes”, de entre estes 200 eram mulheres e 378 franceses, tendo sido necessário o esforço conjunto de dez médicos para realizar a contagem e o estudo em causa. Em Itália a tatuagem era vista com mais regularidade nas classes sociais mais baixas, chamada de “marca” ou “sinal”, sendo particularmente evidenciada entre camponeses, marinheiros, operários, pastores, soldados e, claro, delinquentes. Lombroso (1876) 5 estabelece a existência de tais marcas como sendo um possível fator não só na identificação individual de quem a possui, como também na identificação do grupo social a que pertence. O autor destaca a tatuagem como um aspeto anatómico-legal que poderia ser identificativo de dado indivíduo ou grupo de indivíduos. Lombroso nesta obra tenta classificar as tatuagens em quatro temáticas diferentes: amor, religião, guerra e profissão. Uma vez que se entende que não era algo que só o delinquente faria, pois considerava-se que qualquer indivíduo se poderia relacionar com estas temáticas. As tatuagens sobre profissão e guerra muitas vezes eram sobrepostas, por exemplo no caso dos militares e marinheiros, cuja profissão era a guerra. No entanto, dentro do grupo de militares e marinheiros, a tatuagem de índole profissional seria diferente dependendo da sua unidade, uma vez que, cada unidade tinha as suas insígnias e símbolos específicos. Os símbolos de guerra eram os mais frequentes, os militares tatuavam para além das insígnias, espadas, canhões ou datas de batalhas memoráveis presenciadas, entre outros temas. Outro tipo de tatuagem mais predominante, é o das tatuagens profissionais, em parte pelo mesmo motivo que as de índole militar. O terceiro símbolo mais tatuado era o ligado à religião, sendo que grande parte surgia antes do ingresso dos homens nas forças armadas ou em milícias, providenciados por pastores da Lombardia ou peregrinos de Loreto. As tatuagens de amor eram comuns entre duas populações: lombardos e piemonteses, consistindo nas iniciais do nome da mulher, data em que se tenham conhecido, ou apenas duas mãos que se apertam. É nos delinquentes que se pode observar com maior regularidade a tatuagem. Um soldado de milícia que terá sido questionado por Lombroso relativamente ao motivo de não possuir qualquer tatuagem, ao que este lhe respondeu “são coisas que fazem os condenados”. Alguns dos casos observados pelo autor apresentavam uma simbologia particularmente violenta ou vingativa. Refere ainda o seguinte: “Dir-se-ia que o delinquente tem gravado na sua própria carne o presságio do seu fim.” Da mesma forma, a temática da obscenidade era muito adotada nas tatuagens entre os delinquentes, mas também, tatuavam frases completas o que pensavam ser chamarizes para instigar a vontade sexual entre as mulheres. Tanto Lombroso (1876) como Lacassagne (1881) referem que havia com maior frequência, entre as suas tatuagens, a “amizade” que teriam com o parceiro. Nos delinquentes, a simbologia das tatuagens era variada, sendo por vezes confusa ou até dicotómica. Por exemplo, existiam delinquentes com as iniciais da mãe ou da mulher tatuada no braço, ou uma data importante na sua vida, bem como cenários representativos 6 de guerra, como embarcações, diferentes tipos de armamento, mensagens a quem lhe tenha causado injúrias no passado. Outros optavam por uma tatuagem obscena num braço e outra com significados completamente diferentes no outro. A quantidade de tatuagens que eram feitas e o lugar destas, eram considerados por Lombroso (1876) como sendo importantes aspetos de interesse antropológico, visto que se destacam como prova da vaidade instintiva e característica do delinquente. Há, portanto, toda uma multiplicidade de tatuagens, que é a prova da falta de sensibilidade dos delinquentes, a qual o autor compara à dos selvagens. Quanto aos indivíduos associados ao crime organizado, Lombroso (1876) foi capaz de identificar códigos ou alfabetos inteiros escritos no corpo dos delinquentes. Estas cifras eram utilizadas pelos criminosos para comunicar, entre outros métodos, utilizando jornais dentro do estabelecimento prisional, como observado por Lacassagne (1881). Lombroso (1876) mencionou algumas das causas para a realização de tatuagens por parte dos delinquentes ou criminosos. Embora fosse de esperar que estes as realizassem sem motivo aparente, dada a sua invulnerabilidade, a vaidade que sentiam por ter o corpo pintado com algo que lhes é relevante traduz-se num dos motivos que serão referidos em seguida. De notar que o autor não apresenta somente causas da tatuagem no delinquente, mas nos indivíduos em geral. Lombroso revela que de entre as principais causas estão: a religião, a tatuagem como forma de perpetuação de antigos costumes, nomeadamente religiosos. A imitação, entre os Lombardos era frequente que, quando um dos indivíduos de determinado batalhão se tatuasse, que todos os seus companheiros seguissem o seu exemplo, reiterando a união dentro do grupo. O espírito de vingança, caso alguém tenha causado alguma injúria ou ferimento a dado criminoso é habitual traçarem uma tatuagem como lembrete de quem ou quando o fez. Ociosidade, não por um significado em específico associado à imagem, mas para passar o tempo. Vaidade, Lombroso (1876) e Lacassagne (1881) ambos observaram uma tendência de tatuar as áreas mais visíveis do corpo, entre estas o peito e os braços. Espírito Gregário, refere-se à utilização de determinada simbologia relacionada com os animais. Paixão, nesta causa vemos a ligação do tatuado com a sua família ou pessoas que lhe são ou eram queridas. Pichação, como o nome indica seriam frases de repúdio ou pedidos que o delinquente faria, uma externalização de como se sente em relação a algo (o que, segundo a obra em estudo, não é propriamente habitual). 7 5. A obra e a Criminologia Esta obra de Cesare Lombroso é usualmente apontada como a obra fundadora da Criminologia, trouxe reflexões muito importantes sobre o criminoso e foi com ela que surgiu o período científico. A criminologia divide-se em dois grandes períodos: o período pré-científico, desde a antiguidade, de onde resultam preocupações com o fenómeno criminal e o período científico que surgiu com a obra de Cesare Lombroso, “O homem delinquente” em 1876. O livro em análise, teve impacto significativo na época, revolucionou o Direito Penal e a Medicina Legal e lançou as bases da criminologia e da chamada antropologia criminal de forma sólida. É importante salientar que esta obra foi escrita numa época de poucos recursos da medicina, como por exemplo, a ausência de exames de DNA. Ainda hoje se considera uma grande obra e ajuda a perceber a história da criminologia como ciência interdisciplinar. Sendo a Criminologia multidisciplinar, vai procurar saberes de outras áreas, como a Sociologia, a Psicologia, o Direito e a Psiquiatria. Segundo Agra e Faria, 2012, “Desde a edição original de “O homem delinquente” de Lombroso em 1876, que campo de saber criminológico tem sido questionado acerca das suas fronteiras (autonomia), conteúdo (identidade), forma de atuação (método) e relação com o campo de decisões (aplicação)”. No que concerne à Criminologia, o autor foca-se nas caraterísticas de um indivíduo criminoso e ficamos assim a saber como este era caraterizado por Lombroso. Para isso, Lombroso recorre a uma ciência positivista e empirista, centrada na observação minuciosa que caracteriza a investigação atual em geral 6. Críticas à Obra Considero que foi uma obra importante e marcante naquela época, no entanto, não me identifico com a mesma, nem com a teoria de Lombroso. Por esse motivo, não podemos deixar de fazer algumas críticas à sua teoria assim como à sua obra. Considero que os seus estudos tiveram algumas limitações, como o fato de não haver um grupo de controle, o universo de avaliação de pessoas ser muito limitado, não existir diversidade no estudo. No meu ponto de vista, a maior crítica é o fato do autor não considerar que o delinquente fosse somente uma vítima das circunstâncias socias e educacionais nas quais nascera e vivera, sofrendo de uma tendência atávica, ou seja, uma propensão hereditária para o mal. Assim, o delinquente, segundo o autor, é doente e a delinquência é a sua 8 doença, e não deveria ser responsabilizado pelas suas ações, mesmo que estas fossem qualificadas como ilícitas. Este ponto de vista é muito fechado, uma vez que, existem outros fatores mais relevantes para a delinquência, como as experiências e o ambiente vivenciado durante a infância. O ser humano é, portanto, fruto do meio em que vive e se desenvolve. Os traços característicos de delinquência, denominados de “estigmas” por Lombroso não possibilitam a adequada identificação do indivíduo delinquente, uma vez que os traços que o mesmo entendia ser de delinquência podem ser encontrados em um ser humano normal, comum, sem que isso o torne um possível criminoso. Da mesma forma pode ocorrer o oposto, analisando um real criminoso poderemos não encontrar no mesmo os traços (estigmas) apontados por Lombroso e não é por isso que não vai deixar de ser considerado criminoso. Não existe, pois, o "tipo criminoso", de caráter antropológico, diferente de qualquer outro indivíduo não-delinquente, dotado de determinadas características de identidade que o revelem. Atualmente a criminologia não adota a teoria do delinquente nato, no entanto reconhece-se a possibilidade de um indivíduo nascer com predisposição para violência, ou seja, com uma tendência criminosa. 9 Conclusão Lombroso demonstra um profundo interesse no delinquente e na mente criminosa, desde a sua primeira interação com doentes mentais nos manicómios e alas psiquiátricas de diferentes hospitais italianos. Como já foi referido, desde o início da sua carreira profissional procurava traçar uma relação entre a demência e a delinquência, sendo a sua experiência empírica que veio a permitir desenvolver ambas as temáticas e elaborar uma teoria relacional entre ambas. Nesta obra, o autor demonstra-nos que há um racional por detrás do uso da tatuagem, por parte do delinquente, adotando a perspetiva do criminoso enquanto indivíduo sem livre-arbítrio, que nasce e vive com permanentes defeitos ou malformações físicas e psicológicas, tão recorrentemente associada à perspetiva positiva do crime De acordo com a teoria de Lombroso, o delinquente estaria mais propício a realizar o crime, não só pelas suas características físicas que lembram mais os primatas que os seres humanos ou pelo estado da sua psique, mas também pelo seu gosto por tudo o que é atávico, nomeadamente a vontade de desobediência a normas socialmente aceites, a inscrição na pele, por vezes prévia à detenção, e o seu desprezo pela dor física. Todas as caraterísticas anteriores, são consideradas, pela criminologia positiva, como ligadas ao delinquente, assim nasceu e assim partirá. O principal motivo para ser delinquente é o atavismo, e como referido anteriormente, este traduz-se, entre outros, sob a forma de tatuagem, perpetuada no corpo desse indivíduo. Se a Criminologia é uma área interdisciplinar que estuda o crime, este estudo foi fundamental para a mesma, já que aborda teorias criminológicas, estuda e reflete sobre o criminoso. Note-se, então, que este livro é portador de relevância tanto para a época em que foi escrito, como também para a história e para a análise do crime, pois trouxe novos contributos, novos conhecimentos e novas teorias da antropologia criminal e das caraterísticas do ser criminoso. 10 Referências Bibliográficas Brookes, E. (2021). Cesare Lombroso: Theory of Crime, Criminal Man, and Atavism. Simply Psychology. https://www.simplypsychology.org/lombroso-theory-of-crime-criminal-man-andatavism.html Cole, S. & Campbell, M. (2013). From subhumans to superhumans. Em Paul Knepper & Per Ystehede (Eds.), The Cesare Lombroso Handbook: Routledge Dias, J. & Andrade, M. (1997). Criminologia: O Homem Delinquente e a Sociedade Criminógena. 2.ª reimpressão: Coimbra Editora. Garcia-Pablos de Molina, A. (1990). Manual de criminologia. Direito Penal e Criminologia , 12 , 171. Knepper.P; Ystehede.P.J. (2013). The Cesare Lombroso Handbook. Routledge https://books.google.pt/books?id=WQQTsQDgqegC&printsec=frontcover&dq=The+Ce sare+Lombroso+Handbook&hl=ptPT&sa=X&redir_esc=y#v=onepage&q=The%20Cesare%20Lombroso%20Handbook& f=false Lacassagne, A. (1881). Les tatouages: étude anthropologique et médico-légale. Baillière Lombroso, C. (2010). O Homem Delinquente. (S. J. Roque, Trad.) 1ª Reimpressão: Ícone Editora. Mendes, D. (2006). Classificação dos criminosos segundo: Lombroso, Ferri e Garofálo. Núcleo de Pesquisa e Iniciação Científica da Faculdade Atenas: http://www.atenas.edu.br/uniatenas/assets/files/magazines/DIREITOS_HUMANOS_E_ A_ETICA_COOPERATIVA.pdf Schultz. A. C., de Oliveira Janoti, C. L., Baldan, É. L., & Marques, O. H. D. (2021). Criminologia & Vitimologia. 11