Introdução à História da Criminologia ➢ Criminologia ➢ Criminologia etiológico/causal-explicativa ➢ Criminologia e ciência ➢ Criminologia Moderna ➢ Período científico e pré-científico ➢ Criminologia Radical ➢ Criminologia ➢ Criminologia Ambiental clínica e criminologia geral/sociológica ➢ Criminologia clássica e neoclássica ➢ Criminologia Forense ➢ Paul Topinard, Cesare Beccaria, Jeremy ➢ Criminologia positiva Bentham, ➢ Atavismo Garofalo, Enrico Ferri Cesare Lombroso, Rafaele Etiologicamente, criminologia vem do latim crimen (crime) e do grego logos (estudo, tratado), significando estudo do crime. Atualmente a criminologia não estuda apenas o crime, mas também as circunstâncias sociais, a vítima, o criminoso etc. Criminologia - Consiste no estudo pluridisciplinar do fenómeno criminal, é uma ciência indutiva que parte do particular para o geral, analisando o ser. É uma ciência empírica que assenta na observação da realidade dos factos e na experimentação. É o conjunto de conhecimentos sobre o crime enquanto fenómeno social, e inclui os processos de elaboração das leis, de infração a essas leis e de reação à infração das leis, ocupandose da extensão do fenómeno criminal. Atualmente a criminologia estuda: • As causas, as manifestações e efeitos dos delitos • O delinquente, a vítima e o controlo social da conduta criminosa • As políticas públicas a desenvolver para prevenir/combater a criminalidade e os seus efeitos Pai da criminologia: a) Fundador da criminologia moderna Cesare Lombroso com a publicação em 1876 do seu livro “O homem delinquente” usualmente apontada como a obra fundadora da criminologia b) Antropólogo francês Paul Topinard que em 1883 terá usado pela primeira vez a palavra criminologia c) Raffaele Garofalo que usou o termo como nome de um livro científico – Criminologia – publicado em 1885 (aplicação da palavra no contexto internacional com esta obra?) Fases da criminologia: Período pré-científico: abordagem do crime desde a antiguidade de onde resultam preocupações com o fenómeno criminal. Quando começam a existir coerência na recolha de dados ou quando começa a escola clássica. Numa fase inicial, as questões do crime associado a questões da Igreja. Num primeiro momento histórico, a explicação das causas do crime estava associada a fatores sobrenaturais, causas demoníacas, divinas e não racionais ou supostas características intrínsecas dos indivíduos, que os conduzia a uma incapacidade de integração na sociedade e “prática do mal”. Século XVII – Marco do Direito Internacional e toda a diplomacia internacional. Neste século tiveram lugar os Tratados de Vestefália. A Europa nunca esteve tanto tempo em paz como nesta altura do séc. XVII. A chamada paz de Vestefália designa uma série de tratados que encerraram a Guerra dos 30 anos. Em primeira linha procurava-se recorrer à diplomacia, à negociação, encontrado outras soluções para os conflitos que não a vida da guerra. Percebeu-se que a noção de paz duradoura derivada de um equilíbrio de poder, noção essa que se aprofundou com o Congresso de Viena (1815) e com o Tratado de Versalhes (1919). A Paz de Vestefália, costuma ser o marco inicial do Direito Internacional e uma das bases de estudo das Relações Internacionais e estabeleceu os princípios que caraterizam o Estado moderno, destacando-se: ✓ Estado-nação ✓ Soberania ✓ Igualdade jurídica entre os Estados ✓ Territorialidade ✓ Não intervenção. - Este Tratado foi assinado em 24 de outubro de 1648 entre o Imperador Romano-Germânico, os principais alemães, o Reino de França e a Suécia, pôs fim ao conflito entre estas duas últimas potências e o Sacro Império. Séc. XVIII – Escola Clássica “Dos delitos e das penas’’ de César Beccaria. Nasceu em resposta aos excessos. “Quais são os fins da prisão, das penas?’’ e os limites ao poder do estado. Surgem pensadores que nos levam a pensar que algo tem de mudar, o estado tem de balizar e ter capacidade de olhar para o agente do crime como alguém que pode ser ressocializado. Não se preocupa tanto com o sujeito, mas sim com os fins das penas e o sistema punitivo do estado. Ambicionavam um sistema de justiça penal mais claro e igualitário. O direito de punir passou da vingança para a defesa da sociedade. Focava-se mais no estudo do sistema penal do que no comportamento do delinquente. Existe uma reflexão sistemática e coerente do crime. Partindo de um princípio geral e abstrato, o crime seria fruto de uma escolha racional. Essa escolha seria fundada no livrearbítrio, ou seja, o agente do crime quando comete o crime fá-lo com base num racional, ele pode escolher entre o bem e o mal. Para estes pensadores o crime era fruto de uma escolha racional. Ou seja, as pessoas avaliam os custos e os benefícios antes de cometerem determinados crimes. É exatamente em torno desta questão que surge um sistema penal que reage ao crime através de um efeito dissuasor da punição. Esta legitimidade de atuação encontrou fundamento também no contrato social entre seres humanos livres e racionais. - A pena é vista como uma violação do contrato social e por isso da vontade geral. A pena justa é a pena útil e só assim se conseguiria a prevenção de crimes. A pena a aplicar atuava numa lógica de dissuasão geral e especial, dirigida às pessoas capazes de livre-arbítrio excluindo-se os inimputáveis. - A metodologia é logico-dedutiva, não tendo lugar a observação dos factos. - Beccaria procurava fundar um sistema penal inteiramente fechado e autónomo face à religião e à moral, sem interferências de elementos externos. Defende que a lei deve ser clara, evitando a arbitrariedade do juiz. A pena a aplicar deveria constar na letra da lei e, quando aplicada, não deveria ultrapassar o limite por força do princípio da proporcionalidade e da legalidade. A obra “dos delitos e das penas” tem como principais temáticas: o fundamento e limites do direito de punir; a liberdade e segurança dos indivíduos, incluindo as garantias processuais e uma teoria sobre a pena. - Jeremy Bentham na sua obra “Princípios da Moral e da Legislação” foca o princípio da escolha racional, segundo a qual os indivíduos responsáveis pelas suas ações optam por comportamentos benéficos e não maléficos. Fundador do Utilitarismo clássico: a dor e o prazer, como base da motivação humana. Priorizam o prazer em detrimento da dor. Criador do projeto panótico, na vertente prisional, que se caracterizava por um edifício circular que permitia: maior segurança, menores custos, bom comportamento e maior introspeção para os reclusos. Criminologia Neoclássica – preocupa-se também como a dissuasão penal, mas coloca o foco no funcionamento do sistema normativo, ou seja, para além do delito e das finalidades das penas preocupa-se com os efeitos das penas nos delinquentes, se o agente vai ou não reincidir e a forma como o ser desviante encara o sistema normativo. Séc. XIX – Criminologia Positivista – é aqui que se fala no conceito de criminologia de forma interdisciplinar. Nasceu na Europa em meados do séc. XIX e só ficou consolidada em finais do séc. XIX tendo como autores proeminentes o trio de positivistas italianos – Lombroso, Ferri e Raffaele Garofalo. O objeto de estudo é o criminoso. Assenta as suas bases no empirismo, ou seja, na observação e experimentação. Tenta demonstrar que as características do criminoso o predisponham a praticar um delito, ou seja, já não existiria livre-arbítrio, mas sim determinismo. O individuo quando nascia era levado a cometer crimes em função das suas características, ou seja, agia por causas que fugiam ao seu controlo – relação direta entre as características do agente e a predisposição geral para cometer um certo tipo de crimes. Relação entre a fisiologia do sujeito e a maior ou menor predisposição para o cometimento de um crime. Os diversos tipos de criminalidade eram baseados num conjunto de causas especificas. - Enrico Ferri (determinismo social) – pai da sociologia criminal – apesar de ser considerado positivista, começou a preocupar-se não só com as características do sujeito, mas com o espaço que o envolve. - Raffaele Garofalo (corrente jurídica/psicológica) – jurista que afirmou que o crime estava no homem e que se revelava como degeneração deste. O seu grande trabalho foi conceber a noção de delito natural (violação dos sentimentos altruísticos de piedade e probidade). Classificou os criminosos em: assassinos, criminosos violentos, ladrões e criminosos lascivos. - Lombroso procurou criar uma ciência – antropologia criminal – por meio de pesquisa empírica, utilizou dados estatísticos na tentativa de comprovar que fatores biológicos estariam relacionados na etiologia do crime ou ciência das causas do fenómeno criminal, defendendo o atavismo que significa ancestral: reaparecimento de uma certa característica no organismo depois de várias gerações de ausência. Determinadas caraterísticas reveladas num sujeito poderiam surgir numa geração depois por transmissão hereditária de qualidades ou caraterísticas particulares, como por exemplo dimensões anormais do crânio e da mandibula e assimetrias da face: o criminoso nato. Os criminosos representam um tipo físico peculiar, distinto dos indivíduos não criminosos com uma forte carga biológica na explicação do crime. Desde a edição original da sua obra que este campo de saber tem sido questionado acerca das suas fronteiras, conteúdo, forma de atuação e relação com o campo de decisões. No fim do séc. XIX, começamos a assistir a um distanciamento a estas teorias pela Escola de Chicago nos EUA. Esta escola de que a Sociologia revela investigações importantes sobre alterações de normas sociais com investimento de mecenas para estas investigações (Rockfeller, investiu milhões neste tipo de estudos). Período científico: a maioria da bibliografia disponível aponta os estudos de Cesare Lombroso, com a sua obra “o homem delinquente” (1876) como o marco inicial da criminologia científica. A sua tese principal era o delinquente sem livre-arbítrio. Desenvolve-se um método que se foca na experiência, observação, empirismo, pretende-se chegar a uma resposta de forma objetiva, uma vez que, a ciência ganhou força com o final da 2ª guerra mundial. Ciência positivista empírica metodologicamente rigorosa. Transição do séc. XIX para o séc. XX – Criminologia Moderna - o objeto de estudo é o crime, o ser desviante, a vítima e os sistemas de controle social, há por isso um alargamento do espectro de análise. Atualmente a criminologia consiste no cruzamento dos saberes sobre o crime, a desviância e os sistemas de controle social articulando os conhecimentos de diferentes áreas científicas, bem como os seus métodos. Assim, a criminologia moderna vai buscar um pouco de várias áreas: biologia criminal, sociologia criminal, direito, medicina legal, psicologia criminal essencialmente, mas também a muitas outras áreas. Deve orientar a política criminal na prevenção especial e direta dos crimes socialmente relevantes e deve ainda orientar a política social na prevenção geral e indireta das ações que, embora não previstas como crimes, são reprovadas pela comunidade. Após a década de 1950 atingiu particular projeção no estudo das vítimas e também dos mecanismos de controlo social (a par do criminoso e do delito), verificando-se um alargamento do seu objeto. - A relação do delinquente com a escola, com a vizinhança - O papel da polícia no combate ao crime Subculturas desviantes – falta de oportunidades e circunstâncias como uma família desfavorecida conduzem os indivíduos a comportamentos desviantes Criminologia radical/crítica: criminoso como vítima da sociedade, tendo as suas bases no marxismo negando o capitalismo Criminologia ambiental: estuda eventos criminais, não do ponto de vista do delinquente como sujeito individual que está fora de contexto, mas como resultado do encontro entre um criminoso motivado para cometer um crime, em momentos específicos de espaço e tempo. O objeto de estudo é elemento ambiental/espacial dos crimes. O comportamento criminoso é influenciado pelo ambiente imediato em que ocorre. • Teoria das Atividades Rotineiras • Teoria da Escolha Racional • Teoria do Padrão Criminal • Teoria da Oportunidade Criminologia Clínica – procura uma explicação etiológica endógena (fatores internos) do crime e do homem criminoso. Procura uma causa da conduta criminosa que estaria no próprio homem – do particular para o geral. - Biologia Criminal, Criminologia Genética, Psiquiatria Criminal etc Criminologia Geral/Sociológica – explicação exógena (fatores externos) do crime, mais importante do que o homem criminoso é identificar o meio criminógeno, o contexto em que se encontra – do geral para o particular. Criminologia Forense: ciência auxiliar da justiça. Estudo científico do crime e dos criminosos com o objetivo de informar os processos investigativo e penal. Pode também ser considerada uma ciência forense e do comportamento. Tem metodologias próprias como o Profilling Criminal. Integra conteúdos de várias disciplinas como Ciências Forenses, Investigação Criminal, Psicologia Forense, Vitimologia, entre outras Criminologia Etiológica: criminologia que se preocupa com as causas, a explicação, importante na transição para o séc. XX, no séc. XIX explicava-se pelas características do sujeito que o predispunham para determinado crime. Teorias explicativas do crime ➢ Teorias sociológicas do consenso e do conflito ➢ Subcultura delinquente ➢ Labelling approach ➢ Escola de Chicago e Escola Ecológica ➢ Teoria crítica ou radical ➢ Teoria das zonas concêntricas ➢ Tolerância zero; Broken Windows ➢ Associação diferencial ➢ Teorias Bioantropologicas ➢ Anomia Após a década de 1950 (final da guerra mundial em que o mundo estava destruído) atingiu particular projeção no estudo das vítimas e também dos mecanismos de controlo social (a par do criminoso e do delito), verificando-se um alargamento do seu objeto. Surge a liberdade de investigar, em Portugal só aconteceu depois do 25 de abril. A moderna sociologia assenta nas chamadas teorias macrossociológicas (debruçam-se sobre sistemas sociais em larga escala, como o sistema político e a ordem económica), que influenciaram o pensamento criminológico, a saber: Modelos do consenso e Modelos do conflito O pensamento criminológico moderno é influenciado por duas visões: 1. Teorias de consenso: a Escola de Chicago, a teoria da associação diferencial, a teoria da anomia e a teoria da subcultura delinquente. As teorias do consenso entendem que os objetivos da sociedade são atingidos quando há um funcionamento perfeito das suas instituições, com os indivíduos convivendo e partilhando as metas sociais comuns, concordando com as regras de convívio. Aqui os sistemas sociais dependem da voluntariedade de pessoas e instituições, que partilham os mesmos valores. 2. Teorias do conflito: labelling aproach (teoria da rotulagem) e a teoria critica ou radical. As teorias de conflito defendem que a harmonia social decorre da força, em que há uma relação entre dominantes e dominados. Nesse caso, não existe voluntariedade entre os sujeitos para a pacificação social, mas esta é decorrente da imposição. Há sempre uma luta de classes ou de ideologias a enformar a sociedade moderna. As sociedades são sujeitas a mudanças contínuas, em que todos os elementos cooperam para sua dissolução. Os sociólogos contemporâneos afastam esta visão de luta de classes, argumentando que a violação da ordem deriva mais da ação dos indivíduos/grupos do que de um substrato ideológico e político. Escola de Chicago História da sociologia parte dos métodos de pesquisa, dos estudos sobre a sociedade realizados em instituições e organizações. Destacar a história das organizações ligadas à sociologia, em particular a Universidade de Chicago fundada em 1895 a partir de uma grande doação feita por John D. Rockefeller que em determinado momento da vida, quis fazer alguma coisa com o seu dinheiro, beneficiando a universidade de Chicago com uma grande doação. Em função do crescimento desordenado da cidade de Chicago, que se expandiu do centro para a periferia, inúmeros problemas sociais, económicos, culturais: pobreza, imigração e delinquência juvenil criaram um ambiente favorável à instalação da criminalidade, sobretudo pela ausência de mecanismos de controlo social A Escola de Chicago, atenta aos fenómenos criminais observáveis, passou a usar os inquéritos sociais na investigação por inúmeros sociólogos. Tais investigações sociais assentavam na realização de entrevistas, aplicadas por uma equipa junto de um determinado número de pessoas (amostragem), como por exemplo no percurso do recluso pós-reclusão. Utilizaram-se ainda análises biográficas que permitiram a verificação de um perfil de carreira delituosa. Estabeleceu-se a metodologia de colocação dos resultados da criminalidade sobre o mapa da cidade, pois a cidade é o ponto de partida da mesma (estrutura ecológica) – preocupação de olhar para o espaço físico que espelhava o espaço social. Há um poder informal que regula as relações (polícia informal) que são as relações de vizinhança baseadas num mecanismo solidário de mútuas relações, acaba por ser um controlo informal de comportamentos desviantes, na medida em que uns tomam conta dos outros assegurando o bem-estar do bairro. Os estudos sociológicos americanos foram a priori marcados por uma influência significante da religião. Processo de secularização: perda gradual da influência da Igreja na relação com o estado e nas nossas vidas. É com esta perda que a ciência começa a ganhar força. Ciência para efeitos de apoio à decisão, ou seja, conhecer a realidade, fazer o diagnostico e apresentar soluções Importa destacar a importância dos estudos da escola de Chicago bastante relevantes para a compreensão da criminalidade urbana e para o estabelecimento de uma relação entre as desvantagens sociais e a prática de crimes. Teoria ecológica – ligação entre o espaço e o crime Conceitos para que se possa entender a ecologia criminal e seu efeito criminogeno: • A ideia de desorganização social • Identificação de áreas de criminalidade O crescimento desordenado das cidades faz desaparecer o controlo social informal; as pessoas tornam-se anónimas e a família, igreja, trabalho, associações locais etc. não conseguem impedir comportamentos anti sociais. Estes comportamentos dificilmente serão entendidos sem recurso ao conhecimento do meio social e dos principais valores e orientações culturais que esse meio encerra, e como tal deve ser entendido como um produto de uma socialização que entra em clara competição subcultura e, no limite, em confronto com as normas e valores vigentes. A ausência completa do Estado (não há esquadras, escolas, hospitais, creches etc.) cria uma sensação de anomia e insegurança, potenciando o surgimento de grupos armados/delinquentes – teoria das janelas partidas (falta de vigilância, controlo e guardiões) Teoria das zonas concêntricas Para Shecaira (2008), uma cidade desenvolve-se, de acordo com a ideia central da teoria ecológica, segundo círculos concêntricos, através de um conjunto de zonas ou anéis a partir de uma área central. ▪ No mais central desses anéis estava a zona comercial com os seus grandes bancos, armazéns, fábricas, a administração da cidade ▪ A segunda zona, chamada de zona de transição, situa-se entre zonas residenciais (3ª zona) e a anterior (1ª zona), que concentra o comércio e a indústria. Como zona de transição, é objeto de degradação constante. Favorece a criação de guetos. ▪ 3ª zona mostra-se como lugar de moradia de trabalhadores pobres e imigrantes ▪ 4ª zona destina-se aos conjuntos habitacionais da classe média ▪ 5ª zona compõe-se da mais alta camada social As principais propostas da ecologia criminal que visam o combate à criminalidade são: • Alteração efetiva da situação socioeconómica das crianças • Programas comunitários para tratamento e prevenção • Programas comunitários de recreação e lazer, no desporto, escuteiros, artesanato, excursões, etc. • Reurbanização dos bairros pobres, melhoria da estética e do modelo de casas, etc. A principal contribuição da Escola de Chicago deu-se no campo da metodologia (técnicas e instrumentos como os inquéritos porta a porta, as amostragens) e da política criminal (soluções que visem mitigar os comportamentos delinquentes) com foco na prevenção, reduzindo a repressão. Associação diferencial O sociólogo americano Edwin Sutherland afirma que o comportamento do criminoso é aprendido, nunca herdado, criado ou desenvolvido pelo sujeito. Surgiu no final dos anos 1930 a expressão white collar crimes para designar os autores de crimes específicos, que se diferenciavam dos criminosos comuns. - A associação diferencial é um processo de apreensão de comportamentos desviantes. A aprendizagem do comportamento desviante dá-se no decurso de uma interação. • A criminalidade é uma consequência de uma socialização incorreta • As classes sociais mais altas acabam por influenciar as mais baixas, inclusive em razão do monopólio dos meios de comunicação em massa que criam estereótipos, comportamentos etc Há que considerar o contexto físico e o seu significado, assim como o papel da organização social diferencial e do fechamento das áreas urbanas desfavorecidas na explicação da emergência e racionalidade sociológica do subculturalismo que o comportamento anti social comporta. Sutherland afirma que os indivíduos associam-se a atividades anti-sociais porque aprendem e interiorizam padrões comportamentais dessa índole com mais frequência, duração, prioridade e intensidade do que o fazem com padrões normativos impostos pela sociedade. Anomia: a teoria da anomia não compreende o delito como uma anomalia. Esta teoria insere-se nas correntes funcionalistas, desenvolvidas por Merton e Durkheim. Para os funcionalistas, a sociedade é um todo orgânico articulado que, para funcionar perfeitamente, necessita que os indivíduos interajam num ambiente de valores e regras comuns. Sempre que o Estado falha é preciso criar condições para preservar esse equilíbrio; se isso não for possível, haverá uma disfunção. - A anomia é uma situação de ausência de coesão e ordem, sobretudo no que diz respeito a normas e valores. Merton elaborou um esquema no qual explica o modo de adaptação dos indivíduos em face das metas culturais (status, poder, riqueza etc.) e os meios institucionalizados disponíveis (escola, trabalho etc.), assinalando como positivo quando o homem aceita o meio institucionalizado e a meta cultural, e como um sinal negativo quando os reprova. Subcultura delinquente: A teoria da subcultura delinquente criada pelo sociólogo Albert Cohen (Delinquent boys, 1955). Identificam-se como exemplos os grupos de jovens delinquentes, em que os mesmos passam a aceitar os valores daquele grupo, admitindo-os para si mesmo, desvalorizando os valores sociais dominantes. Segundo Cohen, a subcultura delinquente caracteriza-se por três fatores: a) O não utilitarismo da ação revela-se no fato de que muitos delitos não possuem motivação racional (ex.: alguns jovens furtam roupas que não vão usar), apenas para ganhar o respeito pelos pares, valorização pessoal b) A malícia na conduta: o prazer em prejudicar o outro (ex.: o medo que grupos de jovens provocam naqueles que não os integram); c) O negativismo da conduta: revela-se como um polo oposto aos padrões da sociedade. A existência de subculturas criminais apresenta-se como forma de reação de algumas minorias desfavorecidas perante as exigências sociais de sobrevivência. Labelling approach/Teoria da Rotulagem: interacionismo simbólico, rotulação ou reação social. Não é tanto resultado aquilo que a pessoa está a fazer, mas sim aquilo em que eu acredito de que são exemplo as tatuagens. - Surgiu nos anos de 1960, nos EUA, e os seus principais autores foram Erving Goffman e Howard Becker. Ambos referem que o desvio não decorre de uma meta-social, mas sim de uma ordem socialmente instituida, descontínua e e complexa – inconvencionalidade das praticas sociais geradoras de julgamentos de valor. - Segundo esta teoria, a criminalidade não é uma qualidade da conduta humana, mas a consequência de um processo em que se atribui tal “qualidade” (estigmatização) – rótulo. O criminoso apenas se diferencia do homem comum em razão do estigma que sofre e do rótulo que recebe. O tema central desta teoria é o processo de interação em que o indivíduo é chamado de criminoso. A sociedade define o que entende por conduta desviante, impondo sanções aos que se comportarem dessa forma. Os comportamentos desviantes são aqueles que as pessoas de uma sociedade rotulam às outras que as praticam. • A teoria da rotulação de criminosos cria um processo de estigma para os condenados. • O indivíduo acaba por sofrer a reação da família, amigos, conhecidos, colegas, o que acarreta a marginalização no trabalho, na escola, etc. - Defende que a criminalização primária produz o rótulo que, por sua vez, produz a criminalização secundária (reincidência). O rótulo (materializado nos antecedentes, registo criminal, divulgação de jornais sensacionalistas, etc.) acentua negativamente o indivíduo, causando a expetativa social de que a conduta venha a ser praticada, perpetuando o comportamento delinquente e aproximando os indivíduos rotulados uns dos outros. Teoria crítica ou radical: início do século XX, com o trabalho de Bonger, que entende ser o capitalismo a base da criminalidade, na medida em que promove o egoísmo; e este, por seu turno, leva os homens a delinquir. - Afirma ainda que as condutas desviantes dos menos favorecidos são as efetivamente perseguidas, ao contrário do que acontece com a criminalidade dos poderosos – vide justiça de classes – quem tem mais recursos à partida terá acesso a uma justiça de vá ao encontro das suas expectativas. Esta teoria vê o processo de estigmatizacão da população marginalizada, que se estende à classe trabalhadora, alvo preferencial do sistema punitivo, e que visa criar um receio da criminalização e da prisão para manter a estabilidade da produção e da ordem social. Principais características da corrente crítica: a) A conceção conflitual da sociedade e do Direito (o Direito Penal protege os interesses do grupo social dominante); b) Reclama a compreensão pelo criminoso; c) Critica severamente a criminologia tradicional; d) O capitalismo é a base da criminalidade; e) Propõe reformas estruturais na sociedade para redução das desigualdades e consequentemente da criminalidade. Neo-retribucionismo Uma abordagem diferenciada surge nos EUA, com a denominação lei e ordem ou tolerância zero (zero tolerance), decorrente da teoria das janelas quebradas (broken windows theory), inspirada pela escola de Chicago, conferindo um caráter sagrado aos espaços públicos. Ausência de segurança, transmite a ideia de que não há nada que se preocupe, nem sequer a polícia informal, daí existirem todas as condições para existir o desvio – relacionado com a teoria da anomia. - Parte da premissa de que os pequenos delitos devem ser combatidos, o que inibiria os mais graves (extinguir o mal à nascença), atuando como prevenção geral. Os espaços públicos e privados devem ser salvaguardados e preservados. - Alguns autores discordam dessa teoria, no sentido de que produz um elevado número de indivíduos presos A teoria das janelas partidas (ou broken windows theory), desenvolvida nos EUA e aplicada em Nova Iorque, através da Operação Tolerância Zero, implementada pelo chefe de polícia de Nova Iorque, William Bratton, reduziu consideravelmente os índices de criminalidade naquela cidade. Como resultado assistiu-se a uma redução satisfatória da criminalidade em Nova York, que antigamente era conhecida como a “Capital do Crime”. Hoje essa cidade é considerada uma das mais seguras dos EUA. Uma das principais críticas a essa teoria está no fato de que, com a política de tolerância zero, verificou-se a prisão em massa dos menos favorecidos (prostitutas, mendigos, sem-abrigo, etc.). O nexo de causalidade entre a ausência de ordem e criminalidade é muito maior do que a relação entre criminalidade e pobreza, desemprego, falta de casa, etc. Teorias bioantropologicas Os primeiros estudos bioantropológicos, foram desenvolvidos por Lombroso, com um predomínio das análises morfológicas e fisionómicas. Nesse prisma, ganhou relevo a antropometria (estudos das medidas e proporções do organismo humano para fins de estatística e comparação), que serviria de base para os estudos subsequentes. Na era pós-lombrosiana desenvolveram-se estudos biotipológicos, endocrinológicos e psicopatológicos. Na medida em que as teses anatómicas sobre a conduta humana foram-se revelando insuficientes para a causalidade criminal, surgiram novas teses de conteúdo psiquiátrico. Merecem destaque as teorias dos tipos de autor e das personalidades psicóticas. Kretschmer distinguiu 4 tipos de constituição corporal: 1) Leptossómicos: alta estatura, tórax largo, peito fundo, cabeça pequena, pés e mãos curtos, cabelos crespos (propensão ao furto). 2) Atléticos: estatura média, tórax largo, musculoso, forte estrutura óssea, rosto uniforme, pés e mãos grandes, cabelos fortes (crimes violentos). 3) Pícnicos: tórax pequeno, fundo, curvado, formas arredondadas e femininas, pescoço curto, cabeça grande e redonda, rosto largo e pés, mãos e cabelos curtos (menor propensão ao crime). 4) Displásicos: pessoas com corpo desproporcional, com crescimento anormal (crimes sexuais). As maiores críticas a essa corrente foram no sentido de que tinham forte tendência discriminatória, adotadas por regimes ditatoriais (nazismo/fascismo) para justificar a eliminação de raças inferiores. Estas teorias defendem que há pessoas predispostas para o crime, cuja explicação depende de variáveis congénitas (relativas à estrutura orgânica do indivíduo). O criminoso é um ser organicamente diferente do cidadão normal. Desde a segunda metade do século XX, a genética médica tem procurado destacar a possibilidade de transmissão de fatores hereditários na génese do delito. O fundamental, como defendem diversos autores, é que o estudo do desvio deve incidir, sobretudo, em investigações sobre a pessoa e a sua interação com o contexto e a sociedade Representações sociais do crime – o custo social e económico do crime ➢ Geografia do medo ➢ Topofobia ➢ Geografia do crime ➢ Pânico moral ➢ Geografia da (in)segurança ➢ Criminologia ambiental ➢ Sentimento subjetivo de (in)segurança ➢ Custos de antecipação do crime ➢ Custos sociais do crime ➢ Custos agregados por crime ➢ Custos tangíveis e intangíveis do crime ➢ Síndroma da insatisfação relativa O crime encontra-se associado a um fenómeno complexo denominado “medo do crime”, sendo difícil encontrar uma definição académica consensual. Garofalo definiu o medo do crime como uma “reação emocional caracterizada por uma sensação de perigo e de ansiedade devido a ameaças de danos físicos sentida através de sinais existentes no meio envolvente e que, de alguma forma, estão associados ao crime”. A imagem do mundo onde vivemos forma-se na mente através da perceção que cada um tem do espaço à sua volta. O medo do crime varia em função da perceção subjetiva de uma ameaça criminal potencial, da gravidade dessa ameaça, de vulnerabilidades pessoais, reais ou imaginadas e de um consequente risco, real ou imaginário, de se ser vítima. Geografia da insegurança: relaciona-se com a reação gerada em mim, um medo que me leva a achar que determinada zona é perigosa, apesar de nunca me ter acontecido nada. Mapas de criminalidade: são possíveis devido à análise de dados registados relativos à criminalidade declarada. O medo do crime evolui de forma autónoma em relação à criminalidade, condicionada pelos discursos que sobre ela são realizados, o que proporciona a que a perceção geográfica do medo seja, por vezes, distinta da geografia do crime efetivamente reportada. Geografia do medo: Os bairros de habitação social e as zonas de habitação precária ou degradada são os locais onde o cidadão médio canaliza o seu medo e onde localiza o foco principal da insegurança urbana. As áreas menos receadas são as áreas onde se crê̂ que residam os estratos socioeconómicos mais elevados da população. Reprovamos um comportamento porque o rotulamos como censurável. - Medo – algo que nos invade o espírito, por vezes ficamos imóveis em função deste sentimento. Reprovamos um comportamento porque o rotulamos como censurável. Geografia do crime: variável mais objetiva, aquilo que verdadeiramente acontece. Poderá haver um desfasamento entre a geografia do crime e da geografia do medo sobretudo associado a estudos realizados em Portugal que apontam a zona do Casal Ventoso como a zona de lisboa que é percecionada como mais insegura, não sendo, contudo, a zona onde se registava mais crime. O discurso popular localiza o perigo nos bairros de habitação social e zonas de habitação precária (barracas etc) ou degradada são os locais onde o cidadão médio canaliza o seu medo e onde localiza o foco principal da insegurança urbana. Topofobia: medo em relação ao espaço (espaço inseguro) – medo ou aversão ao ambiente, ao espaço, injustificado sobre certos lugares. Medo irracional, no fundo não temos motivo para ter aquele medo. Pânico moral: exercício/crescendo que nos vai possuindo o espírito de medo, ódio e que geram reações que podem não ter um fundo objetivo. Aderir a uma determinada mensagem que na sua base podem existir elementos que não são objetivos. Produz-se um discurso moral em volta do problema que visa a formação do consenso social. Estes fenómenos tendem a ocorrer em períodos de crise social. Mais do que uma súbita erupção da preocupação, o pânico moral é uma estratégia comunicacional adotado por determinados grupos de pressão, com o objetivo de alcançarem a ‘voz’ pública. Criminologia ambiental: subdisciplina da Criminologia que estuda eventos criminais, não do ponto de vista do delinquente como sujeito individual que está fora de contexto, mas como resultado do encontro entre um criminoso motivado para cometer um crime, em momentos específicos de espaço e tempo. O objeto de estudo é a o elemento ambiental/espacial dos crimes. O comportamento criminal é influenciado pelo ambiente imediato em que ocorre. - Quando mexemos nas variáveis do espaço, nas condições do espaço estamos a aumentar o sentimento de segurança. - Quanto menor for a violência maior será a intolerância à violência e, consequentemente, maior o sentimento de insegurança. Sentimento subjetivo de (in)segurança: O medo do crime varia em função da perceção subjetiva de uma ameaça criminal potencial, da gravidade dessa ameaça, de vulnerabilidades pessoais, reais ou imaginadas e de um consequente risco, real ou imaginário, de se ser vítima. Muito daquilo que nós sentimos, normalmente não residem em dados objetivos, não é porque tenha acontecido algo connosco, mas daquilo que ouvimos, lemos e vemos. Custos sociais do crime: atividades que impactem a sociedade por exemplo menos poluição e crimes e mais educação e serviços de transporte; e custos externos – custos impostos por uma pessoa sobre outra que não os aceita de livre vontade. Governo canaliza fundos para a área da segurança, desviando-os de outras áreas essenciais como a saúde, educação etc Lourenço (2010) chama-nos a atenção para um conjunto de conceitos que nos ajudam a compreender os custos do crime para a sociedade que vão para além dos efeitos imediatos nas vítimas ou na dimensão psicológica e económica do impacto direto. A criminalidade associa-se diretamente à emergência do sentimento de insegurança que gera efeitos que devem ser medidos na dimensão social e económica, pois uma maior segurança pública acarreta custos que recaem sobre toda a sociedade. O conhecimento dos custos económicos e sociais do crime é um instrumento valiosos para avaliar e monitorizar as políticas publicas de segurança e a validação da eficiência das medidas de prevenção e combate do crime Custos tangíveis e intangíveis do crime: aquilo que é palpável e o que não é. Os intangíveis, o impacto na vítima por exemplo o deixar de frequentar determinados espaços, ou seja, dor, sofrimento, sentimento de insegurança. Danos morais, a parte que não é quantificável. A parte tangível por exemplo para além das lesões físicas, o bem afetado, ou seja, perdas de propriedade e resultantes da agressão física. Custos agregados por crime: os custos não são só para a vítima, mas para a sociedade, para o sistema. Cada crime tem agregado a si um conjunto de custos. Desde que à notícia do crime até haver condenação ou absolvição avalia-se os custos com a manutenção das forças e serviços de segurança, funcionamento dos tribunais e serviços prisionais, gastos públicos com as vítimas, em questões de saúde sobretudo desde a deslocação para o hospital, os médicos, possíveis indeminizações, tempo que se perde nos tribunais, gasóleo, etc. O custo social difere em função dos crimes: ➢ Crime de furto vai ter um custo ➢ Violação terá outro custo em função da trajetória na sua globalidade Custos de antecipação do crime: Custos que não têm necessariamente de decorrer do crime, mas da antecipação do crime, por exemplo muros, segurança privada, sistemas de vigilância, ou seja, não decorre do crime, mas é sim uma prevenção, uma antecipação do crime. De que são exemplo as propostas de políticas públicas. Falamos de medidas de precaução para evitar a vitimação. A análise do custo do crime é um contributo indispensável à construção de indicadores dos impactos do crime na vida dos indivíduos e da sociedade e, por isso, elemento essencial na definição das políticas publicas mais transparentes de prevenção e combate da criminalidade e sua monitorização e avaliação. Síndroma da insatisfação coletiva (sociólogo francês Durkheim apresenta este conceito): quanto menor for a violência maior será a intolerância à violência e, consequentemente, maior será o sentimento de insegurança. Insatisfação relativa, porque na verdade factualmente não há motivo para isto quando comparado com outras áreas geográficas. Os media/OCS – criam-se imagens mentais extremamente negativas sobre determinadas áreas das cidades que conduzem a atitudes evasivas e consequentemente de maior receio e medo de por lá circular. Construção daquilo que noutros tempos era o imaginário uma sociedade sem televisão, só com rádio que passava apenas aquilo que o regime entendia que devia passar informação. Recuemos atrás da rádio, o sentimento de insegurança advinha das conversas de café. Com o crescimento dos meios de informação, televisão, rádio surge o conhecimento de que atrás do ser humano existe um lado mórbido, promíscuo que até então era desconhecido. Cifras negras: determinados comportamentos delituosos que constituem um desfasamento entre e criminalidade conhecida pelo sistema penal e a criminalidade real. Criminalidade desconhecida, oculta, não denunciada que não chega ao conhecimento das autoridades policiais. Cifras douradas: crimes de colarinho branco (ambientais, financeiros etc por oposição aos crimes de rua) Mapas de criminalidade: são possíveis devido à análise de dados registados relativos à criminalidade declarada Métodos, técnicas de pesquisa e fontes de informação ➢ Fontes da Verdade ➢ Método científico ➢ Conhecimento empírico e senso comum ➢ Paradigmas quantitativo/qualitativo ➢ Investigação empírica ➢ Efeito rashomon ➢ Ética na investigação ➢ Fontes na criminologia ➢ Dilema da dupla fidelidade ➢ Estudos de follow-up ➢ Obstáculos epistemológicos ➢ Os biogramas ➢ Vigilância epistemológica ➢ Inquéritos à vitimação e de autodenúncia ➢ Triangulação metodológica ➢ Tábuas de prognose ➢ Método dedutivo e método indutivo ➢ RASI, RAMVD Como fonte de verdade mais fidedigna temos a ciência, que é considerada de facto a mais recente fonte da verdade em decurso de um processo de secularização. Investigar e fazer ciência pressupõe um percurso, métodos fundamentados para alcançar uma teoria que tenha verdadeiro valor científico, seja verosímil e irrefutável. Podemos referir-nos para além da ciência como o mais novo método de procura da verdade, a outras fontes de verdade: • Intuição (desde a imaginação brilhante até à conjetura ingénua) • Autoridade (que nos diz o que é verdade) • Tradição (que encontra a verdade em qualquer asserção que há longo tempo tinha sido aceite como verdadeira) • Bom senso (um conveniente vale-tudo que inclui observação casual) O método é o conjunto de operações pelas quais uma disciplina procura atingir as verdades que persegue, demonstrá-las e verificá-las. Para o conhecimento ser válido cientificamente tem de assentar no método científico assegurando as seguintes características: • Objetividade – imparcialidade possível pois a subjetividade atravessa toda a investigação científica • Coerência/clareza – as partes não devem opor-se ao todo • Universal – todos os fenómenos podem ser objeto de investigação científica, deve existir evidencia factual e replicabilidade por outrem • Válido/verdadeiro – a verdade absoluta não existe. Embora a ciência procure a verdade, na realidade nunca podemos ter a certeza de que os nossos conhecimentos ou as nossas teorias são completamente verdadeiras • Rigor teórico e metodológico • Método – no caso a investigação criminal é investigação científica porque nos traz resultados através de um método/procedimento cuidado para se puder analisar dados. Podendo a investigação assentar em métodos quantitativos ou qualitativos para responder à pergunta de investigação • Necessidade – método necessário à produção de conhecimento através do estudo de um objeto • Liberdade – conhecimento científico livre de valores éticos ou políticos, centrando-se naquilo que é observável e mensurável. Científico será todo o sistema que consiste num conjunto de hipóteses que podem ser negadas mediante factos observáveis. A Criminologia aspira à aplicação do método científico no estudo do fenómeno criminal procurando descrever e explicar a realidade concedendo uma importância à observação de factos empíricos, à experiência, sobretudo porque através da observação é possível saber se uma dada teoria ou hipótese é falsa ou verdadeira. É decisivo o uso da metodologia através da qual se realizam observações participantes, entrevistas, inquéritos, estatísticas oficiais. Princípios orientadores da pesquisa científica, segundo o antropólogo Umberto Eco: ▪ abordar um tema reconhecível e definido de tal modo que seja igualmente reconhecível pelos outros; ▪ revelar sobre esse objeto coisas que não tenham sido já́ ditas ou revê̂ com uma ótica diferente coisas que já́ foram ditas; ▪ é útil aos outros, pragmática e utilitária; confirma ou valida a hipótese (explicação provisória sobre determinado facto). O método assenta na utilização das regras do pensamento racional, concebido através de duas estratégias: ✓ Método indutivo – do simples para o complexo, do próximo para o afastado, do singular para o geral ✓ Método dedutivo – do genérico para o particular, do complexo para o simples Na criminologia recorremos a estudos indutivos, isto é, partimos de um caso em particular e depois divergimos para o mais complexo, começamos a desenvolver o raciocínio extrapolando aquele caso para o todo, contrariamente ao direito penal. Em determinadas situações, certos setores sociais e políticos podem reclamar penas mais elevadas por entenderem que terá como consequência uma prevenção do crime. Contudo, a ciência não se contenta com a ideia de o crime parecer lógico, exigindo algum tipo de observação ou de experiência que demonstre se, efetivamente, penas mais pesadas são eficazes no controlo do crime ou se, pelo contrário, não surtem qualquer efeito ou até contraproducentes – ainda que isto possa parecer pouco razoável para muitas pessoas. Uma das pretensões do conhecimento científico é superar esta ideia de senso comum, daquilo que parece ser o mais lógico. Por outro lado, o conhecimento deve ser empírico assim como a própria investigação. A criminologia tenta construir teorias e extrair delas hipóteses por dedução e submetê-las à refutação e, no caso de serem irrefutáveis sob qualquer ponto de vista então falamos de uma teoria com valor científico e verosímil comprovada por factos observáveis e mensuráveis e não apenas naquilo que é o senso comum. A criminologia configura-se como uma ciência livre de valores. Segundo Weber, a ciência e o valor movemse em planos diferentes. A ciência estuda aspetos empíricos da realidade, de modo que não nos pode dizer que valores éticos ou políticos são superiores. A valorização ética de determinados factos ou hipóteses costuma dar lugar a opiniões totalmente opostas, mesmo quando provenientes das mesmas posições ideológicas. a discussão pode levar a que sejam reclamadas limitações éticas à investigação, quando a regra é que, embora seja provável que tenham de existir, têm de ser excecionalmente melhores Obstáculos epistemológicos - Fatores extracientificos que nos podem afastar da objetividade. Ex: receio daquilo que os outros possam pensar, em alguns casos aquilo que eu escrevo pode resultar na morte. A ciência é incomoda para quem esta no poder, sobretudo as ciências sociais. Tudo o que nos possa afastar da isenção, fatores externos como a pressão do nosso chefe e as internas como os preconceitos, estereótipos. Dilema da dupla fidelidade – ocorre sobretudo quando queremos estudar o espaço onde trabalhos, ou vivemos em que de certa forma temos uma fidelidade/lealdade para com a academia, a universidade, temos de prestar contas de um trabalho sério, honesto, rigoroso, mas depois também há uma fidelidade com o espaço em que vivemos. Por um lado, os resultados podem beliscar a instituição – obra de helena machado, sociologia do crime Vigilância epistemológica: estar atentos para não nos deixarmos afetar pelos obstáculos epistemológicos. Ter noção de que é importante não nos deixarmos influenciar com os nossos preconceitos e com elementos externos. Exercício de estarmos permanentemente alerta para não nos deixarmos influenciar. Importa termos consciência de que fizemos tudo o que era possível para diminuir a subjetividade, que está sempre presente, cabe-nos a nos diminuir essa subjetividade. Efeito rashomon: cada pessoa que vai dar um testemunho, apresenta uma versão diferente da realidade. A realidade é uma, mas consoante a nossa experiência académica, experiência pessoal, preconceitos, experiência social, podemos ter leituras diferentes em função dos factos. Visões diferenciadas da mesma realidade. Para contrariamos este efeito temos de triangular, cruzar informação, para chegarmos a verdade. Consiste em versões diferentes e contraditórias sobre o mesmo objeto de estudo Triangulação metodológica (Plattan, 1990): no estudo científico do crime deverá estar uma perspetiva interdisciplinar que reúna uma combinação de diversos métodos ou dados, implicando a consulta de uma variedade de fontes num mesmo estudo. Falamos assim do uso de vários investigadores provenientes de áreas diversas, cruzando diferentes perspetivas teóricas, metodologias e técnicas de pesquisa. Deverá se atender aos fatores sociais e culturais para além dos biológicos, psicológicos e económicos. É necessária uma radiografia objetiva daquilo que acontece em Portugal não nos podemos cingir ao RASI. Em ciência não há verdade absoluta. O que interessa é saber porque é que há versões contraditórias, e não qual é a verdade absoluta. O estudo científico exige uma perspetiva interdisciplinar e de integração metodológica que pressuponha e reúna diferentes áreas do saber e métodos diversos num objetivo comum. NOTA: Crimes preterintencionais – crimes cujo resultado vai para além do esperado Qualquer investigação implica a leitura do que outras pessoas já escreveram sobre a área do seu interesse, a recolha de informações que fundamentam ou refutem os seus argumentos e a redação das suas conclusões. Como é que o objeto de estudo tem sido estudado – estado da arte - Já foram feitas investigações sobre este assunto? O que é que já se sabe sobre este assunto? Paradigma qualitativo vs paradigma quantitativo O objeto de estudo é que define a metodologia e a escolha do paradigma/modelo é fundamental. Apesar de não ser impossível, razões pragmáticas aconselham-nos a escolher apenas um, uma vez que, combinar os dois paradigmas: • Aumenta em demasia a dimensão do estudo • É mais caro e moroso • E é raro encontrar um investigador que domine os dois paradigmas As correntes integracionistas privilegiam as técnicas de pesquisa que permitem o acesso e compreensão dos universos simbólicos de atores sociais e respetivas práticas quotidianas – metodologias qualitativas • Objetivos: compreensão dos fenómenos de forma indutiva, procurando compreender os sujeitos a partir dos seus quadros de referência. • Ponto fraco: subjetividade na recolha de dados As correntes funcionalistas privilegiam as técnicas de recolha de informação em grande escala, que permitam conclusões extensíveis à análise ampla e extensiva das próprias estruturas sociais – metodologias quantitativas • Objetivos: encontrar variáveis, testar teorias e fazer descrições recorrendo ao tratamento estatístico dos dados recolhidos • Ponto fraco: falta de análise aprofundada dos dados recolhidos Técnicas de investigação sociológicas mais usadas ao nível dos estudos sobre o crime: 1. Inquéritos sociais: consistem em técnicas que procedem a uma recolha no terreno de dados suscetíveis de comparação. São aplicados a uma amostra estatisticamente representativa de modo a permitir uma posterior análise quantitativa da informação apurada. Podem ser aplicados sob a forma de entrevista (investigador presente) ou questionário (investigador ausente). Perguntas fechadas, focadas nos conhecimentos e opiniões do entrevistado. a) Inquéritos de autodenúncia – pergunta-se às pessoas que crimes terão cometido num determinado período de tempo. b) Inquéritos à vitimação – colocam-se questões sobre experiências como vítimas de crimes: se durante um determinado período de tempo as pessoas foram vítimas de crimes, quantos e de que tipo e quais os motivos que conduziram as vítimas a renunciar à sua participação às instâncias formais Pontos fortes: consegue-se analisar a extensão e profundidade dos conhecimentos dos entrevistados sobre as vítimas de crime (experiências pessoais ou de conhecidos), sentimentos característicos das vítimas Pontos fracos: resistência em admitir a prática de crime, assim como aa falhas de memória 2. Estudos de caso: adquirem particular importância no âmbito da sociologia do crime. Recorre a várias técnicas como a entrevista, observação participante, análise documental, orientada numa perspetiva compreensiva da conduta humana a partir dos sujeitos/grupos estudados. Perguntas abertas focadas nas vivencias pessoais Pontos fortes: obtenção de dados aprofundados e próximos da realidade estudada traduzidos em relatos emocionais Pontos fracos: os dados apuráveis não são generalizáveis assim como a fiabilidade da informação que depende muito do investigador (sensibilidade, conhecimento, experiência) 3. Observação: pode ser direta (não há envolvimento do investigador, que apenas observa) ou observação participante (o investigador observa e participa ativamente na vida do grupo/comunidade ou organização que é objeto de investigação focando-se nos acontecimentos possíveis desse grupo) – papel que o investigador desempenha junto da população observada. Tem vindo a ser usada como uma técnica principal de recolha de dados Ponto fraco: o contacto com grupos envolvidos em atividades ilícitas pode colocar problemas deontológicos decorrentes de eventuais conflitos de interesse entre o investigador e a população que é alvo de estudo - O objetivo de ambas as técnicas é a recolha da informação. A observação ativa pressupõe que as pessoas não saibam que estão perante um investigador e isto levante questões éticas. 4. Estudos de follow-up – a sua origem remonta-se na sua maioria a estudos sobre reincidência, pelo que um dos campos privilegiados de atuação é o acompanhamento de carreiras delinquentes, em particular após um tratamento institucional. Biograma – tipo de estudo follow-up – método sugerido na análise das trajetórias de vida do sujeito. Este método teve origem nso estudos droga-crime de Agra e Matos, contudo, pode ser utilizado em diversas áreas: na intervenção com jovens, vítimas, agressores. Permite uma visualização clara e objetiva das trajetórias existenciais dos sujeitos em vários níveis, como a família, o trabalho, escola, relacionamento social e outras dimensões. 5. Estatísticas criminais – MAI, MJ, RASI (dados estatísticos apenas), APAV, PSP, GNR, PJ – as estatísticas reportam-se aos crimes chegados ao conhecimento das autoridades policiais sobre crimes registados pela PJ, GNR, PSP, Alfandegas etc. Pontos fortes: são importantes no sentido em que facultam dados sobre os crimes denunciados às autoridades policiais e por isso conhecimento sobre a criminalidade registada e por outro lado também dados sobre o funcionamento da justiça penal no que diz respeito à caracterização dos processos-crime. Pontos fracos: as estatísticas criminais não refletem a verdadeira dimensão do crime pelo facto de incidirem sobre os crimes denunciados às autoridades policiais. São uma fonte pouco fidedigna relativamente a certos tipos de crime como os crimes sexuais, económicos e de corrupção que fazem parte das cifras negras. No caso da APAV muitos dados oficiais de crimes de violência doméstica e crimes de natureza sexual não são inteiramente fiáveis por prevê-se que um número elevado de ocorrências fique por denunciar por constrangimentos de ordem pessoal (a vítima receia represálias) e de ordem jurídica (demoras nos processos dificuldade associada nomeadamente por recear não ser credível porque não tem provas) Tábuas de prognose – medições estatísticas feitas normalmente por psicólogos com o intuito de verificar a condição/evolução do recluso no decorrer do cumprimento de pena, avaliando as probabilidades de vir a delinquir/reincidir RASI: os relatórios anuais do RASI reúnem informação oficial de caráter diverso: estatísticas criminais em Portugal e na Europa, mapas distritais de criminalidade, referencias a legislação e programas específicos em matéria de prevenção da criminalidade, analise especifica e detalhada de delinquência juvenil, inquéritos internacionais que permitem uma perspetiva comparativa da criminalidade em diferentes países europeus. Contudo estes dados não são suficientes, pelas cifras negras atrás referidas. É necessária a triangulação de fontes. O RASI só nos apresenta uma pequena parcela da criminalidade real, crimes semipúblicos e particulares muitas vezes não são contabilizados, portanto, de salientar as cifras negras. 6. Inquéritos à vitimação: permitem uma aproximação à criminalidade real que não é possível atingir pelas estatísticas criminais, que contabilizam apenas os crimes que são participados às autoridades policiais e os crimes que chegam a julgamento. Criminalidade real vs estatísticas criminais Sistema Prisional Português ➢ Sistema prisional: será a resposta adequada? ➢ Os fins da pena de prisão no ordenamento jurídico português ➢ Prisionização (Clemmer) ➢ Visão autárcica das prisões (autarquia = autonomia, comandar a si mesmo; satisfazse a si próprio) ➢ A pena como um direito (correcionalismo penal – séc. XIX) ➢ As parcerias privatização público-privadas dos e a estabelecimentos prisionais. A zona económica prisional ➢ Portugal: elevada taxa de encarceramento ➢ Clemmer, Michel Foucault, Erwing Goffman, António Pedro Dores, Loic ➢ O lucro a partir da violência Wacquant, Manuela Ivone Cunha, Helena ➢ Justiça reparadora/restaurativa Magalhães Um dos maiores dilemas da sociedade contemporânea • Séc. XVII e os Tratados de Vestefália • A reação no séc. XVIII e a prisão até ao séc. XIX • A prisão nos séculos XX e XXI No séc. XX: • 1945: ONU • 1948: Declaração Universal dos Direitos Humanos – inspirou várias constituições atuais. Direitos humanos transpostos para ordenamentos jurídicos, assim designamo-los como direitos fundamentais – Portugal fez essa transposição com a criação da nossa constituição Sistema prisional: será a resposta adequada? Embora os dados pareçam mostrar que as prisões não reabilitam os prisioneiros, continua a existir uma enorme pressão para aumentar o número de prisões e endurecer as penas previstas para muitos crimes. Este constitui um dos maiores dilemas da sociedade contemporânea, uma vez que, as taxas de reincidência, ou seja, a repetição de ofensas criminais por parte daqueles que já estiveram presos, são bastante elevadas. Os jovens delinquentes têm menos probabilidades de “sair da delinquência” do que tinham anteriormente. o sistema não está a cumprir a sua finalidade que é a reintegração do agente na sociedade. Não há fórmulas fáceis. Deve-se lutar por uma aproximação ao modelo ideal. Se somos um produto do somatório das nossas experiências é extremamente complexo inverter a elevada taxa de reincidência. (concurso de crimes e crimes reincidentes). Alguns autores entendem que é necessário colocar o interior e o exterior em continuidade analítica, fomentando relações sociais extracarcerais. Reclusos já não são mal tratados fisicamente, mas sofrem de outros tipos de privação (não apenas de liberdade, mas de rendimento apropriado, companhia de família e amigos, relações heterossexuais, de roupas e outros objetos pessoais). Vivem em lugares apinhados, aceitam procedimentos disciplinares severos e regulamentação de vida diária. Viver nestas condições tendem a erguer uma barreira entre os detidos e a sociedade exterior, em vez de ajudar no comportamento face às normas. Eles devem habituar-se a ambiente muito diferente do exterior e os hábitos que aprendem lá dentro são os apostos do que deveriam: podem aceitar a violência como algo normal, adquirir contactos com criminosos experimentados. Embora as prisões não pareçam ter sucesso na reabilitação dos presos, é possível que dissuadam outros a cometer crimes, tendo em consta as condições desagradáveis da vida lá. Fazer com que sejam lugares desagradáveis ajuda a desencorajar criminosos potenciais, mas faz com que os objetivos de reabilitação sejam difíceis de alcançar. Quanto menos desagradáveis forem as condições, mais a encarceração perde o seu efeito dissuasor. O princípio subjacente ao sistema prisional moderno é o de ele contribuir para melhorar o indivíduo de maneira que este possa ter um papel digno e decente na sociedade. Pensa-se ainda que as prisões, bem como as sentenças longas, constituem um poderoso dissuasor do crime. Muitos políticos que anseiam por “parecer duro” relativamente aos níveis crescentes de crime, favoreçam um sistema de justiça mais punitivo e um aumento das instalações prisionais. Os fins da pena de prisão no ordenamento jurídico português • Art.º 1 da CRP: dignidade da pessoa humana • Art.º 24 e 25 da CRP • Art.º 30 da CRP: não podem existir penas de duração ilimitada • Art.º 40 do CP: proteção dos bens jurídicos e reintegração do agente, bem como a proporcionalidade das penas • Art.º 41 do CP: prazos, limite máximo é 20, e em casos excecionais 25 anos • Art.º 42 do CP: execução da pena de prisão regulada em legislação própria Pirâmide etária da população reclusa reflete sinais de envelhecimento, baixos níveis de qualificação académica, a situação jurídico-penal da população reclusa revela que esta se encontra maioritariamente condenada (84.6%) – dados de 2017. Prevalência dos condenados por crimes contra a propriedade, seguidos dos crimes contra as pessoas, seguindo-se os crimes relativos a estupefacientes. A degradação do parque prisional e dos equipamentos, bem como a falta destes últimos, a necessidade de garantir respostas estruturadas de reabilitação e de reinserção. Para responder a este diagnóstico, propõe-se: • Construir 5 novos estabelecimentos prisionais • Encerrar faseamento 8 Estabelecimentos Prisionais • Ampliar 1 estabelecimento prisional • Requalificar os espaços • Aumentar os técnicos • Acompanhamento pós-reclusão • Reforçar o corpo prisional Correcionalismo penal (Séc. XIX): uma linha de pensamento penal e criminológico particular de Espanha que vem criticar a escola positivista porque entendia que no alinhamento daquilo que eram as preocupações das penas, também temos de olhar para os fins das penas, de que a pena acaba por ser um direito do cidadão. Para os correcionalistas a pena não pode consistir na compensação de um mal mediante a aplicação de outro, mas mais precisamente na correção ou emenda do criminoso – embora também reconhecessem outros objetivos para a pena, tais como a prevenção em geral ou a defesa da ordem social. Consideram que a pena é um bem para o criminoso e um direito. A pena justa, longe de ser um mal, constitui um benefício para o criminoso, visto que tende a restabelecer a sua consciência e liberdade racional, de que caiu, erguendo-se, do ponto de vista criminal, ao nível de um membro útil para Humanidade e para o Estado. Os estudos clássicos da prisão, levados a cabo por autores como Clemmer, Foucault e Goffman projetam o meio prisional como um mundo à parte como se as relações sociais prisionais fossem apenas produzidas localmente. Clemmer, Foucault e Goffman: meio prisional como um ‘’mundo à parte’’, como se as relações sociais prisionais fossem apenas produzidas localmente. Estes autores focalizaram as relações prisionais e os processos identitários e práticas criadas no contexto da prisão, vista como um hiato social e temporal. Clemmer - Prisionização: desenvolveu este termo definindo-o como uma adoção, em maior ou menor grau dos usos e costumes, em geral da cultura da prisão. A identidade não será a mesma que teria no contexto exterior. Socialização à prisão, à subcultura, conversão ao anonimato. Processo lento e gradual que começa por uma conversão ao anonimato. O próprio processo de ingresso acentua a criminalização, por criar condições para a aprendizagem ou eventual fortalecimento das competências para a atividade criminosa, que ocorrem após estadia na prisão. Foucault entende que a prisão é mais uma escola do crime, serve para punir o preso em vez de se preparar a sua reintegração social, fomentando ainda mais o crime e o criminoso. Tem de se adaptar, para sobreviver. Considera que ao invés de ser ressocializado para a vida em liberdade, o individuo é socializado para viver em prisão. Punindo, a cadeia deveria operar a transformação dos indivíduos, o que implicava em primeiro lugar conhecê-los e classificá-los Visão autárcica: sociedade que se basta a si própria, que produz tudo aquilo que precisa. Esta visão é continuada por Goffman quando apresenta o meio prisional como uma instituição total. Meio prisional como uma instituição total, onde o conjunto de indivíduos, separados da sociedade e por num período considerável, levam em conjunto uma vida fechada e formalmente administrada. O carater totalitário da prisão surge no mento em que se estabelecem barreiras as trocas e transações com o exterior, sejas estas barreiras físicas, culturais ou simbólicas, que demarcam as fronteiras entre o interior e exterior do EP. Salienta ainda as caraterísticas principais deste tipo de instituições: totais, segregativas, homogeneizantes, normalizantes e estigmatizantes. - Nós somos um mundo à parte, não precisamos dos outros. Reforça o que é o nós e o que são os outros. Temos valores diferentes aos de lá de fora, temos um código próprio, uma hierarquia própria, os seus rituais e rotinas. Se vivemos num espaço onde vivemos os mesmos problemas, dificuldades e temos os mesmos rótulos vamos unir-nos. O princípio subjacente ao sistema prisional moderno é o de ele contribuir para melhorar o indivíduo de maneira que este possa ter um papel digno e decente na sociedade. Pensa-se ainda que as prisões, bem como as sentenças longas, constituem um poderoso dissuasor do crime. A organização do sistema prisional pode assim refletir as seguintes dimensões da vida em sociedade: ▪ Hábitos sociais herdados e transmitidos ▪ Sistemas jurídicos, políticos, cívicos e mediáticos ▪ Intenções políticas organizadas Os estudos sociológicos abordam várias temáticas ao nível dos estudos prisionais: 1) Relações prisionais (interações nos grupos de reclusos e dos reclusos com outros atores sociais inseridos no contexto prisional); 2) As identidades e as práticas dos reclusos (nomeadamente a transformação dos processos identitários e relações com o crime, durante a estadia na prisão); 3) Relações com o mundo exterior (Com instâncias de regulação superiores, parceiros dos EP e fluxos de comunicação, de bens e de serviços entre o interior e o exterior da prisão). Portugal: elevada taxa de encarceramento Alguns autores explicam a elevada incidência do número de reclusos nos EUA pelo facto de existir uma cultura histórica de violência, acompanhada, desde pelo menos a década de 70 do século XX, por um capitalismo agressivo, que não só́ criou amplas malhas de exclusão e desemprego como converteu o sistema penitenciário numa indústria. Tomando como referência o ano de 2002, Portugal destacava-se ao nível europeu por apresentar uma das mais elevadas taxas de sobrelotação (número de reclusos por 100 lugares), a mais elevada taxa de detenção (número de reclusos por 100 mil habitantes) e a mais elevada taxa de encarceramento (duração média de permanência na prisão, em meses), perfilando-se no conjunto de países europeus mais penitenciários (Inglaterra e Espanha). Acrescente-se que tanto Portugal como Espanha são países com elevada percentagem de mulheres reclusas: em ambos os países, no ano de 2002, as mulheres correspondiam a cerca de 8% da população prisional. Sobrelotação mundial das prisões: penalização do tráfico e consumo de drogas (crime que mais pessoas põe na prisão em conjunto com os crimes contra a propriedade). Os prisioneiros têm de se habituar a um ambiente bastante diferente do “exterior”, e os hábitos e atitudes que aprendem na prisão são, bastantes vezes, exatamente o oposto dos que deveriam adquirir. Podem, por exemplo, desenvolver uma aversão contra os cidadãos comuns, aprender a aceitar a violência como algo normal, adquirir contactos com criminosos experimentados que mantêm depois de cumprida a pena e desenvolver dotes para o crime que anteriormente não possuíam. Justiça reparadora/restaurativa Alguns defensores da reforma do sistema de justiça penal alegam que se devia mudar de uma justiça punitiva, para formas de uma justiça reparadora. Atualmente fala-se de uma justiça restaurativa. Depois do 25 de abril houve mudanças ao nível da justiça, as contravenções passaram a ter natureza administrativa em vez de serem tratados no âmbito dos tribunais. Em paralelo houve outro movimento, o surgimento dos MRAL (tribunais arbitrais outra forma de resolução de litígios) – início do séc. XXI Crimes sujeitos à mediação penal - crimes particulares ou semipúblicos (lei 21/2007 da mediação penal – crimes sujeitos a mediação). Justiça restaurativa: corrente relativamente recente nas áreas da vitimologia e da criminologia. Surgida em meados da década de 70, nasce associada à proclamação do fracasso da denominada justiça retributiva, incapaz de dar respostas adequadas ao crime e às problemáticas especificas de vítimas e infratores. Surgida em meados da década de 70, nasce associada à proclamação do fracasso da denominada justiça retributiva, incapaz de dar respostas adequadas ao crime e às problemáticas específicas de vítimas e infratores. Enquanto o sistema de justiça criminal tradicional concebe e encara o crime - o ato criminoso como um conflito entre o Estado (ou o sistema formal de justiça criminal) e o infrator/o autor do crime. Uma justiça reparadora procura sensibilizar os reclusos para os efeitos dos seus crimes através do cumprimento de “sentenças” no seio da comunidade. Os autores dos delitos poderiam ser chamados a contribuir em projetos de serviço à comunidade ou em sessões de reconciliação mediados com as suas vítimas. Em vez de serem separados da sociedade e também do impacto dos seus atos criminosos, os delinquentes seriam assim expostos às consequências dos seus delitos de um modo construtivo. Embora as prisões ajudem a manter alguns indivíduos perigosos fora das ruas, os dados sugerem que temos de encontrar outras formas de combater o crime. As Zonas Económicas Prisionais/ As parcerias público-privadas e a privatização dos estabelecimentos prisionais (Helena Magalhães) • As parcerias público-privadas • Objetivos humanitários vs lucro • O lucro a partir da violência • A necessidade de manter os EP ocupados • O recluso não como cidadão, mas como objeto de lucro – estigmatização – A privatização também atentará contra a dignidade humana do recluso, que assim verá limitado o direito inerente a cada cidadão trabalhador – o de rescindir o contrato de trabalho. Isto conduz à institucionalização do trabalho escravo, sujeitando seres humanos com necessidades de ressocialização à obrigatoriedade de trabalhar para empresários privados – lucro a partir da violência • A sobrelotação e os encargos para o Estado • Maior qualidade dos EPS privatizados. A certificação • Uma melhor integração dos condenados no mercado de trabalho? Esta matéria de privatização das prisões traz questões como o domínio publico e privado, exercício de funções publicas e intervenção do setor provado, soberania, cidadania e segurança. Para conseguir desempenhar as suas funções eficazmente, o Estado desenvolveu novas formas de gestão das organizações públicas. Falando diversos autores em 4 paradigmas reformadores: politização, privatização, medida do rendimento e função pública profissional. A privatização atribui ao setor privado um conjunto de tarefas antes exclusivamente públicas. Surgem então as parcerias público-privadas (PPP) entre as autoridades públicas e os operadores económicos, a que os Estados recorrem cada vez mais, entre outros, por motivos de constrangimentos orçamentais. As PPP estão regulamentas pelo DL n.º 86/2003 e DL n.º 141/2006. Tanto o Fundo monetário Internacional quanto a Comissão Europeia devem a adoção das PP – aumento da eficácia da despesa aos contribuintes. ✓ Pressupostos: avaliação prévia rigorosa das vantagens das parcerias; o confronto; a repartição clara das responsabilidades e dos riscos; transferência efetiva de riscos para o setor privado ou social; limitação do risco público. ✓ Objetivos: eficiência qualitativa e quantitativa, transparência de forma a permitir o controlo da sua execução. Vigilância feita por empresas privadas – Zona Económica Prisional: transformar os EP em entidades prestadoras de serviços, geridas em regime de parceria do Estado com operadores privados. Alguns não concordam com a ideia de se gerar lucro através do processo de cumprimento de penas de prisão e reintegração social. Argumentos contra: 1) A privatização apenas serve para o Estado se libertar de tudo o que não lhe dá lucro; 2) Não visa objetivos humanitários, mas sim a obtenção de lucro a partir da violência. Argumentos a favor: 1) O atual sistema prisional não funciona; 2) As prisões estão realmente sobrelotadas, o que acarreta custos elevados ao Estado e não contribui favoravelmente para a função de reintegração. Isto gerará a visão de recluso, não como um cidadão que precisa de ser reintegrado na sociedade, mas como objeto de lucro, facilmente objeto de estigmatização. Sendo o recluso necessário ao sistema de produção, isso implica que se torne vital à obtenção de lucro a inexistência permanente e sistemática de trabalhadores, reclusos neste caso. Os EP deverão estar sempre ocupados, o que exercerá pressões no sentido de manter e prolongar o tempo de prisão. Manuela Ivone Cunha – Prisão e sociedade A ligação com a sociedade é, portanto, focada a montante da prisão e é pensada a partir do paradigma crime/castigo. Porém, o elo crime/prisão está longe de ser linear, porque os índices de encarceramento não estão diretamente relacionados com os índices de criminalidade. Exemplo disso é, uma ilustração disso é a evolução da população prisional nos EUA ao longo das três últimas décadas, a qual triplicou num período de estagnação da criminalidade. - Para Rusche e Kirschheimer a prisão participaria diretamente no controlo do mercado de trabalho, enchendo-se para responder ao excesso de mão-de-obra e esvaziando-se quando ela é escassa Na perspetiva de Loïc Wacquant (2001), além de não ser direta a relação entre forças económicas e política penal, não se pode reduzir as primeiras ao mero foro do mercado de trabalho, haveria que levar em conta os efeitos simbólicos do sistema penal e do seu poder para traçar e dramatizar fronteiras entre grupos.