Uploaded by Tânia Pinto

Chiavenato Conflitos

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Capítulo
Gestão de conflitos
As pessoas nunca têm objetivos e interesses idênticos. As diferenças de objetivos e de
interesses individuais sempre produzem alguma espécie de conflito. O conflito é ine­
rente à vida de cada indivíduo e faz parte inevitável da natureza humana. Constitui o
lado oposto da cooperação. A palavra conflito está ligada à discórdia, divergência, dis­
sonância, controvérsia ou antagonismo.
Além da diferença de objetivos e interesses, deve haver necessariamente uma inter­
ferência deliberada de uma das partes envolvidas para que haja conflito. O conflito
existe quando uma das partes - seja indivíduo ou grupo - tenta alcançar seus próprios
objetivos interligados com alguma outra parte e esta interfere na outra que procura
atingir seus objetivos. A interferência pode ser ativa (mediante ação para provocar obs­
táculos, bloqueios ou impedimentos) ou passiva (mediante omissão ou deixar de fazer
algo). Assim, o conflito é muito mais que um simples desacordo ou desavença; consti­
tui uma interferência ativa ou passiva, mas deliberada para impor um bloqueio sobre a
tentativa de outra parte de alcançar os seus objetivos. O conflito pode ocorrer no con­
texto do relacionamento entre duas ou mais partes: entre pessoas ou entre grupos
como conjuntos de pessoas, bem como entre mais de duas partes ao mesmo tempo.
Quando ocorre entre pessoas, o conflito individual pode ser:
• Intemo: quando ocorre intimamente dentro de uma pessoa em relação a senti­
mentos, opiniões, desejos e motivações divergentes e antagônicas. Quando a
pessoa quer trabalhar em uma empresa porque esta lhe dá prestígio e dinheiro,
mas ao mesmo tempo não quer trabalhar na empresa porque não gosta do pa­
trão. É o chamado conflito psicológico ou intra-individual, de natureza íntima
da pessoa. O conflito interno provoca um colapso nos mecanismos decisórios
normais, provocando dificuldade na escolha dentre várias alternativas de ação.
• Externo: quando ocorre entre uma pessoa e outra ou entre dois grupos de pes­
soas. É o chamado conflito social, que ocorre entre pessoas ou grupos sociais
com interesses ou objetivos antagônicos.
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Capítulo i 9
- Gestão de conflitos
O conflito pode ocorrer em três níveis de gravidade:
• Conflito percebido: ocorre quando as partes percebem e compreendem que o
conflito existe porque sentem que seus objetivos são diferentes dos objetivos
dos outros e que existe oportunidade para interferência. É o chamado conflito
latente, que as partes percebem existir potencialmente.
• Conflito experienciado: quando o conflito provoca sentimentos de hostilidade,
raiva, medo, descrédito entre uma parte e outra. É o chamado conflito velado,
quando é dissimulado, oculto e não manifestado externamente com clareza.
• Conflito manifesto: quando o conflito é expresso e manifestado pelo comportamen­
to, que é a interferência ativa ou passiva por pelo menos uma das partes. É o chama­
do conflito aberto, que se manifesta sem dissimulação entre as partes envolvidas.
19.2 A BO R D A G EN S Q U A N T O À G ESTÃ O DE C O N FLIT O S
O gerente tem à sua disposição três abordagens quanto à administração de conflitos:
1. Abordagem estrutural: baseia-se no fato de que o conflito surge das percepções
criadas pelas condições de diferenciação, de recursos limitados e escassos e de
interdependência. Se esses elementos puderem ser modificados, as percepções
e o conflito resultante poderão ser controlados. Trata-se, pois, de atuar sobre
uma condição existente que predispõe ao conflito. A abordagem estrutural pro­
cura minimizar as diferenças entre os grupos identificando objetivos que pos­
sam ser compartilhados por eles. Se o gerente conseguir conscientizar os gru­
pos de que eles têm interesses em comum, eles deixarão de perceber seus pró­
prios objetivos como incompatíveis. A ameaça externa e o inimigo comum são
soluções utilizadas freqüentemente para localizar um objetivo compartilhado.
Outro mecanismo estrutural é a utilização dos sistemas de recompensas formais
da organização. Utilizando um sistema de incentivos para recompensar o de­
sempenho conjunto e combinado de dois ou mais grupos, a organização cria
um objetivo comum. Se o bolo de recursos a ser distribuído não é fixo, isso pos­
sibilita que um grupo ganhe recursos sem fazer com que o outro perca, tornan­
do vantajoso para todos os grupos desempenharem bem e cooperarem entre si.
A abordagem estrutural também procura reduzir a diferenciação dos grupos
por meio do reagrupamento de indivíduos, de maneira que os grupos conflitan­
tes se tomem parte de uma unidade maior. O pessoal de produção e de vendas
pode ser colocado junto a uma equipe de produto, com a responsabilidade de
produzir e vender determinado produto e ser recompensado com base no de­
sempenho global, em vez de no desempenho individual. Além disso, rodando
entre si, os indivíduos adquirem uma melhor compreensão de outras perspecti­
vas, visualizando objetivos comuns existentes. Para reduzir a interdependência
Série Provas e Concursos
19.1 N ÍV E IS DE G R A V ID A D E DO C O N FLIT O
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Séfie Provas e Concursos
180
Administração Gerai e Pública —Chiavenato
ELSEVIER
e suas oportunidades de interferência, os grupos podem ser separados física e
estruturalmente. Embora percebam a incompatibilidade de seus objetivos, o
baixo nível de interdependência das atividades torna a interferência distante e
reduz a possibilidade de conflito.
2. Abordagem de processo: é a abordagem que procura reduzir os conflitos por
■meio da modificação do processo, ou seja, de uma intervenção no episódio do
conflito. Pode ser utilizada por uma das partes em conflito, por pessoas de fora
ou por uma terceira parte, como um consultor, um gerente neutro ou algum su­
perior da organização. A abordagem de processo pode ser realizada de três dife­
rentes maneiras. A primeira é a desativação ou desescalonização do conflito.
Ocorre quando uma parte reage cooperativamente - em vez de agressivamente
- ao comportamento de conflito da outra, encorajando comportamentos menos
conflitantes ou desarmando o conflito. Enquanto a reação conflitante de uma
parte provoca idêntico comportamento da outra, uma reação cooperativa tende
a provocar idêntica reação cooperativa da outra. A segunda maneira é a reunião
de confrontação entre as partes. Ocorre quando o ponto de desativação jã foi ul­
trapassado e as partes se preparam para um conflito aberto via confrontação di­
reta e hostil. A intervenção nesse processo pode ser feita pela reunião de con­
frontação que procura reunir face a face as partes conflitantes, exteriorizar as
emoções, discutir e identificar as áreas de conflito e localizar soluções do tipo
ganha/ganha antes de qualquer solução beligerante. A terceira maneira é a cola­
boração. É usada após ultrapassada a oportunidade de desativação e de reunião
de confrontação. Na colaboração, as partes trabalham juntas para solucionar
problemas, identificar soluções do tipo ganha/ganha ou soluções integrativas
capazes de conjugar os objetivos de ambas as partes.
3. Abordagem mista: é a abordagem que procura administrar o conflito tanto com
aspectos estruturais como processuais. A solução inclui intervenções sobre a si­
tuação estrutural e sobre o episódio conflitivo. A primeira maneira mista é in­
fluenciar o processo de conflito por meios estruturais, como a adoção de regras
para resolução de conflitos. Determinando-se previamente os procedimentos e
os limites para trabalhar o conflito, esse pode ser contido e controlado, condu­
zindo as partes para a solução do problema. A segunda maneira mista é criar
“terceiras partes” dentro da empresa de modo que estejam disponíveis a qual­
quer momento para ajudar na solução do tipo ganha/ganha dos conflitos que
surgem. Uma parte em conflito pode se comunicar com a outra por meio de in­
divíduos formalmente responsáveis pela tarefa de comunicação entre partes
•conflitantes. São os chamados papéis de ligação que podem ser exercidos pelo
pessoal de ligação ou pelas equipes de trabalho intergrupais. São papéis integra­
dores cuja tarefa é coordenar o esforço dos grupos potencialmente conflitantes
em direção aos objetivos globais da empresa. Ao contrário do consultor de pro­
cesso ou da terceira parte, que são passageiros, os papéis integradores são parte
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Capítulo i 9
—Gestão de conflitos
A maneira pela qual as partes reagem ao conflito e a maneira pela qual o conflito é
solucionado produzem uma influência sobre as percepções, os sentimentos e os com­
portamentos que se seguem, bem como sobre a qualidade da comunicação entre os
grupos.
Abordagens estruturais
* Fixação de objetivos comuns
.•Sistemas de recompensas
• grupais
Abordagens m istas'
;
•Definição de regras e •
regulamentos
* Reagrupamento de pessoas
♦Formação de grupos e
equipes de trabalho ■
* Rotação de pessoas
•Papéis de ligação
* Separação de pessoas
♦Papéis integradores
Abordagens de processo
♦Desativação do conflito
: ♦Confrontação direta ■.
Coiaboração
FIGURA !9 .i As abordagens de administração de conflitos.1
19.3 EFEIT O S P O S IT IV O S E N EG A T IV O S DO C O N FLIT O
O conflito pode gerar efeitos positivos. Em primeiro lugar, o conflito desperta sen­
timentos e energia dos membros do grupo. Essa energia estimula interesse em desco­
brir meios eficazes de realizar as tarefas, bem como soluções criativas e inovadoras. Em
segundo lugar, o conflito estimula sentimentos de identidade dentro do grupo, au­
mentando a coesão grupai. Em terceiro lugar, o conflito é um modo de chamar a aten­
ção para os problemas existentes e serve para evitar problemas mais sérios, atuando
como mecanismo de correção. Todavia, o conflito pode gerar efeitos destrutivos. Em
primeiro lugar, apresenta conseqüências altamente indesejáveis para o funcionamento
da organização, pois indivíduos e grupos vêem seus esforços bloqueados, desenvol­
vendo sentimentos de frustração, hostilidade e tensão. Obviamente, isso prejudica o
desempenho das tarefas e o bem-estar das pessoas. Em segundo lugar, grande parte da
energia criada pelo conflito é dirigida e gasta nele mesmo, prejudicando a energia que
poderia ser utilizada no trabalho produtivo, pois ganhar o conflito passa a ser mais im­
portante do que o próprio trabalho. Em terceiro lugar, a cooperação passa a ser substi­
tuída por comportamentos que prejudicam a organização e que influenciam a natureza
dos relacionamentos existentes entre pessoas e grupos.
Se o conflito pode trazer resultados positivos ou negativos para pessoas e grupos,
sobretudo para a organização como um todo, a questão primordial é como administrar
o conflito de maneira a aumentar os efeitos positivos (construtivos) e a minimizar os
negativos (destrutivos). Essa tarefa cabe ao gerente. Embora muitas vezes seja um ator
Série Provas e Concursos
permanente da organização. O gerente pode assumir papel integrador sempre
que surgir a necessidade de intervir nas condições estruturais como na dinâmi­
ca do conflito.
18!
Administração Gerai e Púbiica —Chiavenato
Série Provas e Concursos
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envolvido até a cabeça em muitos conflitos, o gerente deve sempre buscar uma solução
construtiva. Para tanto, deve saber escolher adequadamente as estratégias de resolução
para cada caso. As abordagens estruturais são geralmente mais fáceis de utilizar e exi­
gem menos habilidades do que as abordagens de processo.
19.4 EST ILO S DE G ESTÃO DE C O N FLIT O S
As equipes, assim como as pessoas, desenvolvem estilos específicos para lidar com
conflitos, baseados no desejo de satisfazer seus próprios interesses versus o interesse
da outra parte. O modelo a seguir descreve os cinco estilos de administrar conflitos por
meio de duas dimensões: da dimensão assertiva (tentativa de satisfazer a seus próprios
interesses) e da dimensão cooperativa (tentativa de satisfazer aos interesses das outras
partes):
1. Estilo competitivo: reflete a assertividade para impor o seu próprio interesse e é
utilizado quando uma ação pronta e decisiva deve ser rapidamente imposta em
ações importantes ou impopulares, durante as quais a urgência ou a emergência
se toma necessária ou indispensável. O negócio é ganhar.
2. Estilo de evitação: reflete uma postura não assertiva, nem cooperativa e é apro­
priado quando um assunto é trivial, quando não existe nenhuma possibilidade
de ganhar, quando uma demora para obter maior informação se torna necessá­
ria ou quando um desentendimento pode ser muito oneroso. O negócio é se
manter em copas.
3. Estilo de compromisso: reflete uma moderada porção de ambas as características
de assertividade e de cooperação. É apropriado quando os objetivos de ambos
os lados são igualmente importantes, quando os componentes têm igual poder
Assertivo
*
. Competição ’
Assertividade
Não-assertivo
Colaboração
Compromisso
Acomodação
Evitação
Não-cooperaüvo
Cooperação
................................ ......................
FIG U R A 1 9 .2
Os cinco estiios de gestão de conflitos.2
Cooperativo
...........—
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Capítuio 19
- Gestão de conflitos
Referências bibliográfieas
1 Adaptado de D. A Nadler, J. R. Hackman & E. E. Lawler III, Comportamento Organizacional, op. cit., p. 217.
2 Kenneth Thomas, ín: M.D. Dunnette (ed.), Handboók o f industriai and organizational psychology, Nova York,
John Wiley & Sons, 1976, p. 900.
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e ambos os lados querem reduzir as diferenças ou quando as pessoas precisam
chegar a alguma solução temporária sem pressão de tempo. O negócio é ter jogo
de cintura.
4. Estilo de acomodação: reflete um alto grau de cooperação e funciona melhor
quando as pessoas sabem o que é errado, quando um assunto é mais importante
que outros para cada lado, quando se pretende construir créditos sociais para
utilizar em outras situações ou quando manter a harmonia é o mais importante.
O negócio é ir levando.
5. Estilo dè colaboração: reflete um alto grau de assertividade e de cooperação. O
estilo colaborativo habilita ambas as partes a ganhar, enquanto utiliza uma
substancial parcela de negociação e de intercâmbio. O estilo de colaboração é
importante quando os interesses de ambos os lados são importantes, quando os
pontos de vista das partes podem ser combinados para uma solução mais ampla
e quando o compromisso de ambos os lados requer consenso. O negócio é re­
solver para que ambas as partes ganhem' e se comprometam com a solução.
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