Uploaded by Letícia Ximenes

E-book PDF Como vender e realizar sua ideia

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Como
vender e
realizar
sua
ideia
maria dolores
2022
Rua Teodoro Sampaio, 744, cj 36 – Pinheiros
São Paulo, SP CEP 05406-000
www.maroloproducoes.com.br
marolo@maroloproducoes.com.br
Revisão: Paula Terra
Foto da autora: Cíntia Duarte
Arte da capa: Milton Lima
Diagramação: Milton Lima
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Dolores, Maria
Como vender e realizar sua ideia : conteúdo
prático para transformar seus projetos criativos
em realidade / Maria Dolores. -- São Paulo :
Marolo Produções, 2022.
ISBN 978-65-997909-0-4
1. Captação de recursos 2. Criatividade
3. Criatividade - Ideias 4. Empreendedorismo
5. Planejamento estratégico 6. Vendas I. Título.
22-111990
CDD-658.421
Índices para catálogo sistemático:
1. Empreendedorismo : Desenvolvimento pessoal e
profissional : Administração
658.421
Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129
Todos os direitos reservados.
A reprodução de qualquer parte desta obra só é permitida
mediante autorização expressa da
autora e da Marolo Produções.
Para Felipe, sócio, marido e companheiro,
responsável por não nos deixar tirar os pés do
chão.
Para a equipe (e família) Marolo, sem a qual
nada disso seria possível.
Em ordem alfabética:
Betina, Cíntia, Daniel, Fabrício, Flávia, James,
Kiko, Mariana, Miltinho, Roberta, Xandico,
Vitoria e Zita.
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maria dolores
sumário
Introdução: A ideia
Pág
07
1ª Parte – Como conseguir o recurso
Pág
13
- 2 tipos de projetos: Projeto Ganha-Pão e Projeto do Coração
- O caminho inverso: O segredo é ir atrás do dinheiro
- Como descobrir onde está o dinheiro
- O Mito do Q.I.
- Como descobrir quem manda no dinheiro
- O que enviar
Pág
Pág
Pág
Pág
Pág
Pág
15
31
37
57
65
79
2ª Parte – Como montar um projeto?
Pág
93
- Pós-contato: montando a proposta
- Apresentação (Regra das 5)
- Consegui uma reunião, e agora?
Pág
Pág
Pág
95
129
137
3ª Parte – O que preciso para realizar o meu projeto
Pág
155
- Habilidades (as que tenho e as que preciso desenvolver)
- Planejamento
- Regra dos 10%
- Se eu não sei, vou atrás de quem sabe
- Não tente ser quem você não é
Pág
Pág
Pág
Pág
Pág
157
179
207
215
225
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Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
Introdução
A ideia
7
Como vender e realizar sua ideia
Temos várias ideias o tempo todo. Algumas
pessoas mais, outras menos. Ter ideias que nos parecem
incríveis faz parte da nossa essência. Somos seres criativos. Para quem trabalha com cultura e criatividade ainda
mais, pois a própria natureza do trabalho com o qual esta-
mos envolvidos favorece o surgimento de novas e boas
ideias. Existem várias maneiras de estimular a criativida-
de, em outra oportunidade poderemos falar sobre isso.
Hoje vamos falar sobre como transformar em realidade
algumas dessas ideias que acalentamos. Uma boa ideia
colocada em prática pode transformar a vida – sua e dos
outros. O grande obstáculo, no entanto, é que na maioria
das vezes uma ideia se encerra no que ela é, ou seja, continua no universo abstrato da imaginação e se perde com o
passar do tempo e o surgimento de tantas outras destinadas ao mesmo fim.
Eu sempre tive muitas ideias, desde criança.
Algumas jamais saíram do lugar. Entretanto, várias aconteceram e se transformaram em projetos responsáveis
pela virada na minha vida profissional. Nenhuma delas
se transformou em realidade sozinha, nem por intermé-
dio de outra pessoa que surgiu na minha frente como
um anjo e se propôs a concretizar os meus sonhos. Não
existe esse tipo de fada madrinha, embora a gente perca
um pouco – ou muito – tempo na busca por esse persona-
gem irreal. Seria tão bom se eu contasse minha ideia para
alguém e esse alguém fizesse tudo! Esqueça, no mundo
prático esse personagem não existe. No mundo das coisas
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maria dolores
possíveis – e o limite para o possível é a sua imaginação existe você. Você é esse alguém capaz de transformar seus
sonhos em fatos. É claro que não precisa fazer essa jornada
sozinho, quebrando a cabeça. Há muitas formas de agilizar o processo, encontrar atalhos, aprender estratégias e
técnicas que ajudem a chegar lá com mais assertividade,
sem tantos erros e voltas tal qual quem começou sozinho,
como é o meu caso e do meu sócio e marido. Teríamos
poupado esforços, prejuízos e caminhada se tivéssemos,
lá atrás, aprendido algumas coisas básicas, porém funda-
mentais para fazer de uma ideia um projeto concreto e de
sucesso.
Esse livro é exatamente o que teria me ajudado
quando comecei a sair do imaginário e trabalhar para
transformar meus sonhos em algo real: dicas práticas e
efetivas aprendidas com a experiência. Não é uma teoria,
não é um estudo acadêmico. “Como vender sua ideia” é
um apanhado de dicas e passo a passo de como nós, na
nossa produtora, transformamos nossas ideias em projetos reais. Há quatorze anos eu e meu marido e sócio, Feli-
pe, montamos nossa produtora, a Marolo. Pequena e familiar, mas que realiza projetos de grande porte nas cinco
regiões do Brasil. Como toda empresa pequena, a equipe
é reduzida e eu sou responsável pelas vendas, sozinha.
Vendi – e continuo vendendo - de Festivais de Música para
multidões a Concertos de Orquestra em praça pública; de
Livros a Espetáculos de Teatro; de Espetáculos de Dança
a Eventos de Gastronomia; de Vídeos a Seminários; de
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Como vender e realizar sua ideia
Circuitos de Cultura a Corridas de Rua; de Festas Popu-
lares a Turnês de artistas, de norte a sul do país. Todos
projetos nossos, criados e realizado por nós.
O diferencial deste livro é, segundo me dizem as
pessoas que participam das nossas palestras, compartilhar
realmente informações práticas e que funcionam, compar-
tilhar a forma como fazemos as coisas para darem certo.
Muita gente me pergunta: “Vocês não têm medo de criar
concorrência?”. Não. Há mercado para todos e, quanto
mais o setor se profissionalizar, melhor para todo mundo.
Comecei a realizar palestras sobre o tema em 2013. Em todo
o evento que realizávamos, aparecia algum artista – sobretudo músicos - ou produtor cultural pedindo orientações
sobre como montar um projeto e como vende-lo. Eu dava
meu e-mail e procurava ajudar. Mas faltava tempo para
ajudar de forma aprofundada. E às vezes não conseguia
atender todo mundo. Então, tive uma ideia para ajudar a
quem tivesse interesse de uma forma mais eficiente e para
mais pessoas. Eu e o Felipe passamos a ministrar pales-
tras e workshops gratuitos sempre que realizávamos um
projeto, em todas as cidades abrangidas por ele. De São
Paulo (SP) a João Pessoa (PB), de Manaus (AM) a Porto
Alegre (RS), de Primavera do Leste (MT) a Maracaju(MS).
Eram momentos de muita troca e aprendizado e o retorno
dos participantes era gratificante. Muitos tiveram o famo-
so “click” durante as palestras e depois conseguiram reali-
zar seus projetos. O que eu mais ouvia era “É tão simples,
mas nunca tinha pensado nisso, assisti a muitas palestras
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maria dolores
e nunca disseram isso de uma forma tão prática e direta”.
Depois de oito anos de palestras e workshops por todo o
país, senti o desejo de compartilhar nossa experiência com
ainda mais pessoas. E, por isso, estamos aqui.
Transformar uma ideia em realidade envolve
várias questões. Neste livro o foco é em um dos empecilhos
mais recorrentes enfrentados pela área criativa e cultural:
conseguir recurso financeiro. A famosa captação de recur-
sos. O termo, aliás, não ajuda muito, traz impregnado em
si algo de burocrático e teórico, embora não seja. Captar
recurso é venda. Uma venda como outra qualquer. É como
vender uma caneta, com as devidas particularidades de
cada produto. E o nosso foco será na venda, embora este
livro traga outros temas relacionados. Para isso, começare-
mos com a nomenclatura. Entenderemos aqui Ideia como
Projeto. Esse é o primeiro passo para tirar a sua do univer-
so abstrato e trazê-la para o mundo de carne e osso. Ao
entender e transformar uma ideia em projeto, temos algo
palpável com o que trabalhar, algo para vender. O mais
legal é que vender um projeto não é um bicho de sete cabe-
ças. Nem é preciso ter uma estrutura complexa ou morrer
de trabalhar. É preciso estratégia adequada e dedicação.
É disso que trataremos aqui. Não abriremos a caixa com
todos os segredos do sucesso, porque não temos a chave
para abrir essa caixa, se ela existir. Vamos, juntos, abordar
o passo a passo para se chegar lá, tendo como base nossa
experiência particular, ou seja, o que temos feito para
obter resultado nesses anos. E espero, com isso, ajudar
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Como vender e realizar sua ideia
você a transformar suas ideias em projetos e a descobrir
seus próprios caminhos e maneiras de fazer as coisas e
obter resultado e sucesso na área cultural e criativa. Vamos
nessa?
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maria dolores
1ª Parte
Como conseguir
o recurso
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Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
Dois tipos
de projeto:
Projeto do Coração
e Projeto Ganha-Pão
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Como vender e realizar sua ideia
Há quatorze anos entrei de paraquedas no univer-
so de projetos culturais e eventos. E a primeira coisa que
aprendi, a custo de prejuízo e perda de tempo, é que
existem dois tipos diferentes de projetos. E é preciso
saber exatamente com qual deles estamos lidando para
conseguir não só realizá-lo como ter êxito na realização.
Vou compartilhar com você o que aprendi com a prática,
pesquisa e a experiência, para que não tenha o mesmo
prejuízo que eu tive nem perca o mesmo tempo que perdi
até descobrir o que estava fazendo errado e o que precisava fazer certo.
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maria dolores
Projeto do Coração
Vou começar com o que eu chamo de Projeto do
Coração. Para isso, preciso contar a história de como
acabei entrando nesse universo. Nasci em Belo Horizonte,
mas cresci em Três Pontas, uma cidadezinha agrícola no
sul de Minas Gerais. Estudei Comunicação Social (Habilitação em Jornalismo) na Universidade Federal de Minas
Gerais. Quando chegou a hora de fazer meu TCC escolhi
escrever um livro reportagem sobre o cantor e compositor
Milton Nascimento. Ele havia nascido no Rio de Janeiro,
mas, assim como eu, cresceu em Três Pontas. Era para ser
um livro reportagem pequeno, um trabalho para concluir a
graduação. Entretanto, quando comecei a pesquisar sobre
a vida do meu personagem e entrevistei o pai do Milton,
Seu Zino, descobri que ele tinha uma história fascinante.
Um romance pronto, esperando para ser passado para o
papel. Decidi então escrever uma biografia em vez de um
simples livro reportagem. Não uma biografia qualquer,
mas uma biografia profissional. Usei como referência
biografias que eu admirava, como “Anjo Pornográfico” e
“Garrincha”, do Ruy Castro. Entusiasmada, fui em busca
de um orientador para meu TCC. Para minha surpresa,
nenhum professor aceitou. Diziam que eu era nova demais
para uma empreitada daquele tamanho. Disseram, inclu-
sive, para eu esperar entrar na casa dos quarenta anos e, aí
sim, fazer o livro. Estou na casa dos quarenta agora. Esta-
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Como vender e realizar sua ideia
ria esperando até hoje.
Depois de muita peleja, uma professora aceitou
ser minha orientadora. Meu plano inicial era perfeito:
no primeiro mês entrevistar oitenta pessoas; no segundo
transcrever as entrevistas e pesquisar em bancos de dados
de jornais e revistas; no terceiro reunir e cruzar as informa-
ções e fazer o roteiro; no quarto, escrever. Entregar o trabalho e me formar. Tudo em um semestre, ou seja, quatro
meses corridos. Claro que esse plano deu errado. Era
totalmente fora da realidade. Um erro gigante de plane-
jamento (tópico, aliás, que trataremos mais adiante). Para
não virar uma aluna decana daquelas que não terminam a
faculdade nunca, entreguei a primeira parte do livro para
me formar e passei os três anos seguintes finalizando o
projeto, em paralelo com meu trabalho de jornalista para
revistas da Editora Abril. Escrever matérias como freelance, aliás, ajudou a bancar os custos do livro, pois eu precisava viajar regularmente para o Rio de Janeiro, São Paulo
e Belo Horizonte para as entrevistas com o Milton e outras
pessoas, e para pesquisar em bancos de dados e arquivos,
pois não existia Google.
Quatro anos depois, finalmente, em novembro de
2006, o livro foi publicado pela Editora Record. Eu era fã
do escritor colombiano Gabriel García Márquez e decidi
que queria publicar meu livro pela mesma editora dele
aqui no Brasil, a Record. Utilizando as técnicas que apri-
morei e hoje uso para vender projetos enviei um e-mail
para a diretora editorial e tive uma resposta em exatos
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maria dolores
quinze minutos. Foi o tempo de tomar um café e voltar
para o computador. Uma semana depois eu estava com o
contrato assinado. Foi uma grande conquista e eu estava
muito feliz, mas havia uma questão.
Achava lançamento de livro chato demais. Ficava
preocupada com a coitada da pessoa que saia da sua casa,
gastava tempo, enfrentava trânsito para chegar no lançamento e ganhar, no máximo, um pró-seco. Meu marido,
Felipe, tem uma banda de rock. Pedi que ele e a banda
ensaiassem um repertório do Milton Nascimento, porque
aí o cidadão que animasse a ir ao lançamento ganharia,
pelo menos, uma música ao vivo para se distrair. Era
uma época em que o Milton Nascimento havia retomado
o contato com Três Pontas e com os músicos da cidade.
Ele ficou sabendo que tocariam, não só a banda do Felipe,
mas outros jovens músicos que faziam parte dessa reapro-
ximação do Milton com sua terra. Resultado: o Milton quis
cantar junto, de graça.
Parecia mentira, de tão bom. Foi quando descobri
que de graça não significava custo zero. Ele não cobraria cachê, mas havia toda despesa de logística. Passagem
aérea, transporte local, hospedagem, alimentação, equi-
pamentos. Para ele e sua equipe. A editora cobriria parte
desses custos, mas eu teria que arcar com o restante. Da
noite para o dia precisava arrumar dez mil reais. E consegui. Com uma empresa de call center, depois de falar com
um diretor de uma empresa de telefonia móvel e que
acabou virando nosso grande amigo e parceiro.
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Como vender e realizar sua ideia
Foram quatro eventos. No Rio, São Paulo, Belo
Horizonte e Três Pontas. Com o pocket show gratuito do
biografado ilustre, vendi todos os livros, foi um sucesso.
Foi tão bom que acabamos, eu e meu marido, tendo a ideia
de resgatar em Três Pontas um evento que o Milton havia
organizado em 1977 e ficou conhecido como “Woodsto-
ck Mineiro”. O evento original havia sido realizado num
pasto, a céu aberto, e contou com o Milton, Chico Buarque,
Gonzaguinha, Clementina de Jesus, Azimuth e muitos
outros. Sem nunca ter feito nada parecido, nos lançamos
na aventura de reviver o festival.
Foi a primeira vez que ouvimos falar de Lei de
Incentivo. Inscrevemos o projeto, quando ainda era tudo
no papel, sem sistema online, captamos o recurso e reali-
zamos, em 2009, o Festival Música do Mundo. Nossa
experiência nesse tipo de trabalho era tanta, que escolhemos o local pelo pôr do sol. Nada de energia, água, estru-
tura. Realmente o pôr do sol foi lindo, atrás do palco. Mas
os custos e as dores de da cabeça pela falta de experiência foram grandes O Festival acontecia em toda a cidade,
com shows em um palco montado na praça, shows nos
bares e restaurantes, exposição fotográfica, apresentações
de folias de reis, dança e Fanfarras pelas ruas da cidade,
sarau, atividades em todas as escolas da cidade, tenda
de circo nas margens da represa de Furnas (na área rural
do município) e o palco principal, erguido à frente do tal
almejado pôr do sol, com um cenário gigante ao redor que
remetia à serra de Três Pontas. Além do Milton Nascimen-
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maria dolores
to, participaram vários artistas não conhecidos e vários
conhecidos como Ivan Lins, Tom Zé, Lô Borges, Lenine,
Wagner Tiso – também de Três Pontas –, 14 Bis, Wilson
Sideral, Didier Lockwood, Lokua Kanza, entre outros.
O evento alcançou um êxito além do esperado, com
direito a chamada ao vivo em grandes canais de televisão
e matérias de página inteira nos principais jornais do país.
Vieram pessoas de todo o Brasil e conseguimos o objetivo
de resgatar aquele sentimento que fez parte do “Woodsto-
ck Mineiro”. Financeiramente, no entanto, foi um fracasso.
Encerramos com duzentos mil reais de prejuízo, apesar de
toda a realização pessoal e do aprendizado. Como me disse
o Tom Zé, ao nos encontrarmos poucos dias depois: “Foi
uma universidade, minha filha. Cara, mas uma universidade”. Para não deixar nenhum fornecedor sem receber,
pegamos dinheiro emprestado. No banco, com parentes
e amigos.
Apesar do prejuízo, como o projeto em si tinha
sido excelente, novas oportunidades começaram a surgir.
Convites de artistas e de patrocinadores. E, assim, acaba-
mos entrando nesse universo, aos poucos. Em 2010 eu
passei a diminuir o ritmo de matérias escritas para as
revistas da Abril, o Felipe saiu do escritório de advocacia no qual trabalhava e começamos a nos dedicar efeti-
vamente a esse trabalho tão encantador e gratificante que
é a criatividade. E aqui estamos. Conseguimos pagar os
duzentos mil reais do prejuízo e hoje realizamos projetos
em todas as regiões do Brasil.
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Como vender e realizar sua ideia
Tanto a biografia que escrevi, publicada com o título
“Travessia – a vida de Milton Nascimento” quanto o Festival Música do Mundo são da categoria Projetos do Coração. Um Projeto do Coração tem valor subjetivo. É algo
que você quer muito realizar, por uma questão afetiva e
pessoal. Você se dedica a um Projeto do Coração porque é
seu sonho, por uma grande caus. Você se dedica por algo
em que você acredita, por um sentimento. Nesse tipo de
projeto o foco não é o resultado financeiro. O foco é fazer
acontecer. Ter clareza sobre isso é fundamental, pois é a
definição de Projeto do Coração ou Projeto Ganha-Pão que
ajudará você saber até onde pode ceder em uma negociação por busca de investimentos e venda de projetos.
Se, no mundo ideal, preciso de duzentos mil reais
para realizar um Projeto do Coração e um patrocinador
oferece cem mil, posso avaliar e aceitar, caso seja possível
cobrir os custos essenciais com essa quantia. No Projeto do
Coração você pode, inclusive, abrir mão da sua remuneração, trabalhar sem ganhar nenhum centavo. Porque o que
vale é colocar em prática. No entanto, o Projeto do Coração deve ser a exceção, não a regra. Senão você vai passar
a vida pulando de um prejuízo a outro, uma frustração a
outra, até esgotar sua energia e não sobrar força nem para
sonhar. Um dos perigos na venda de projetos criativos é
justamente cair na cilada de considerar todo projeto “do
Coração”. E é realmente tentador. A maioria dos projetos
é envolvente e incrível. Afinal, estamos falando de criatividade, uma área apaixonante. Mas, se você não tomar
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maria dolores
cuidado, vai acabar tratando todo projeto como pessoal
e vai sempre ceder nas negociações, de forma a nunca
alcançar êxito financeiro. E a saúde financeira é indispen-
sável tanto para viver, quanto para ter fôlego e, aí sim,
concretizar seus Projetos do Coração. Quando for vender
um projeto, avalie. Antes de seguir, faça a você mesmo a
pergunta: “Por que eu quero realizar esse projeto?” Refli-
ta, busque dentro de você e responda com sinceridade.
É do Coração? É um sonho? Uma causa? Mesmo? Se for,
vá em frente. Se não for, prepare-se para recusar patrocí-
nios, oportunidades e dizer não para os outros e para você
mesmo. Novos investimentos virão.
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Como vender e realizar sua ideia
Projeto Ganha-Pão
Para cada Projeto do Coração é preciso realizar
dez Projetos Ganha-Pão. Essa proporção não é uma regra,
é apenas uma imagem para você compreender a impor-
tância de dedicar energia e esforço para projetos que sejam
mais viáveis comercialmente e que possam gerar resultado financeiro positivo. Um Projeto Ganha-Pão é aquele
que você realiza com o objetivo de ganhar dinheiro. E não
tem nada de errado ou ruim com isso. Não é demérito.
É o que vai garantir a sustentabilidade do seu negócio e
vai permitir, como consequência, que você tenha recursos
e meios para se dedicar aos seus sonhos e causas pessoais. Antes de seguirmos é importante nos livramos de
um pré-conceito muito comum e arraigado no mundo da
cultura, da criatividade e das artes, o paradigma de que
“arte não se vende”. Essa é uma prerrogativa ingênua e
ignorante, que só atrapalha a vida e o progresso de muitas
pessoas altamente talentosas.
Ingênua porque a arte se vende, ou é vendi-
da. Todo artista quer – ou quase todo – que sua obra
seja comprada por alguém. Comprada no sentido de ser
consumida ou comtemplada. A própria dinâmica da arte
envolve dois lados: quem produz e quem consome, e uma
obra só está completa quando conclui este processo, quando alguém, que não o artista, absorve e consome essa arte.
O que seria de um livro sem leitores? Uma música sem
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maria dolores
ouvintes? Um filme sem espectadores? Um espetáculo
sem plateia? Uma pintura em um museu sem visitantes?
O público é consumidor da produção criativa. Este consu-
mo pode ser gratuito ou pago, mas, nos dois casos, é uma
relação de compra e venda. Suponhamos que o artista
banque todos os custos da sua obra do próprio bolso e não
cobre nenhum valor do público. Nesse caso não se trata
de uma relação de compra e venda? Trata-se, sim. Porque
o público está comprando a obra não com dinheiro, mas
com seu tempo. O tempo necessário para consumi-la.
Ignorante porque desde há muito tempo a arte é
financiada ou comprada por um terceiro, sob encomenda
ou não. Bradar o pré-conceito de “arte não se vende” ou
separar em duas caixas a “arte verdadeira, maior, pura,
que não está à venda” e a “arte menor, impura, sob enco-
menda, comercializada”, é ignorar a própria história da
arte e da cultura no mundo. A Capela Sistina, na Itália,
uma das obras primas mais importantes e conhecidas da
história mundial, foi pintada por Michelangelo sob enco-
menda da Igreja Católica. Em 1508 o Papa Júlio II contratou o artista para realizar o serviço, que levou quatro
anos para ser concluído. A Igreja encomendou, ele acei-
tou, pintou, entregou e recebeu o pagamento por isso,
conforme acertado entre as partes. A “Cantata do Café”
de Johann Sebastian Bach foi composta sob encomenda
do Café Zimmermann, localizado na cidade de Leipizig,
na Alemanha, entre muitas outras composições sob enco-
menda de um dos maiores artistas ocidentais de todos os
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Como vender e realizar sua ideia
tempos, que criou todo o sistema a partir do qual a músi-
ca ocidental tem como base até hoje. Mozart compôs sua
primeira ópera aos doze anos para atender a uma enco-
menda do Imperador José II. Uma das pinturas mais céle-
bres do francês Renoir, “Rosa e Azul” foi um retrato de
duas filhas do banqueiro Louis Raphael Cahen d’Anvers,
aliás, um cliente frequente do artista, que pintou retratos
de praticamente toda a família do banqueiro. Nenhuma
destas obras “vendidas” são menos arte. A compra não
diminui a beleza, os traços característicos, a sofisticação da
técnica, a relevância da obra e muito menos do seu criador.
O artista, o produtor cultural, o trabalhador do segmento
criativo, mais que ninguém, possui criatividade suficiente
para desenvolver uma obra incrível, sem perder a essên-
cia, mesmo sob encomenda ou para atender a uma deman-
da específica. O Projeto Ganha-Pão entra exatamente aqui.
São projetos que você vai desenvolver para aten-
der a uma demanda ou oportunidade. O Festival Música
do Mundo do qual falei anteriormente só podia ser reali-
zado em Três Pontas, sul de Minas Gerais. Era um resgate de um evento anterior, além de uma homenagem aos
filhos ilustres da terra, Milton Nascimento e maestro e
pianista Wagner Tiso. O festival era um sonho, o desejo
de realizar algo para o lugar de onde viemos. Na segunda
edição, depois do sucesso da primeira, dois patrocinadores potenciais nos procuraram em momentos diferentes
querendo patrocinar o projeto, mas com a condição de ser
transferido para outra cidade. Recusamos. Era um Projeto
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maria dolores
do Coração.
O Projeto Ganha-Pão você irá desenvolver sob
demanda ou já conceber com a maior flexibilidade possível, para se adaptar às necessidades do cliente/patroci-
nador. Que fique claro: você não irá flexibilizar o conte-
údo ou a essência, mas o entorno. Como, por exemplo, o
local de realização. Você imaginou realizar um Festival de
Dança em São Paulo, mas conseguiu um patrocinador em
Catalão, Goiás. É só trocar São Paulo por Catalão. Se for
um projeto via lei de Incentivo, é importante verificar o
que a lei específica permite. A Lei de Incentivo à Cultura federal permite alteração dentro do território nacional.
As Leis Estaduais geralmente apenas dentro do estado,
e as municipais nos limites do município, a não ser que
sejam projetos de divulgação ou circulação artística fora
da localidade de origem. É fundamental verificar todos os
aspectos da legislação antes. Mas, verificado o que é legal-
mente possível, a indicação das praças (cidades) é um dos
itens que você pode deixar a cargo do patrocinador como
contrapartida, se isso não interferir na essência do seu
projeto. O mesmo ocorre em relação à data. Você gostaria de realizar seu Festival de Dança em outubro. Mas o
patrocinador só topa investir se for realizado em agosto ou
dezembro. Se houver condição de produção em alterar o
cronograma, não tem por que dizer não. Vamos lá dançar
em agosto ou dezembro. Outubro que fique para depois.
Outra contrapartida atraente a muitos patrocinado-
res é a possibilidade do naming rights que, nada mais é
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Como vender e realizar sua ideia
do que batizar o projeto com o nome da empresa patrocinadora. Quando eu e meu sócio e marido desenvolvemos pela primeira vez o Festival BB Seguros de Blues e
Jazz e inscrevemos na Lei de Incentivo à Cultura o projeto
chamava-se Blues Jazz Festival. Como a legislação federal
de incentivo permite o naming, foi um importante atrativo
para o patrocinador e, assim, o Blues Jazz Festival passou
a se chamar Festival BB Seguridade de Blues e Jazz. Na
terceira edição, com a mudança do nome do próprio patrocinador, tornou-se Festival BB Seguros de Blues e Jazz. Na
sétima edição, com alteração de patrocinador, passou a se
chamar Blues Jazz Brasil. O festival não teve sua essência
alterada em absolutamente nada ao ter o nome do patro-
cinador por aquele período. Continuou a ser um festival
de blues e jazz, em parques públicos, como fora pensado
desde o início.
No Projeto Ganha-Pão você vai identificar oportu-
nidades antes de sair em busca de investimento, antes de
vender. Vai formatar suas ideias, explorar sua criatividade da melhor maneira para efetivar a capação de recurso
e, assim, tirá-las do papel e transformá-las em realidade.
Nesse tipo de projeto é preciso ter muito claro que não
se trata de um projeto pessoal, trata-se, antes de qualquer
coisa, do seu ganha-pão. Ter essa clareza é indispensá-
vel no momento da negociação, para você saber até onde
pode ir, onde pode ceder ou não. Se você precisa de 200 mil
reais e o patrocinador oferece 100 mil, por mais que seja
um montante expressivo, você vai agradecer e dizer não,
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maria dolores
obrigado. Pois, com metade do recurso necessário, você
não só irá colocar a execução em risco, como não receberá
nada pelo seu trabalho, não vai ganhar dinheiro. E você
PRECISA ganhar dinheiro. Como os projetos da área criativa são sempre muito legais nós tendemos a dispensar a
remuneração, achar que vale à pena para o currículo e pela
satisfação pessoal.
Preste atenção: ninguém almoça currículo, nem
paga a escola dos filhos com satisfação pessoal. É preciso
construir um bom portfólio, mas também, pagar as contas
e ter conforto financeiro para se dedicar aos seus sonhos,
em vez de minar a criatividade passando noites em claro
sem saber como vai pagar a conta de luz amanhã. Quando
vou vender um Projeto Ganha-Pão eu me faço a pergunta:
Por que quero fazer este projeto? E respondo: porque eu
tenho três filhos e preciso pagar as contas. Simples assim.
Isso não quer dizer que você fará algo ruim ou menor. Tem
que realizar um excelente trabalho, com toda sua criati-
vidade e dedicação. Um projeto de sucesso e bem execu-
tado é o melhor portfólio que você pode produzir. Com
essa definição clara a respeito do tipo de projeto, é hora de
conseguir os investimentos necessários.
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Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
O caminho inverso:
O segredo é ir atrás do
dinheiro
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Como vender e realizar sua ideia
Eu errei muito. E não quero que você erre também.
Se alguém tivesse me dado essa dica simples, eu teria
focado tempo e energia no que dá resultado, em vez de
ficar correndo sem sair do lugar, dando murro em ponta
de faca. Quando começamos a trabalhar com projetos
culturais, eu fazia o que as pessoas fazem: montava meu
projeto, colocava frases de efeito, fotos bonitas, conteúdo
fantástico e saía oferecendo para todo mundo. Fazia uma
lista de empresas, entrava em contato, enviava, explicava as qualidades e benefícios do projeto. Às vezes conse-
guia uma reunião. Me preparava para ir, ensaiava o que ia
dizer, imprimia a apresentação do projeto, me dirigia ao
local ou cidade da reunião, enchia minhas expectativas de
esperança e rezava.
Ao chegar na empresa, os acontecimentos seguiam
um roteiro muito semelhante em todas elas. Eu pedia para
usar o banheiro. Aproveitava para ver se estava tudo certo
com o visual e, se estivesse cansada da viagem ou com
sono ou qualquer outra coisa me deixando desanimada,
fazia uns polichinelos para despertar. Depois, aceitava o
café e a água que me ofereciam e, então, esperava. Por
quinze minutos, meia hora, uma hora. Já cheguei a esperar
por duas horas e meia. Como eu levava um livro, apro-
veitava para ler e não ficar irritada com a espera. Afinal,
era minha grande oportunidade. Então, quando eu já nem
queria parar de ler o livro e nem me lembrava o que estava
fazendo ali, a voz dizia: Maria Dolores, é a sua vez. Sim, a
minha vez. A minha grande e esperada vez.
32
maria dolores
O responsável da empresa que havia aceitado
me receber era sempre gentil. Oferecia mais água e café,
que eu tratava de aceitar. Seguiam-se então duas partes
da reunião, alternadas conforme o interlocutor da vez.
Uns perguntavam primeiro sobre o projeto e eu apresen-
tava. Depois eles falavam sobre o momento da empresa.
Às vezes era o contrário. Eles falavam sobre o momento
da empresa primeiro, depois pediam para apresentar o
projeto. Na maioria das vezes, o projeto, embora ótimo,
não tinha absolutamente nada a ver com o tal momento
da empresa. E realmente não tinha. A empresa estava focada em aumentar a carteira de clientes acima de sessenta
anos no Norte. Meu projeto era para jovens do Sudeste.
A empresa estava trabalhando com plataforma de dança.
Meu projeto era de música.
Uma vez fui para o Rio de Janeiro no ônibus que
saía de São Paulo à meia noite e chegava na rodoviária
Novo Rio às seis da manhã. A reunião era às onze horas.
Não tinha onde esperar o tempo passar, então, fiquei na
rodoviária mesmo, num calor com o qual eu não estava
acostumada. Às nove da manhã peguei um ônibus Fres-
cão até a Barra da Tijuca, para não correr o risco de atra-
sar. Eu e minha mala com o indispensável travesseiro
dentro. Esperei por duas horas na recepção do escritório
da empresa, em um desses conjuntos comerciais em esti-
lo americano. Morta de fome e calor. Adoraram o projeto,
mas estavam buscando apenas projetos da cidade do Rio
de Janeiro. “Por que não disseram isso antes?”, pensei.
33
Como vender e realizar sua ideia
“Eles quiseram ser gentis”. Genial, Maria, parabéns.
Em outra ocasião fui também de ônibus de São
Paulo para Belo Horizonte. Nove horas de viagem.
Cheguei na rodoviária às sete da manhã. Fui para a casa
dos meus avós, tomar café e fazer uma visita até a hora
da reunião, logo depois do almoço, num bairro longe.
Chegando lá, esperei por quase uma hora para ser rece-
bida. A reunião foi ótima. Pelo menos, eu achei que sim.
Estava tudo certo! O projeto coincidia com os objetivos da
empresa, tinha tudo a ver com o que estavam procurando.
O gerente e a analista de marketing ficaram sinceramente
empolgados. Saí do prédio da empresa direto para a rodoviária, radiante. Peguei o ônibus do fim do dia. No início
da madrugada desembarquei na rodoviária do Tietê, de
volta para casa cheia de cansaço e planos.
Mas, aí, vinha a mesma história. Passava um dia,
dois, três. Uma semana, duas, três. O responsável tinha
dado encaminhamento interno e esperava ter um retorno em breve. Pedia mais informações. Trazia questões.
Perguntava se podiam montar um estande. Enviavam
mais perguntas. O estande podia ser de cinco metros por
dez? Talvez não consigamos incluir no nosso budget um
estande desse tamanho, diziam. Pode ser de quatro por
quatro? Talvez não tenhamos o valor da cota que queríamos, justificavam. Podemos entrar com uma cota menor?
Passava um dia, dois, três. Uma semana, duas, três. Infe-
lizmente não foi dessa vez, vinha a resposta final. O recurso já estava comprometido. A diretoria adorou o projeto, é
34
maria dolores
muito legal mesmo, mas não vamos conseguir participar
neste momento. E lá se ia a animação, dando lugar a um
balde de água fria e à frustração.
Passei por isso mais vezes do que gostaria. E o
pior não é o não. O pior não é o negócio dar errado, porque
há sempre negócios que dão errado. O pior é o tempo
perdido. O tempo, o esforço, o dinheiro. Desde o primeiro
contato para tentar apresentar o projeto, seja por e-mail ou
telefone, até a preparação para a reunião, a reunião em si,
as demandas pós reunião, a expectativa que suga toda a
energia emocional, não deixando nada para outras fren-
tes. E, por fim, você tem que começar tudo de novo. Cinco
anos depois do nosso primeiro projeto, ou seja, após cinco
anos errando, resolvi mudar a estratégia. Parei de sair
igual uma doida oferecendo projetos para um milhão de
empresas e comecei a fazer o caminho inverso. Meu foco
não era mais criar o projeto e sair em busca de recurso para
viabilizá-lo. Meu foco passou a ser ir em busca do recurso
e, só depois de encontrá-lo, criar o projeto.
Existe muito dinheiro no mundo. Mais do que a
nossa cabeça leiga pode imaginar. Existe mais recurso do
que projeto. Mas dinheiro disponível do que projetos ou
produtos que ele possa comprar. Então, o segredo é ir atrás
desse dinheiro. Foi o que passei a fazer, e isso mudou a
nossa vida e o patamar dos nossos projetos, além de redu-
zir drasticamente o tempo e esforço perdidos. Veja bem:
nós só temos UM tempo. Não temos dois. Só um. Então
eu vou despender tempo e esforço em algo que possa me
35
Como vender e realizar sua ideia
trazer mais resultado ao invés de gastar o mesmo tempo e
mesmo esforço em tentativas com poucas chances de efeti-
vação. Atirar para todo lado, nunca mais. Em vez de sair
oferecendo projeto para empresas só por serem de médio
ou grande porte, passei a pesquisar em quais empresas
havia dinheiro disponível e, então, a focar meus esforços
e tempo para oferecer um projeto para aquela empresa.
Nesse caminho, na maioria das vezes o projeto a ser apre-
sentado é um Projeto Ganha-Pão. Mas, em algumas ocasiões o recurso disponível de uma empresa está em busca
justamente de um projeto como o Projeto do Coração. Nos
dois casos, você interrompe o tóxico processo de andar em
círculos, aumenta a efetividade das suas vendas e a consequente realização dos seus projetos. Mas, como descobrir
onde está o dinheiro?
36
maria dolores
Como descobrir
onde está o dinheiro
37
Como vender e realizar sua ideia
É mais simples do que parece. Você não precisa
ter um software israelense nem comprar um banco de
dados, listas de contatos ou um dos inúmeros serviços e
soluções para prospecção que existem no mercado. Você
pode até optar por uma dessas ferramentas depois, quan-
do seu negócio estiver mais consolidado e houver recurso
disponível para tanto. Mas, se você está começando ou já
começou e ainda precisa firmar o negócio, não vai gastar
dinheiro com isso, não nesse momento. Você só precisa do
Google. “Ah, não acredito que eu li até aqui para isso!”.
Pois bem, leu. E se souber utilizar o Google a seu favor,
não vai se arrepender. É a ferramenta que eu utilizo para
todas as minhas vendas, com raríssimas exceções, e, até
hoje, já vendi dessa forma projetos que vão de 500 mil a 6
milhões de reais. Então, é isso mesmo: dá certo.
Segundo a pesquisa Global Digital Overview 2020,
o brasileiro passa, em média, 3 horas e 31 minutos nas
redes sociais por dia. Por dia! São 4 dias e meio por mês,
sem dormir, sem comer, sem fazer mais nada a não ser
navegar pelas redes, ou 55 dias por ano, praticamente dois
meses. Você pode pegar uma hora dessas 3h31 por dia útil
para encontrar o dinheiro. “E o que eu faço no Google?”.
O que todo mundo faz: pergunta. Você pode começar, por
exemplo, com a pergunta básica e direta: “Quais empresas
tem dinheiro em caixa no Brasil?”. Acabei de fazer isso e
apareceram “Aproximadamente 235.000.000 resultados
(0,74 segundos).
Para que a estratégia funcione, é indispensável
38
maria dolores
que você monte seu próprio banco de dados ou planilha
de controle. O ideal é fazer em uma planilha digital, que
você possa preencher, atualizar, alterar, pesquisar, cruzar
dados. Mas você pode fazer como eu, anotar no caderninho. Eu não sou tão antiga, tenho quarenta e três anos.
Aprendi a me virar bem no universo digital, mas ainda
sou uma apaixonada pelos cadernos, agendas de papel,
blocos com muitas folhas e linhas. Quando entrei na
faculdade de Comunicação, minha madrinha me deu de
presente um curso de computação, porque, segundo ela
(com razão) eu teria muito texto para escrever e trabalhos
para fazer. Curso de Computação significava na época: o
básico. Lembro da minha primeira aula. Passei uma hora
aprendendo a ligar e desligar o computador. Gastei uma
semana para conseguir controlar o mouse. Não entendi
patavinas do Excel, consegui me virar no Word e terminei
o curso sem ter um e-mail ou saber navegar na internet.
Afinal, não existia ainda o Google. A ferramenta de busca
era o Cadê? e eu não consegui me familiarizar com ela.
Voltando ao caderninho, ao Excel ou a outro forma-
to de planilha, deixe a sua à mão e comece anotar os resultados da sua pesquisa. O objetivo da sua missão detetive
é descobrir empresas que tenham dinheiro para investir.
Foque em empresas de grande porte ou de médio porte.
Lembre-se: você só tem UM tempo. Invista esse tempo
para encontrar onde há mais recurso e oportunidade. Há
várias perguntas que você pode fazer ao Google ou frases
para digitar que fornecerão listas e rankings de empre-
39
Como vender e realizar sua ideia
sas com verbas disponíveis em potencial. Vá anotando
cada uma dessas empresas. Esse é primeiro passo, criar
uma relação de Empresas-alvo. E, muito importante:
deve ser uma lista enorme de empresas. Comece com,
pelo menos, cem. Uma quantidade razoável para obter
resultado é montar uma lista com trezentas empresas.
“Mas é muito!”. Não é. Se, durante seis semanas, você
gastar uma hora por dia das suas 3h31 das redes sociais,
você terá a sua lista de trezentas empresas. Dez por dia.
Confira abaixo algumas frases que você pode digitar no
Google para ajudar a descobrir essas fontes de recurso:
Quais empresas têm dinheiro em caixa no Brasil?
Empresas que mais cresceram em 2020
Empresas com recursos para investir
Empresas em expansão
Maiores empresas do Brasil
Empresas com maiores lucros no Brasil
Empresas que mais crescem no Brasil
40
maria dolores
Ao aparecerem os resultados, abra alguns dos
links que surgiram na busca e dê uma lida no conteúdo.
E é imprescindível conferir a data da publicação. Não
conferir a data é um erro básico e que pode jogar todo o
seu trabalho fora. Vamos supor que você ache uma maté-
ria excelente, falando sobre as vinte empresas com recurso para investir em inovação. Você começa a trabalhar
com foco nessas vinte empresas. Mas esqueceu de olhar
a data da publicação e, tcham, tcham, tcham, tcham... era
de 2016. Todo o trabalho em vão. Sempre que fizer uma
pesquisa, abra links que achar interessantes ou que pareçam responder ao que você busca. Então, primeiro veja a
data de publicação e só depois leia o conteúdo. Vale à pena
se dedicar a ler conteúdos publicados desde o ano anterior
ou, no máximo, até dois anos anteriores. Mais antigo que
isso não vale a leitura. O mundo dos negócios muda muito
rápido.
Além de perguntar ao Google, inclua na sua rotina
passar a vista, todos os dias, em sites que trazem informações preciosas para descobrir onde está o dinheiro e o que
esse dinheiro busca. Sites de negócios, como www.exame.
com.br, da revista Exame, ou www.valor.com.br, do jornal
Valor Econômico sempre trazem notícias e informações
do que acontece no universo empresarial. Qual setor está
em expansão, qual empresa comprou outra, quais tiveram lucro e uma infinidade de informações úteis. Calma,
você não precisa se tornar expert em finanças nem preci-
sa ler todas as matérias. Basta abrir as páginas e ler as
41
Como vender e realizar sua ideia
manchetes, os títulos, ver se tem algo interessante, alguma
pista sobre onde está o dinheiro. Quando o conteúdo for
muito bom, aí sim, gaste tempo com a leitura. Aliás, tanto
a Exame quanto o Valor produzem guias anuais com as
maiores e melhores empresas. Eu costumo comprar esses
guias nas bancas, porque, como eu já disse, gosto de papel,
mas você pode pesquisar o ranking virtual mesmo.
Outro canal excelente para conseguir uma lista
eficiente de empresas com recursos é o ranking de empre-
sas incentivadoras da Lei Federal de Incentivo à Cultura.
Ele está disponível nas plataformas da Secretaria Especial
da Cultura e relaciona as empresas que mais aportaram
recursos em projetos culturais. Para você entender como
essa informação é valiosa, uma empresa só pode alocar
recurso em um projeto aprovado pela Lei de Incentivo à
Cultura se estiver enquadrada no sistema de tributação
de Lucro Real, que, geralmente é o status tributário de
empresas que lidam com grandes quantias de dinheiro.
E, o principal, a empresa só pode destinar ao projeto até
4% do imposto de renda devido. Ou seja: se a empresa
tem que pagar 100 milhões de reais de imposto de renda,
ela pode destinar até 4 milhões para projetos culturais. Há
várias empresas que destinam 4 milhões, outras que destinam ainda mais. Vamos fazer outra conta por alto, apenas
como ilustração. Suponhamos que a alíquota de imposto
de renda a pagar da empresa seja de 27% sobre o lucro. Se
o imposto devido é de 100 milhões de reais, os 100 milhões
representam 27% do lucro. Portanto, o lucro da empresa
42
maria dolores
é em torno de 370 milhões. Não é pouca coisa. Como eu
disse, há bastante dinheiro por aí.
Atualmente, você pode encontrar esse ranking da
Secretaria Especial da Cultura no portal VerSalic (versalic.
cultura.gov.br) ou no SalicNet (sistemas.cultura.gov.br).
Eu sempre pesquiso o resultado do ano anterior, que já
está consolidado. A dica é pesquisar por Incentivadores
Maiores. Tem gente que pesquisa por Unidade da Federação, Região, mas esses filtros não condizem com o cenário
real, pois são pela origem do CNPJ da empresa. Muitas
vezes a empresa tem CNPJ em Recife, mas atua em todo
o Brasil. É mais eficaz procurar as maiores incentivadoras.
Eu gosto de pesquisar nas mil maiores empresas incenti-
vadoras. Pode parecer chato, mas não é. É como um jogo,
você tem que pesquisar, buscar, passar de fase e, quando
você fecha um negócio, zera o jogo e começa de novo. A
sensação é incrível. “Isso não é para mim, não trabalho
com leis de incentivo”, você pode dizer. É sim. Você não
precisa trabalhar com projetos via leis de incentivo para
pesquisar uma lista prontinha com algumas das maiores
empresas com lucro no país. Mesmo que você só realize
projetos não incentivados, que seu negócio seja outro, essa
relação da Secretaria Especial da Cultura é um excelente
ponto de partida para descobrir onde estão os recursos.
Feita essa primeira lista de empresas, o segundo
passo é pesquisar cada uma delas. Para saber no que estão
interessadas, o que querem. Um dos grandes problemas
nessa relação de venda de projetos é que a maioria dos
43
Como vender e realizar sua ideia
projetos que chegam nas empresas não tem nada a ver
com os objetivos das mesmas. Isso vale para qualquer tipo
de projeto, não só cultural. Uma vez eu precisava comprar
uma bota com sola de metal para uma dança de festa
junina do meu filho do meio. Era um tipo de sapateado
com bota, o que, aliás, achei um desaforo. As escolas não
podem pedir coisas mais simples? Como se uma bota com
sola de metal tamanho 32 fosse algo fácil de encontrar. É
mais fácil encontrar dinheiro disponível nas empresas do
que uma bota dessas. Descobri uma loja de roupa country
em Belo Horizonte, onde estava realizando um Festival.
Fui até lá, expliquei sobre a bota e que precisava ter sola
de metal para a dança. A atendente, muito simpática, foi
lá dentro. Demorou um tempão. E voltou com uma calça
com franjas. “Não tenho a bota, mas tenho essa calça linda
de franjas”. Eu tive vontade de desaparecer, não só porque
ela não tinha o que eu precisava, mas pelo tempo que eu
havia perdido. Não comprei a calça. É a mesma situação de
quando você precisa de uma blusa branca para um evento específico. Você vai em uma loja, explica que precisa
da blusa branca para o evento e o vendedor ou vendedo-
ra volta com uma calça preta, que combina com branco e
está na promoção. Qual a chance de você comprar a calça?
Bom, se você for um consumidor impulsivo, pode até ser
que compre para aproveitar a promoção. Mas as empresas
não são consumidores imulspivos. Não compram o que
não precisam.
Após montar a sua lista de clientes potenciais, é
44
maria dolores
chegada a segunda fase do processo. Pegar empresa por
empresa, uma de cada vez, e pesquisar quais os interesses
dela, as estratégias, o que ela quer e precisa. Sim, você terá
que fazer essa pesquisa para cada uma das cem ou trezen-
tas empresas da sua lista. Mas, em um mês pesquisando
uma hora por dia, você consegue coletar as informações
sobre cada uma delas. Até aqui, dedicando uma hora por
dia útil, em um mês e meio trabalho, você reuniu informações que farão toda a diferença na realização dos seus
projetos. Lembrando que, se você dedicar mais de uma
hora por dia, termina antes. Não tem como pular essa
etapa. Não dá só para confiar nos rankings. Por exem-
plo, mesmo que a empresa apareça em todos os rankin-
gs, durante a pesquisa você pode descobrir que aquela
multinacional irá fechar unidades ou construir uma fábri-
ca nova e, portanto, não terá recurso disponível por um
tempo. Não foi trabalho perdido, você coloca a empresa
em stand by, aprende um pouco mais sobre o segmento e
segue para as outras.
Uma vez definida qual empresa pesquisar, você
pode, claro, consultar sobre a empresa no site dela. Mas
atente-se que o site da empresa não traz todas as informações que você demanda. O site de uma empresa é como eu
ou você. Quando nos apresentamos para alguém, falamos
o que queremos que o outro saiba, recortamos determinadas informações para repassar. Não saímos por aí abrindo nossa vida inteira. As empresas também não. Os sites
são vitrines, não são o melhor lugar para você descobrir
45
Como vender e realizar sua ideia
a estratégia da companhia. Para isso, mais uma vez, o
Google é uma excelente ferramenta. Você fará perguntas
sobre a empresa no Google. Veja alguns exemplos (onde
está xxxx você coloca o nome da empresa):
Estratégia de crescimento da xxxx para 2020
Estratégia de crescimento da xxxx para 2021
Estratégia de comunicação (ou marketing) da xxxx 2020
Estratégia de comunicação (ou marketing) da xxxx para
2021
Por que você precisa descobrir a estratégia de cres-
cimento ou marketing? Para descobrir em qual público a
empresa está interessada. Esse é o segredo. Qual público
a empresa quer conquistar ou ampliar? Esse público é o
foco de interesse do seu cliente potencial e, se você tiver
um projeto justamente para esse público, que converse e
envolva esse público, as suas chances de venda aumentam significativamente. Você para de oferecer calças pretas
desnecessárias e passa a oferecer a blusa branca certeira.
Exatamente o que ela precisa.
Além de pesquisar no Google, alguns sites podem
ajudar a descobrir essas estratégias. Os sites da revista
46
maria dolores
e Exame e do jornal Valor Econômico, como já falamos
antes, e sites do mercado publicitário. O que eu mais gosto
é o site do Meio & Mensagem (www.meioemensagem.
com.br). Ele traz informações sobre as campanhas publicitárias e essa informação é ouro. A campanha publicitária
é feita para atingir o público para o qual a empresa deseja
vender, o público que ela quer conquistar. Se uma empresa de automóveis lança uma campanha para o público
feminino jovem no Nordeste, é porque quer vender para o
público feminino jovem do Nordeste, quer ganhar espaço
junto a esse público. Bingo! Essa empresa tem recurso e
precisa de um projeto que converse com o público femini-
no jovem do Nordeste. O que você faz? Oferece para ela
um projeto que lida justamente com esse público. Coincidência? Não, trabalho. Você não vai sair criando projetos
para cada público potencial que descobrir. Depois vamos
falar sobre como fazer isso sem perder tempo montando
mil projetos diferentes. Por ora, vamos manter nosso foco
no dinheiro. Descobrimos onde ele está. Precisamos descobrir quem manda nele. Antes disso, vamos abrir os olhos.
47
Como vender e realizar sua ideia
É preciso estar atento
Parece óbvio, e é óbvio. Grande parte das estra-
tégias e segredos para uma vida feliz e satisfatória são
óbvias. O que falta é colocarmos em prática as obvieda-
des. Isso é o difícil. Para realizar seu projeto, seus sonhos e
suas prioridades na vida você precisa abrir os olhos para o
que acontece ao seu redor. As oportunidades passam por
nós com mais frequência do que imaginamos. Se você não
estiver atento, pode perdê-las sem nem se dar conta de
terem acabado de passar do seu lado. Infelizmente, isso é
o que mais acontece. Perdemos inúmeras oportunidades
por falta de atenção ao que acontece a nossa volta. Agora
ainda mais que antes. Com os olhos pregados na tela do
celular, perdemos os inúmeros bilhetes de loteria que
passam por nós, nos dão oi – sem receber nossa resposta
- e vão embora enquanto continuamos com o olhar fixo
na tela. Nos abster de olhar ao redor e observar o mundo,
prejudica não só nossa vida profissional, mas, ainda mais,
nossa vida pessoal. Enquanto você gasta toda sua energia
e atenção no aparelho à sua mão, deixa de viver a vida
real, experimentar o presente e produzir memórias. Fico
pensando, com aperto no coração, no idoso do futuro:
sentado na cadeira, sem conseguir navegar pelo celular
porque a vista não está boa, a audição não está boa e sem
poder recorrer à memória. Se eu passo a maior parte do
tempo conectado no mundo virtual, a que tipo de recor-
48
maria dolores
dações vou poder recorrer quando precisar delas? Que
lembranças terei da minha vida se eu não tive tempo para
vive-la e experimentá-la, com a atenção focada numa tela
de celular? A nossa mente não fixa o momento como deveria fixar se estamos de olho na tela. Eu percebi isso de um
modo triste.
Uma das coisas que eu mais gostava com meus
filhos, e gosto, é levá-los para brincar num lugar lúdico ou
interessante e observá-los. Não tenho paciência para brincar, nunca tive. Só tenho paciência para contar histórias, ler
e jogar alguns jogos de cartas, mas gosto de levá-los para
algum lugar, observar, estar ali com eles. São imagens,
sentimentos e momentos que guardo com muito carinho
no coração, memórias que me acalmam quando estou me
sentindo mal por alguma coisa. Recordações que aquecem.
Tenho filhos em idades bem diferentes. Vinte e três, dez e
cinco anos. Com o meu caçula fiz a mesma coisa. Sempre
o levava para brincar no parquinho do clube do Hospital
em frente onde moramos, na trilha, na livraria, no quintal
da casa da minha mãe e da minha sogra no interior. Um
dia me dei conta que passava a maior parte desses preciosos momentos mexendo no celular que, aliás, é o novo e
principal modo de entretenimento de qualquer pessoa,
de qualquer idade. Ficava resolvendo coisas de trabalho
ou só dando uma passeada pela internet. Um dia percebi,
com remorso e sofrimento, que não conseguia me lembrar
muito bem desses momentos. Enquanto ele estava fazendo bolinhos na caixa de areia, eu estava lendo uma notícia
49
Como vender e realizar sua ideia
sobre como comer feijão ajuda em sei lá o quê. Coloquei
o celular na bolsa, com vergonha, culpa e nostalgia por
tudo o que eu estava perdendo. A partir desse dia, comecei a me esforçar para não ficar no celular nesses momentos. É difícil. O trabalho demanda, a família demanda, a
vida demanda e a própria facilidade e o universo infinito
de possibilidades da internet demandam. É tentador. Tem
hora que não me controlo, mas tem hora que consigo. E
sigo nessa luta, para que minhas lembranças da infância
do meu caçula não se percam no vazio. E para que ele não
se sinta sozinho. Para que suas recordações, lá na fren-
te, não sejam da mãe que nunca estava presente, estava
sempre vagando por perdida em algum lugar virtual.
Contei esse meu drama particular para mostrar
quantas oportunidades estamos perdendo ao focarmos
nossa atenção no celular à nossa mão e deixar de observar o que acontece à nossa frente. Isso vale para tudo. Eu
sempre trabalhei com a criatividade. Seja como jornalis-
ta escrevendo matérias ou crônicas, ou como produtora
cultural criando projetos. A maioria das ideias que tive, e
tenho, para um texto ou um projeto – e isso inclui ideias
para vender um projeto – surgiram enquanto eu estava
sem ocupar a mente consumindo algum tipo de conteúdo ou respondendo a algum tipo de conteúdo. Surgiram
quando estava sem ter nada para fazer ou pensar, quando a mente estava livre. Na sala de espera de um médi-
co. Em uma caminhada, no congestionamento, na ida de
um lugar para outro a pé, na estrada (não consigo ler em
50
maria dolores
movimento, sou igual criança, enjoo). Nesses momentos
em que não tinha como trabalhar, resolver alguma outra
coisa na internet eu pensava, observava a vida, conversa-
va com as pessoas e, pronto, as ideias vinham. Experencia-
va o momento, de forma atenta e plena. Viver o momento
é uma ferramenta indispensável para quem trabalha com
criatividade e é o que mais temos deixado de fazer com
o advento do vasto mundo virtual. Nas salas de esperas
dos médicos, nas filas, está todo mundo conectado ao seu
próprio aparelho, com as cabeças baixas para a tela, baixas
para a vida que acontece ali, naquela hora.
Uma vez, numa fila para pegar autógrafo com o
autor no lançamento de um livro, fiz amizade com um
cineasta importante que, na hora, eu nem sabia quem
era. Ele acabou me inspirando e , da conversa, surgiram
ideias para um projeto. Recebeu a mim e meu marido na
sua produtora, compartilhou conhecimento e
o acabei
entrevistando para meu livro sobre o Milton Nascimen-
to, porque ele havia feito um filme com ele. Estar aten-
to, conversar com as pessoas, se interessar pela vida que
acontece fora das telas, é fundamental para criar – e vender
– bons projetos. Em 2013 acontecia no Brasil a Copa das
Confederações. Eu e o Felipe estávamos fazendo um curso
à noite na área de audiovisual. O lugar das aulas ficava a
doze quarteirões de casa, doze longos quarteirões paulis-
tanos, mas aproveitávamos para ir a pé, evitar o trânsito
e ainda fazer uma caminhada. Descíamos a rua Teodoro
Sampaio, onde, além de lojas de instrumentos musicais
51
Como vender e realizar sua ideia
e móveis, há várias agências bancárias. O curso era às
terças-feiras. Numa dessas terças, ficamos impressionados
porque todas as agências, todas, estavam com as fachadas
protegidas por tapumes. Ao chegarmos no curso, demos
uma olhada no celular para ver o que estava acontecendo
e, nos sites de notícia, havia a informação de uma manifestação naquela noite, que passaria pela av. Rebouças, para-
lela à Teodoro. Eram manifestações por todo o Brasil, mas
principalmente em São Paulo, contra o aumento no valor
da passagem de transporte público. Começaram pequenas e cresceram, somando à insatisfação pelo aumento
do preço do bilhete a indignação pelos gastos astronômicos e desperdício de recurso para o Brasil sediar a Copa
das Confederações. Algumas agências bancárias haviam
sido vandalizadas em uma manifestação anterior. Por isso
todas as agências, de todos os bancos, estavam cercadas
por tapumes.
Nunca fui de assistir ao Jornal Nacional, da
Globo. Quando criança, porque odiava jornal. Na faculdade, porque assistir ao Jornal Nacional, novela ou ler a
revista Veja eram a maior traição que poderia existir ao
curso de Comunicação Social – algo que descobri, depois,
ser completamente sem sentido. Na vida adulta, não assis-
tia porque já havia tv à cabo, streaming e quase não via
televisão aberta. Mas, nos dias do curso, o intervalo era
justamente na hora do Jornal Nacional, que era exibido
pela padaria da esquina onde tomávamos um café. Então,
nas terças-feiras assistíamos. Nesse dia, ao ver os tapumes
52
maria dolores
nas agências e saber da manifestação, eu disse para o Felipe: “Vamos assistir ao Jornal Nacional até o fim hoje, tenho
certeza de que todas as propagandas relacionadas à Copa
das Confederações vão sumir”. Dito e feito. A propaganda
do banco que trazia o público emocionado, segurando a
bandeira e a bola de futebol foi substituída pela propa-
ganda tradicional do rapaz oferecendo cartão de crédito.
A propaganda da empresa de bebidas que também trazia
o público emocionando, segurando a bandeira nacional e
a bola foi substituída pelo churrasco da família feliz no
final de semana. Meu pensamento foi: está péssimo para
os patrocinadores da Copa das Confederações. Nenhum
diretor de marketing que se preze vai manter uma propa-
ganda de apoio ao evento nesse momento, principalmente
no intervalo do Jornal Nacional, que vai mostrar as mani-
festações pelo Brasil. No dia seguinte, fiz uma relação dos
patrocinadores da Copa das Confederações. Descobri os
responsáveis pelo marketing de cada empresa, o contato
deles e enviei um e-mail. Na época estávamos prestes a
cancelar uma edição de um dos nossos Projeto do Coração, o Festival Música do Mundo. Faltavam cem mil reais.
Sem essa quantia era impossível realizar o projeto. No
e-mail que enviei, pedi desculpas por entrar em contato
num momento delicado e desejava que tudo se resolvesse
logo. Depois dizia que, justamente num momento como
aquele, com tantos questionamentos em relação ao apoio
da marca à projetos de grandes somas de dinheiro e visibi-
lidade, como a Copa das Confederações, talvez fosse inte-
53
Como vender e realizar sua ideia
ressante associar-se a projetos fora dos grandes centros e
totalmente desvinculados de qualquer foco comercial. No
caso, um projeto como o nosso. E faltavam apenas cem mil
reais para que fosse realizado.
No mesmo dia, durante a tarde, recebi um telefo-
nema da secretária de uma das pessoas para as quais eu
havia enviado e-mail. Ela se apresentou e perguntou se o
que precisávamos eram os cem mil reais mesmo. “Sim”,
respondi, já morrendo de raiva por não ter pedido mais.
Cem mil era o que precisávamos para realizar o projeto
sem nenhum lucro. Podia ter pedido mais, pensei. Não,
não podia. Esse era nosso Projeto do Coração. Meu objetivo era realizá-lo, e não aproveitar o momento ruim das
empresas para ter lucro. O mundo, a meu ver, não é dos
espertos. É dos espertos e corretos. Uma coisa leva à outra
e, quando você age com honestidade, boa fé e ética, as
coisas tendem a dar certo, mesmo que a passos mais lentos
do que os espertinhos de ocasião. Em três dias o recurso
estava na conta e não precisamos cancelar o evento.
“Ah, mas você não precisava estar atenta à rua
para saber disso, toda a informação estava na internet”,
alguém pode dizer. Sim, estava. E eu uso a internet como
principal ferramenta para as minhas vendas. Mas estar
atento ao mundo concreto e real faz diferença, traz insights que não temos pelo universo virtual. Se eu não tives-
se descido a Teodoro Sampaio e passado em frente, a pé,
de diversas agências cobertas de tapume, não teria expe-
rimentado a sensação tão forte quanto experimentei. Não
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maria dolores
teria sentido o quanto aquilo era grave para as empresas,
o quanto estavam preocupadas, o quanto havia sido um
azar associar suas marcas ao evento. Foi a imagem forte
dos tapumes, reais, diante de mim, que despertou a minha
sensibilidade.
Eu procuro andar com um caderninho na bolsa,
e uma caneta. Para anotar minhas ideias. Coisas que vão
surgindo nesse contato direto com o mundo, os cenários
e as pessoas. É um excelente exercício. Eu coloco o nome
de Caderno de Ideias. Se não estou com o caderninho em
mãos, envio um e-mail para mim mesma do celular, com
o assunto “Ideias”. Depois eu dou busca, junto as ideias,
salvo num arquivo com esse mesmo nome “Ideias”. De vez
em quando consulto tanto as ideias do caderninho quando
as do arquivo no computador. O virtual e o real trabalhan-
do juntos. Você pode ter uma ideia para um projeto, uma
abordagem de venda ou
encontrar a solução para um
problema se se desconectar um pouco e observar o mundo
à sua volta. Se não tem o hábito de fazer isso, experimente.
Deixe o celular em casa e saia sem ele, para evitar à tentação de dar só uma olhadinha. Faça esse exercício. Repare
nos lugares e nas pessoas. Tente conversar com algumas
delas. O atendente da lanchonete, o segurança da agência bancária, a pessoa da fila, a caixa de supermercado, o
motorista de aplicativo. As pessoas têm histórias maravilhosas para contar, que podem inspirar você. Você não vai
ter uma ideia incrível cada vez que fizer isso. Mas uma
hora a ideia vem. Você só precisa praticar. Não vai se arre-
55
Como vender e realizar sua ideia
pender.
Mas, voltando à nossa busca pelo dinheiro, como
eu sabia quem eram as pessoas nas empresas patrocinadoras que decidiam sobre os recursos destinados à Copa das
Confederações? E como consegui, em uma manhã, entrar
em contato com todas elas? Antes desta resposta, é preciso
esclarecer sobre o mito do Q.I.
56
maria dolores
O Mito do Q.I.
57
Como vender e realizar sua ideia
Quando fizemos nosso primeiro projeto, o Festi-
val Música do Mundo, em 2009, o que eu e o Felipe mais
ouvíamos das diversas pessoas que tentaram ajudar
foi: “Para conseguir um recurso tem que ter um Q.I.”.
O famoso “Quem Indica”. Nós também acreditávamos
nisso, afinal, era o mantra repetido desde sempre, não só
no universo da cultura e da economia criativa como em
todas as esferas da vida. Infelizmente, crescemos acredi-
tando nessa máxima. Hoje as coisas mudaram um pouco,
mas a prerrogativa de que é necessário um Q.I. para se
chegar a algum lugar ainda é arraigada no imaginário e na
nossa cultura. Eu ouvi isso desde criança. Engraçado que
não na minha família. A minha família é um tanto quanto
diferente e as pessoas nunca foram envolvidas ou interes-
sadas em relações de poder, em conseguir ou não coisas
que dependessem dos outros, de contatos importantes.
Viviam mais no seu mundo. Mas, na escola, nas minhas
outras áreas de convivência, sempre ouvi a história do Q.I.
e essa crença estava tão naturalmente dentro de mim que
não questionei quando as pessoas diziam que, para conseguir um patrocínio, era preciso ter um Q.I.
Eu já tinha tido várias experiências pessoais
mostrando justamente o contrário, mas não me atentei
a elas, e esse foi um outro grande erro que, espero, você
não repita. Quando resolvi escrever a biografia do Milton
Nascimento fiz um caminho diferente do que todo mundo
em Três Pontas fazia quando queria algo do conterrâneo
ilustre. Em vez de procurar o pai ou a irmã dele, em Três
58
maria dolores
Pontas, pedir ajuda à família, apelar para o fato de sermos
da mesma cidade e as famílias terem relação há anos,
telefonei no escritório que agenciava o Milton no Rio de
Janeiro e pedi para falar com a empresária dele. Ela me
atendeu. Não no primeiro dia que telefonei. Alguns dias
e telefonemas depois. Expliquei - primeiro por telefone,
depois pessoalmente em um horário agendado no Rio, no
escritório - que estava concluindo o curso de Comunica-
ção com habilitação em Jornalismo e meu TCC era uma
biografia do Milton Nascimento. Que eu podia realizar o
trabalho sem entrevistas com ele, mas seria muito melhor
se eu pudesse entrevista-lo. Ela me conhecia, conhecia
minha mãe, era amiga de um primo de segundo grau, mas
não tínhamos qualquer contato e não lembrava de tê-la
visto algum dia na minha vida. O fato é que eu ter ido
falar com ela pelo caminho normal, em vez dos atalhos
pelos Q.I. dos laços conterrâneos, fez toda a diferença. Ela
disse que falaria com o Milton, mas já adiantava que havia
gostado do projeto e que, sim, eu poderia entrevista-lo. E
poderia também pesquisar o acervo sobre ele no escritório.
Dei uma olhada no acervo, havia muita coisa e estava tudo
desorganizado. Combinamos então que eu pesquisaria e
poderia usar tudo o que quisesse e, em troca, organizaria
o acervo. Bom para ela, bom para mim.
Depois de preparar a minha lista de pessoas a
serem entrevistadas, em vez de pedir ajuda para a empre-
sária do Milton, para o próprio Milton ou para as pessoas do entorno dele, eu mesma procurava os telefones dos
59
Como vender e realizar sua ideia
escritórios de cada uma dessas pessoas e entrava em conta-
to em meu nome. Nunca entrei em contato dizendo algo
do tipo: “Estou ligando em nome do Milton Nascimento”
ou “Foi o Milton Nascimento que passou o seu contato”
ou qualquer coisa do tipo. Sempre me apresentei da forma
como achava que devia ser. E deu certo. Consegui entre-
vistar todas as pessoas da minha lista. Até os tidos como
impossíveis. Todo mundo dizia que o Chico Buarque era
de difícil acesso, que eu não conseguiria, que precisava
que alguém falasse com ele, precisava de um Q.I.. Mas eu
sabia que estava fazendo um trabalho importante e não
havia razão para ele não querer dar a entrevista. Telefo-
nei no escritório que o agenciava. Disse exatamente assim:
“Boa tarde, meu nome é Maria Dolores. Estou escrevendo a biografia do Milton Nascimento e preciso entrevistar
o Chico. Gostaria de saber se ele poderia me atender”. A
moça explicou que ele estava terminando de escrever um
livro (“Budapeste”, na época), e que não estava receben-
do ninguém. Mas que, por ser para a biografia do Milton
Nascimento, provavelmente ele abriria uma exceção.
Ela me telefonou alguns dias depois e passou a
data, horário e local da entrevista. Seria no dia do meu
aniversário, no apartamento dele. Minha mãe, minha
sogra e mais um milhão de parentas pediram para ir comigo. Segurando a mala, o gravador, tirando as fotos. Eu
não precisava de nada disso. Era uma entrevista de apoio
para um livro de texto, só precisava das perguntas e do
gravador com fita e pilhas sobressalentes. Antes de entre-
60
maria dolores
vistar qualquer pessoa, eu pesquisava sobre ela. Lia não
só sobre os fatos que interessavam ao meu propósito (no
caso, passagens que envolviam o Milton) mas lia também
um pouco sobre a biografia do entrevistado, para saber
com quem estava falando e não fazer perguntas idiotas.
Não existia Google. As pesquisas eram feitas em livros e
materiais de acervos e bancos de dados de jornais e revis-
tas. Fiz minha pesquisa sobre o Chico Buarque e ele me
recebeu na hora marcada. Foi o único entrevistado famoso
que abriu a porta ele mesmo. Perguntou se não havia fotó-
grafo. Eu expliquei que não, porque eu não precisava de
foto dele para o livro. Ele pareceu mais tranquilo e ficou à
vontade, o que faz toda diferença para uma entrevista. Me
ofereceu café e, como aceitei, coou ele mesmo na cozinha
conjugada com a sala grande de uma bonita cobertura no
alto de um morro. Foi uma ótima entrevista e, para não
perder a oportunidade, no meio dela eu disse: “Ah, hoje
é meu aniversário”. O que ele poderia fazer? Me deu os
parabéns. E, então, sem Q.I. nem nada do tipo, tenho os
parabéns do Chico Buarque para mim guardados em uma
gravação numa caixa cheia de fitas cassete. Com o mesmo
método, telefonando nos escritórios, entrevistei o Gilberto
Gil, Caetano Veloso, Wayne Shorter, Herbie Hancock, Beto
Guedes, Lô Borges e muitos outros.
Eu havia feito todas essas coisas sem um Q.I. mas
não tinha parado para pensar nisso. Portanto, na busca por
patrocínio para o Festival quando alguém dizia: “tem que
conhecer alguém, e eu conheço” eu acreditava e depositava
61
Como vender e realizar sua ideia
todas as minhas esperanças e energias. Às vezes a pessoa
chegava com a maior boa vontade do mundo e dizia: “Tem
um conhecido meu, amigão, que tem um cargo importan-
te na empresa tal, ele manda lá”. E, então, agendava um
horário para eu ir apresentar o projeto. Eu fazia todo aque-
le processo. Preparava, estudava a empresa, preparava um
material de apresentação, gastava tempo, dinheiro, esforço e, pronto, chegava o dia da reunião. A pessoa me rece-
bia com atenção e gentileza, afinal, era amigão do meu Q.I.
E, realmente, ocupava um cargo importante na empresa.
Era diretor de RH. Mandava, sim. Mas no RH. Não tinha
qualquer relação com a área que decidia sobre os recursos
de patrocínio ou eventos. Depois de me ouvir com interes-
se, o diretor de RH pegava o projeto e encaminhava para
o responsável. E a história terminava por aí. Em muitas
empresas existe uma certa resistência de uma área para
outra. Se um diretor de RH leva um projeto para a área
que decide pelos patrocínios, não raras vezes esse gesto
é visto como intromissão. Do tipo “meter o bedelho onde
não foi chamado”. E o projeto vai para o fim da fila, onde
fica eternamente. Mesmo quando a relação entre as áreas é
boa, o projeto acaba ficando de lado, porque quem deveria
ter recebido as informações, ouvido a minha empolgação
e entusiasmo, não ouviu e tem outras prioridades, outros
projetos para avaliar, projetos recebidos pela própria área.
O resultado da empreitada? Eu gastei o meu tempo e o do
coitado que me recebeu.
Depois de alguns anos perdendo tempo e esforço
62
maria dolores
em visitas inúteis aos contatos via Q.I., compreendi que
esse tipo de abordagem pode até ter sido a estratégia domi-
nante lá atrás, quando o mundo era menor, restrito aos
limites históricos do “quem manda sou eu”, mas não hoje.
Esse tipo de comportamento e mentalidade persistem, o
que é uma pena, e ainda controlam uma parte expressi-
va da engrenagem da riqueza e do sucesso, mas estão em
declínio, sobretudo no universo dos negócios, ocupado
cada vez mais por empresas saudáveis, que crescem exponencialmente apoiadas em valores como ética, meritocra-
cia, desempenho e sustentabilidade. De uns bons anos
para cá, descartei a abordagem Q.I. das minhas vendas e
buscas por recurso. É claro que não podemos perder oportunidades que chegam por Q.I.. Se alguém se oferecer para
apresentar a você uma pessoa que valha à pena para o que
você está buscando, você vai aceitar, agradecer e se empenhar ao máximo. Mesmo assim, o ideal é você aproveitar
o nome do seu conhecido, sim, mas buscar o encontro por
si próprio. Você pode pegar o contato com seu conhecido
e enviar um e-mail, ou uma mensagem, ou dar um tele-
fonema dizendo “Oi, o fulano meu passou o seu contato,
gostaria de apresentar um projeto, se você tiver dispo-
nibilidade, cinco minutinhos etc”. É melhor do que seu
conhecido organizar tudo, como se você fosse incapaz de
entrar e fazer o caminho por si próprio. Se você precisa de
uma babá para agendar um encontro, isso pode dizer algo
sobre você e atuar contra sua credibilidade e competência.
Pode passar a mensagem errada. Mas, afinal, se o Q.I. não
63
Como vender e realizar sua ideia
é a solução, como descobrir na empresa quem manda no
dinheiro?
64
maria dolores
Como descobrir quem
manda no dinheiro
65
Como vender e realizar sua ideia
Vamos descobrir quem manda no dinheiro da exata
e mesma forma que descobrimos onde está o dinheiro.
Como vimos antes, existem bancos de dados de empresas
e listas de contatos que você pode comprar, de forma legal,
para trabalhar suas vendas. Para tanto, você dispenderá
recurso financeiro. Além disso, a sua pesquisa acabará
sendo um trabalho menos personalizado, o que é funda-
mental para o sucesso da sua jornada. Existem diversas
formas de fazer a mesma coisa, diferentes caminhos para
alcançar os objetivos. A minha proposta, neste livro, é
compartilhar a forma como eu tenho feito para vender e
realizar nossos projetos. Você pode seguir outras técnicas
ou pode criar a sua. Mas é sempre legal a gente saber como
outras pessoas conseguem realizar algo similar ao que
buscamos. E a forma como eu descubro quem manda no
dinheiro dentro das empresas é tão óbvia e simples que,
se você continuou a ler e chegou até aqui, vai pensar de
novo: “Eu li até aqui para isso?”. Sim, para isso. Esse isso,
no entanto, se bem aplicado, dá resultado.
Quando fiz o Curso Abril de Jornalismo, antes de
começar a escrever matérias para as revistas da Editora,
aprendi algo que nunca mais abandonei, uma forma de
olhar para as coisas que fez toda a diferença na minha vida
e é completamente óbvia. Foi na aula do Thomaz Souto
Corrêa, então vice-presidente do Conselho de Administra-
ção e Diretor Editorial da empresa. Ele nos ensinou sobre
os “Óbvios” na arte de fazer revista. Eram coisas óbvias,
como o próprio nome diz, mas geralmente abandonadas
66
maria dolores
pelos jornalistas e designers, em desfavor do leitor, dificultando a vida do dito cujo. O “óbvio” símbolo dessa
aula, que guardei e aplico, é “Letra preta em fundo bran-
co é sempre melhor”. Um livro impresso ou uma revista
impressa precisam facilitar a leitura do leitor, senão ele
desiste. Já tentou ler um livro impresso com letra branca
em fundo preto? Cansa. Uma página é até bonitinha. Na
segunda a gente já quer ir embora. E letra verde em fundo
vermelho? Laranja em fundo amarelo? Marrom em fundo
azul? É óbvio e é simples, mas nada funciona tão bem
para facilitar a leitura do que letra preta em fundo branco, no máximo um fundo levemente puxado para o creme.
O fundo do Word não é branco porque o Bill Gates, da
Microsoft, adora branco. Mas porque é o mais funcional.
Óbvio, simples. Na tentativa de inovar ou fazer diferente,
muitas vezes a gente acaba fazendo algo que atrapalha em
vez de ajudar, que nos cria obstáculos em vez de nos levar
adiante. Pode até ficar bonito, mas não atende ao objetivo.
Então, vamos ao óbvio.
Como você vai descobrir quem manda no dinhei-
ro? No Google. A primeira coisa é saber qual área da
empresa tem afinidade e potencial interesse pelo seu
projeto. Se você estiver buscando recurso para um projeto cultural, esportivo, gastronômico ou para um evento,
o mais comum é a área responsável dentro da empresa
ser de Comunicação ou Marketing. Se o seu projeto é de
tecnologia, provavelmente a área responsável é a de inova-
ção. Se o seu projeto atende ao público interno das empre-
67
Como vender e realizar sua ideia
sas, é grande a chance de a área responsável ser RH ou
Desenvolvimento de Pessoas. Para descobrir qual a área,
você digita no Google. Pode começar escrevendo: “área
responsável projetos esportivos xxxx”. Lembrando que
xxxx é o nome da empresa. Ou “área responsável projetos
de inovação xxxx”. Ou “área responsável por eventos e
feiras xxxx”. A partir dessa busca inicial, você vai aprimorar a pesquisa de acordo com o que descobrir. O trabalho
de vendas é como o trabalho de um detetive. Você precisa escarafunchar, analisar, ir atrás e seguir as pistas que
surgem ao longo do caminho.
Pronto, você descobriu que a empresa Vida Linda
tem recursos para investir em 2021 e 2022, quer aumentar seu público no Sudeste e conquistar novo público na
Bahia. Você trabalha com cultura e, portanto, quer apre-
sentar algo nesse segmento. Você descobriu que a área
responsável por eventos e projetos culturais na Vida Linda
é Marketing – como geralmente é. Então, qual o próximo
passo? Você vai digitar no Google:
Diretor de marketing Vida Linda.
Diretora de marketing Vida Linda.
VP de marketing Vida Linda.
Vários nomes irão aparecer. Como saber com qual
trabalhar? Abrindo os links e lendo o conteúdo. Mais uma
vez: é indispensável ver a data da publicação do link. Se
a Joana Cardoso está como diretora de marketing da Vida
Linda e a matéria é de 2013, pode ser que ela não esteja
68
maria dolores
mais lá, ou tenha mudado de cargo. Trabalhe sempre com
publicações de dois anos para cá. Se tudo der a entender
que a Joana Cardoso é a diretora de marketing atual, digite
o nome dela associado à Vida Linda, procure mais informações. Veja o que estão fazendo atualmente. Os diretores
das suas áreas sempre dão entrevistas para veículos espe-
cializados, falando sobre lançamentos, estratégias e resul-
tados. Não é difícil encontrar ao menos uma nota ou vídeo
com uma fala da pessoa em questão sobre a sua área.
Algumas vezes, poucas, quem cuida da área na
empresa não é um diretor, é um gerente. Mas eu sempre
começo minha pesquisa pelos cargos mais altos: direto-
res, vice-presidentes, que são as pessoas que, em última
instância, decidem sobre o destino dos recursos. Direciono a busca no Google para “gerente de marketing Vida
Linda” só em último caso, quando não consigo encontrar
de forma nenhuma os ocupantes de cargos de diretoria. As
áreas costumam ter vários gerentes, que podem ser geren-
tes de equipe e gerentes de subdivisões dentro da área. E,
com a busca pela internet, é difícil saber qual gerente específico é aquele que tem o poder de encaminhar interna-
mente a sua proposta. Por isso, foco na diretoria. Também
acontece com certa frequência de enviar um e-mail para
o diretor e ele encaminhar para o gerente responsável da
sua equipe. Aí sim, você dará sequência com o gerente.
Além do Google, manter a olhadinha diária nos
portais do Meio & Mensagem, Exame e Valor, ajuda na
busca pelos profissionais com os quais você precisa falar.
69
Como vender e realizar sua ideia
Esses canais trazem matérias sobre questões internas
das empresas. Essas matérias apresentam a fala de uma
pessoa envolvida diretamente nas ações. Essa pessoa
pode ser aquela com a qual você precisa entrar em conta-
to. Para a área da economia criativa, o Meio & Mensagem
é fundamental. Por ser um veículo sobre o universo da
publicidade e propaganda, traz conteúdo de quem entra
e quem sai nos cargos chaves de marketing, comunicação
e inovação das empresas, ou sobre as campanhas e estra-
tégias de publicidade das marcas. O Meio & Mensagem
traz ainda informações sobre as agências de publicidade
que possuem as contas das empresas. Conheço algumas
pessoas que entram em contato com as agências para
vender seus projetos. Eu não faço isso. Porque não seria
uma venda direta. Eu venderia algo para a agência, que
venderia para o cliente. É um caminho com mais etapas
e obstáculos e sobre o qual não temos controle. De todo
modo, é uma alternativa que você também pode explorar,
se tiver interesse.
Mas vamos ao que interessa. Descobri na pesquisa
que a Joana Cardoso é a diretora de Marketing da empresa
Vida Linda. E agora, como faço para entrar em contato?
Pelo bom e velho e-mail. Se você, por acaso, conseguir o
WhatsApp pode até tentar. No entanto, para um primei-
ro contato o e-mail é menos agressivo e invasivo. Você
envia o e-mail. Se a proposta for algo dentro do escopo de
interesses atuais da empresa, é enorme a chance dela ao
menos abrir para ler. Quando eu trabalhava nas revistas
70
maria dolores
da editora Abril, na maior parte das vezes eu trabalhava
como
freelancer, escrevendo matérias. Para isso, preci-
sava vender o meu trabalho. Estudava, listava algumas
pautas (ideias de matérias), escolhia uma e enviava como
sugestão para uma revista. Se a editora, redatora-chefe ou
diretora de redação achasse interessante, eles fechavam
comigo. Acontecia muito também de eu sair para fazer
uma matéria sobre um tema para uma revista e ter ideias
para outro tema, de outra revista. As ideias surgiam à
medida que eu abria os olhos e ficava atenta ao meu redor.
Observar o presente, o entorno, tirar os olhos do celular,
conforme já vimos.
Uma vez eu estava em Mariana, Minas Gerais,
trabalhando em uma matéria sobre o circuito das cidades
históricas mineiras para a revista Viagem e Turismo. Esta-
va diante da Igreja principal quando vi um senhor bem
idoso, vestido de terno, gravata e chapéu, sentado numa
cadeira no passeio, em frente a um bonito casarão barroco.
Com aquela idade e vizinho da igreja, certamente ele teria
coisas interessantes para contar. Fui até ele, me apresen-
tei, expliquei que estava fazendo a matéria e começamos
a conversar. Ele realmente sabia muitas coisas legais, mas
o que mais me chamou a atenção é que ele ia a Belo Horizonte duas vezes por semana dirigindo o próprio carro.
Uma hora e meia dirigindo em uma rodovia movimentada, duas vezes por semana, aos noventa e dois anos. Ali
tinha uma história, uma pauta. Não sobre viagem e turismo, mas sobre carros. O personagem era fascinante e a
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Como vender e realizar sua ideia
história também. Fiz a entrevista, desenhei a ideia geral da
pauta e enviei como sugestão para a revista Quatro Rodas.
Fecharam comigo. O que era para ser um dia de trabalho
para uma matéria se transformou em duas matérias. Mais
portfólio, mais recurso.
Mas, por que estou contando essa história? Não
adiantava nada eu enviar a sugestão de pauta do motorista de noventa e dois anos para a Viagem e Turismo, nem
para a revista Claudia ou a Manequim. Como o assunto
interessava à Quatro Rodas, o diretor de redação abriu
meu e-mail, leu, gostou e retornou. O e-mail funciona.
Pelo menos ainda funciona. Quando e se parar de ser um
canal de comunicação eficiente, é só mudar para o canal
da vez. A tecnologia muda, as ferramentas de suporte
mudam, mas a estratégia para alcançar os objetivos pode
ter as mesmas bases – vender o que interessa para quem
interessa e tem recursos para comprar - e se adaptar às
novas realidades. Se você tem uma boa ideia, algo que
realmente possa interessar à empresa, as suas chances são
grandes. Mande um e-mail.
Retomando o passo a passo, você já descobriu que
a Joana Cardoso é a diretora de marketing da Vida Linda.
Confirmou na sua pesquisa que ela, atualmente, continua
como diretora de marketing da empresa. Falta só enviar
a mensagem. E agora? Agora vamos ao passo: “Como
descolar um e-mail?”. A primeira coisa a se fazer é desco-
brir a extensão de e-mail das pessoas que trabalham na
empresa. O site oficial é uma boa pista para começar a
72
maria dolores
pesquisa. Se o site é www.vidalinda.com.bré possível que
a extensão de e-mail de quem trabalha lá seja @vidalinda.
com.br. Mas nem sempre o e-mail interno segue a exten-
são do site oficial. A extensão pode ser @vidalinda.net
ou @vdsa.br ou outra infinidade de possibilidades. Uma
dica é acessar a aba de RI no site da empresa. As grandes
empresas geralmente possuem uma seção chamada Relações com Investidores, o RI. Nessa seção haverá um e-mail
de contato, que costuma ser ri@algumacoisa. O “alguma
coisa” desse endereço de e-mail do RI é, com 99% de acer-
to, a extensão dos e-mails internos da empresa. Se o site
não tem a seção do RI, você começa pela extensão do site
oficial e, se não der certo, parte para a pesquisa no Google.
Você pode pesquisar: e-mail Joana Cardoso Vida
Linda, ou contato Joana Cardoso Vida Linda, e-mail de
quem trabalha na Vida Linda. Às vezes você encontra
na pesquisa e-mail de outro colaborador. Já está ótimo,
achou como é a extensão de e-mail e, de quebra, desco-
briu a lógica da composição de e-mail. Cada empresa tem
a sua forma de compor e-mail, que serve para todos os
colaboradores, com raras exceções. As mais comuns são
joana.cardoso@, jcardoso@, joanacardoso@, joana_cardoso@, joana@, joanac@. Como você vai saber qual o correto?
Tentando. Você vai enviar um e-mail para cada um desses
endereços. E aí, chegamos ao momento da aula de filosofia! “Como vou saber qual o e-mail certo?” Eis a resposta:
o que não voltou é o que foi! Na sua tabelinha de controle,
seja no Excel ou no papel, você irá anotar o e-mail que foi e
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Como vender e realizar sua ideia
não voltou. Esse é o certo. Às vezes acontece de você reali-
zar todos os passos certinhos e não conseguir. A extensão
pode ser muito diferente do site, o e-mail daquela pessoa
específica ser uma total exceção à lógica de composição de
e-mail da empresa ou a própria lógica ser um tanto quanto
ilógica. Isso acontece? Sim. Mas em bem menor proporção
do que as tentativas que dão certo.
Usando essas técnicas de pesquisa no Google eu
vendi mais de 40 milhões de reais em projetos nos últi-
mos anos, e pretendo vender mais. 40 milhões em vendas
para patrocinadores e parceiros, sem falar no impacto
econômico desse recurso e em quanto dinheiro esses valo-
res geraram. Em uma visão mais ampla, foram mais de
200 milhões de reais em recursos movimentados. Você
também pode atingir essas vendas e superar esse montante. Certa ocasião dei uma palestra sobre o tema de captação
de recursos e um patrocinador de um dos nossos projetos
foi assistir. Ele se divertiu durante a palestra, com boas
risadas, e me deu os parabéns. Tanto por compartilhar o
conhecimento com outras pessoas quanto por seguir esse
caminho da pesquisa por conta própria. Tão simples e
efetivo. Um caminho que qualquer pessoa pode seguir.
Então, por que todo mundo não faz isso? O que acontece,
em muitos casos, é que, apesar de ser um processo sem
segredo nenhum, demanda dedicação. Ocupa tempo,
pesquisa, análise, atenção. Demanda trabalho. E as pessoas
querem vender seus projetos, querem realizar seus projetos, mas não querem realizar o trabalho de venda. Que
74
maria dolores
não é exaustivo, nem difícil, nem estressante. É tranquilo,
basta organizar e fazer um pouco por dia. Sobrará tempo
para você fazer todas as outras coisas que são importantes
para você, sem sobrecarga.
No futuro, se você puder contratar alguém para
vender seu projeto, poderá se dedicar com mais exclusivi-
dade às questões criativas e menos às vendas. Mas, você
também pode descobrir – assim como eu descobri – que
vender é um processo divertido e um excelente caminho
para exercer e estimular a criatividade. No início, eu e o
Felipe tentamos contratar captadores de recursos. Sei
que existem ótimos captadores. Todavia, nunca deu certo
para a gente. Nunca recusamos ofertas de pareceria que
chegavam até nós, do tipo: “Posso oferecer seu projeto?
Tenho um cliente, cobro x porcento?” Claro, pode. É prefe-
rível pagar, com gosto, a porcentagem de captação para
o captador e realizar o projeto do que ficar com ele na
gaveta. Mas em doze anos trabalhando com projetos, não
tivemos a sorte de encontrar um captador que funcionasse
para nós ou de realizar uma pareceria que desse resultado
positivo nesse sentido. Por isso, desde o início eu comecei
a vender. Errando, acertando, mas sobretudo, aprendendo
e realizando todos os projetos que eram importantes para
o crescimento do nosso negócio.
Agora que temos um bom portfólio, com projetos
expressivos, com frequência recebemos e-mails de produtores com projetos muito legais, com qualidade, queren-
do realizar parceria com a nossa produtora, a Marolo. A
75
Como vender e realizar sua ideia
parceria, pelas propostas que recebemos, é invariavel-
mente nesta direção: eles entram com o projeto e a realização, nós com a captação dos recursos. De vez em quando
aparece alguém que não tem o projeto, apenas uma ótima
ideia, o que já é muito bom, pois sem a ideia nada acontece.
Resumindo: a pessoa tem a ideia e “só” precisa de alguém
para fazer o restante - formatar a ideia, transformá-la em
projeto, captar recursos e executar o projeto. Em algumas
poucas e sortudas ocasiões você pode ter uma excelente
ideia e conseguir um parceiro que faça o restante. Entretanto, no mundo real, onde há milhares de boas ideias,
conseguir uma parceria dessas tem a mesma probabilida-
de de ganhar na loteria. Não basta ter uma boa ideia, é
preciso ser capaz de avançar um pouco mais. É preciso ter
capacidade e dedicação para desenvolver a ideia e, mesmo
que você não goste ou tenha preguiça, é preciso vender a
ideia. Se você encara a venda como um jogo online, como
uma busca ao estilo detetive, ela deixa de ser chata. Não só
passa a ser divertida como cada passo avançado se torna
uma conquista. Como já disse, é muito gratificante quan-
do você descobre as empresas que tem dinheiro, quando
você descobre quem manda nesse dinheiro, quando você
envia o e-mail e ele não volta (ou volta com aviso de férias
e fornece outros contatos) e, por fim, quando você consegue um retorno e fecha o negócio.
Eu classifico os e-mails que envio em três catego-
rias: os que deram errado (voltaram, preciso retomar as
tentativas com essa empresa depois); os que deram certo
76
maria dolores
(foram e não voltaram, ou seja, o e-mail está correto) e os
que deram algum tipo de retorno. Mesmo que o retorno seja só “obrigada, no momento não estamos avalian-
do novas propostas” já vale a comemoração. Comemo-
rar um não? Sim! Você recebeu um não neste momento.
Mas poderá trabalhar esse contato e receber um sim no
futuro. Durante três anos recebi nãos de uma empresa do
segmento de turismo. No quarto ano vendi um grande
projeto para eles. Durante seis anos recebi nãos de uma
empresa do segmento financeiro. Nos três anos seguintes
vendemos um projeto para essa empresa e a parceria só
terminou porque aquele projeto específico se encerrou.
Nada se compara ao receber um retorno dando continuidade, pendido mais detalhes ou agendando uma conversa
que, por fim, gera uma venda de sucesso.
Em relação às nossas vendas, a proporção é mais ou
menos a seguinte: de cem e-mails enviados (dos que foram
e não voltaram) recebo uns dezesseis retornos. Uns três
avançam. Um fecha. 100 para 1. Se você trabalhar menos
de uma hora por dia, por um mês, vai conseguir enviar
seus 100 e-mails ou mais. Se, em um mês você fechar uma
boa venda, pode garantir um ano inteiro de trabalho.
Então, antes de pensar: “ah, mas é muito chato”, foque no
retorno que pode ter e, o principal, na possibilidade de
realizar o seu sonhado projeto. Faça um teste. Por um mês,
em vez de ficar 3h31 minutos nas redes sociais por dia, tire
uma hora desse tempo e dedique às vendas do seu projeto.
Depois me conte como foi. Você não vai se arrepender. No
77
Como vender e realizar sua ideia
entanto, não basta acertar a empresa, a pessoa e o endereço de e-mail. É fundamental enviar um e-mail interessante. E é o que veremos a seguir.
78
maria dolores
O que enviar
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Como vender e realizar sua ideia
Vamos começar pelo mais importante: o que
NÃO enviar. Você vai eliminar para todo o sempre dos
seus e-mails de venda os termos “Patrocínio”, “Proposta
de Parceria”, “Solicitação”. Nunca, jamais, por nada nesse
mundo, envie algum desses termos no assunto do e-mail
ou no e-mail. Separados ou juntos. Eu mesma já recebi
e-mails que uniam essas palavras de uma só vez, como:
“Solicitação de Patrocínio – Proposta de Parceria”. É a
morte da venda. Você nunca mais vai usar a palavra patro-
cínio nas suas abordagens. A não ser depois que a negociação estiver avançada. Afinal, dependendo do seu projeto
você vai assinar um contrato que se chamará Contrato de
Patrocínio. Mas, na abordagem, essa palavra causa o efeito
contrário, é um espanta-patrocínio. Assim, você só tocará
nela se a negociação avançar e a pessoa do lado de lá utili-
zar esse termo. Imagine quantos e-mails com pedidos de
patrocínio um diretor ou gerente de marketing recebe por
dia. Uns trinta em média. Ele tem mil coisas para fazer,
pode até ler um ou outro. A maioria, no entanto, vai passar
batido.
Você também vai deletar da sua existência a palavra
“Solicitação” ou qualquer variação dela. Repita para você
mesmo: você nunca mais vai solicitar nada! Você vai oferecer! Oferecer a solução que a empresa precisa. Você tem
um bom produto, que atende aos objetivos da empresa e
você vai oferecer o que a empresa tanto necessita. A palavra solicitação pode causar alergia. Solicitação seja lá do
que for. De patrocínio, de parceria, de reunião. As pesso-
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maria dolores
as recebem nos seus trabalhos solicitações o dia inteiro.
Recebem solicitações em casa também, na vida pessoal.
Basicamente, são solicitações da hora que acordamos até
a hora em que vamos dormir. Portanto, você não vai ser
mais uma entre as mil solicitações no dia a dia do outro.
Proposta de Parceria pode não parecer tão ruim.
Mas é. Pelo seguinte: as empresas recebem e-mails com
esse tema diariamente. E a maioria das propostas de
parceria que recebem, na verdade, não são propostas de
parceria. São como as propostas que às vezes nós, aqui,
recebemos: a pessoa tem uma ideia e a gente faz todo o
resto. Isso não é uma parceria. Em uma parceria, os lados
trabalham e dedicam esforço de forma equilibrada, e
ganham de forma equilibrada. Uma parceria é boa se vale
à pena de forma balanceada para os dois lados. Geralmen-
te os contatos com Propostas de Parceria não são isso. Por
esse motivo, mesmo que a sua proposta seja de uma efetiva parceria, a pessoa que receber o e-mail já vai olhar para
ele com resistência. Você pode até usar a palavra proposta.
Eu mesma uso bastante. Mas conjugada com outras palavras. Com parceria, não.
Você também não vai enviar um e-mail na sexta-
-feira à tarde ou na tarde véspera de feriado. Depois de
uma semana intensa de trabalho, as tardes de sextas-feiras são apressadas, as atenções não estão tão focadas e o
cansaço natural acumulado da semana torna esse período
menos propício para novidades. Por outro lado, atenção:
você estará disponível ao toque do celular e vai conferir o
81
Como vender e realizar sua ideia
e-mail antes da sexta-feira terminar. Você também estará
disponível no sábado e no domingo, se estiver em uma
maratona de vendas. Eu já recebi telefonemas fechando negócios depois das dezoito horas da sexta-feira. Se
eu não estivesse com o celular por perto, teria perdido a
ligação. A pessoa teria enviado um e-mail ou entrado em
contato segunda? Nem sempre. Recentemente recebi um
desses telefonemas. A pessoa perguntou se poderia me
ligar novamente no sábado, pois trabalharia no fim de
semana e até segunda-feira de manhã precisava estar com
o projeto a ser patrocinado fechado. Se não desse certo
com o nosso, seria outro. Nesse caso específico, se eu não
tivesse atendido ao telefone na sexta, não teria recebido o
contato na segunda. Mas, calma, não é para você virar o
doido do celular, conferindo de minuto em minuto. É só
deixar por perto de segunda à sexta em horário comercial
e, caso esteja numa das tais maratonas de venda ou em um
momento propício à venda, ficar atento durante o fim de
semana. Sem neurose, senão, antes de vender um projeto
você terá esgotamento por ansiedade.
Da mesma forma que as sextas-feiras à tarde, as
segundas-feiras pela manhã não são o melhor momento para entrar em contato. As pessoas estão organizando
suas caixas de e-mail, as tarefas da semana, enfim, estão
retomando o foco e os trabalhos. Então, o período ideal
para enviar e-mails de vendas é em horário comercial, da
segunda-feira após o almoço até a sexta-feira até o almo-
ço. Não envie e-mails à noite nem de madrugada. Apesar
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maria dolores
do e-mail poder chegar em qualquer horário e a pessoa
abrir quando quiser, entrar em contato tarde da noite ou
de madrugada pode passar uma impressão de você ser
uma pessoa desorganizada, dessas que troca a noite pelo
dia, que está sempre correndo para apagar incêndios. Isso
é um preconceito e um clichê? Sim. Mas vamos nos ater ao
horário comercial na primeira abordagem. Além do quê,
os e-mails oferecem ferramentas para programar o horário
do envio. Então mesmo que você esteja escrevendo às duas
da manhã, pode programar para enviar às nove e meia.
Isso é importante, porque uma venda conta também com
a sorte. Seu e-mail chegar na caixa de entrada do outro
no momento em que ele estiver justamente verificando
os e-mails traz mais chances de ser lido do que entrar em
outros horários e ficar lá, em negrito, entre vários outros
não lidos.
Observadas essas orientações básicas do que e
quando não entrar em contato, vamos ao e-mail em si,
começando pelo assunto. O assunto é o principal. É como
a manchete de uma notícia, como a vinheta de um programa de televisão ou o trailer de um filme. É o que vai atrair
a atenção e o interesse do interlocutor à primeira vista. É
o que o fará abrir um livro, clicar na matéria ou procu-
rar o filme no serviço de streaming. O assunto do e-mail
determinará se será aberto ou não. Uma dica é algo curto
que traga o nome da empresa. Como trabalhamos bastan-
te com música, dependendo da empresa e do que tenho a
oferecer, coloco no assunto: “Festival Vida Linda – proje-
83
Como vender e realizar sua ideia
to” ou “Festival Vida Linda – proposta”. Tá vendo? Uso
a palavra proposta em alguns casos, mas sem o comple-
mento “de Parceria”. Por que colocar o nome da empresa?
Porque a chance de o responsável abrir é maior. Nem que
seja para ele conferir o que estão fazendo ou pensando em
relação à empresa e ele não está sabendo. É legal identifi-
car que se trata de uma possibilidade de projeto, de algo
que tenha a ver com a empresa, e não só o nome da empresa. Use a sua pesquisa prévia sobre o cliente e dedique um
tempo específico para criar o assunto do e-mail.
Eu recebo muitos e-mails que vejo, automaticamen-
te, serem enviados por programas robôs ou de mala direta
e às vezes só abro para ver as técnicas que as malas dire-
tas estão utilizando. E detesto e-mails que me pressionem
já logo no assunto. Recebo muitos assim: “Confirmando
reunião Marolo”. Daí eu penso: que peleja, não marquei
reunião nenhuma! Ou “Vamos falar, Marolo?” ou “Tenho
o que você precisa, Marolo”. Eles estão usando uma técni-
ca parecida com a minha, colocando o nome da empresa
no assunto. Mas é só ter um pouco de experiência para
saber que se trata de mala direta. As pessoas em cargos de
decisão nas empresas sabem muito bem disso. Por isso,
seu e-mail precisa ser realmente personalizado, pessoal.
Depois, vamos ao corpo do e-mail. Eu começo
como uma saudação meio-termo, entre cordial, coloquial
e formal. Não pode ser algo tão formal a ponto de espantar a pessoa. Lembre-se: ninguém gosta de burocracia e
começar um e-mail com algo como “Prezado Sr. Frederico
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maria dolores
Gonzales,” pode parecer notificação da Receita Federal,
intimação judicial ou cobrança de débitos antigos do IPTU.
Também não pode ser tão coloquial do tipo “E aí, Gui,
beleza?”. Melhor o meio termo, afinal você não conhece
o interlocutor para saber o estilo dele: “Boa tarde, Juliano,
tudo bem?” ou “Cara Patrícia, boa tarde” ou, se a pessoa
for bem jovem (o que você já sabe ao ter pesquisado para
saber que ela decide sobre os recursos e para descobrir o
e-mail dela) pode ser algo como “Oi Vanessa, tudo bem?”.
Feito isso você vai escrever um e-mail curto, dividi-
do em três partes:
Parte 1: Em duas ou três linhas, no máximo, apresen-
te você ou a sua empresa e algum trabalho realizado
que possa credenciá-lo ao que está oferecendo. Ex: Meu
nome é Maria Dolores, da Marolo. Realizamos projetos de
sucesso que agregam valor às marcas e estreitam os laços
afetivos com o público, como o xxxx, xxx, xxx. (aqui você
pode colocar link do seu site ou de algum trabalho realizado e, se tiver um bom portfólio, pode anexar o arquivo).
Parte 2: Em uma ou duas linhas no máximo vai dizer o que
tem a oferecer. Ex: Gostaria de apresentar uma proposta
do projeto xxxx, que irá aproximar a Vida Linda com seu
público e criar novos públicos.
Parte 3: Despedida. Nunca se despeça cobrando um retor-
85
Como vender e realizar sua ideia
no, do tipo “Fico aguardando um retorno”. Não se esque-
ça do que acabamos de falar: as pessoas são cobradas e
pressionadas no trabalho o tempo todo, não seja mais um
a pressionar. Você está ali para oferecer e vender soluções, não para aumentar a pressão. Também não podemos deixar a coisa solta, como “Atenciosamente” ou “Um
abraço e obrigada” ou “Fico à disposição”. Existem vários
termos legais para encerrar deixando a coisa em aberto.
Eu gosto de usar variações de “Acha possível? Um abraço
e obrigada, Maria”. O “Acha possível?” é um encerramen-
to que cai bem depois de frases como “Gostaria de apresentar uma proposta de projeto xxxx”.
Você pode se perguntar: eu digo meu nome lá em cima
e assino embaixo? Duas vezes? Sim, qual o problema? O
seu cliente precisa saber quem você é, lembrar-se de você,
saber desde o início com quem está falando. Você pode
começar dizendo seu nome ou o nome da sua empresa e
encerrar com a assinatura, sim.
Nesse primeiro contato você não enviará um
projeto detalhado. Você precisa customizar o seu traba-
lho, ou não sai do lugar. Não pode dedicar um dia ou dois
para montar um projeto específico para cada empresa que
for abordar. Deixe isso para o segundo momento, quando
você tiver um retorno e conseguir abrir o canal. Mas o que
eu mando, então? Eu trabalho de duas formas: enviando
nada ou uma apresentação simples, geral. Na maioria
dos e-mails não envio arquivo em anexo sobre o proje-
86
maria dolores
to proposto. Envio apenas o e-mail falando sobre a ideia
geral e que gostaria de apresentar mais detalhes. Quando
já tenho um determinado projeto em mente e acho que se
encaixa naquela empresa, envio uma apresentação que eu
mesma faço, em Power Point e salvo em PDF. Apenas uma
apresentação da ideia, sem detalhes, sem valor. Com fotos
bonitas e frases que reforcem o potencial.
E se a pessoa responder dizendo que quer sim e
pedir para enviar uma apresentação detalhada? Aí você
vai parar tudo o que estiver fazendo, vai estudar mais
sobre aquela empresa, pegar as ideias que você já tem,
transformar em um projeto detalhado, coerente, eficiente e
enviar. Aí sim, é o momento de desenvolver o projeto em si.
Às vezes a empresa pede para enviar por e-mail, às vezes
agenda um call, uma chamada de vídeo ou uma reunião
presencial. Para mostrar como essa técnica funciona, vou
contar uma das vendas que fechei dessa forma. Enviei
um e-mail para o diretor de marketing de uma grande
empresa, oferecendo um Festival com o nome da empresa.
Dois dias depois, ele me retornou, copiando outra pessoa,
que era a responsável por aquele tipo de projeto. Essa
segunda pessoa me enviou um e-mail passados três dias,
perguntando se eu poderia ir até a sede da empresa no dia
seguinte para apresentar melhor a proposta. Recebi esse
e-mail na parte da manhã. A reunião era na tarde seguinte.
Parei tudo o que estava fazendo e me dediquei a formatar e detalhar a proposta de acordo com a minha pesqui-
sa sobre o que interessava à empresa. Mas isso não acaba
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Como vender e realizar sua ideia
com seu projeto? Não. Não é se vender aos interesses do
mercado? Sim, e não. Como já vimos no início do livro,
a pintura do teto da Capela Sistina foi criada atendendo
aos interesses do mercado, e isso não diminui o seu valor
criativo. Tudo depende da forma como compreendemos
um projeto e a forma como executamos. Um projeto de
alta qualidade criativa pode estar alinhado aos interesses
da empresa, e não tem nada de errado
nisso. Da mesma
forma, você pode realizar em paralelo seus “Projetos do
Coração”. Uma coisa ajuda na outra. Em relação a essa
venda específica, não ofereci meu “Projeto do Coração”,
ofereci um “Projeto Ganha Pão”. Após o pedido para ir
até a sede da empresa, passei o tempo todo estudando e
montando uma proposta detalhada para apresentar na
reunião do dia seguinte.
Conseguir uma reunião, aliás, é um passo impor-
tantíssimo. Muitas vezes fazemos toda a negociação por
e-mail e telefone. Um dos nossos maiores projetos foi
fechado sem eu saber qual a cara da pessoa com a qual
conversava. Conheci seis meses depois do contrato assina-
do, no dia do evento. Mas se surgir a oportunidade de uma
reunião é um ponto a mais. Você terá a chance de desco-
brir informações que podem ajudar a fechar o negócio. O
segredo de uma reunião é ouvir. Não só deixar o outro
falar como se preparar para conseguir que o outro fale,
ajudar seu interlocutor nesse processo de fala, de contar,
conversar. Ouvir o que o outro tem a dizer é infinitamente mais importante do que fazer a sua apresentação. Será
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maria dolores
ouvindo que você descobrirá informações que irão ajudá-lo na hora de aprimorar seu projeto, formatá-lo, adaptá-lo
ou não. Uma boa reunião não é quando você fecha um
negócio – pois isso raramente acontecerá em um primei-
ro encontro. Uma boa reunião é quando você descobre os
planos da empresa para aquele ano, o que ela precisa, qual
tipo de público quer alcançar, quais valores quer traba-
lhar, quais temas e qual verba ela tem disponível para um
projeto como o seu. Se você descobrir essas informações,
tem como ajustar o seu projeto, ou mesmo oferecer outro
projeto mais adequado aos objetivos da empresa.
Não é educado, já numa primeira reunião, pergun-
tar: quanto de dinheiro vocês tem para isso. Mas você
pode buscar essa informação de outra forma. Eu costumo explicar assim: “Seria importante ter um patamar de
valor para poder desenhar uma proposta que se encaixe
e atenda da melhor forma. Eu posso desenhar uma linda
proposta no valor de duzentos mil reais e uma linda
proposta de um milhão. Mas elas serão bem diferentes.
Então, para ser mais assertivo é importante ter um pata-
mar de orçamento”. Costuma dar certo, porque é verdade
o que estou dizendo. O valor muda totalmente o projeto.
Algumas vezes não consigo essa resposta. Então estudo
ainda mais a empresa, projetos similares ao que pretendo
oferecer, vejo o que está sendo feito no mercado e monto
a proposta em um valor médio, de acordo com o projeto
que eu acredito ser o ideal para aquela empresa. Depois, se
ela interessar, numa etapa seguinte irão informar o valor
89
Como vender e realizar sua ideia
disponível e pedir para ajustar o projeto a este valor, que
pode ser cinquenta por cento menor ou totalmente dife-
rente, sendo necessário mudar todo o escopo. Outra coisa
para você não tirar de cabeça: para a saúde financeira do
seu negócio, é fundamental você fazer esse ajuste para o
novo valor (o estipulado pela empresa) sem perder dinheiro. Caso contrário, dali a pouco você pagará para trabalhar
ou trabalhará de graça. Sobre isso, falaremos mais adiante.
Esta etapa do processo de vendas do seu projeto
tem dois pontos cruciais, que você precisa ter ciência para
não se deixar abalar nem desistir. É onde muita gente desis-
te. Primeiro – e já falamos sobre isso – você precisa entrar
em contato com muitas empresas. Para fechar um negócio
você terá que enviar, pelo menos, uns cem e-mails. E-mails
naquele método: pesquisar onde está o dinheiro, listar as
empresas, pesquisar quem decide, descobrir o e-mail,
enviar o e-mail. Ocupa tempo? Sim. Mas menos do que
bater perna nas redes sociais. E um tempo que traz resultado. Segundo ponto importantíssimo: quando receber um
não, seja no início, no meio ou no fim do processo, jamais
leve para o lado pessoal. Vejo muita gente falar “Ah, não
procuro mais aquela empresa, recusaram meu projeto”, ou
“Ah, me fizeram de bobo, fiquei seis meses negociando
e deram para trás”. Atenção: vender o seu projeto não é
uma ação entre amigos, não é uma gincana de escola, não
é uma disputa com seu vizinho. Vender o seu projeto é um
negócio. E negócios são assim. Quantas vezes você entrou
numa loja, experimentou dezenas de sapatos ou calças e
90
maria dolores
não comprou nenhum? E a pilha de roupas só aumentando
em cima do balcão, com o vendedor lá, pegando mais um,
mais um até você dizer “ah, vou pensar mais um pouco”
e não voltar nunca mais e o vendedor ter que dobrar tudo
de novo e voltar para os devidos lugares nas prateleiras ou
no estoque? Se você voltar na loja, qual a chance do vendedor olhar para você e dizer “para esse aí eu não vendo, me
fez de trouxa da outra vez”. Bom, se você experimentou
montes de roupas vários dias diferentes, com frequência,
e é do tipo que só vai experimentar para passar o tempo
e nunca compra, pode ser que ele peça para outra pessoa
atender você, mas só em um caso extremo.
Empresas não são pessoas. Obviamente pessoas é
que trabalham nas empresas, com todas as suas cargas
emocionais, perfis, estilos, habilidades e problemas. Mas
essas pessoas estão contratadas para atender aos objetivos
das empresas e esses objetivos não são pessoais, do tipo
“não gostei da cara dele”. Por isso, se você recebe um não,
seja no início, no meio ou no final, continue a tratar bem
a empresa e o seu representante, agradeça pela atenção e
pelo tempo dispendido e mantenha o canal aberto. Não é
para ficar mandando e-mail toda semana, nem todo mês.
Mas se organize para entrar em contato em momentos
pontuais. Uma vez por ano para oferecer projeto, outras
vezes para convidar para conhecer projetos que você realiza. Sem importunar, mas sem desaparecer. Mantenha as
portas abertas, e vá trabalhando para entrar devagarinho,
pé ante pé.
91
Como vender e realizar sua ideia
Pois bem, parabéns, você recebeu o retorno positivo
ao seu contato. A diretora de marketing quer saber mais
detalhes sobre o projeto e pediu para você enviar uma
apresentação detalhada em dois dias. E agora?
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maria dolores
2ª Parte
Como montar um projeto?
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Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
Pós-contato:
montando a proposta
(o projeto em si)
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Como vender e realizar sua ideia
Aconteceu com você exatamente como aconteceu
comigo (várias vezes, é importante ressaltar, o que significa que, sim, funciona). Você fez o caminho do dinheiro,
listou as empresas, os responsáveis, o e-mail, entrou em
contato e teve um retorno dizendo: “sim, temos interesse
em conhecer mais detalhes, envie uma apresentação por
favor”. E agora? O que você faz? Você foca na apresen-
tação. Você não pode demorar mais que dois dias para
enviar o material. O ideal é enviar no dia seguinte. Por
isso é muito importante aquela pesquisa prévia sobre
a empresa e, tão importante quanto, ter total domínio e
ciência sobre o seu projeto ou sobre os tipos de projetos
que você pode oferecer. Cuidado! Oferecer significa realizar. Você só pode oferecer o que for capaz de realizar com
qualidade e eficiência. Não adianta ter ideias incríveis e
sair oferecendo sem ter plenas condições de executá-las.
Eu tenho muitas ideias, sempre. Já tive ideias excelentes,
que depois vi por aí virarem unicórnios. Você também já
deve ter tido ideias do tipo. Entretanto, eu não sabia como
transformar essas ideias em um negócio prático. Demandariam esforço e energia em algo muito fora das minhas
habilidades. Eu poderia ter levado alguma dessas ideias
adiante, mas optei por não levar. A vida é feita de escolhas
e prioridades. Entre todas as ideias que iam surgindo, eu
dava preferência para as que eu conseguiria realizar com
o tempo e energia disponíveis. Temos três filhos. O primeiro veio aos dezoito anos, o segundo aos trinta e dois e o
terceiro aos trinta e oito. Nossa vida sempre foi povoada
96
maria dolores
por crianças e todas as demandas que envolvem ter uma
criança em casa. Eu sempre quis ser uma mãe presente,
aliás, justamente por isso nunca quis ter um emprego e,
portanto, me dediquei a trabalhar por conta própria. Essa
prioridade na vida pessoal era maior do que me dedicar
por completo, ou quase por completo, a qualquer projeto. Então, eu precisava escolher quais ideias levar adiante,
aquelas que poderia realizar e conciliar com outras prioridades.
Na primeira edição do Festival Música do Mundo
nos deparamos com um problema. Esperávamos pesso-
as de todo o Brasil para assistir ao evento. A estimativa era ter um público quase um terço da população de
Três Pontas, cidade sede do projeto. Entre os três hotéis
existentes e um hotel fazenda, havia 350 leitos disponí-
veis para um público estimado entre 15 e 20 mil pessoas.
Para tentar amenizar o problema, tive a ideia de criar um
sistema de classificados de hospedagem no blog oficial
do Festival. Nós éramos a plataforma de contato entre o
dono da hospedagem e o hóspede. As pessoas colocavam
seus anúncios de casa (muita gente saiu da própria casa
e foi para a casa de um parente nos dias de evento para
alugar), sítio, áreas de lazer, quartos e até quintais para
acampamento. Funcionou super bem e achei que era uma
ótima ideia de negócio. Isso foi em 2009. O Airbnb surgiu
um ano antes, 2008, mas em nível local, ninguém por aqui
sabia desse modelo. A gente poderia ter criado o similar
brasileiro. Mas precisávamos de pessoas de tecnologia,
97
Como vender e realizar sua ideia
demandaria tempo, dedicação e, entre as ideias fervilhan-
tes, preferi me dedicar à cultura. Poderia ter ganhado mais
dinheiro como um Airbnb nacional, mas cada um no seu
quadrado. Se eu não tinha como montar um site de hospe-
dagem, não podia sair oferecendo um projeto como este.
Ofereça só o que você pode realizar.
Outra vez tivemos a ideia de montar um site que
funcionasse como plataforma de conexão entre o cliente e
o produtor de produtos agrícolas e derivados saudáveis,
orgânicos ou artesanais. Foi em 2010. Criamos o nome e
registramos o domínio. Balcão Verde. Poderia ter dado
muito certo. Mais uma vez, abandonamos a ideia, como
várias outras, por priorizar nosso tempo para outros
projetos. Vamos repetir para não esquecer: você só pode
oferecer o que for capaz de realizar. Não o que você, com
suas próprias mãos, for capaz de fazer. Você pode – e deve
– contratar pessoas mais capacitadas que você para determinadas ações e vamos falar sobre isso mais adiante. Mas
o que quero que não saia da sua cabeça é que você só pode
vender o que você for capaz de gerenciar. Você é o respon-
sável pela entrega final. Se algo der errado, a responsa-
bilidade perante o investidor ou cliente não é do diretor
de palco, do produtor, do designer ou do técnico de som.
A responsabilidade é sua, que não gerenciou o projeto da
forma adequada. “Ah, eu não entendo de contas, preciso
de alguém para cuidar da parte financeira”. Eu também
sou péssima de contas e de administrar recursos. Enquan-
to me meti nessa área, perdemos dinheiro. Só passamos a
98
maria dolores
ganhar quando parei de lidar com orçamento e controle
de gastos. Mas eu preciso saber como funciona, preciso
saber por onde o dinheiro vai e volta. Não adianta apenas
entregar para alguém que sabe. Você precisa saber geren-
ciar quem sabe. Ou irá perder dinheiro, pois a tendência
quando não sabemos gerenciar é, em alguma hora, a coisa
dar errado. “Mas eu sou o criativo, o artista”. Bom, eu
também. Bem-vindo ao mundo prático. Quer transformar
suas ideias e sua criatividade em algo rentável? Quer viver
com dignidade da sua arte? Você deve sair da sua bolha
criativa e compreender o restante, para vender, gerenciar
e ganhar dinheiro.
Tendo ciência das suas habilidades e capacidades,
e tendo ciência das suas limitações de execução, você sabe
o que pode oferecer quando receber o retorno positivo ao
seu e-mail, pedindo mais detalhes sobre a proposta. Agora
você precisa aprofundar a sua pesquisa sobre a empresa
para descobrir o que ela quer e necessita. As informações
mais importantes para buscar são: qual público a empre-
sa quer atingir e quais os valores deseja trabalhar naque-
le momento ou no futuro próximo. O público no qual a
empresa está interessada deve ser, sem exceção, o público
do projeto que você vai oferecer. Se o seu projeto é para
um público teen e a empresa está de olho no público da
terceira idade, não adianta enviar esse projeto. Você precisa oferecer outra coisa. Se a empresa está interessada no
público teen e seu projeto é para adultos jovens, também
não adianta enviar. Você só vai perder o seu tempo e o
99
Como vender e realizar sua ideia
tempo do outro. O objetivo final de uma empresa é o lucro,
por mais que ela tenha foco na melhoria da qualidade de
vida das pessoas, do mundo como um todo ou do meio
ambiente. Uma empresa quer crescer e ganhar dinheiro.
Seu projeto precisa ajudar essa empresa nesse objetivo,
mesmo que de forma sustentável.
Isso não quer dizer que tenha que oferecer um siste-
ma de otimização de produção ou uma nova ferramenta
de funil de vendas. O crescimento de um negócio não se
dá só por quanto ele vende. Se dá também pela aproximação entre a marca e o público. Os projetos criativos entram
nesse espaço. São uma plataforma para a empresa se
aproximar do público e estreitar os laços. O grande trunfo
que você tem nas mãos é um projeto que converse com o
mesmo público no qual a empresa tem interesse. “Mas eu
não tenho um projeto para o público teen!”. Você não é
da área criativa? Use a sua criatividade. Identifique suas
habilidades e competências e as utilize para criar um incrível projeto criativo que converse com o público com o qual
a empresa deseja se conectar. Seja um Michelangelo, pinte
uma obra prima como a Capela Sistina, não porque você
sempre sonhou em fazer isso, mas porque havia um cliente interessado naquele público e, portanto, no seu trabalho
como um canal de comunicação com o público. Uma obra
como a pintura da Capela Sistina aproximou o público da
Igreja Católica, e continua aproximando mais de quinhentos anos depois, além de fortalecer o imaginário geral.
Dê uma olhada também no que o mercado tem
100
maria dolores
feito para aquele público. Quais os projetos criativos estão
sendo desenvolvidos aqui e no exterior. Tem muita coisa
legal acontecendo. Você não vai copiar um projeto, mas
você pode se inspirar, ter ideias que possam se encaixar na
sua proposta. Concluída essa pesquisa, que não vai tomar
mais que meio período do seu dia, você deverá ter condições de responder às questões:
Qual o público-alvo do projeto?
Qual o local de realização?
Qual a data de realização?
Qual o cronograma de execução?
Em que meu projeto contribui para melhorar a vida das
pessoas e do mundo?
Por que quero realizar esse projeto?
Descreva o projeto em até cinco linhas
acima.
Vamos falar um pouco sobre cada um dos tópicos
101
Como vender e realizar sua ideia
Qual o público-alvo do projeto?
Esse, como vimos, é o grande trunfo do seu proje-
to: o público-alvo. Você deve saber qual público terá interesse no projeto. Sem público, nenhum projeto ou produto
tem sentido em existir. “Eu sou artista plástico, escritor ou
cineasta e a arte que eu produzo é feita a partir de mim, do
meu olhar, da minha inspiração, e não a partir do públi-
co”. Ok, mas uma vez elaborada a arte, seja qual for, é
possível identificar o público potencial para cada projeto
com base na percepção histórica da produção cultural e
do comportamento das pessoas. Um determinado estilo
de pintura em óleo sobre tela irá interessar a um determinado perfil de pessoas. Um livro de ficção científica irá
interessar a outro perfil. Um festival de um estilo musical
a outro. Mesmo porque, se você pinta um quadro espera que alguém o veja. Se escreve um livro, que alguém o
leia. Se organiza um festival, espera que alguém compareça. Ou, se você quer produzir apenas para si mesmo sem
que ninguém contemple ou consuma sua arte - o que é
totalmente possível e compreensível - não precisa perder
tempo lendo este livro nem qualquer outro do tipo. Pode
fechá-lo agora e procurar algo mais interessante para ler.
Essa, aliás, é uma dica que eu, que adoro ler, aprendi há
alguns anos. Existem milhares de livros bons e que atendem ao meu estilo de leitura. Se eu começo um livro e não
gosto, paro e vou para outro. Antes desse aprendizado
importantíssimo, eu insistia e lia até o final, por questão
102
maria dolores
de honra, perdendo horas preciosas que poderiam ser
aproveitadas com outras possibilidades de leitura praze-
rosa ou com alguma utilidade para a minha vida. Era uma
questão de honra idiota, na verdade.
Mas, voltando ao nosso assunto, não existe desculpa
para desconhecer o público-alvo do seu projeto. Por mais
básico que isso possa ser, vejo muitas pessoas altamen-
te criativas e capacitadas, com projetos muito bons, não
conseguirem responder, quando pergunto: qual o públi-
co do seu projeto? As respostas muitas vezes são palavras
soltas, gaguejadas, pescadas ao acaso para não ficarem
sem resposta. Única e simplesmente porque não pararam
trinta minutos para pensar sobre essa questão fundamental. Não sabe por onde começar? Procure projetos seme-
lhantes e veja quais perfis de pessoas estiveram presen-
tes, compraram ou se interessaram por eles. Você, como
uma pessoa criativa, com frequência segue a sua intuição.
Nesse caso, por favor, ignore sua intuição. Não defina seu
público por suposições do tipo “eu acho que o público tal
vai se interessar”. Pesquise. Não raras vezes achamos que
um determinado público é o do nosso projeto e, no final
das contas, não tem nada a ver. Por exemplo: ir atrás de
um banco para oferecer um projeto porque é o banco com
mais clientes na sua cidade. Isso acontece muito em cidades pequenas. Sei disso, porque sou de cidade pequena e
eu mesma já pensei nessa possibilidade – e paguei o mico
por isso.
Você tem um projeto para adolescentes e tenta
103
Como vender e realizar sua ideia
vender para um banco de cooperativa, que é o maior da
sua cidade, mas cujos clientes são agricultores cooperados.
Ou, pior, você oferece projeto para outro banco porque
VOCÊ tem conta naquele banco e comprou o título de
capitalização da campanha passada. Não faça isso. Pesquise. Primeiro esclareça o básico: gênero, faixa etária, classe
socioeconômica e localização geográfica. Mas é necessário
ir além, identificando áreas de interesse desse público. Um
projeto pode ter como público-alvo mulheres, entre 18 e 24
anos, classes BC, de Florianópolis, interessadas em celebridades e música. Um encontro de motoqueiros pode ter
um público-alvo de homens, classes A, B e C, entre 35 e 55
anos, da grande Belo Horizonte, interessados em motos.
Você pode dizer: “Mas também tem mulher em encontro
de motoqueiros, também tem moçada de vinte e poucos
anos”. Sim, sempre há um leque maior de público do que o
definido por público-alvo. Os grupos de interesses entram
justamente para preencher essa lacuna, pois podem existir pessoas muito diferentes em termos de definição de
faixa etária e classe socioeconômica e um interesse em
comum. Quando estabelecemos um público-alvo trata-se
do público majoritário potencial para aquele projeto. É o
público para o qual você vai direcionar a maioria dos seus
esforços de divulgação, o público que você vai trabalhar
e investir recursos para atrair, já que sempre é necessário
otimizar os recursos para atrair o maior número de pessoas com a verba disponível para tanto. É também o público
que você vai apresentar para a empresa para a qual está
104
maria dolores
tentando vender o seu projeto. Lembre-se que o público
do seu projeto é o que interessa para a empresa. Você pode
ajustar ou flexibilizar seu projeto em várias frentes, mas o
público não é uma delas, porque ele está intrinsecamente
ligado ao conteúdo. Para você mudar de público tem que
mudar o projeto.
Qual o local de realização?
Se o seu projeto for um evento ou algum produto a
ser distribuído especificamente em uma localidade, essa
informação precisa estar clara. A possibilidade de altera-
ção do local de realização é fator fundamental de negociação – ou não. O Natal Luz de Gramado só pode ser realiza-
do na cidade de Gramado. O festival de gastronomia pelo
aniversário da cidade de São Paulo só pode ser realizado
em São Paulo. Alguns projetos têm a sua essência ligada
a um local específico. Esses projetos não têm flexibilidade
para alteração de localização. Quando fizemos a primeira
edição do Festival Música do Mundo e foi um sucesso, a
secretaria de cultura de uma cidade vizinha nos procurou
para realizarmos a segunda edição lá. Mas o Festival era
uma homenagem ao Milton Nascimento e Wagner Tiso,
ambos de Três Pontas, e tinha toda uma conceituação com
a história e a cultura da cidade de Três Pontas. Não era
viável, naquele momento, realizá-lo em outra cidade. Até
pensamos que, se o festival perdurasse, no futuro poderia
105
Como vender e realizar sua ideia
haver uma edição itinerante, mas naquela época não havia
sentido.
A maioria dos projetos, no entanto, não estão vincu-
ladas a uma determinada localidade. Uma peça de teatro
pode ser montada em qualquer cidade, a não ser que seja
uma homenagem a um local específico. Mesmo assim,
depois pode circular por outras paragens. Os eventos,
de um modo geral, têm bastante flexibilidade quanto ao
local de realização. Um livro pode ser lançado em qualquer lugar, inclusive no exterior. Um filme pode ser exibido em qualquer lugar. Um produto, se houver capacidade
de distribuição, pode ser distribuído onde for necessário.
Acontece com frequência de você apresentar um projeto
para uma empesa, ela dizer que tem interesse e perguntar
se, em vez do projeto acontecer na cidade A poderia acon-
tecer na cidade B. Parece mentira, mas já vi muita gente
recusar recurso por não aceitar trocar a cidade A pela B.
Mais uma vez: se a cidade A não estiver ligada à essência
do projeto, qual a diferença em realizar na B? Tudo bem,
você nasceu na A, seus amigos estão na A, os veículos de
comunicação onde você deseja aparecer e ser visto estão
na A. Mas o recurso está na B. Cabe a você decidir se quer
realizar o seu projeto ou quer deixá-lo na gaveta. Para
ganhar dinheiro no universo criativo é preciso saber onde
é possível ceder e onde não é. Se apegar a detalhes que
não interferem no conteúdo não é proteção à sua criação,
é vaidade e teimosia.
106
maria dolores
Qual a data de realização?
Outro item que merece atenção e pode ser uma
moeda de troca na negociação com um investidor ou não
é a data de realização. Vamos voltar ao Natal Luz. Se este
é seu projeto, não adianta o investidor oferecer o dobro do
recurso para você realizar em julho. Natal Luz é no Natal.
Se você fizer em julho, pode até não perder o dinheiro,
mas vai perder credibilidade, que é o que faz a diferen-
ça a médio e longo prazo no seu histórico profissional.
Por outro lado, se você planejou realizar o seu projeto e
outubro e a empresa topou e precisa que seja realizado em
dezembro, ok, vamos para dezembro. Não, não é mentira
também. Já vi gente recusar recurso por não querer arre-
dar o pé na data ou, pior, brigar com um possível cliente/
patrocinador por causa de data que, na verdade, é indiferente ao conteúdo. Quando é possível, é preciso arredar o
pé, senão você vai morrer com os pés fincados, sem sair do
lugar.
Certa ocasião, trabalhamos dois anos com uma
empresa até conseguir fechar um projeto. Fechamos em
dezembro. O projeto era para junho e aconteceria em
quatro cidades específicas, mas a empresa só topava
investir se o projeto acontecesse em outras cidades e no
mês de março. Sobre as cidades estava tudo certo, não
interferiam no projeto em si. A data, no entanto, era uma
questão importante. Seria uma antecipação em três meses
107
Como vender e realizar sua ideia
no cronograma de produção. Estávamos em dezembro.
Realizar o projeto em março não era algo tranquilo. Não
dava para dizer na reunião apenas sim. Pedimos uns dias
para avaliar. Estudamos, analisamos, verificamos todas
as possibilidades e obstáculos a serem vencidos. Feito o
dever de casa retornamos ao patrocinador. Sim, o projeto
poderia ser realizado em março em vez de junho. Nunca
dê uma resposta positiva sem ter condição de realizar o
que foi combinado. Você não pode aceitar mudar a data de
um projeto e depois não ter como cumprir. Para ter ferramentas que auxiliem na avaliação e decisão é indispensável ter um cronograma detalhado de execução.
Qual o cronograma de execução?
Vamos entrar nessa questão mais detalhadamen-
te à frente. Mas falemos do principal neste momento. É
indispensável ter total ciência do cronograma necessário
para realizar o seu projeto. Consideremos que o seu projeto seja produzir um livro sobre mudança de vida, tendo
como fio condutor pessoas que saíram da cidade grande e
foram para o campo na pandemia, que trocaram de vida
por completo temporariamente, mas depois transformaram essa decisão em algo permanente. Muita gente fez
isso e é um tema muito legal para um livro. Você apre-
sentou o projeto e conseguiu avançar a negociação com
uma empresa que oferece produtos de bem-estar e tem
108
maria dolores
interesse no mesmo público que pode se interessar pelo
seu livro. A empresa, aliás, pode ser a mesma Vida Linda
que estamos usando como exemplo. Ela não só quer patro-
cinar o seu livro como quer trezentos exemplares para dar
de presente para alguns parceiros no Natal. Então, vem a
pergunta da Vida Linda: Você consegue me entregar até
cinco de dezembro? Estamos no início de setembro.
Para saber se é viável, você precisa ter todos os
passos detalhados do início até estar com o livro impresso
nas mãos. Um cronograma deve ser feito sempre de trás
para frente. Ou melhor, eu prefiro falar da frente para trás,
porque, na verdade, vamos começar a contar da data futura para trás. Se o livro precisa estar na sede da Vida Linda
dia 5 de dezembro, eu preciso que a gráfica me entregue
até, no máximo, dia 30 de novembro, para poder conferir,
separar os exemplares e ter uma margem para imprevis-
tos, mesmo que pequena. Se a gráfica precisa me entregar
dia 30 de novembro, devo enviar o arquivo do livro pronto
para ela de acordo com o prazo daquela gráfica específica.
Por ser final de ano e haver muita demanda de impres-
são, vamos considerar vinte dias. Então, preciso enviar
o arquivo até dia 10 de novembro. Para enviar dia dez,
o designer deve fazer os ajustes finais e fechar o arquivo entre 1 e 9 de novembro. Para ele receber os ajustes
finais, o revisor precisa ter revisto. Para isso, deve receber
o arquivo até 20 de outubro. Para enviar para o revisor
20 de outubro, o texto precisa estar pronto. Vamos considerar um mês e meio para o texto, que é um prazo aper-
109
Como vender e realizar sua ideia
tado, mas factível para esse tipo de livro. Nesse mesmo
período, se houver imagens, um profissional pode tratar
as imagens. Então, até 10 de setembro quem for escrever
precisa estar com todo material de apoio em mãos, para
escrever o texto a partir dele. Para isso, ao menos um mês
antes precisa começar a organizar o material da pesquisa,
como transcrição das entrevistas, leitura de livros sobre o
tema, definição de roteiro e estrutura. Portanto, a organi-
zação do material precisa começar até 10 de agosto. Para
essa organização do material ser possível as entrevistas
precisam começar a ser feitas um mês antes, ou seja, 10 de
julho. Para começar as entrevistas e a pesquisa, deve ser
feito antes um trabalho de apuração, à fim de descobrir os
personagens e as histórias possíveis. A apuração bem feita
é a base de um texto coerente de um livro estilo livro-re-
portagem, então demanda, ao menos, um mês. Portanto
10 de junho. Resumindo: para que o livro esteja na sede
da Vida Linda em 5 de dezembro, você precisa iniciar a
execução, no mínimo, em 10 de junho. Portanto, dessa vez
você vai agradecer, mas recusar o patrocínio, porque não
conseguirá fazer a entrega. Ou vai tentar negociar para
outra data no ano seguinte.
Diante de um recurso possível e uma pergunta do
tipo “Preciso para dia tal, vocês conseguem?” somos tenta-
dos a responder: “Sim!”. A tendência é a gente dar uma
pensada rápida, fazer uns cálculos por cima e achar que
dá. Com a experiência e a prática, você consegue responder isso talvez imediatamente. Mas, na maioria das vezes,
110
maria dolores
mesmo com experiência, o melhor é responder: “Precisa-
mos avaliar, amanhã respondo” ou, em dois dias respon-
do ou o tempo que for necessário para dar uma resposta
factível. Pode ser que você já tenha realizado parte desse
processo, já tenha os personagens, já tenha feito algumas
entrevistas. Pode ser que sim, seja possível entregar em 5
de dezembro. Mas você só pode dizer sim se realmente
puder cumprir com qualidade. Se não tiver certeza, peça
para avaliar e, identificando que não é possível diga não.
Dizer não é crucial para a construção de uma rela-
ção de sucesso com os parceiros e investidores e para a
construção do seu currículo. Não é sair dizendo não toda
hora (tem gente que adora dizer não). Eu raramente digo
não de imediato para um patrocinador, cliente ou parceiro.
Eu me esforço para estudar todas as demandas e ver o que
é possível.
Algumas vezes, me perguntam sobre algo
que eu já sei ser praticamente impossível, mas, mesmo
assim, nós verificamos. Vai que existe alguma possibilidade.
Nossa função é não só atender ao cliente, mas nos
esforçar para tentar atendê-lo. Há algum tempo um patro-
cinador de um dos nossos projetos me enviou um e-mail
com uma série de coisas que ele gostaria que verificássemos, para vermos se seria possível realizá-las no evento
seguinte. Era uma lista com dezenove itens. Verificamos
e respondi ao e-mail. Dezessete itens não eram possíveis. Dois, sim. Era uma das maiores empresas do Brasil
e acho que, por isso, os patrocinados não costumavam
dizer muitos nãos ao patrocinador. A pessoa me telefonou,
111
Como vender e realizar sua ideia
rindo. Nunca havia recebido um e-mail com tantas nega-
tivas, mas agradecia, porque para eles era muito melhor
receber negativas em vez de promessas que não seriam
cumpridas.
Então, não tenha receio de dizer não. Isso vale
tanto para fechar o patrocínio de um projeto quanto para
as demandas no decorrer da execução. Sempre faça o
esforço para ver se é possível, em vez de negar apenas
porque “já sabe” que não vai dar certo. Estude, avalie. Se
realmente não for viável, diga não e tenha os argumentos
para explicar por que não. Você pode perder um recurso
pontual, mas ganha credibilidade, o que vale muito mais.
Em que meu projeto contribui para melhorar a vida das
pessoas e do mundo?
No começo, quando eu oferecia um projeto, foca-
va em todos os benefícios que ele traria para a sociedade,
o planeta e a natureza. Para mim, o mais importante do
projeto era o potencial que ele tinha para transformar, de
alguma forma, a vida das pessoas. Enxergava o Festival
Música do Mundo, nosso Projeto do Coração, como um
meio de produzir um grande encontro, promover a cultu-
ra para pessoas que não tinham muito acesso a ela, incrementar a economia da cidade com o turismo e promover
troca de experiências. Não eram só os shows. Havia música e cultura por toda parte. O projeto começava um mês
112
maria dolores
antes, com uma ação em todas as escolas da cidade, da
rede pública e privada. Os professores desenvolveram
projetos com os alunos tendo como tema os conterrâneos
famosos, Milton Nascimento e Wagner Tiso. Das creches
ao terceiro ano do ensino médio. Todos participaram. O
objetivo era resgatar a cultura local, a identidade cultural,
fortalecer a autoestima e inspirar essas crianças e adolescentes. Milton Nascimento foi uma criança negra adotada
por um casal branco. O pai era professor e a mãe era uma
dona de casa encantadora. Apesar de ter boa educação e
todos os cuidados dos pais, enfrentou o preconceito de ser
negro, principalmente numa cidade pequena e agrícola.
Foi orador da turma na formatura do ensino médio, mas
não pôde participar do baile de formatura, por não ser
permitida entrada de negros no clube local. Com todos os
obstáculos, ele venceu e se tornou um dos músicos mais
celebrados no mundo, com uma contribuição para a músi-
ca popular que é comparada apenas às inovações que o
compositor Debussy havia feito na música erudita. Ele era,
e é, um personagem com uma história capaz de inspirar.
Os trabalhos realizados pelos alunos foram expostos na
biblioteca municipal e a cada dia um grupo de alunos ia
até a biblioteca conhecer a exposição, ver expostas suas
próprias obras.
Nos dias do Festival, organizamos apresentações
de músicas pelas praças e esquinas da cidade. A ideia
era que você estivesse andando pela rua, indo do banco
para a padaria, e se deparasse com uma pessoa tocando
113
Como vender e realizar sua ideia
saxofone. Havia músicos individuais e grupos que fazem
parte da cultura local, como as fanfarras da prefeitura e
das escolas, as folias de reis, a banda de crianças da APAE.
Nas noites de quinta e sexta-feira aconteciam shows em
uma das praças e, depois dos shows das praças, shows
nos bares e restaurantes da cidade. Havia ainda saraus,
exposições de fotografia e palestras. No sábado aconte-
cia a maratona de doze shows no palco montado em um
pasto, com um cenário construído com ajuda de alunos
da APAE, que participaram de uma oficina de cenografia
com cenógrafos profissionais da TV Globo. Todo o cenário
foi feito com material da Associação Trespontana de Cata-
dores de Material Reciclável. No domingo, para encer-
rar, uma grande tenda foi montada em um distrito rural
da cidade, nas margens da represa de Furnas, com mais
shows e bons encontros.
O poder de transformar o mundo para melhor, ao
menos uma pequena transformação, era inegável. E eu
achava que isso era o que atrairia o patrocinador. Aprendi,
como já vimos, que o olhar do investidor era para o públi-
co, não para o caráter sustentável e social. Mas, mesmo
assim, esse lado precisa estar presente nos projetos. Bom,
na verdade, não é uma condição fundamental. Existem projetos de sucesso que não contribuem muito para
melhorar o mundo. É uma questão pessoal, de princípios e
valores, algo tão fundamental nos nossos dias. Já que você
vai criar um projeto do zero, por que não fazer algo que
possa melhorar, nem que seja um pouquinho, a vida das
114
maria dolores
pessoas? Não precisa ser uma transformação gigantesca.
Pode ser um pequeno passo.
Nós realizamos um projeto de orquestra com convi-
dado famoso no interior do Brasil. Os palcos gigantescos
são montados em praças públicas ou na rua. A cidade,
geralmente pequena, fica alvoroçada na semana da monta-
gem, com aquele trambolho sendo erguido. Os eventos
são realizados no domingo de tarde, justamente para que
as pessoas possam ir pelo interesse no conteúdo e no evento. Achamos que se fizéssemos sábado à noite muita gente
poderia ir com o espírito de “beber até cair, porque é sába-
do”. No domingo as pessoas vão com o espírito “amanhã
é segunda-feira e eu acordo cedo para trabalhar”. No
domingo, duas horas antes do início do evento, as pesso-
as começam a chegar. Famílias inteiras com suas cadeiras,
lanches e expectativas. Elas vão por causa do convidado
famoso, claro. Mas aí acontece a magia. A enorme maioria
dessas pessoas nunca viu ou ouviu uma orquestra.
O evento começa com a apresentação da orquestra,
que toca músicas populares e eruditas de mais fácil assi-
milação. Eu gosto de ficar no meio do público durante os
eventos. Ando de lá para cá, para ver se está tudo bem, o
que as pessoas estão achando e como estão reagindo. E é
incrível. Uma vez, em Maracaju, no Mato Grosso do Sul,
um pai de chapéu e botina, estava de mão dada com o filho
de uns seis anos quando o menino perguntou: “Pai, que
música é essa?”. O pai respondeu “É música de orquestra, meu filho”. E os dois permaneceram de pé, olhando
115
Como vender e realizar sua ideia
para o palco, assistindo e ouvindo aquela música. A vida
daquele menino pode não mudar drasticamente por ter
conhecido e ouvido uma orquestra. Mas é uma gotinha
a mais, regando, inspirando, apresentando novas formas
de viver e estar no mundo. Ao todo, mais de duzentas mil
pessoas já assistiram a esse evento. Se uma criança se inte-
ressar em tocar violino ou qualquer outro instrumento,
ou apenas descobrir e gostar de música de orquestra, ou,
ainsa, se compreender que a vida pode ir além, o projeto
já terá valido à pena. Mais para o fim da apresentação, a
orquestra convida o convidado e aí tocam e cantam juntos
com o público que, no final das contas, recebe aquilo que
havia esperado, o ídolo.
Como parte desse projeto realizamos ainda pales-
tras e oficinas em escolas de cada cidade que recebe o
evento. Sempre procuramos realizar algo além do produto principal. Promovemos palestras de capacitação ou de
inspiração. É nossa forma de contribuir para melhorar
a vida das pessoas, além do evento em si. O seu projeto
também pode melhorar o mundo e a vida da comunidade,
pode proporcionar um instante de alegria, pode propor-
cionar encontros, pode motivar as pessoas a fazerem sua
parte pelo meio ambiente, pode fazer muitas coisas que
não demandam grande esforço da sua parte, nem grandes recursos, às vezes nenhum recurso. O locutor de um
evento incentivar as pessoas a separar o lixo reciclável
em casa não tem custo, só um esforço mínimo e atenção.
Há inúmeras formas do seu projeto, seja qual for, contri-
116
maria dolores
buir para um mundo melhor para todos nós. Então, não
desperdice essa oportunidade. Seja uma festa de forma-
tura, um livro, um filme, um produto ou um show. Seja
o que for. Se você pensar e pesquisar um pouquinho, vai
descobrir coisas lindas que pode fazer e incentivar através
do seu projeto.
Por que quero realizar
esse projeto?
Esta pergunta nos remete ao início deste livro.
Antes de se lançar à aventura de realizar um projeto, você
deve refletir. Você não precisa explicar para as pessoas ao
seu redor ou para o mundo a motivação pela qual você
decidiu dedicar esforço, tempo e recursos para empre-
ender uma realização. Mas você precisa explicar para si
mesmo. Como contei, eu e meu marido e sócio dividimos
nossas empreitadas em Projetos do Coração e Projetos
Ganha-Pão. Ter ciência dessa distinção e do tipo de projeto que você quer realizar ou está trabalhando para realizar
é fundamental para você ter sucesso na realização, seja
uma realização financeira ou pessoal. Sem resposta a essa
pergunta, você pode se perder durante uma negociação,
você pode ser inflexível onde não deve (alterar a data ou
local do evento, por exemplo) e ser flexível onde não deve
(aceitar realizar o projeto com metade do patrocínio necessário). Conhecer os limites em cada situação é essencial.
117
Como vender e realizar sua ideia
Para a maioria dos nossos projetos, que são os
Ganha-Pão, a minha resposta, também como já disse, é:
“Porque tenho três filhos e preciso pagar as contas”. É
claro que essa é a motivação principal pela qual quero
realizar aquele trabalho e essa motivação ajuda a tratar
o projeto como um negócio e ganhar dinheiro, como tem
que ser um negócio de sucesso. Mas há outras motivações
que tornam o trabalho prazeroso. Aí entram as respostas
secundárias: “Porque gosto de música, porque me sinto
realizada ao levar a música para as pessoas, ao promover encontros e experiências que acrescentem na vida do
público, porque me sinto feliz ao saber que estou ajudando a tornar o mundo e a vida melhor, mesmo que seja só
um pouquinho”. Quem trabalha com cultura, esporte,
inovação e criatividade, sabe o quanto este sentimento
está presente no processo e o quanto o resultado do que
fazemos é gratificante. No entanto, não podemos perder
de vista a resposta inicial, para que o projeto tenha êxito
para os outros e para nós mesmos, não só trazendo à tona
todos esses bons sentimentos e realizações quanto resultado financeiro.
Se a sua resposta for: “Porque é algo que quero
fazer, sempre quis, é meu sonho, acredito etc” você irá
trabalhar de outra forma. Primeiro você pode – e deve
– tentar realizar o seu Projeto do Coração com todos os
recursos necessários e ganhar dinheiro com isso. Tem
muita gente que ganha, o que é ótimo. Mas, se não conse-
guir ganhar financeiramente, não tem problema. A moti-
118
maria dolores
vação é outra. Pode ser até que decida usar os seus recursos pessoais para realizá-lo. Eu sempre gostei muito de
ficar com as pessoas mais velhas da minha família, talvez
por ter passado boa parte da infância com meus avós
maternos e paternos e ter, inclusive, morado uma parte
expressiva da minha vida com eles. Adorava ouvir as
histórias de antigamente, as histórias dos pais deles, dos
avós, dos tios, dos parentes estranhos e queridos. As histórias engraçadas, as histórias do cotidiano, as tristezas e as
perdas jamais esquecidas. Meu filho mais velho, Daniel,
conviveu bastante com algumas dessas pessoas. Eu e o
Felipe começamos a namorar aos dezesseis, engravidei
aos dezoito. Daniel nasceu quando nós tínhamos dezenove anos. Nossos pais também nos tiveram cedo, então o
Daniel tinha uma tataravó, quatro bisavós, três bisavôs,
três bisavôs tortos, vários tios avós e um tio tataravô e
inúmeros tios, tias e primos. Nosso segundo filho veio
treze anos depois e, o terceiro, dezoito anos depois. Nesse
caminho, muitas dessas pessoas queridas e fascinantes se
foram. E eu sentia um apertinho no coração pelos nossos
filhos mais novos não terem conhecido esses familiares ou
terem convivido tão pouco com eles. Decidi, então, escrever essas histórias que eu vivi e ouvi quando era crian-
ça. Comecei há três anos, escrevendo pouco, maturando
as ideias, resgatando as memórias, devagar, sem pressa.
Ano passado, nos primeiros meses da pandemia, quando
ficamos com menos trabalho, naquele limbo sem saber
se esperávamos para realizar os eventos presenciais ou
119
Como vender e realizar sua ideia
seu transformávamos em online, resolvi terminar o livro.
Aproveitei todas as horas vagas entre cuidar das crian-
ças, da casa, fazer comida, lavar roupa, e escrevi. Foi uma
maneira muito boa também de aliviar a tensão e o medo
da covid-19. Eu pensava: se eu morrer, pelo menos meus
filhos terão parte da história deles escrita, um passado
resgatado, um pedaço de mim.
Montei um cronograma. Eu queria dar de presente
para minha família no Natal. Consegui uma gráfica rápi-
da em São Paulo que me entregaria cinquenta exemplares
em quinze dias. Para o livro estar na gráfica até primei-
ro de dezembro, eu precisava terminá-lo até setembro.
Para dar tempo de corrigir, revisar e diagramar. Quando a gente escreve sobre coisas que viveu e se apoia na
memória, como está tudo tão dentro da gente, às vezes
informações importantes escapam no texto. Você acha
que deu para entender tudo, mas é porque a história está
dentro de você. Alguém que não esteve ali, não conheceu
aqueles personagens, pode não compreender. Uma amiga
que não conhecia a história nem as pessoas fez uma leitu-
ra crítica, para ver se o texto estava claro e apontar onde
não estava. Outra prima, escritora, também fez uma leitu-
ra crítica. Minha cunhada, professora de português, fez a
revisão. Contratei uma outra amiga, designer de livros, e
ela diagramou. O livro ficou pronto, mais lindo do que eu
esperava. Coloquei na capa a foto do tapete arraiolo que
minha avó paterna, a única ainda viva, estava bordando.
Ela começou a bordar o tapete em 1970. Parou e retomou
120
maria dolores
em diversos momentos da vida. Agora, sentada em uma
cadeira de rodas, ela está terminando o bordado. A história
de uma vida. Eu mesma paguei a diagramação e a impres-
são. E, no Natal em Três Pontas, conforme o planejado,
dei de presente para meus filhos, meu marido, minha mãe,
meus tios, tias e primos. Depois, fui a Belo Horizonte e dei
de presente para meu pai, minha madrasta, minhas irmãs,
minhas tias e minha avó, a autora do belíssimo tapete
bordado por cinquenta anos.
Eu não ganhei dinheiro com esse projeto. Pelo
contrário, gastei. E foi o melhor projeto que realizei até
hoje. O projeto que mais me deixou feliz, com a sensação
de missão cumprida. Eu tinha a resposta pronta, era um
Projeto do Coração. E só foi possível diagramar e impri-
mir porque eu tive recurso para isso, recurso alcançado
graças aos diversos Projetos Ganha-Pão que tenho feito,
com alegria e dedicação, ao longo desses anos.
Descreva seu projeto
em até cinco linhas
Depois de pensar e estudar sobre qual projeto dese-
ja realizar, local, data, cronograma, público-alvo e moti-
vação, você precisa fazer o que a maioria das pessoas tem
desânimo de concluir: descrever seu projeto em até cinco
linhas. Parece pouco, né. É pouco, mas as pessoas têm
121
Como vender e realizar sua ideia
muita resistência em escrever essas míseras cinco linhas.
Não são quaisquer cinco linhas, é a síntese do seu projeto,
é a sua oportunidade de passar a mensagem do que ele é.
Você não pode desperdiçá-la.
Tem gente que começa a montar o projeto por essa
descrição. Eu sugiro deixar para o final ou escrevê-la em
dois momentos. O primeiro momento seria apenas um
rascunho, para ter um norte. O segundo momento seria
ao final, depois de responder as questões anteriores e, a
partir delas, ajustar ou reescrever, transformar o rascunho
em versão final, tendo como base tudo o que você pesquisou e analisou. Essa descrição em até cinco linhas é o pilar
do projeto. Por que cinco linhas? Por ser o tamanho geralmente solicitado para descrição resumida do projeto em
editais e leis de incentivo. Mas também porque você preci-
sa saber explicar o seu projeto, de forma clara e sucinta. Se
for enviar uma apresentação por escrito, nenhum diretor
de marketing ou de investimentos terá tempo ou dispo-
sição para ler mais do que cinco linhas. O ideal, aliás, é
conseguir descrever em duas ou três. Cinco é o máximo.
Se for apresentar pessoalmente, a descrição geral também
precisa ser sucinta. Você deve explicar em uma única fala,
dessas que a gente consegue proferir de um fôlego só.
Depois, havendo tempo e oportunidade, você aborda os
detalhes. Nos famosos pitchings o tempo para apresentar
a ideia ou projeto varia entre três e cinco minutos, o que
é muito mais do que as cinco linhas de um texto. Mesmo
assim, para obter êxito em explanar os tópicos principais e
122
maria dolores
mais interessantes do seu projeto em cinco minutos, você
precisa exercitar a arte da síntese. Portanto, nada melhor
do que começar com a descrição em até cinco linhas.
Não sabe por onde começar? Comece. Eis uma dica
de jornalista: escreva. Não se preocupe se está bom, se é
a melhor forma de começar ou terminar. Não se preocupe se as palavras são as mais apropriadas, se tem erro,
se não tem. Se você não sabe por onde começar, apenas
comece. Depois você vai, aos poucos, amadurecendo as
ideias e a própria escrita. Eu aprendi isso com uma matéria que escrevi para a revista Exame, da Editora Abril. Eu
havia me formado há pouco tempo e acabado de concluir
o Curso Abril de Jornalismo quando me chamaram na
Exame para escrever uma matéria na cidade mineira de
Divinópolis sobre confecções que produziam uniformes
para o Exército dos Estados Unidos. Do sul de Minas
Gerais para o front da maior potência mundial. Topei na
hora. Era minha primeira matéria para uma revista. E não
uma revista qualquer. A Exame fazia parte do alto escalão
de publicações da Editora Abril, era a principal revista de
negócios do país. Eu não entendia nada de negócios ou de
economia e não tinha o menor interesse ou afinidade com
o tema.
Fui até Divinópolis, conheci as confecções, conver-
sei com as pessoas, pesquisei. Essa parte foi ótima. Quando
chegou a hora de escrever, travei. Embora eu pudesse colocar minha voz e meu estilo no texto, havia um limite para
isso. O limite era a própria linguagem e estilo da revista.
123
Como vender e realizar sua ideia
Cada publicação tem sua cara. Em textos de opinião você
não precisa se alinhar à essa cara. Mas em uma matéria,
sim. O leitor espera por algo que lhe é familiar. O familiar de uma revista de negócios era completamente estranho para mim. Nunca havia escrito nada parecido. Não
sabia por onde começar. Por onde seguir. Nem começo,
nem meio, nem fim. Nada. Era exatamente isso, meu texto
estava reduzido a nada. E o tempo corria, o prazo para
entrega se aproximava. Telefonei para o editor. Expliquei
a situação. Falei da minha dificuldade com o segmento.
Ele me deu um dos melhores conselhos que recebi em
relação à escrita. “Apenas escreva. Não se preocupe com
a forma, nem se está bom. Escreva como se estivesse me
contando o que descobriu, me contando a história”. Foi o
que fiz. Comecei de uma maneira despretensiosa. Contan-
do, como quem conta para uma amiga sobre uma viagem
que fez, um lugar que visitou, uma história que descobriu.
Enviei para ele, esperando que me retornasse e me desse
uma direção sobre o que fazer. Achei que, depois de ler, ele
me indicaria por onde começar e o que fazer para escrever a matéria. Mas não. Ele me retornou dizendo que era
aquilo mesmo, só precisava de uns ajustes. Então, com o
texto em mãos e as observações dele que apenas deixavam
a informação mais clara, ajustei e a matéria foi publicada.
Duas páginas, com direito a fotografia.
Desde então, sempre que tenho dificuldade para
escrever um texto, seja do que for, eu sigo esse conselho
recebido há dezoito anos. Simplesmente escrevo. Depois
124
maria dolores
eu volto relendo, corrigindo, mudando as coisas de lugar.
Às vezes chego à conclusão de que não está bom e preciso
escrever tudo. Deletar. Recomeçar. Ainda nessas ocasiões,
o texto escrito não é trabalho perdido. Foi um exercício,
parte do processo que me ajudou a clarear as ideias e a ver
que aquele não era o melhor caminho. Portanto, escreva.
Ao concluir as suas cinco linhas, peça para alguém
ler. São só cinco linhas, você vai encontrar uma boa alma
com disponibilidade para lê-las. Não precisa ser alguém do
ramo. Peça para alguém fora do ramo. Um leigo. Se o leigo
entender, é porque a informação está clara. Se não entender, mesmo que não esteja familiarizado com a temática,
provavelmente tem alguma frase truncada, algo dúbio ou
confuso. Aceite as críticas com gratidão e releia. Alguns
pontos serão pertinentes, outros não. Mas a opinião de
quem lê ou recebe a informação traz sempre algo valioso
para lapidá-la e torná-la mais atraente e precisa.
Para adiantar o seu trabalho e facilitar o seu cami-
nho, vamos lá: um erro muito comum nas descrições resu-
midas é justamente não descreverem o projeto, mas apresentarem a justificativa. A descrição em até cinco linhas
não é o lugar para você dizer por que seu projeto é importante, por que é diferente ou por que vale à pena investir
nele. Vamos usar como exemplo um dos nossos projetos, o
Festival de Blues e Jazz.
125
Como vender e realizar sua ideia
Descrição correta:
5ª edição do maior Festival de Blues e Jazz do Brasil
a ser realizado de forma gratuita em oito capitais brasi-
leiras, com sete shows por dia e um dia de duração por
cada cidade. O projeto contempla ainda ações de susten-
tabilidade e atividades lúdicas para crianças, além ações
educativas em escolas.
Descrição equivocada:
5ª edição do maior Festival de Blues e Jazz do Brasil,
que leva música de forma gratuita e acessível a oito capitais brasileiras, promovendo democratização, formação
de público e fomentação da cultura. O projeto incrementa ainda as economias das cidades abrangidas, gerando
postos de trabalho e movimentação de recursos indiretos
nas áreas de hospedagem, transporte, alimentos e bebidas.
O segundo exemplo é fundamental para o projeto
ser aprovado em editais ou leis de incentivo e, sim, contri-
bui para a venda e captação de recursos junto às empresas.
Mas não é a descrição. A descrição deve se ater ao que é
o projeto, de forma clara e prática. O lúdico, o afetivo, o
potencial social transformador deixamos para a justificativa. Em uma apresentação para um diretor de marketing é
claro que você vai abordar essas questões, mas, primeiro,
ele precisa saber o que é o projeto para decidir se investe tempo em conhecer melhor a proposta ou não. Uma
boa venda começa com clareza. Vamos repetir pela enési-
126
maria dolores
ma vez? Todos temos apenas um tempo. Vamos gastar
esse tempo com o que realmente importa. Isso vale para
nós mesmos e para o outro. Se eu contribuo para que o
outro não perca tempo, posso não ganhar o recurso nesse
momento, mas ganho simpatia e confiança.
Pronto, você realizou a pesquisa e tem total condi-
ção de responder as perguntas abaixo:
Qual o público-alvo do projeto?
Qual o local de realização?
Qual a data de realização?
Qual o cronograma de execução?
Em que meu projeto contribui para melhorar a vida das
pessoas e do mundo?
Por que quero realizar esse projeto?
Descreva seu projeto em até cinco linhas
E, agora? Agora você vai montar uma apresen-
tação inicial para enviar por e-mail ou apresentar pesso-
127
Como vender e realizar sua ideia
almente. Essa apresentação não pode ter mais que cinco
páginas ou slides. Veremos por quê.
128
maria dolores
Apresentação
(Regra das 5)
129
Como vender e realizar sua ideia
Como boa parte das pessoas que escolhem cursar
jornalismo, optei pelo curso por gostar de ler e escrever.
São meus dois hobbys. Qualquer tempo vago eu leio ou
escrevo. Adotei o hábito de carregar um livro sempre
comigo. Se estou numa fila, eu aproveito para ler. Se estou
sentada numa sala de espera, aproveito para ler. Se meus
filhos estão brincando numa tarde de sábado e eu não
tenho nada para fazer, aproveito para ler. Sei que o Kindle
e outras formas de leitura digital podem facilitar muito a
minha vida e abrir um novo leque de oportunidades, mas
eu já passo tanto tempo no computador e no celular trabalhando, que ainda prefiro carregar um livro em papel,
mesmo que pese, ocupe espaço e consuma papel.
Não consegui desenvolver o hábito de escrever nas
filas e salas de espera. Mas eu carrego comigo também
um caderninho onde anoto ideias e, se estou sem o cader-
ninho, envio um e-mail para mim mesma com o assun-
to “Ideias”, para que eu possa pesquisar depois. E levo
o computador comigo se estiver em casa, na minha mãe,
na minha sogra ou no sítio. Se eu acordo mais cedo que
as crianças, aproveito para escrever um pouco. Se tenho
alguma hora tranquila no fim de semana e estiver em casa,
escrevo também. Este livro, por exemplo, escrevi durante
as manhãs, antes das crianças acordarem e antes de come-
çar a trabalhar. Escrevia por uma hora, meia hora, o que
desse. E não incluía esse tempo gasto na categoria trabalho
da minha agenda do dia, mas na categoria pessoal/lazer.
Por isso, tenho facilidade para escrever muito. Não
130
maria dolores
necessariamente uma escrita primorosa, mas volumosa.
A primeira apresentação que fiz do Festival de Blues e
Jazz para enviar ao potencial patrocinador, depois de já
ter trocado e-mails com ele, tinha 22 páginas. Por sorte
encontramos muitas pessoas do lado de lá do balcão de
negociação que nos ajudam e nos ensinam. Esse gerente
de marketing, que foi praticamente uma escola para nós
nos anos de parceria, me telefonou ao receber a apresenta-
ção e disse: “Maria, a apresentação ficou bonita, mas preci-
so que você pegue o conteúdo e apresente em 5 slides. A
diretoria não tem tempo para mais que isso”.
Foi o que fiz, com muita dificuldade e sofrimento.
Ele precisava do material para a manhã seguinte. Quase
entrei em pânico. Já havia sido difícil colocar todas as
informações importantes em 22 páginas. Como adaptar
para cinco? Muita coisa vai ficar de fora, eu pensei. Eu lia,
lia, lia e não via o que cortar. Tudo era importante. Mas,
mais importante era a diretoria ver nosso projeto. Então eu
precisava editar. Comecei tirando o conteúdo que expli-
cava por que nosso projeto era incrível para o mundo e
as pessoas. Havia três páginas sobre isso. Também tirei a
parte que explicava o que era um Festival de Blues e Jazz
e como eles eram fundamentais para a cultura. Havia uma
página para cada artista possível, com foto e descrição a
respeito de cada um deles. Transformei essas várias pági-
nas em uma única com as fotos e os nomes de todos eles.
Nada de descrição sobre cada um. Peguei as informações
essenciais e reuni em uma única página. Para conseguir
131
Como vender e realizar sua ideia
enviar em cinco páginas, não contei a capa, então a apre-
sentação foi enviada na manhã seguinte, com seis páginas,
miolo de cinco. A partir de então, minhas apresentações
iniciais seguem um padrão com poucas variações:
Capa: Imagem impactante, nome do projeto em tamanho
grande e nome do autor do projeto em tamanho pequeno
(que pode ser o seu ou o da sua empresa)
Página 1: Imagem bonita e lúdica com uma frase de impacto afetivo/emocional.
Página 2: Respondo com uma frase, no máximo duas, às
perguntas O quê? Para quem? Quando? Onde? Como?
Por quê?
Páginas 3 e 4: A terceira e quarta páginas são dedicadas a
dar mais detalhes sobre o projeto. Se for um evento, em uma
delas você pode colocar imagens e os nomes das atrações
possíveis. Pode colocar ainda referência de outros eventos
similares de sucesso, no Brasil e no Mundo. Pode colocar
ações extras. Pode colocar o nome dos profissionais envol-
vidos, quando isso der peso e for importante para a venda.
Ou seja, você tem duas páginas para dar mais detalhes do
projeto. Com boas imagens e pouco texto. E lembre-se que
as imagens possuem direito autoral. Há vários bancos de
imagens gratuitos na internet para você pesquisar e fazer
132
maria dolores
download.
Página 5: Investimento, apenas com o valor total do proje-
to. Nesta primeira apresentação não envio cotas nem
contrapartidas específicas para cada cota. Numa apresen-
tação mais detalhada posteriormente altero o valor para
o valor do investimento já conversado com a empresa e
acrescento uma ou mais páginas com as contrapartidas,
conforme cada caso.
Página 6: Nesta última página coloco apenas a palavra
“Obrigado” e meus contatos.
Quando você tem um departamento de arte para
montar apresentações lindas ou mesmo um designer na
sua equipe, ótimo. Quando não tem, é bom aprender a se
virar, como é nosso caso. Aqui na Marolo, como já expli-
quei, somos uma equipe fixa pequena. Eu, meu marido
e sócio e duas primas que são da área de produção. Para
cada projeto montamos as equipes conforme a necessidade e contratamos o designer ou o pessoal para cuidar
das artes, criação de logomarca, peças etc. No dia a dia eu
mesma monto as apresentações. Não tenho talento para o
desenho e não tenho habilidade com programas ou apli-
cativos. Uso o Power Point, embora meu filho mais velho
já tenha me explicado que existem outros programas mais
fáceis e autoexplicativos. Você pode usar o programa que
133
Como vender e realizar sua ideia
preferir. Se você, como eu, não é da área visual, o impor-
tante é criar algo simples e que funcione. Mais uma vez:
não sou do ramo, existem várias formas de montar apresentações melhores que as minhas, mas como eu estou
escrevendo esse livro e compartilhando a minha experi-
ência, vão aqui as minhas dicas para uma boa e eficiente
apresentação visual do seu projeto, que você mesmo pode
fazer:
Imagens em boa resolução: por favor, certifique-se que
a imagem que você está usando tem alta resolução. A
imagem precisa ser nítida, não pode ser borrada, fraca,
tremida, fora de foco ou fragmentada. As imagens dos
bancos gratuitos podem ser baixadas em boa resolução
e oferecem opções, entre baixa, média ou alta. Prefira a
média. A baixa vai ficar ruim, a alta pode deixar o arquivo
pesado.
Texto legível: vamos facilitar a vida do leitor? Nada de
usar letras em degradê, com sombra ou efeitos desse tipo.
Se for usar texto sobre imagem, o texto precisa estar em
um local da imagem em que dê leitura, que seja um fundo
mais uniforme. Se você colocar um texto em cima de uma
foto de multidão, por exemplo, vai ficar ruim para ler.
Texto claro: escreva um texto claro e fácil de entender.
Deixe a criatividade apenas para a frase de efeito no início,
134
maria dolores
mesmo assim, precisa ser uma frase curta e inteligível. No
restante do texto, economize adjetivos. Ninguém quer
ler um texto dizendo que seu projeto é incrível. Você vai
mostrar que ele é incrível pelo conteúdo, pelo que ele é,
não pelos adjetivos.
Cor da fonte: a fonte precisa contrastar com o fundo para
dar boa leitura. Em um fundo claro, escolha cores de fonte
escuras. Em fundo escuro, escolha fontes de cores claras.
Box: uma alternativa para usar uma imagem que não
tenha uma parte em fundo uniforme é colocar o texto
dentro de um box, que pode ser um retângulo, um círcu-
lo, um quadrado, entre outros. Nesse caso, você mantém
na apresentação tanto a foto que quer usar quanto o texto
legível.
Imagens estouradas: se você não é da área visual, pode
usar a técnica da imagem estourada para dar uma cara
mais profissional. Imagem estourada é quando ela ocupa
toda a extensão da página, de fora a fora. Se a imagem for
boa (e você já aprendeu a usar só imagem em boa resolução) vai dar uma cara profissional, bonita e clean.
Seja clean: se você não é diretor nem diretora de arte e não
entende patavinas de design, por favor, seja clean. Não
invente, não tente inovar e muito menos complicar. Numa
135
Como vender e realizar sua ideia
apresentação visual, menos é mais. Com imagens fortes,
texto legível e organização da informação você alcançará
seu objetivo.
Num segundo momento, o investidor pode solici-
tar uma apresentação mais detalhada, com cronograma
de execução, contrapartidas, ações de sustentabilida-
de e outras informações. Se pedirem uma apresentação
detalhada, não tente adivinhar o que ele quer dizer com
isso. Pergunte. As empresas são diferentes, os interesses
são diferentes e o olhar é diferente. Pergunte que tipo de
informações precisam que constem no material. Só isso. A
resposta irá direcionar em que deve aprofundar ou não.
136
maria dolores
Consegui uma reunião,
e agora?
137
Como vender e realizar sua ideia
Você descobriu onde está o dinheiro. Descobriu
quem manda no dinheiro. Conseguiu o e-mail. Entrou
em contato. Teve retorno. Enviou uma proposta. Outro
retorno. E surgiu então um agendamento de reunião para
apresentar a proposta detalhada. Parabéns! O caminho
ainda é longo, mas você já venceu várias etapas. Antes de
ir para uma reunião você precisa ter duas coisas em mente
– opostas, mas complementares. O negócio pode dar certo.
O negócio pode não dar certo. É claro que você irá se
preparar, intelectual, física e emocionalmente para fechar
o projeto. Mas para o bem do seu negócio, da sua carreira e
da sua vida a longo prazo, precisa ter plena ciência de que
há possibilidade real da venda não se concretizar daquela
vez. Daquela vez! Algo não dar certo num determinado
momento ou em uma negociação, não significa que tudo
deu errado. A gente fica chateado quando investe tempo
e energia em um projeto e, lá na frente, para de avançar.
Mas isso é totalmente normal, faz parte do processo. Ter
essa compreensão nos dá segurança e confiança. Uma
venda que não prosperou, uma recusa, um declínio, nada
disso pode tirar a sua confiança, porque você sabe que
é assim. Lembra de quantos e-mails você precisa enviar
para ter uma resposta? Para uma negociação avançar? Ao
menos cem. Do mesmo modo, você irá em várias reuni-
ões que serão excelentes, mas não darão o resultado esperado. Você perde com isso? Não. Você ganha experiência
e abre canais. Tece mais um ponto na construção – que
nunca termina – de credibilidade, currículo, ou seja, de um
138
maria dolores
nome, o seu nome. Compreendido isto, vamos à reunião.
Parece banal, mas não é. Cuide do seu visual. Você
não precisa ir com a roupa de uma festa, nem deve se
transformar em quem não é. É fundamental manter a sua
essência, mas é importante se apresentar com um mínimo de organização visual. O que isso significa? Cabelo
penteado, roupa limpa, sapato limpo, unhas cortadas,
cara limpa, dentes escovados. Você não pode chegar numa
reunião suado, sujo, bagunçado. Você pode ter um estilo mais informal, como eu, pode até ser mais desleixado,
como eu. Mas para uma reunião você precisa se organi-
zar. Ser informal ou não se encaixar nos padrões da moda
pode ser um trunfo, mostra que você tem personalidade,
que não se deixa levar facilmente, mas ir para uma reunião
profissional desleixado não é indicativo disso, pelo contrário, pode dar a entender que você não liga para a reunião
e que ela não é tão importante assim. Se você é desleixado
com uma reunião, talvez seja com o projeto, não é mesmo?
É o que pode intuir quem estiver do lado de lá, mesmo que
não faça essa avaliação de forma consciente.
Uma vez participamos de uma licitação para a
produção de um dos eventos mais importantes de uma
das maiores estatais do Brasil. Preparar a proposta para
entregar na licitação foi um trabalho intenso, árduo e que
envolveu uma série de pessoas, todas trabalhando no
risco. Se vencêssemos, todo mundo ganharia pelo trabalho. Se perdêssemos, todo mundo ficaria no zero. Eu fui
a Belo Horizonte entregar os envelopes e participar da
139
Como vender e realizar sua ideia
licitação, que era presencial. Não tínhamos muito recurso,
então fui de ônibus. Saí da rodoviária do Tietê, em São
Paulo, no ônibus previsto para chegar à capital mineira às
seis da manhã. Daria tempo de deixar minha mala e meu
travesseiro na casa dos meus avós, lavar o rosto e trocar
de roupa. Na chegada da região metropolitana o trânsito
parou. Foi desesperante. Seis, sete, oito horas e o ônibus
havia percorrido poucos metros. O Felipe, meu marido,
telefonou para saber se estava tudo bem. Não tive cora-
gem de dizer que não estava. Era muito esforço, de muita
gente, para morrer dentro de um ônibus. Respirei fundo e
avaliei quais eram as soluções. Olhei para fora.
A única coisa que andava eram as motos, que passa-
vam voando entre os carros, ônibus e caminhões. Peguei
minha mala, meu travesseiro, a pasta com os envelopes
e fui até o motorista. “Moço, por favor, você pode abrir a
porta para mim, por favor? Preciso descer.” Ele não podia.
Explicou que não podia simplesmente abrir a porta, estávamos na faixa do meio, era perigoso. “Você pode tentar
ir para a faixa da direita, então? Por favor”. Expliquei
que tinha uma licitação e que muita gente dependia de
mim. Com muita dificuldade, setas e buzinas ele conse-
guiu deslocar o ônibus para a faixa da direita. Abriu a
porta. Desci, agradecida. Estávamos em Betim. Naquela
parte da cidade em que ainda não é cidade, mas já não é
só rodovia. Havia fábricas, oficinas e três pontos de entre-
ga expressa e serviço de motoboy. Fui aos três. “Entrega
pessoa, moço?”, perguntei. Nenhuma entregava. “Se for
140
maria dolores
entregar esse envelope, eu posso ir junto?”, tentei. Não,
não podiam transportar passageiros. Quase desisti. Vi
então, mais pra baixo um pouco, um cômodo com uma
placa “CHAVEIRO” e uma moto na frente. Pensei “Essa
moto só pode ser desse chaveiro”. Ele estava lá, fazendo
chaves. Eis o diálogo:
- Moço, bom dia, desculpe perguntar, mas essa moto aí na
frente é sua?
- É, sim.
- Desculpa perguntar de novo, moço, mas, por acaso, você
tem dois capacetes?
- Tenho.
- Moço, se eu pagar para você o que você ganha por dia,
será que você me leva no bairro Santo Antônio, em Belo
Horizonte?
Ele coçou a cabeça, com muita preguiça. Fui então
salva pela mulher. Ela apareceu por uma portinha. Havia
escutado a conversa.
- É claro que ele leva.
141
Como vender e realizar sua ideia
Isso foi em 2011. Fechamos a corrida por cento
e cinquenta reais. Subi na moto com minha mala, meu
travesseiro e a pasta com o projeto e a documentação.
Minhas poucas experiências com moto foram na moto do
meu padrasto, no interior, só para ir da casa da minha mãe
para a minha vó quando eu era pré-adolescente. Nunca
mais andei de moto e, muito menos, numa cidade grande
e na rodovia, entre carros, trânsito, correria, quebra-mo-
las, sinais, escapamentos e pedestres. Foi uma alternativa
arriscada. Hoje eu não faria isso. A despeito do perigo da
moto, eu não conhecia o chaveiro, poderia ser uma pessoa
má, um doido, sei lá. Mas tive sorte. Era só um trabalha-
dor com uma moto e uma esposa que sabia não recusar
oportunidades. Atravessamos Betim, Contagem, metade
de Belo Horizonte e, faltando cinco minutos para às nove,
cheguei ao edifício onde seria a licitação. Havia representantes de outras oito empresas participantes. Entregamos
os envelopes. Primeiro os da proposta técnica. Depois de
algumas horas de discussão interna, a comissão regressou.
Nossa proposta fora a escolhida. Passei então mais algumas horas detalhando e conversando com a comissão e
com os representantes das outras empresas. Na hora de ir
embora, uma mulher e um homem da comissão me chamaram num canto e falaram baixinho: “Parabéns, a proposta
é ótima e você também, muito simpática e comunicativa.
Gostamos muito de você e, por isso mesmo, escute a nossa
dica: nunca mais vá a uma apresentação com o travesseiro
142
maria dolores
na mão e o cabelo nessa bagunça”. Eu, que não andava de
moto, nem pensei que, ao tirar o capacete, o cabelo – preso
num rabo de cavalo - ficaria totalmente bagunçado, parecendo uma louca.
O caso pode parecer engraçado, e é. Ainda mais por
ter tido um final feliz, que foi ganhar a licitação. Mas me
ensinou algo importante, que nunca mais esqueci. Eu só
tenho três calças, sendo duas jeans e uma preta. Um par
de tênis, uma bota e três sapatilhas. Não tenho paciência
nem talento para figurino. Não vejo isso como qualida-
de, porque sinceramente invejo as mulheres que andam
produzidas ou estilosas. Eu só sei combinar azul com azul.
Qualquer variante que eu tente dá errado. Ainda assim,
sempre me arrumo para as reuniões de trabalho. Tenho
uma camisa de manga comprida, duas de manga curta e
um casaco para reuniões. Arrumo o cabelo, com creme ou
secador, e passo uma maquiagem básica, só para não ficar
com cara de desmilinguida. Base, blush, rímel e batom
claro. Pronto. Não estou mais com cara de desleixada. Sou
uma convicta de que aparência engana, de que é preciso
conhecer um pouco melhor a pessoa para ver se vale à
pena ou não, se é confiável ou não, se é o que aparenta
ou não. E já vi muita gente ser enganada justamente por
confiar em pessoas que “aparentam” poder, confiança e
conhecimento. Mas, mesmo sendo convicta de que é preci-
so conhecer a pessoa além da capa, é importante ir a uma
reunião de venda com o visual minimamente organizado.
Essa atitude mostra que você se preocupa com o outro. Ir
143
Como vender e realizar sua ideia
de chinelo ou short avacalhado pode indicar que você não
está nem aí. E é como eu disse. Se não está nem aí para as
pessoas que estarão na reunião, quem garante que estará
aí para o desenvolvimento do projeto?
Resolvida a questão do visual, o sucesso de uma
reunião - seja para fechar o negócio ou para abrir o canal e
mantê-lo aberto – passa por dois pontos cruciais: preparação e empatia. Vamos a cada um deles.
Preparação: Você já conhece a empresa, pesquisou sobre
ela, suas estratégias de crescimento, marketing e suas áreas
de interesse. O próximo passo é aprofundar e ampliar essa
pesquisa. Estudar todas as informações que conseguir
encontrar sobre a empresa. Não só estratégias de marke-
ting ou crescimento, mas de sustentabilidade, políticas de
desenvolvimento de pessoas, estratégias internas, políti-
cas para fornecedores. Você precisa conhecer a empresa,
entender a empresa. Mesmo pesquisando e lendo bastan-
te, será um conhecimento superficial, de quem está do lado
de fora. Todavia, já é alguma coisa. Pois o seu desafio na
reunião não é só fechar o negócio, é conseguir mais informações, conseguir que o cliente se abra com você, que sinta
confiança para compartilhar os objetivos, o que realmente
querem e precisam. Para isso, pesquise também projetos
similares ou do mesmo segmento nos quais a empresa já
investiu. Não só uma olhada rápida. Procure saber como
foi o projeto, ou como está sendo. O que foi legal e o que
144
maria dolores
não foi. O que deu certo e o que não deu. Quanto a empresa investiu em cada um desses projetos - se essa informa-
ção estiver disponível. Pesquise ainda projetos similares
ao seu que estejam acontecendo no Brasil ou no mundo.
O que eles têm de positivo, o que não tem, o que pode ser
uma inspiração, o que não cabe na sua proposta. É sua
obrigação conhecer o mercado. Muita gente chama isso
de “conhecer a concorrência”. Nós aqui na Marolo não
usamos esse conceito de concorrência. Estamos todos no
mesmo barco. Tem espaço para o meu produto, para o
meu projeto. Mas tem para os outros também. Aprovei-
tando, peço uma pausa para falar um pouco mais sobre
concorrência, pois é um tema para se ter em mente.
Em janeiro de 2018, divulgamos as datas do nosso
Festival de Blues e Jazz, que aconteceria em seis capitais
brasileiras, uma delas, Recife. Quando realizamos um
evento em uma cidade, verificamos antes para saber se
não haverá nenhum outro evento similar na mesma data,
ou que possa dividir o público. Não havia nada para a
data marcada. Mais tarde, sem ter visto nossa data, um dos
mais importantes e tradicionais festivais da cidade agendou sua realização para o mesmo final de semana. Uma
diferença favorecia o nosso projeto: o nosso festival era
gratuito, o outro era com ingresso pago. Quando soubemos da coincidência de datas, ficamos preocupados. Tudo
bem, levaria uma parte do nosso público. Mas, mesmo
assim, haveria público e o nosso Festival não dependia de
bilheteria, era gratuito, tinha todos os custos pagos pelo
145
Como vender e realizar sua ideia
patrocínio. O outro festival também tinha patrocinadores,
mas como contava com bilheteria, certamente esse recur-
so entraria na composição da receita. Entrei em contato
com a organização do “concorrente”. Expliquei a situação
e perguntei no que poderíamos ajudar. O evento deles
durava dois dias, o nosso um. Durante os intervalos do
nosso Festival, que começava de dia e terminava às dez e
meia da noite, divulgamos vídeos nos telões sobre o outro
Festival e o locutor dizia para as pessoas irem para lá após
o nosso, onde a programação seguiria até a madrugada.
Não foi a primeira nem única vez que fizemos algum tipo
de ação para ajudar a “concorrência”. A mentalidade de
compartilhar é importante, e ainda mais nas áreas criati-
vas. Como eu disse, estamos todos no mesmo difícil barco,
remar juntos fortalece a travessia.
Voltando à questão da preparação, pesquise a fundo
a empresa, os projetos apoiados ou investidos por ela e os
projetos similares ao seu. Chegue para a reunião com o
dever de casa feito. A pior coisa é chegar boiando. Quando
eu fazia entrevistas no meu trabalho de jornalista, pesqui-
sava bastante sobre o tema e o entrevistado antes, mesmo
quando não havia os sistemas de busca de internet como
existem hoje. E, se precisava fazer perguntas que o entre-
vistado já havia respondido um milhão de vezes, eu dizia
“me desculpe, você já respondeu isso mil vezes, mas preci-
so perguntar de novo, para constar na entrevista”. Essa
postura mostrava ao entrevistado que eu me importava
com ele, que sabia quem era e o que havia feito. Por incrí-
146
maria dolores
vel que pareça, boa parte dos jornalistas chega para uma
entrevista sem saber absolutamente nada do entrevistado.
É uma vergonha alheia sem fim. Você não pode passar
esse tipo de vergonha. Vá preparado para a reunião.
Empatia: Cuidado! Não é porque você pesquisou sobre
a empresa que pode chegar à reunião falando sem parar.
É preciso vigiar a si mesmo para não dizer coisas como
“eu sei que vocês agora querem isso” ou “eu sei que vocês
fazem isso” ou “eu sei “blá blá blá”. Atenção: você não
sabe o quanto acha que sabe. Se preparou, fez um bom
trabalho, mas o seu principal objetivo em uma reunião é
menos apresentar o projeto em si e suas habilidades de
detetive e mais conseguir novas informações e criar empatia. O maior segredo de uma reunião de sucesso é a empa-
tia. A empatia gera cumplicidade, destrói as barreiras de
resistência e aproxima. Mas, como fazer para alcançar
empatia? Sendo simpático? Carismático? Sim, mas princi-
palmente sabendo ouvir. Parece fácil, né? Chegar, se apre-
sentar, mostrar o projeto e ouvir. Mas não é bem assim que
funciona.
Você precisa ir de coração aberto, sem escudos, since-
ramente pronto para ouvir, compreender e, por conseguin-
te, poder oferecer o que a empresa precisa. Quando você
consegue criar empatia, a pessoa do lado de lá se desarma,
acaba dizendo o que realmente precisa, o que a empresa
espera alcançar e, sabendo disso, você poderá ajustar a sua
147
Como vender e realizar sua ideia
proposta, ampliando enormemente as chances de fechar
o negócio. Há pessoas que são naturalmente propícias a
criar empatia, mas mesmo que você não tenha essa habilidade ou traço natural de personalidade, pode aprender
e trabalhar para desenvolvê-la. Isso irá ajudar não apenas
na sua vida profissional e nas suas vendas, mas a sua vida
pessoal também. Os laços que formamos com as pessoas
são a base da vida que construímos. Algumas dicas:
Seja autêntico: Não tente montar um personagem. Seja
quem você é. É claro que é importante se apresentar bem,
falar bem, mas se você é uma pessoa tranquila, de fala
mansa, não tente parecer um palestrante motivacional.
Soará artificial. Use as suas características a seu favor. Você
não pode deixar o interlocutor morrer de sono, mas aprenda a utilizar os seus pontos positivos a seu favor. Faça uma
lista dos seus traços positivos, aquilo que todo mundo diz
que você faz bem, e use na reunião. Se o seu sorriso é conta-
giante, sorria, se o seu sotaque é aconchegante, não tente
acabar com o sotaque, se você é engraçado, não tente pare-
cer sério. Mas faça isso de maneira natural, sem forçar. A
linha entre espontaneidade e inconveniência é tênue. Seja
você, mas sem exagero. Seja você, mas sem perder de vista
que não está na sua casa, está num local de trabalho.
Com a energia para cima: Como acabamos de falar, você
não precisa se comportar como um palestrante motivacional. Entretanto, mesmo sendo uma pessoa tranquila, não
148
maria dolores
pode chegar para uma reunião com cara de desânimo,
sono ou qualquer sinal de apatia. Já cheguei para algumas
reuniões cansada ou até desanimada, fosse pela viagem
ou por estar num dia mais pra baixo mesmo. Então, ao
chegar no local, eu pedia para usar o banheiro. Lá, fazia
alguns polichinelos ou dava pulinhos. Parece idiotice. Mas
não é. Movimento traz energia. E você precisa dela para
vender o seu projeto ou a sua ideia.
Aceite o café e a água: Eu sempre aceito o cafezinho e
a água. Primeiro porque chego com sede nos lugares e
porque adoro café. Segundo porque é uma oportunidade
para quebrar o gelo. Falar sobre amenidades ajuda a dimi-
nuir as barreiras e a minimizar o nervosismo e a ansie-
dade. Eu cresci em um município que produz café. Então
sempre falo sobre isso de alguma forma. “Aceita café?”.
“Aceito, claro, obrigada, minha cidade é um dos maiores
produtores de café do mundo, então não recuso um cafezinho”. É verdade, e uma forma de falar de trazer algo
ameno para a conversa.
Pergunte sobre a pessoa: Por favor, não seja “entrão”, mas
as pessoas gostam de falar sobre si. Se tiver oportunida-
de, pode perguntar coisas básicas, do tipo “você é daqui
mesmo?”, “como começou a trabalhar com isso?”, “tem
filhos?” etc. Coisas que você vai perguntar se já não souber
e se surgir oportunidade. Só vai perguntar se a pessoa tem
filhos caso haja uma brecha ou um sinal. Esteja atento ao
149
Como vender e realizar sua ideia
entorno, aos gestos. Esteja atento à pessoa à sua frente,
para ver o que pode ou não perguntar, o que é indelicado
ou não.
Seja solidário: As pessoas têm uma sobrecarga muito
grande de trabalho e metas altas e difíceis. Geralmente a
rotina é puxada. Então não se esqueça que aquela pessoa
que está diante de você escolheu dedicar uma parte do
seu precioso tempo para lhe receber. Mostre que você sabe
disso e agradeça. Algo do tipo: “Agradeço muito por me
receber, sei que sua vida é corrida, não sei como dá conta
de tanta demanda, então obrigada mesmo”.
Seja objetivo e rápido: Ser autêntico, aceitar o café, conver-
sar amenidades, perguntar sobre a pessoa. Isso tudo deve
ser rápido, uma palavra aqui, outra ali, para não ocupar
demasiado o tempo do interlocutor. Mostre que você se
preocupa com o tempo dele, que sabe o quanto vale e não
quer desperdiça-lo. E a melhor forma de fazer isso é reali-
zar uma apresentação rápida e objetiva. Poucos slides. O
restante do tempo, se houver e você conseguir, deixe para
a conversa e as perguntas (suas e do interlocutor).
Pergunte: Sua meta principal é descobrir o que a empre-
sa realmente quer e como isso pode se encaixar no seu
projeto ou no seu negócio. Então, pergunte sobre o que
a pessoa espera, o que precisa. Deixe claro que, só assim,
150
maria dolores
você terá meios para apresentar uma proposta adequada.
Eu sempre levo uma apresentação baseada no que pesqui-
sei, no que acho que possa interessar à empresa. No entanto, antes de apresentar eu explico. “Eu trouxe a proposta,
mas o ideal, para ajustar e trazer algo que realmente seja
efetivo para vocês, é saber qual é a demanda, se puderem
depois me passar mais algumas informações, eu ajustarei
a proposta para atender de forma adequada”.
Verba: A questão da verba é muito importante e a reunião é
a melhor ocasião para falar sobre isso. Eu costumo explicar
da seguinte forma, conforme já mencionei anteriormente,
“fizemos essa proposta baseada em um valor, mas seria
importante ter uma estimativa ou média de verba disponí-
vel para que possamos desenhar uma proposta mais real,
porque uma coisa é um projeto para uma verba de trezen-
tos mil reais, outra é um projeto para um milhão, os dois
serão excelentes, mas são projetos diferentes”. As pessoas
nas empresas estão cansadas de saber isso. Quando expli-
camos que precisamos de um indicativo de valor por esse
motivo, elas costumam entender e passar uma estimativa.
Se apenas perguntarmos qual a verba sem explicar a razão
da nossa pergunta, pode parecer especulação, curiosidade
e as pessoas podem resistir em abrir o valor.
Diga não ou peça um tempo: Jamais, em hipótese algu-
ma, responda sim a uma pergunta sobre a qual não tenha
certeza. Também já falamos sobre isso. Seja sobre valor ou
151
Como vender e realizar sua ideia
entrega. “É possível realizar o projeto com cem mil reais
em vez de duzentos?”. Se você já sabe a resposta, respon-
da: “não”, ou responda, “é possível se reduzirmos isso
ou aquilo”. “É possível ter a contrapartida tal?”. Se você
não sabe ou não tem certeza, peça um tempo. “Talvez seja
possível sim, mas preciso olhar com a equipe” ou “Acho
difícil, mas vamos estudar e retorno”. E, sim, você vai real-
mente estudar, avaliar e responder com propriedade se é
possível ou não e, quando necessário, explicar o porquê.
Escute com atenção e interesse: Passe a observar suas
conversas. Na maioria das vezes a gente escuta o outro já
pensando no que vamos responder ou no que falaremos
em seguida. Faça o seguinte exercício: escute, sem pensar
na resposta. Escute tentando realmente entender o que a
pessoa fala. Preste atenção não apenas nas palavras, mas
na pessoa. Nos gestos, nas expressões, na postura. Tudo
diz alguma coisa. Se você se esforçar para ouvir o que o
outro tem a dizer, duas coisas incríveis acontecem: 1) você
percebe coisas importantes que irão ajudá-lo a realmente compreender a mensagem, o que contribuirá para sua
apresentação e para proposta em si; 2) o interlocutor vai
sentir que você realmente está ouvindo, que está presente,
com interesse sincero. Isso quebra barreiras.
Seja gentil e agradeça: Mesmo se ouvir um não retum-
bante na reunião, agradeça. Afinal, a pessoa reservou uma
parte do tempo dela para receber e ouvir você. Aproveite
152
maria dolores
para deixar as portas abertas, estreitar os laços. De tempos
em tempos você pode mandar um alô, oferecer novas
propostas e, principalmente, reforçar que está à disposição.
Todas essas dicas acima só irão ajudar você se forem
seguidas de forma sincera. Não são técnicas para empregar de forma superficial. São ideias para absorver e colocar
em prática de coração aberto. Não há como criar empatia
de maneira forçada. Pode até funcionar por um momento,
mas a base é frágil. Não dura muito tempo. É preciso se
esforçar e praticar, é preciso realmente pensar no outro,
no tempo do outro, nos interesses e problemas do outro
e levar tudo isso em conta. Se ouvir um não, precisa estar
preparado para realmente sentir gratidão, apesar do não.
Gratidão pelo tempo que lhe foi dedicado e pela porta que
lhe foi aberta. É fundamental incorporar essa forma de
ver o mundo e as pessoas. O sucesso e os resultados virão
como consequência, mesmo que não de maneira imediata.
153
Como vender e realizar sua ideia
154
maria dolores
3a Parte
O que preciso para realizar
o meu projeto
155
Como vender e realizar sua ideia
156
maria dolores
Habilidades
(as que tenho e as que preciso desenvolver)
157
Como vender e realizar sua ideia
Transformar seu projeto em realidade dá trabalho.
Justamente por isso algumas pessoas conseguem realizar
seus sonhos e outras não. Talento faz diferença, sim. Sorte
também. Mas dedicação às questões fundamentais para
o sucesso do projeto tem mais peso na balança. Embora
as pessoas sejam diferentes e valorizar essa diferença seja
essencial, algumas habilidades facilitam o processo. Todos
nós temos habilidades
inatas e habilidades aprendi-
das, habilidades que deixamos de desenvolver, outras
que desenvolvemos e ainda as que nunca pensamos ser
capazes de ter, mas podemos aprender. Aprenda a usar
suas habilidades a seu favor. Para isso, primeiro faça um
mapeamento delas, separando em três grupos: Habilidades desenvolvidas, habilidades esquecidas e novas habilidades.
Habilidades desenvolvidas: É aquilo em que você é
melhor. São habilidades que você tem e desenvolveu
no decorrer da sua vida. Muitas vezes temos uma visão
distorcida de nós mesmos, mas, no fundo, sabemos em
que somos realmente bons e em que não somos. Escrita,
oratória, disciplina, gerenciamento, planejamento, nego-
ciação, liderança, compreensão, criatividade, paciência e
lealdade são algumas habilidades. Muitas se confundem
com características pessoais. A categoria Habilidades
Desenvolvidas reúne tudo em que você já é bom e tem
relativa facilidade. Habilidades mais específicas também
entram aqui. Dominar um determinado tipo de software,
158
maria dolores
pintura em aquarela, escultura em madeira, organização
de armário, limpeza de roupas, faxina, direção de veícu-
los, correr, realizar embaixadinhas, dançar, apontar lápis,
dobrar papéis. O leque é amplo. E tudo pode ser útil.
Para você dirigir bem um carro, por exemplo,
precisa ter noção de espaço, manter foco e atenção, precisa de bons reflexos, conhecimento do veículo, das regras
de trânsito e algum nível de controle emocional. Todas
essas habilidades são extremamente úteis para gerenciar
um momento de alta tensão. Suponhamos que você este-
ja realizando um festival de música. A última banda é a
mais esperada. Quinze minutos antes de subir ao palco
o artista começa a passar mal, sintomas de uma virose.
O que você faz? Algumas das habilidades para dirigir
um automóvel são necessárias para gerenciar uma crise
como essa e encontrar uma solução. Conseguir manter
foco e atenção, para não se deixar influenciar pelo entorno
(barulho do público, do show, nervosismo das equipes).
Precisa ter capacidade de responder rapidamente, que se
assemelha a ter bons reflexos. Precisa conhecer o “veícu-
lo”, que nada mais é que o seu projeto. Precisa conhecer
as regras, para saber o que pode ou não fazer. O que está
envolvido com os contratos do artista, patrocinador, local
de realização, fornecedores, público. É possível atrasar a
entrada do artista, para ver se ele melhora? Qual o limi-
te? O local contratado para o festival permite ir além do
horário contratado? A legislação do município permite? É
melhor explicar e chamar outro artista que já se apresen-
159
Como vender e realizar sua ideia
tou e ainda se encontra no local para tocar um pouco mais?
O que diz o contrato desse outro artista? Ou a solução é
explicar para todos a situação, pedir desculpas e não fazer
o último show nem colocar um substituto? Conhecendo
as regras, como as regras de trânsito, você sabe elencar as
alternativas. E, por fim, controle emocional é indispensá-
vel para uma situação como essa e todas as situações de
crise. Se você tem controle emocional no trânsito, use essa
habilidade a seu favor em seus projetos.
Faça uma relação de todas as suas habilidades já
desenvolvidas, todas mesmo. Pergunte às pessoas com
as quais convive em que você é bom, desde habilidades
bastante visíveis – como cantar – até outras mais difíceis
de identificar, como capacidade de aceitação. Com a lista
pronta, reflita sobre cada uma delas e as outras habilida-
des envolvidas, necessárias para que você faça aquilo bem
feito. Terminada a lista, você terá uma relação de habilida-
des que você já vem desenvolvendo ao longo da sua vida.
Elas são seu ponto forte. Apoie-se nelas para traçar suas
estratégias e ações e invista tempo para aperfeiçoá-las. Um
músico, por mais genial que seja, nunca para de praticar,
porque sempre há o que aprimorar e aprender. Um cien-
tista vencedor do prêmio Nobel continua a pesquisar e
estudar mesmo após o Prêmio, porque o aprendizado não
termina ali. Ciente das suas habilidades, continue a desenvolvê-las, agora com consciência.
Habilidades esquecidas: Dos cinco aos quinze anos eu fiz
160
maria dolores
ginástica artística, que, na época, era chamada de ginástica
olímpica. Eu queria ser a romena Nádia Comaneci, que fez
história na ginástica ao tirar dez em todas as suas provas
durante uma Olimpíada. No entanto, logo eu percebi que
jamais seria a Nádia Comaneci. Eu era alta e desajeitada
para o esporte. Mas, os dez anos de prática deixaram algu-
mas habilidades esquecidas, que, depois de adulta resga-
tei, na figura da estrela. Um movimento simples, que as
crianças aprendem na escola, mas poucos adultos realizam. No carnaval, quando o bloco tradicional da minha
família vai para o desfile na rua, vou na frente virando
estrelas. É meu momento de glória. Às vezes, com meus
filhos, eu viro uma estrela e, literalmente, viro uma estrela
por alguns minutos, ainda mais se estiverem juntos cole-
guinhas da escola. O que isso pode ajudar no meu trabalho? Diretamente nada, mas me dá confiança, sei que sou
capaz e quando nos sentimos capazes em algo esse sentimento acaba influenciando outras áreas da vida.
Durante a faculdade de jornalismo, nas férias e nas
greves eu estagiava na rádio da minha cidade. Tanto na
redação quanto na locução. Apresentava jornais, fazia
entrevistas e cheguei a apresentar um programa de varie-
dades para o público feminino. No dia do atentado de 11
de setembro, nos Estados Unidos, descobri um conhecido
que trabalhava ao lado das torres gêmeas e fiz uma longa
entrevista com ele ao vivo, enquanto o mundo ainda não
entendia o que havia acontecido. Foi um grande momento
da rádio local. Terminados a faculdade e o estágio, as habi-
161
Como vender e realizar sua ideia
lidades que aprendi na rádio ficaram de lado. Até come-
çar a promover eventos. Com equipes enxutas e recursos
escassos, em vez de contratar alguém para gravar ou fazer
a locução da apresentação dos espetáculos, eu mesma
fazia. Resgatei uma habilidade esquecida. Com os eventos
cada vez maiores, passamos a contratar apresentadores,
mas ainda hoje eu gravo áudios e locuções quando precisamos. Uma vez, estávamos no Teatro Alterosa em Belo
Horizonte, para a apresentação da peça “Mãe de Dois”,
baseada em meu livro de mesmo nome. Lá, a locução de
apresentação não era feita em off, no microfone na coxia.
Você precisava ir até a rádio Guarani, do mesmo grupo
e no mesmo prédio, e gravar o áudio para soltar quando
fosse o momento. Então, fui até lá e gravei. O diretor da
rádio adorou minha voz e minha locução. Me convidou
para trabalhar lá, pois estavam precisando de vozes femininas. Se não morasse em São Paulo teria aceitado, pois
trabalhar em rádio é realmente divertido. A prática no
rádio também me ajudou a desenvolver a fala em público
e a comunicação, algo extremamente necessário no meu
dia a dia profissional.
Desenvolvemos várias habilidades ao longo da
vida, que vamos abandonando pelo caminho. Esquecidas,
mas não desaprendidas. Faça uma segunda lista de todas
as habilidades que você desenvolveu em algum momento,
veja os pontos fortes delas e o que pode resgatar e aplicar
no seu dia a dia para ajudar você a realizar seus proje-
tos, desde a concepção até a venda e execução. Você vai
162
maria dolores
se surpreender com quantas coisas é capaz de fazer com
qualidade.
Novas habilidades: Quando me formei na faculdade,
voltei a morar em Três Pontas. Na verdade, não deixei
de morar totalmente em Três Pontas durante a faculdade. Com longas greves todos os anos passei boa parte do
tempo no interior. Além disso, minha turma foi a primeira
da universidade a testar a flexibilização curricular. Então,
nos dois últimos anos juntei todas as minhas aulas entre
terça e quinta e passava metade da semana em Belo Hori-
zonte, metade em Três Pontas. Ao concluir a graduação,
voltei de vez e arrumei um trabalho no jornal da Cooperativa de Cafeicultores. Escrevia matérias sobre agricultura
e, uma vez por mês, um perfil de um personagem interes-
sante para a coluna chamada Gente da Terra. Um desses
perfis, sobre um sapateiro antigo, me rendeu um prêmio de
uma associação de cooperativas e uma máquina fotográ-
fica profissional. Numa tarde de terça-feira fui ao Centro
Cultural Milton Nascimento, único teatro da cidade,
cobrir um evento para os cooperados. Depois de palestras
técnicas e demonstrativos da cooperativa, um palestran-
te motivacional subiu ao palco. Não era uma missão fácil
motivar o empreendedorismo na plateia composta por
uma mulher – a única que, na época, cuidava da fazenda
da família e participava ativamente como cafeicultora - e
duzentos e cinquenta homens de meia idade para cima,
criados nos costumes de fazer tudo igual sempre foi. A
163
Como vender e realizar sua ideia
propensão para coisas novas era restrita, o que valorizava
ainda mais a iniciativa da Cooperativa, que começava a
dar sinais de uma busca pela modernização. O palestrante
não se intimidou pelo público pouco receptivo. Deu o seu
show e, já no início, eu me senti contagiada por aquele
entusiasmo, aquelas oportunidades que, segundo ele, a
vida nos dava, só dependia de nós sabermos aproveitá-las.
Confesso, sou uma pessoa que adora palestras, seja
do que for, e me deixo contagiar facilmente pela explana-
ção. Lá pelo meio da apresentação o palestrante disse que
o que faltava para empreender, para realizar o sonho, era
basicamente ter coragem para se expor, para enfrentar os
desafios e os medos. “Eu sei que você, empreendedor, está
aí na plateia. Você vai conquistar tudo o que quiser, você é
capaz”, ele dizia. “Então eu quero que você venha ao palco
aqui, agora, você que vai realizar todos os seus sonhos”.
Ninguém na plateia se mexeu. Aquelas muitas cabeças
brancas sequer se moveram, fosse de preguiça, espanto,
animação ou tédio. Era um público respeitoso, ficaria até o
fim, mesmo não entendo o porquê daquela palestra alvoroçada. Nessa altura eu já estava totalmente empolgada,
pensando em tudo o que faria ainda da minha vida. Eu
estava ali a trabalho. A palestra não era para mim. Mas, ao
ver que realmente ninguém levantaria a mão, eu pensei:
“eu sou capaz, eu vou realizar os meus sonhos” e, mesmo
morta de vergonha, levantei a mão. “Se eu fizer isso, posso
fazer qualquer coisa”, disse para mim mesma. E realmente
foi uma prova. Pior do que eu esperava. O mico que eu
164
maria dolores
pagaria no palco me mostraria que posso, sim, fazer qual-
quer coisa, mesmo que seja pagar micos e, ainda assim,
sobreviver.
Já no palco, olhando para aqueles rostos curiosos e
confusos, eu me arrependi. Mas não tinha como desistir. Os
diretores da cooperativa me olhavam sem entender muito
bem. Por sorte eu era uma pessoa querida no trabalho. O
desafio do palestrante não podia ter sido mais bobo, feito
exclusivamente para a pessoa passar vergonha. Ele disse:
“Vou colocar uma música e você tem que fazer uma coreografia”. O quê? Eu pensei. Ciente da minha falta de ritmo
e do meu desajeito, eu sabia que a única saída honrosa era
fugir, desmaiar ou levar na brincadeira. Então, começou
a tocar “YMCA”, do grupo Village People, que sempre
tocava em algum momento das festas de casamento. Era
a coroação do mico. Pelo menos eu sabia os passinhos e,
com as pernas tremendo e o rosto quente – provavelmen-
te vermelho – dancei. Não perdi o trabalho, e isso já foi
muito. Mas foi mais do que isso. Ao atender ao chamado
do palestrante e me dispor a pagar o mico, eu trabalhei no
desenvolvimento de uma nova habilidade, que me seria
muito útil para vendas, e útil em qualquer projeto: não ter
medo de errar, não ter medo de me expor, de tentar, de
fracassar. Para colocar um projeto em prática, para realizar
os sonhos, essa é uma habilidade essencial e que qualquer
pessoa pode desenvolver. Não há uma regra acabada de
quais habilidades são necessárias para empreender, para
transformar um projeto em realidade, então vou comparti-
165
Como vender e realizar sua ideia
lhar com vocês as habilidades que eu, na minha trajetória,
precisei desenvolver, resgatar ou aprimorar. Não são um
guia, mas um ponto de partida para que você descubra as
que serão úteis a você. Trago aqui habilidades pontuais
e técnicas e habilidades de comportamento ou enfrentamento da realidade. São elas:
Planilhas: você pode não gostar nem ser bom em núme-
ros, mas é indispensável saber trabalhar com planilhas.
Para montar orçamentos, cronogramas e realizar o contro-
le do projeto. Você pode fazer um curso básico ou aprender por si próprio, mas as chances de progredir sem lidar
com uma planilha são raras. Você pode dizer: “Ah, mas eu
contrato quem saiba”. Ok, você até pode e deve contratar
quem saiba melhor que você, mas se você não souber o
básico, como fará o controle? Na minha terra dizem “O
olho do dono é que engorda o gado”. Lembre-se que o
projeto é seu. Mesmo que você queira se dedicar à parte
artística ou criativa, precisa saber como anda o restante.
Um projeto é um todo. Se uma das áreas não funciona
acaba comprometendo o restante. Você até pode alcançar
reconhecimento e algum tipo de sucesso, mas em termos
financeiros e práticos, sua vida pode se transformar em
um caos, um redemoinho do qual ficará cada vez mais
difícil escapar.
Gestão: no mesmo sentido das planilhas, é necessário
entender de gestão. Se você não entende ou não quer fazer
166
maria dolores
gestão, é preferível procurar um emprego ou um trabalho
em projetos de terceiros. Não que isso seja ruim, depende
do perfil de cada um. Você pode ter uma carreira brilhante
e realizar muitos dos seus sonhos em projetos de terceiros
ou num emprego. Mas, se você quer realizar o seu projeto,
quer empreender e transformar suas ideias em negócio,
não tem como não aprender a fazer gestão. Nós, da área
cultural, temos uma certa resistência. Dizemos a mesma
coisa das planilhas “Sou da área criativa, contrato alguém
para fazer isso”. Mais uma vez: se você não souber, não
entender como funciona e o que precisa ser feito, seu
negócio tem grande possibilidade de desandar. Existem
diversos cursos, palestras e assessorias gratuitas ou a
preço baixo oferecidos pelo Sebrae, por exemplo. Eu fiz
vários cursos desse tipo. Se você quiser e puder fazer uma
especialização, MBA ou algo semelhante, ótimo, mas os
cursos do Sebrae oferecem os caminhos e princípios que
ajudam. Não estou fazendo propaganda, mas temos que
falar do que funciona, não é verdade?
Imagens: Não é preciso procurar um curso, a não ser que
queira se especializar na área. Mas é fundamental saber o
que é uma boa imagem. Você pode pesquisar na internet
e aprender as características para uma imagem boa, que
cause impacto e seja profissional. Digo isso, porque muita
gente utiliza em seus projetos imagens ruins, distorcidas,
desfocadas, com enquadramento ruim, em baixa resolução, em contraluz. A imagem, seja da sua apresentação
167
Como vender e realizar sua ideia
de vendas ou de divulgação do seu projeto, deve causar
impacto. Além disso, não pode causar desconforto ao
público nem espantá-lo. A imagem deve estar legível, inteligível e com boa qualidade. É o mínimo.
Design: Um diretor de arte custa caro, você precisará
contratar algum em um momento, pois faz uma diferença
gigantesca em um projeto. Mas, no dia a dia, para as coisas
que acontecem durante o processo de venda ou mesmo
de divulgação da sua imagem pessoal no trabalho ou da
sua empresa, você mesmo pode resolver as demandas, tal
qual expliquei sobre os projetos visuais de venda, que eu
mesma crio aqui na Marolo. Existem vários programas e
plataformas
autoexplicativos que ajudam e podem ser
utilizados. Faça um curso ou aprenda na tentativa e erro,
experimentando, se arriscando. Ao adquirir esse conheci-
mento, quando você contratar um excelente designer para
seu projeto ou sua empresa, você saberá o que quer, o que
não quer e o que atende ou não aos seus objetivos.
Texto: Por amor à língua portuguesa, aprenda a escrever
um texto correto. Texto não quer dizer só um livro, uma
carta ou um artigo. Um e-mail curto é um texto. Acredito piamente que todo mundo deveria fazer um curso de
Português ou redação após concluir a faculdade, o curso
técnico ou o ensino médio. Procure ler, um pouco que seja,
todos os dias, para exercitar o contato com as palavras. E,
por favor, faça uso dos corretores ortográficos e gramati-
168
maria dolores
cais dos programas de escrita.
Oratória: Se você não souber falar em público, mesmo
para um pequeno público – como é o caso das reuniões –
enfrentará grandes dificuldades. Não existe outra forma
de aprender, a não ser falando. Quando tiver uma reunião,
treine a apresentação antes. Apresente para algum fami-
liar ou amigo. Para uma, duas pessoas. Treine sozinho,
repasse. Pense nos problemas do projeto – todos tem seus
pontos fracos -, nas dúvidas que podem surgir, antecipe. Prepare-se. Com o passar do tempo você vai ganhar
confiança e ritmo de jogo. Também existem cursos que
podem ajudar. Existem cursos para tudo, mas estamos
considerando que você está no início dessa jornada e
ainda não tem recursos sobrando para investir em cursos,
então comece treinando com as pessoas à sua volta. Peça o
feedback e aceite as críticas com gratidão, não com raiva.
Todas as críticas ajudam no processo. As que realmente
tem objetivo de nos ajudar a melhorar e as críticas gratuitas, que tem objetivo de nos rebaixar. “Como uma crítica
gratuita e maldosa pode me ajudar?”, talvez você esteja
perguntando. A resposta é simples: sempre enfrentaremos
críticas sem fundamento, maldosas. Então, é importante
aprendermos a lidar com elas e não nos deixarmos abater.
Por isso, saber enfrentar uma crítica, analisar para saber se
é fundamentada ou não e tirar o melhor proveito é fundamental.
169
Como vender e realizar sua ideia
Confiança: Lembra do meu mico no palco dançando YMCA
para os agricultores? Serviu para me ajudar a desenvol-
ver confiança, além de fortalecer a minha fama de não ser
muito boa da cabeça. Todos nós temos confiança em nós
mesmos em algum nível. Alguns, pouca confiança, outros
demais. Os dois extremos prejudicam a realização de um
projeto. Pouca confiança trava o processo, traz inseguran-
ça, desestimula a tentar ou ir atrás. Muita confiança costuma tirar os pés do chão, leva a pessoa a se arriscar demais
e levar um tombo talvez grande demais, além de passar
uma imagem um tanto quanto antipática e arrogante. O
ideal é encontrar o meio termo, aquele que nos permite
acreditar em nós mesmos para conseguir o que queremos,
mas sabendo que precisamos nos esforçar, que precisamos
de outras pessoas e que o trabalho é árduo (embora possa
– e deva – ser divertido). Uma das maneiras para desenvolver confiança é se conhecer melhor, saber os seus pontos
fortes e apostar neles, os pontos fracos e focar neles a fim
de aprimorá-los. Para ajudar, pense em algo que você fez
e foi muito difícil. Relembrar esse sentimento de supera-
ção ajuda bastante. Nosso filho do meio tinha muito medo
de cachorro, na verdade tinha pânico, desde bebê. Com
o passar dos anos e muito esforço, ele superou o medo, a
ponto de, aos dez anos, entrar num canil com vinte cachor-
ros. Quando esse meu filho vem falar comigo preocupado
com alguma coisa, com medo de fazer algo, de não conseguir, eu o lembro: “Filho, você superou um medo gigante,
que era seu medo de cachorro. Lembra? Se você conseguiu
170
maria dolores
superar isso, você consegue fazer qualquer coisa”. Temos
que descobrir onde está a nossa força e nos apegarmos a ela.
Criatividade: Deveria ser a regra, mas nem sempre é. Se
você vai trabalhar com um projeto de economia criativa,
cultura, inovação, é preciso ter criatividade. Não só para
essas áreas, mas para qualquer uma. Criatividade não tem
a ver apenas com arte ou cultura. É preciso criatividade
para solucionar problemas e encontrar novos caminhos.
Criatividade tem a ver com uma forma de ver e estar no
mundo. E, num mundo com tanta oferta de tudo, a criatividade é um diferencial importante. “Eu sou de exatas,
não sou criativo”. Não se preocupe. Criatividade se apren-
de, assim como tudo. Eu nunca serei um Pelé ou uma Elis
Regina, mas posso aprender a jogar futebol e a cantar, se
me dedicar e praticar. Com a criatividade é a mesma coisa.
Todas as crianças usam a criatividade, ou seja, todos nós
nascemos com enorme potencial criativo. À medida que
crescemos, vamos sendo podados – e vamos podando
nossos filhos. A Revolução Industrial no século XIX trouxe
avanços no mundo, mas trouxe alguns entraves também.
O sistema de educação – que permanece até hoje – passou
a se valer do sistema de linha de produção trazido pela
Revolução Industrial. As peças (conteúdo) são postas
na esteira e os operários (alunos) montam os equipa-
mentos encaixando as peças umas nas outras conforme
a regra. Esse sistema foi fundamental para o ensino em
larga escala, mas há algum tempo já tem sido repensado,
171
Como vender e realizar sua ideia
pois mina absurdamente a criatividade. Somos educados
para encontrar as respostas “certas”, ou seja, esperadas.
Enquanto deveríamos ser educados para buscar a respos-
ta, independentemente de ser a esperada ou não. Na vida
adulta replicamos o modelo: estamos sempre tentando dar
as respostas esperadas. Temos medo de errar e fracassar,
porque o erro e o fracasso são vistos como deméritos. E
não são. São parte do processo. Quantas ideias deixamos
de dar em uma reunião por medo do ridículo? Medo de
sermos criticados ou passarmos vergonha? É difícil desa-
prender e reaprender, mas temos capacidade para isso, se
nos esforçarmos. Há vários artigos e livros sobre o tema,
procure se informar melhor. Lembre-se que a criatividade
é um ponto chave no seu trabalho e na sua vida. Aqui vão
apenas algumas dicas. Mas, mais uma vez, esse livro é só
um ponto de partida baseado na minha experiência particular e pessoal. Você pode, e deve, se aprofundar no que
achar melhor para a sua realidade.
Um bom treinamento, por exemplo, é deixar o celu-
lar de lado quando estiver na rua, numa fila ou sala de
espera e observar. Observar o entorno. Prestar atenção nas
cores, nos cheiros, na temperatura e nos sons. Observar o
mundo traz grandes insights. É um estímulo incrível para
a criatividade. Faça o exercício algum dia. Saia por aí sem
o celular. Observe. Depois anote tudo o que você obser-
vou. Não só pela visão, mas pelos outros sentidos: olfato,
tato, audição, paladar. Repare nas pessoas, nos cenários e
nas situações. Talvez o caminho para a solução que você
172
maria dolores
precisa esteja ali. Isso já aconteceu comigo muitas vezes.
Não fazer nada, não pensar em nada e relaxar ajuda a
resgatar o potencial criativo. Mas é fazer nada mesmo,
é observar. Porque se você estiver conectando a mente a
um estímulo, o exercício não vai adiantar. Nem música no
fone de ouvido pode entrar nesse exercício. Na contramão,
você também pode estimular o seu potencial criativo com
referências criativas. Ler um livro, assistir a um filme, ir a
um museu, ouvir uma música. Se não pode ir presencialmente a um local de criatividade, cultura e inovação, vale
ir virtualmente. Interagir com a cultura, a arte e a inova-
ção ampliam o repertório e nos traz inspiração, mesmo
que o tema do filme você for assistir não tenha nenhuma
relação com o seu negócio ou projeto. No entanto, não se
limite ao papel receptivo. Seja ativo. Tente desenhar, colorir, recortar, dançar. O exercício aqui não é se tornar um
Pablo Picasso. É apenas exercitar e experimentar. Deixar a
criatividade sair sem medo do ridículo. Leia uma história
para uma criança. Brinque. São pequenas coisas que pare-
cem bobagens, mas atividades lúdicas ajudam a despertar o seu lado criativo. Para isso, você precisa se livrar da
vergonha. Nós costumamos ter vergonha de brincar. Se
você desenhava um boneco quando era criança, ou uma
flor, ou o que quer que fosse, tente repetir aquele dese-
nho, como criança mesmo. Eu gostava de desenhar um
surfista e um barril em uma onda no mar. Fiz muitas vezes
o mesmo desenho quando estava no grupo escolar (hoje
ensino fundamental), colorindo de lápis de cor, contornan-
173
Como vender e realizar sua ideia
do o mar de azul escuro, preenchendo com azul claro. Um
traço infantil, mas que gosto de repetir, toda vez que me
sento com meus filhos para desenhar. Se não tem crian-
ça em casa, desenhe sozinho, para você mesmo. Explore,
experimente, libere. A criatividade irá para um outro patamar e, pouco a pouco, fará parte do seu dia a dia.
Compreensão do todo: Algo indispensável a quem quer
realizar um projeto, ou ter um negócio, é uma visão geral.
Aquela capacidade de compreender o todo. Algumas
pessoas são melhores para enxergar e focar nos detalhes,
outras são melhores para compreender o todo. Se você
quiser realizar um projeto seu, ou um negócio, por mais
que seu perfil seja de se ater aos detalhes e à parte em
vez do todo, precisa exercitar e desenvolver a capacidade
de olhar para o projeto como um todo. Essa visão geral
é essencial para que você possa tomar decisões. Saber
se, num projeto de um festival de música, por exemplo,
vale mais a pena reduzir o número de bandas de seis para
cinco para que uma das bandas seja de um cachê maior ou
manter seis bandas sem investir num cachê mais alto. Se,
em um projeto de livro, é preferível ter menos exemplares,
em cor e papel com gramatura maior ou mais exempla-
res em preto e branco e gramatura menor. Se vale a pena
investir em um evento de lançamento ou só divulgação
em mídia. Se vale a pena contratar um determinado profissional para uma função ou se vocês podem absorver essa
função na equipe existente. Sem a visão do todo, fica difícil
174
maria dolores
tomar essas decisões de forma a obter o melhor resultado
possível.
Persistência: Sem persistência, os projetos, negócios e
ideias morrem no meio do caminho – ou até no início do
caminho. Hoje queremos tudo rápido, inclusive realizar o
projeto e colher os resultados. Mas o caminho para uma
carreira e um negócio bem-sucedidos geralmente costu-
ma ser mais lento do que desejaríamos. Por mais que
estejamos vivendo num mundo acelerado, as coisas têm
seu próprio tempo. Você precisa desenvolver sua ideia,
detalhar, fazer orçamentos, cronograma, traçar um plano
de ação e ir atrás dos recursos para, finalmente, executar.
Esse processo não acontece da noite para o dia. O ideal,
para um projeto cultural, por exemplo, é começar a traba-
lhar, no mínimo, um ano antes do esperado para o início
da pré-produção. Se quero realizar um evento de Natal,
preciso começar a trabalhar, ao menos, em novembro do
ano anterior. Isso para projetos mais simples. Os mais
complexos demandam mais tempo, mesmo que você
consiga realizar antes do esperado. E a venda, sim, exige
muita persistência. Porque você vai receber muitos nãos.
Mais nãos do que sins. E isso nos leva à última habilidade
que vou abordar aqui, a resiliência.
Resiliência: Não estamos acostumados com a frustração. E, como ela sempre vem em algum momento, tem
o potencial de nos derrubar. Muita gente desiste depois
175
Como vender e realizar sua ideia
de uma frustração. Ou leva o não para o lado pessoal e
passa a cultivar ressentimento pelo não recebido, pelo que
não deu certo. Ressentimentos em relação aos outros, ao
mundo ou a si mesmo. Como já vimos, temos que deixar
as portas abertas e aprender com as vivências. Não deu
certo agora, tudo bem, uma hora vai dar, vamos ver o que
é preciso ajustar, pois sempre há o que ajustar. Talvez tenha
que buscar outro tipo de investidor, público, projeto ou
negócio. Talvez tenha que me capacitar mais, aprimorar
e desenvolver outras habilidades. Talvez seja necessário
fazer uma mudança radical. Ou talvez tenha só que continuar, persistir e acreditar. O principal é não desistir nem se
deixar desanimar. Faça planos e metas para curto, médio
e longo prazo. Isso ajuda a não desistir. Receber um não
após a apresentação de um projeto a uma empresa está
nas metas de curto prazo, não influenciam a meta de longo
prazo que é realizar o projeto. Ter ciência disso ajuda a
aceitar aquele não como parte do processo e persistir. Se
você só tem objetivos de curto prazo, as chances de as
ideias morrerem no início são grandes. Mas, atenção: é
preciso ter metas de curto e médio prazo também, que são
justamente o passo a passo do que você precisa fazer para
alcançar seu objetivo a longo prazo. Comece escrevendo
a meta de longo prazo, que, em relação a um projeto, é o
tempo para a sua realização. Um ano, dois, cinco. Mesmo
que a meta de longo prazo do seu projeto seja de um ano,
pense no seu negócio de forma mais ampla, envolvendo
não só um projeto específico, mas um empreendimento.
176
maria dolores
Trace metas para cinco e dez anos também. Em seguida faça
a relação das metas de curto e médio prazo para alcançar a
sua meta final, tanto para o projeto quanto para o negócio
como um todo. Claro que todo planejamento precisa ser
flexível – e falaremos sobre planejamento a seguir – mas se
você não tiver esse passo a passo, mesmo que vá ajustando
pelo caminho, fica muito difícil seguir adiante e fica mais
fácil desabar com as frustrações que, certamente, surgi-
rão. Quando a gente enxerga esses pequenos passos como
parte de uma vida que é muito mais do que isso e como
parte de objetivos a longo prazo, é mais fácil se recuperar
de uma frustração e ter resiliência.
177
Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
Planejamento
179
Como vender e realizar sua ideia
Na maioria dos projetos que não acontecem ou
dão errado, um dos principais vilões é o erro ou falta de
planejamento. Planejamento em todas as etapas. O planejamento deve estar presente não apenas no cronograma
de execução do projeto em si, mas em todo o processo e
em todas as esferas. Levar um projeto adiante baseando-
-se na intuição é um passo em direção a problemas. Nosso
primeiro grande projeto, o Festival Música do Mundo, foi
feito sem planejamento correto, por inexperiência. Entre-
tanto, inexperiência não é desculpa. Nós poderíamos ter
estudado mais, buscado mais informações e planejado
melhor. Fizemos no impulso, na ânsia de realizar e de
colocar aquela linda ideia em prática. O resultado artístico
foi superpositivo. O resultado financeiro foi um desastre.
Levamos dez anos para pagar todas as dívidas e prejuízos.
Talvez nunca tivéssemos conseguido nos recuperar, talvez
tivéssemos desistido de trabalhar com cultura, projetos e
eventos. Quando me perguntam se eu faria tudo de novo,
porque, no final das contas, foi a partir do Festival Música do Mundo que entramos no universo da produção
cultural, eu respondo que não, claro que não faria tudo de
novo. Faria melhor. Poderia ter feito um lindo evento, sem
prejuízo e com remuneração justa.
Quando falamos em planejamento, no entanto,
parece algo muito amplo e pouco palpável. Está certo,
é preciso planejar. Mas, como e por onde começar? Para
ajudar no planejamento do seu projeto, vou apresentar
como colocá-lo em prática em diferentes áreas. São apenas
180
maria dolores
alguns exemplos para ajudar você a compreender a impor-
tância do planejamento, mas você mesmo vai saber como
deve ser aplicado para o seu tipo de projeto. Cada caso é
um caso. De todo modo, exemplos nos ajudam a termos
uma ideia de caminhos por onde seguir.
Cronograma: a primeira coisa a se planejar é o cronograma. Já falamos sobre isso, de como é importante ter um
cronograma factível quando for oferecer o projeto ao
patrocinador ou investidor, para saber se existe possibili-
dade para negociar datas e prazos de realização e entrega
ou não. O cronograma, no entanto, é importante não só por
causa da sua negociação em busca de recurso, é importante por tudo. Se você não fizer um cronograma bem-feito,
terá surpresas ruins e prejuízos. Você deve saber quanto
tempo precisa da pré-produção até o projeto estar na rua,
e também quanto tempo precisa para a pós-produção, que
é algo que a gente às vezes esquece. Ainda em relação ao
Festival Música do Mundo até que nos saímos bem no
planejamento do cronograma da pré à produção. Quando o evento terminou, meu sócio e marido Felipe e minha
mãe, Cíntia, estavam no local do evento, já vazio, e ficaram
olhando um para o outro. E agora? Havia tendas, computadores, equipamentos, materiais de palco etc. Exaustos
e sem dormir, os dois saíram em busca de carregadores,
seguranças e pessoas para ajudar. Não é uma mão de obra
que se encontre fácil e disponível por aí, ainda mais numa
cidade pequena do interior. Às sete da manhã, trabalhado-
181
Como vender e realizar sua ideia
res de uma fábrica próxima saíram do turno. Então, minha
mãe e o Felipe foram até os trabalhadores e propuseram
o negócio: ajudar a carregar materiais para lá e para cá.
Toparam. Não resolveu a situação, mas amenizou, por um
preço maior e que, simplesmente, inexistia no orçamen-
to previsto. Então, jamais inicie-se na deliciosa aventura
de colocar um projeto em prática sem antes trabalhar no
cronograma de ponta a ponta.
A melhor forma para evitar e minimizar os erros
é fazer um cronograma de frente para trás, conforme já
vimos. A data a ser projetada, para desenhar seu cronogra-
ma, é a data do evento ou data do lançamento do produ-
to. Já traçamos esse percurso com o lançamento de um
livro, quando falamos deste assunto anteriormente. Agora
vamos ao exercício de montar um cronograma para um
festival de música com duração de um dia.
Data do evento: 30 de outubro.
Prestação de contas e pós-produção:
30/10 até 30/11, considerando um mês.
Para os shows acontecerem em 30/10, a passagem de som
precisa acontecer em 29/10.
182
maria dolores
Para a passagem de som acontecer em 29/10, palco, som,
luz e estrutura de camarins precisam estar montados até
28/10.
Para som e luz serem montados dia 28/10, o palco precisa
estar pronto até 27/10.
Para o palco estar montado até 27/10, no caso de um palco
grande como o do nosso festival, é necessário começar a
montar o palco em 22/10, quando também já pode ser
iniciada a montagem da estrutura de camarins, pórticos
etc.
Ou seja, para que o festival aconteça em 30/10, a
montagem deve ser iniciada em 22/10. Essa informação é
fundamental não só para que o evento aconteça no prazo e
com a qualidade esperada, como para projetar o orçamen-
to corretamente. Uma coisa é locar um espaço para um
dia de evento, outra é locar para um dia de evento e sete
dias de montagem, mais alguns de desmontagem. Aliás,
assim que você terminar esse cronograma de frente para
trás, vá até o dia do evento ou lançamento do produto e
faça o cronograma detalhado de pós-produção. Por exemplo, uma estrutura como esta leva cerca de cinco dias para
ser desmontada. Então é necessário incluir cinco dias de
desmontagem. Na pós-produção também entram conso-
lidação de clipping, mensuração de clipping, elaboração
183
Como vender e realizar sua ideia
de relatórios de prestação de contas, vídeos e materiais de
pós-evento. Inclua tudo isso no seu cronograma.
Já falamos sobre a montagem do evento em si. Mas,
para poder montar o evento e realizá-lo dia 30 de outubro os contratos com a maioria das bandas têm que estar
fechados seis meses antes. Por que tanto tempo? Para você
conseguir bons artistas para seu projeto, para comprar
passagens aéreas por um preço razoável e garantir hospedagem a preço razoável. Quando você contrata logística
com antecedência, uma passagem aérea nacional pode sair
a 250 reais, se for em cima da hora, pode chegar a 3 mil
reais. Aqui, outra dica importante para controlar os custos.
Já tivemos muitos prejuízos e gastos extras com a troca
de passagens de artistas e suas equipes. Há alguns anos
incluímos uma cláusula no contrato, uma ideia, aliás, da
Flávia Gomes, nossa prima e produtora responsável pela
logística, entre outras coisas. Uma vez dado o ok do artista para aquela passagem aérea, se ele ou alguém da sua
equipe quiser trocar, deve arcar com os custos da troca. Se
não fizermos isso, cada dia aparece um pedido de troca,
pois surgem outros trabalhos para o artista no decorrer do
tempo. Antes a banda sairia do Rio de Janeiro para São
Paulo, mas apareceu um show e agora precisam mudar
quatorze passagens para sair de Recife para São Paulo. É
um custo não previsto enorme. Se essa combinação estiver
no contrato, você minimiza muitos gastos extras.
Para começar a contratar as bandas seis meses antes,
o recurso deve estar fechado até 30 de abril.
184
maria dolores
Para estar com o contrato de patrocínio ou investi-
mento assinado até 30 de abril, você deve ter começado a
venda do seu projeto em, pelo menos, agosto do ano anterior.
Para começar a venda do projeto em agosto do ano
anterior, o projeto deve estar formatado e desenhado.
Resumindo, para realizar um festival de música de
médio a grande porte em outubro de 2023, será necessário
começar a trabalhar nele, pelo menos, em maio de 2022.
Esse é um cronograma viável, embora, dependendo do
tamanho do Festival seja necessário começar antes.
assim:
No caso desse projeto, o cronograma geral ficaria
185
Como vender e realizar sua ideia
186
maria dolores
Esse foi apenas um exemplo, um exercício de como
deve ser pensado e montado um cronograma factível.
Como você viu, planejamento é fundamental. Além da
noção temporal, o cronograma é uma ferramenta que
ajuda a dimensionar tudo o que será necessário para a
execução do projeto. Com o cronograma em mãos, fica
mais real dimensionar o tamanho da equipe, as funções
que precisam ser exercidas, as demandas de contratação.
Para dimensionar tudo isso, basta você fazer uma pergun-
ta para cada item do cronograma: “Para que isso aconteça,
o que eu preciso providenciar ou contratar?”. Não tenha
preguiça, este é o seu negócio. Destrinche item a item do
cronograma tendo esta pergunta em mente. O que é neces-
sário providenciar para que o palco esteja montado? O que
preciso contratar? Que tipo de palco? O palco se monta
sozinho? Precisa de equipe técnica? Carregadores? Ele se
limpa sozinho? Precisa de limpeza? Precisa de seguran-
ça? Como é o espaço onde o palco ficará? É cercado? É
na rua? É necessária alguma autorização da administração pública? Enfim, são muitas perguntas que desdobram
desta pergunta inicial. Então, não deixe de questionar a
cada item: “Para que isso aconteça, o que eu preciso providenciar ou contratar?”.
Tempos e Movimentos: Poderia entrar em cronograma, mas como é algo bem pontual e específico, o melhor
é trabalhar Tempos e Movimentos de forma separada.
Mesmo porque, você não vai desenvolver seu cronograma
187
Como vender e realizar sua ideia
de Tempos e Movimentos um ano e meio antes do evento
ou lançamento do produto, pois não terá ainda as informações necessárias. Tempos e Movimentos é uma planilha
na qual você detalha, hora a hora, tudo o que vai acontecer
durante a montagem, execução e desmontagem do evento, seja um Festival, um espetáculo ou um lançamento de
um livro ou produto. Já aconteceu de você estar a poucos
minutos do evento começar e perceber ter esquecido alguma coisa? Pense em um evento particular. Uma festa de
aniversário. Faltando meia hora você lembra que esque-
ceu de buscar o bolo, ou esqueceu de comprar a vela, ou
esqueceu de papel higiênico e guardanapo?
Minha mãe sempre fazia lindas decorações para
meus aniversários. Ela, meus avós, tios, tias e tias passavam dias confeccionando os enfeites. Meu aniversário de
oito anos foi do tema “Fundo do Mar”, com cavalos marinhos de papel crepom, peixes em balões, cartolinas, painéis
e celofane. Tudo lindo, até que os convidados começaram
a chegar. Chegaram os parentes e os adultos, mas, nada
das crianças. Eu havia esquecido de chamar meus colegas
de escola, minha mãe também havia se esquecido daquele
insignificante detalhe. Só não foi uma tragédia completa
porque era uma cidade pequena e eu e minha madrinha
saímos com minha melhor amiga e fomos nas casas dos
meus colegas carregá-los para a festa, alguns de pijama.
Se você não tiver um cronograma detalhado de tudo o que
precisa fazer, receber e checar na montagem, execução e
desmontagem, pode acabar se esquecendo do principal.
188
maria dolores
Mas, em vez de falar e falar, acho mais produtivo demons-
trar com um exemplo real. A planilha de Tempos e Movimentos abaixo foi utilizada em um dos nossos Festivais
de música. Na nossa equipe, a Mariana Mariano, outra
prima e excelente produtora, é quem monta os cronogra-
mas de Tempos e Movimentos da estrutura dos eventos
e é a responsável, entre outras coisas, pela montagem e
desmontagem. Costumo dizer que a Mariana é a “prefeita” do evento, ela comanda tudo no local. Cada projeto
tem suas características e necessidades particulares, mas
o exemplo abaixo é um bom sinalizador para você não
passar apuros totalmente dispensáveis.
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Como vender e realizar sua ideia
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Como vender e realizar sua ideia
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maria dolores
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Como vender e realizar sua ideia
Para concluir esse tópico, vamos a mais uma dica.
Minha tia Betina, que faz parte da nossa equipe nos projetos, tem uma forma muito eficiente de pensar sobre o even-
to para ver o que pode estar faltando ou não, se está tudo
contemplado ou não. Ela faz o caminho do evento mentalmente. “Chego na entrada, tem pórtico? O pórtico tem
iluminação? Tem segurança? Onde está o segurança? No
caminho tem banheiro químico? Os banheiros têm papel?
Quem vai levar o papel? E a limpeza?” E assim, realizando
o percurso visual do evento, passando por todos os locais,
é possível analisar o cronograma de Tempos e Movimen-
tos e completar com o que estiver faltando.
Divulgação: Outro erro recorrente nos projetos é não
pensar na divulgação com antecedência. Deixar para
pensar próximo à execução e realizar sem planejamen-
to, fazendo o que todo mundo está fazendo, ou fazendo
o que ouviu dizer que as pessoas fazem ou que projetos
similares fazem. Cada projeto é um projeto. Você pode não
ser da área da comunicação, mas lembra das habilidades
que precisa desenvolver? Você precisa ter alguma noção.
Saber o que funciona para cada tipo de projeto ou produto. Antigamente as plataformas eram limitadas. Rádio,
jornal, revista, televisão, guias, panfletos, folders, cartazes,
outdoors e pequenas variações disto. Hoje, o limite é a sua
imaginação. Você pode utilizar os veículos convencionais
ou pode apostar tudo nas redes sociais. Você pode usar
um pouco de cada ou pode fazer uma ação de divulgação
194
maria dolores
pontual, como um concurso ou um evento. O importante
é saber qual público precisa atingir e quais os melhores
canais para chegar a este público. Quando fazemos shows
em cidades pequenas do interior do Brasil, um dos canais
mais eficazes de divulgação é o carro de som, que passeia
pela cidade divulgando o projeto. É claro que é importante
fazer o reforço com jornal, outdoor, rádio e internet, mas
o carro de som é um dos principais. No orçamento, para
saber quanto custará o projeto, você deve prever uma
verba para divulgação. De acordo com essa verba, será
possível avaliar as opções de divulgação com o melhor
custo-benefício. Seria incrível divulgar na tv, mas a verba
dá para isso? Se der para uma única veiculação na tv, vale
à pena ou é melhor investir toda a verba em redes sociais.
Qual o impacto? O importante é planejar, mesmo que
depois seja necessário ajustar, o que acontece bastante em
divulgação, por ser uma área muito dinâmica.
Prestação de contas: A prestação de contas começa
no primeiro dia de trabalho, e não no final. Os maiores
problemas com prestação de contas acontecem porque
as pessoas começam a se preocupar com ela no final do
projeto. É uma corrida contra o tempo e, como não dá para
voltar atrás, uma corrida perdida, pois é impossível recuperar papéis e refazer ou desfazer ações. Atenção: prestação de contas não é exclusiva para projetos realizados
via lei de incentivo ou com recursos públicos. Você sempre
precisará prestar contas, nem que seja para você mesmo.
195
Como vender e realizar sua ideia
Não há como saber se projeto ou negócio deu resultado
se não tiver uma prestação de contas. No caso de projetos
realizados via leis de incentivo ou com recursos públicos,
é fundamental ler, conhecer e assimilar todos os processos
obrigatórios e o que será avaliado – e se ater a eles desde o
início. Quais os comprovantes de pagamento você precisa
apresentar? Como devem ser realizados esses pagamen-
tos? Quais os tipos de contratação? Inúmeras irregulari-
dades decorrem da falta de atenção e cuidado com esses
procedimentos. Vamos a alguns erros frequentes:
•
Todo pagamento deve ser formal, ou seja, o
prestador de serviço precisa emitir uma nota
fiscal ou um RPA ou ser funcionário contratado. Na correria, muita gente acaba pagando
informalmente e isso pode causar a reprovação
das contas do projeto e devolução dos recur-
sos (no caso de projetos via lei de incentivo ou
com recursos públicos) ou pode dar a você uma
visão equivocada do resultado final do projeto
ou negócio. Afinal, um pagamento informal e
sem registro pode ficar perdido e o projeto terá
um resultado menor do que o aparente. Se você
fez um pagamento informal no valor de três mil
reais ou de cem reais, pode ser que seu resultado seja três mil reais ou cem reais menor do que
o apontado ao final caso você não tenha uma
prestação de contas condizente com a realidade.
•
Outro erro frequente é efetuar pagamento na
196
maria dolores
conta errada. Se você contratou um prestador
de serviços e ele enviou a nota fiscal, o paga-
mento só pode ser realizado em conta bancária
de titularidade do CNPJ do prestador de servi-
ço. Acontece muito de a empresa enviar a nota
fiscal de um CNPJ e uma conta de outra titulari-
dade, seja conta bancária pessoal do diretor da
empresa ou de outra empresa do mesmo grupo,
por exemplo. Você recebe a conta e, sem ques-
tionar, paga. Nem repara que a conta estava em
outro nome ou só descobre muito tempo depois,
ao ter as contas reprovadas ou um problemão
com a Receita Federal. E que problemão! Então,
sempre que for efetuar um pagamento, esteja
atento a esse detalhe fundamental.
•
Mais uma armadilha terrível é se descuidar dos
impostos. É indispensável ter um contator ou
contratar um contador para o projeto, porque
há muitas variações. Quando você faz um
pagamento de nota fiscal, precisa saber se deve
ou não reter parte do pagamento e recolher
impostos ou se o pagamento da nota é integral
e o recolhimento de impostos é por conta do
contratado. Só um contador saberá dar a orientação correta.
Os exemplos acima são apenas para demonstrar o
197
Como vender e realizar sua ideia
quanto é importante enxergar a prestação de contas como
algo que acompanha todo o processo de realização do
projeto, desde o início.
Orçamento: Mais um dos grandes erros de planejamento
de um projeto e o principal responsável pelos prejuízos é
o orçamento fora da realidade. A maioria dos orçamentos
não contempla todos os itens necessários para a realização
do projeto, ou dimensiona de forma errada. Por exemplo:
não inclui diretor de arte ou designer porque você tem
um primo que pode quebrar um galho, ou porque você
mesmo é capaz de fazer a arte. Ou, você não prevê assessor de imprensa porque, como eu, é jornalista e pode fazer
o trabalho. Eu, aliás, fiz assessoria de imprensa para vários
projetos nossos. Mas acumular funções e contar com
quebra galhos não deve ser a sua primeira opção. Você
deve prever tudo no orçamento e trabalhar para conse-
guir o recurso realmente necessário para realizar um bom
projeto, em que todos os envolvidos sejam devidamente
remunerados. A decisão de acumular funções ou quebrar
galhos deve vir depois, caso você avalie que não há alternativa viável.
Eu gosto de fazer assessoria de imprensa, gosto de
escrever releases, mas o tempo de dedicação necessário
para isso rouba o tempo que eu deveria estar empregando em gerenciar o projeto como um todo. E não é humanamente possível realizar bem várias funções simultâne-
as. Em alguma delas você deixará a desejar, sem falar na
198
maria dolores
sobrecarga de trabalho, estresse e esgotamento. Palavra de
quem já passou por isso muitas vezes: não vale a pena.
Nem pelo dinheiro, nem pela saúde, nem pela qualidade
ou resultado do projeto. Você não precisa fazer uma coisa
só. Nós, que temos empresas pequenas, precisamos fazer
várias coisas. Mas há um limite e é crucial descobrir o seu.
Para ter mecanismos para avaliar se conseguirá, saudavelmente, realizar mais de uma função, ou quais funções, faça
a conta que pouca gente faz: quantas horas de trabalho são
necessárias para realizar determinada ação?
De acordo com o livro “168 Horas”, de Laura
Vanderkam, o tempo é o recurso mais democrático que
existe. Está disponível para todo mundo de forma igual.
No entanto, não é renovável. Se passou uma hora, essa
hora passou, não volta mais. Todos nós temos 168 horas
por semana. O que costumamos fazer é colocar na agen-
da mais coisas do que somos capazes de realizar. Se você
dormir oito horas por dia e gastar duas horas por dia
entre higiene pessoal, alimentação e cuidados básicos, são
10 horas por dia, 70 horas por semana. Sobram 98 horas
por semana ou 14 horas por dia. Suponhamos que você
tem família e amigos e dedique os finais de semana a eles.
Nesse caso, mesmo que você só trabalhasse de segunda
a sexta, sem qualquer tempo dedicado à família, amigos,
lazer, redes sociais etc, você teria 14 horas de trabalho por
dia. Nessas 14 horas por dia (que são irreais, mas supo-
nhamos que você tenha super poderes) é possível gerenciar o projeto, cuidar do atendimento ao investidor ou
199
Como vender e realizar sua ideia
cliente, cuidar das finanças, fazer curadoria, gerenciar a
produção e ainda escrever e enviar releases, ligar para
os veículos e jornalistas, influenciadores, conversar com
eles para tentar engatar uma pauta, agendar entrevistas,
fazer a ponte entre os entrevistados e os entrevistadores,
supervisionar o clipping e muito mais, com a atenção e
cuidados necessários e com qualidade? Não existem horas
disponíveis para tudo isso, simples assim. Algo ficará sem
ser feito, ou será malfeito. Por isso, se você quer realizar
um projeto de sucesso, inclua no seu orçamento todos os
itens e funções necessários.
Outro equívoco é superdimensionar o projeto de
acordo com o investidor ou cliente potencial, vulgo “cres-
cer o olho”. O mercado é profissional e as pessoas sabem
quanto custam as coisas. Definir o valor do seu trabalho
pelo cliente é arriscado e trabalha contra a sua credibilidade. Claro que você pode dar um desconto ou reduzir
sua remuneração ou seus ganhos se o cliente ou investidor
tiver poucos recursos e você achar que vale à pena, seja
por ser um bom parceiro a longo prazo, seja por querer
apoiar ou ajudar. Mas, jogar o valor para cima porque o
cliente tem dinheiro, não é a melhor alternativa. Você deve
definir o valor pelo valor que as coisas têm, consideran-
do todas as variáveis. Se você vai gerenciar um grande e
complexo projeto, obviamente a sua remuneração deve
ser maior. Se é um projeto pequeno e simples, pode ser
menor. Você pode consultar preços de projetos e serviços
nas tabelas desenvolvidas pela Fundação Getúlio Vargas,
200
maria dolores
que oferecem um parâmetro por Estado. A prestação de
um determinado serviço em São Paulo tem um valor
médio, já em Manaus, tem outro. Varia por região, estado
e também pelo currículo do prestador de serviço.
Nem sempre essa tabela da FGV é atualizada, mas
serve de base para um pontapé inicial. Existem outros
indicadores de preços, outras tabelas de associações e
conselhos regionais. Essas tabelas, no entanto, são apenas
indicadores. Quando você for montar um orçamento faça
o trabalho que tem que ser feito: orce cada item. Nós reali-
zamos sempre três orçamentos para cada item, porque,
assim, temos uma ideia concreta dos valores. Recebemos
orçamentos bem baixos, bem caros e outros no meio termo
para um mesmo item. Então, com base na experiência que
vamos adquirindo e no currículo do prestador, conseguimos saber qual o valor é real e acessível para nosso projeto, a fim de alcançar o melhor custo-benefício. Chutar um
valor é simplesmente inadmissível. E o pior é que tem
quem faça isso. Eu mesma já fiz e sempre deu errado. Dá
trabalho realizar três orçamentos para uma planilha de
cem itens? Dá. Mas, em qualquer setor, todo trabalho dá
trabalho para alcançar êxito. E, lembre-se, isso não significa que você vai morrer de trabalhar.
Organização da agenda: Nós temos três filhos, como já
disse, nas idades de 5, 10 e 23 anos. Fiquei grávida pela
primeira vez aos dezoito anos e, pela última, aos 37. São
vinte e três anos cuidando de criança. Passei no vestibu-
201
Como vender e realizar sua ideia
lar em uma semana, descobri que estava grávida na outra.
Justamente por ter tido filho tão nova e querer ser uma
mãe presente, nunca procurei ou tive um emprego. Fui
uma desempregada declarada desde o primeiro dia do
início da minha vida profissional. Busquei alternativas
para que me sobrasse tempo para cuidar do meu filho e
depois do outro filho e depois do outro. Sempre trabalhei
bastante, mas nunca desesperadamente - e com horários
flexíveis. Ou seja, você pode trabalhar com afinco no seu
negócio, crescer profissionalmente sem desistir da vida
pessoal. Basta organizar e planejar. E aqui, outro alento,
dá para organizar mesmo sendo uma pessoa desorganizada, como eu.
Eu não tenho disciplina, tenho dificuldade de
manter as coisas nos lugares, de fazer e manter uma
dieta e de seguir as regras para viver bem. Tenho inveja das pessoas que conseguem organizar a vida certinha
e possuem autocontrole para os horários das refeições,
para o que escolhem para as refeições, para a atividade
física, para o sono de qualidade, para a casa e a vida em
ordem. Não sou assim, mas me dedico para fazer o meu
melhor, dando foco à algumas prioridades. E isso já é o
suficiente para realizar grandes projetos e sonhos e estar
presente para a família. Por exemplo: meus filhos sempre
estudaram no período da tarde, porque para o meu tipo
de trabalho a tarde rende mais. Então, durante a manhã
eu respondo alguns e-mails importantes, escrevo algo se
conseguir, faço uma reunião ou outra quando necessário,
202
maria dolores
mas o restante do tempo é dedicado para os filhos, a casa,
caminhada ou ginástica (tenho me esforçado) e resolver
problemas do cotidiano.
De tarde eu me concentro no trabalho, das 13h às
18h. São cinco horas que, bem empregadas, rendem muito.
Nos domingos pela noite eu gosto de preparar a agenda
da semana. Não que eu tenha que seguir tudo à risca, mas
pelo menos funciona como um guia. Há muitos anos eu
tenho agenda, dessas de papel, porque gosto de papel.
Mas você pode usar uma agenda eletrônica ou um apli-
cativo, existem vários. Antes de organizar a agenda por
semana, minha segunda-feira era lotada. O que eu fazia,
basicamente, era uma lista de tarefas e pendências e, claro,
não conseguia cumprir nem metade na segunda-feira.
Na verdade, nem um terço, nada. Era frustrante e pouco
produtivo. Em 2014 participei do EMPRETEC, um progra-
ma de empreendedorismo do Sebrae. Ganhei um livro
em uma das dinâmicas em que meu grupo se sobressaiu.
Eu detestei a capa e o título. Como uma leitora assídua
de literatura, torcia o nariz para qualquer publicação que
soasse autoajuda. O livro ficou parado na estante, só não
doei porque tinha dedicatória dos professores do curso.
Um ano depois, eu estava uma noite em casa desesperada
para ler algum livro novo. Já havia lido todos os meus, de
Dostiéviski a Machado de Assim, Paul Auster a Gabriel
García Márquez, Mia Couto a Phillp Rolth. Peguei o tal
livro na estante para dar uma olhada. O título me dava
arrepio, e a capa também. Chamava-se “Os 7 hábitos das
203
Como vender e realizar sua ideia
pessoas altamente eficazes”, de Stephan Covey. Comecei a
folhear, ler uma coisa aqui e outra ali e me surpreendi. Já
li quatro vezes. Quebrei meu preconceito arraigado contra
qualquer coisa que pareça autoajuda.
Há livros bem bobos realmente, superficiais, mas
há outros que são resultado de pesquisa e experiências
que efetivamente podem acrescentar algo na nossa vida,
dependendo de cada caso. Foi só por ter quebrado esse
preconceito que eu, por exemplo, estou escrevendo esse
livro. A experiência com as palestras que ministramos
quando executamos projetos me mostrou que compartilhar nosso conhecimento e vivência pode abrir alguns
caminhos e facilitar a vida de outras pessoas que querem
se aventurar nesta área criativa. Enfim, o livro me ajudou
muito. A gente não deve acreditar cegamente em tudo o
que lê. Cada autor tem suas crenças, suas teorias e sua
subjetividade. Mas uma boa leitura consiste justamente
em identificar o que serve para você ou não. Se você achar
que tudo o que leu em um livro serve exatamente para
você sem qualquer questionamento, respire fundo, pode
haver algum problema aí. Seguir de olhos fechados algo
que outra pessoa pensa ou diz é dar um salto perigoso no
escuro e deixar de ser você. Logo no início da leitura eu
compreendi que o autor era um típico homem americano
branco, provedor do lar, conservador e religioso. O que
não é ruim nem bom, só estou ressaltando que eu sabia
de onde ele falava, então algumas coisas não serviam para
mim. Essas eu descartava. Mas, o autor não era só isso.
204
maria dolores
Era um grande estudioso e conhecedor das dinâmicas
humanas. Descartei as características que não tinham a
ver comigo e aproveitei o que tinha. Foram vários ensina-
mentos e que, aliás, valem a pena para quem quer empreender e ter uma vida equilibrada, seja no âmbito pessoal
ou profissional.
Dois ensinamentos melhoraram muito minha vida e
tenho procurado colocar em prática desde 2014. O primeiro é organizar a agenda pelo período de uma semana. Não
de um dia, um mês ou em listas intermináveis. Organizar
significa distribuir. Como não dá para fazer tudo em um
dia, você distribui tudo o que é importante para você e o
que é prioridade ao longo dos sete dias da semana. Traz
alívio emocional e aumenta a produtividade. O segundo
ensinamento foi focar a ação no que é importante, mas não
é urgente. O que acontece no dia a dia é que a gente foca a
atenção no que é urgente, mas não necessariamente impor-
tante, ou mesmo no que é urgente e importante. Responder e-mails e demandas, atender telefonemas, responder
WhatsApp, participar de reuniões intermináveis quando
o assunto poderia ser resolvido em quinze minutos, ou
seja, apagar incêndios. A grande pergunta é: “O que você
faria diferente que teria uma grande transformação positiva na sua vida?”. Geralmente são coisas não urgentes,
como dormir melhor, estar mais com os filhos, o parceiro
ou parceira, aprimorar o inglês, prospectar para aumentar
as vendas, pesquisar, estudar, planejar com mais cuidado o projeto, buscar inovações. Quando a gente passa a
205
Como vender e realizar sua ideia
aumentar o tempo dedicado a essas questões importantes
e não urgentes, aos poucos as não importantes e urgentes
vão diminuindo, os incêndios a serem apagados se reduzem. É o que tenho procurado fazer, sem neura: organizar
as tarefas por semana e focar no que é importante, mas
não urgente. Tem funcionado.
Então, com base na minha experiência de nunca
ter tido um emprego, de ter sempre conseguido dedicar
tempo à família e à vida pessoal, de não ser uma pessoa
organizada, eu confirmo: você consegue fazer um bom
trabalho para realizar um bom projeto sem precisar
morrer de trabalhar. Exige esforço e dedicação, sim. Mas
não conheço outro tipo de sucesso duradouro sem esforço
e dedicação.
206
maria dolores
Regra dos 10%
207
Como vender e realizar sua ideia
Mais um obstáculo para o sucesso dos negócios
criativos e de qualquer negócio é não enxergá-lo como tal,
ou seja, não enxergá-lo como um negócio e, por conse-
guinte, abrir mão do lucro. É muito comum, nas áreas da
criatividade, não darmos a devida atenção ao lucro ou, o
que é pior e acontece com regularidade: associar o lucro ao
demérito do produto criativo. Como se a arte fosse menos
arte quando dá dinheiro. O que é uma tremenda bobagem.
Falamos sobre isso no início do livro, quando enumerei
algumas obras-primas contratadas sob encomenda. Todo
trabalho deve ter sua remuneração, a não ser que seja
voluntariado, mas aí é outra história. Se você trabalha
com arte, cultura e criatividade, deve ser remunerado
por isso. Receber dinheiro pela sua criatividade, pela sua
dedicação e pelas horas trabalhadas não diminui o méri-
to do conteúdo nem faz de você um mercenário. Faz de
você uma pessoa saudável, que sustenta financeiramente
a sua vida e o seu negócio. Ao longo da nossa trajetória
nós escolhemos, diversas vezes, trabalhar sem receber. No
entanto, isso é uma escolha pontual. Não deve ser a regra
caso você queira ter independência financeira e queira que
seu negócio progrida. Para não cair na armadilha de sair
de um projeto devendo ou sem ganhar nada, é importante
focar na regra dos 10%.
Confesso que eu, particularmente, tive muita difi-
culdade com a Regra dos 10%. Quando eu ainda me
envolvia com a parte financeira dos nossos projetos, volta
e meia fugia da regra e, toda vez que fazia isso, o prejuí-
208
maria dolores
zo aparecia. Para quem vive com a cabeça nos sonhos, na
beleza e no resultado criativo, é fácil desistir dos ganhos
financeiros. Você pensa: “Ah, mas vai ficar tão melhor com
seis bandas em vez de cinco! Tão melhor o cenário com
cinco árvores em vez de duas, com tecido ortofônico em
vez de lona, com papel couchê gramatura 150 em vez de
90”. Será? Se houver recurso disponível, tudo bem. Mas,
se ter seis bandas em vez de cinco fizer com que você não
tenha remuneração ou que sua empresa não tenha lucro,
será que ter uma banda a mais vai fazer tanta diferença
para o projeto como um todo? A gente acha que sim, bate o
pé, chora, fica com o coração apertado e doendo, achando
que vai ser um desastre. E é uma dor real, que tira nossa
noite de sono, nos abate e fere a nossa alma sonhadora.
Mas, aí o público aparece e adora o festival com as cinco
bandas, o espetáculo com as duas árvores ou o livro em
papel com gramatura 90. E, convenhamos, se somos da
área da criatividade, quem melhor do que nós para pensar
em soluções criativas com o recurso disponível? Com
muito esforço, aprendi a desistir de ter artistas incríveis
nos nossos projetos quando o valor para tê-los na progra-
mação estava acima da verba para tanto. Aprendi a adap-
tar ideias fantásticas para poder colocá-las em prática com
o recurso existente, sem entrar no que seria o lucro. Hoje,
quatorze anos depois do primeiro projeto, posso dizer
que até mesmo eu consigo me manter na Regra dos 10%,
sozinha, caso não tenha outra pessoa mais competente
para cuidar do controle do orçamento. É difícil. É tenta-
209
Como vender e realizar sua ideia
dor entrar nesse dinheiro intocável para viabilizar aque-
le detalhe incrível, mas a gente aprende a se segurar, se
houver esforço e consciência do quanto isso é importante
para suas ideias e projetos a longo prazo. Respeitar esse
limite é o que confere sobrevida, sustentabilidade e crescimento ao seu negócio, seja criativo ou não.
A Regra dos 10% é, basicamente, deixar 10% do
valor total do projeto como remuneração para a sua
empresa (convenhamos que, nessa altura do campeonato
você já não trabalha como Pessoa Física, mas como Pessoa
Jurídica e, portanto, se seu projeto é, na verdade, um
projeto da sua empresa). 10% é modo de dizer, é um parâ-
metro para servir como exemplo. Obviamente há varia-
ções. Se você estiver trabalhando com leis de incentivo ou
outros segmentos que utilizam recursos públicos, existem
tetos para a remuneração da empresa ou dos dirigentes e
é fundamental você se atentar e se ater a tais regras. Mas,
se seu projeto não envolve recurso público, o ideal é que a
remuneração da sua empresa seja entre 10% e 20% do valor
total do projeto. Se um projeto tem o valor total de 100 mil
reais, a remuneração da empresa deve ficar entre 10 e 20
mil reais. Menos que 10% não é saudável financeiramente.
Mais que 20% pode comprometer a execução e qualida-
de do projeto e, consequentemente, a sua credibilidade e
construção do seu currículo. O objetivo é sempre que a
remuneração seja 20% ou o máximo saudavelmente possível. Esse é o melhor resultado. Entretanto, você sabe que
pode reduzi-la um pouco se necessário, sem jamais entrar
210
maria dolores
nos 10%, pois eles são sagrados. Importante ressaltar que
essa margem para trabalhar dos 10 aos 20% não é para
imprevistos e gastos extras. Na sua planilha orçamentária
inicial você já vai prever uma porcentagem ou valor para
imprevistos ou gastos extras, que INVARIAVELMENTE
aparecem. A previsão será uma estimativa, é claro. Se, por
um milagre supremo, seu projeto não precisar utilizar a
verba de imprevistos e gastos extras, parabéns, aproveite,
esse valor entrará como lucro e um bônus extra para a sua
empresa. Entretanto, em quatorze anos realizando proje-
tos, isso nunca aconteceu com a gente. E, na verdade, se
não tomarmos muito cuidado, a verba para imprevistos
e gastos extras acaba não sendo suficiente e falta dinhei-
ro para o inesperado. Mas, como realizar esse controle na
prática?
É mais um dos óbvios: gastar no projeto o dinheiro
que se tem, menos os 10% ou 20% da remuneração da sua
empresa. Na correria a gente faz o contrário. Monta orça-
mento do projeto e executa pensando no que queremos
realizar e o que sobrar, ou se sobrar, é a remuneração. Para
ter êxito financeiro você precisa fazer o caminho inverso.
Voltemos ao projeto fictício no valor de 100 mil reais. Se
este é o valor total, pelo menos 10 mil reais são a remuneração da empresa. Então, você vai contratar todo o restante com 90 mil. Você queria um artista com cachê de 25 mil,
mas dentro dos 90 mil cabe um artista de 20 mil? Ok, agra-
deça ao de 25 e vá em busca de um de 20 mil. Existem
talentos, ideias e soluções de todos os preços. O segredo é
211
Como vender e realizar sua ideia
você buscar o melhor possível dentro da verba disponível.
Está vendo? Não é nenhum bicho de sete cabeças. O difícil
mesmo é conseguir se controlar. Mas, ou você se controla
e faz da Regra dos 10% seu mantra, ou vai passar a vida
mergulhando em projetos lindos sem sair do lugar ou até
mesmo se afundando em dívidas que, no final das contas,
minam qualquer criatividade.
Para êxito nesta missão – e na vida -, é preciso apren-
der a dizer NÃO. Dizer não para o que está além do orça-
mento, não para o que está além da sua capacidade técnica
ou de tempo para realizar, não para as conquistas aparentemente fáceis demais (e duvidosas) e não para as diversas
solicitações que chegam a quem empreende um projeto ou
um negócio. Como realizamos muitos festivais de músi-
ca, recebemos uma grande demanda de artistas e bandas
que, com razão e propriedade, querem se apresentar nos
eventos. Desde artistas consagrados a iniciantes. Não exis-
te outra saída, temos que dizer não, muito mais nãos do
que sins. Dá dor no coração? Dá. Porque há muitos traba-
lhos excelentes e porque sabemos o quanto é difícil para
um artista conseguir espaço e público. Também somos
artistas, também batalhamos por palco e plateia. Todavia,
a escolha do casting deve passar pelo que atende ao projeto. Temos muitos amigos e familiares artistas, gente que a
gente gosta, tanto como artista quanto como pessoa. No
entanto, em um projeto sério, a escolha não deve passar
por esse tipo de filtro. Deve ser técnica. Por isso, antes
de começar a contratar e colocar um projeto para andar,
212
maria dolores
defina o perfil dos artistas, do conteúdo e daquilo a que
o projeto se propõe. Assim fica menos difícil dizer não. Se
um amigo ou um artista gente boa tiver um trabalho que
se encaixe no que você está procurando, ótimo, que bom,
é sempre bom unir as coisas. Mas se não se encaixa, você
explica que não se encaixa e segue em busca do que lhe
atende.
Às acontece também de o artista participar de um
projeto uma vez e, no ano seguinte e nas demais edições,
querer participar novamente. Se a ideia do seu projeto é
mudar a programação a cada ano e você tem clara essa
conceituação, basta explicar para o artista, agradecer e
deixar para uma próxima oportunidade. Tudo isso é ruim
de se fazer, pelo menos eu acho ruim. Dizer não é complicado. Mas é a única forma de levar os projetos adiante.
No entanto, é fundamental manter a educação e a gentile-
za. Existem muitas pessoas, infelizmente, que confundem
eficiência com grosseria, confundem clareza com falta de
educação ou insensibilidade. “Eu sou direto, falo assim e
pronto”. Parabéns, ser direto é muito melhor, mas isso não
dá o direito de ser mal-educado, grosso ou insensível. Ter
empatia, saber se colocar no lugar do outro e dizer não
sem ser estúpido, ser firme sem ser arrogante é tão impor-
tante quanto controlar o orçamento e cumprir a Regra dos
10%. Fixe na sua mente e no seu coração: o que eu faço e o
que eu falo, a maneira como me comporto no dia a dia, nas
pequenas e grandes coisas, constrói a minha credibilidade
e meu currículo, constrói também a minha vida e os meus
213
Como vender e realizar sua ideia
relacionamentos. Está tudo interligado. “Ah, mas tem
gente arrogante e grosseira que está rica”. Ok, tem. Mas
essa pessoa é feliz? Tem bons relacionamentos? Está rodeada por pessoas que, genuinamente, gostam dela? Inspira
os outros que passam pelo seu caminho? Vai deixar um
legado positivo que não seja dinheiro? Pode até ser, mas
é raro.
214
maria dolores
Se eu não sei,
vou atrás de quem sabe
215
Como vender e realizar sua ideia
Certa vez fui apresentar uma proposta de projeto
em uma empresa, em busca de investimento. Apresentei
a proposta e o responsável gostou. Estava alinhada com
as estratégias da empresa em relação ao público-alvo.
Tratava-se de um evento. O impeditivo era que eles estavam investindo apenas em projetos que tivessem também
conteúdo audiovisual. “Vocês fazem vídeos?”, o executivo
perguntou. “Sim, nós fazemos”, eu respondi sem titubear.
Nós nunca havíamos produzido vídeos. Só mesmos
os vídeos institucionais de divulgação dos projetos ou de
pós-evento, com um apanhado geral. O conteúdo sobre o
qual o executivo perguntava se referia a minidocumen-
tários. Minha única experiência com isso havia sido na
faculdade de Comunicação, com um curta-metragem de
ficção e um pequeno documentário sobre a produção arte-
sanal de doces de goiaba. Se a minha experiência era tão
limitada, como eu pude responder “Sim, nós fazemos”?
Eis outro mantra que utilizamos no nosso dia a dia: “Se eu
não sei, vou atrás de quem sabe”. Obviamente não serve
para tudo. Precisamos reconhecer nossos limites. A chave
está tanto em arriscar e ousar, mas também em saber
onde e quanto arriscar. Se você se arrisca em uma esfera
ou projeto que não conseguirá cumprir com qualidade, o
estrago está feito, você perde a credibilidade, o dinheiro e
a energia. É uma aventura que não vale o risco. Em outra
ocasião me perguntaram se poderíamos realizar um proje-
to de restauração de patrimônio arquitetônico. No prazo
que precisavam, minha resposta foi: “Infelizmente não”.
216
maria dolores
Arquitetura é cultura? Sim. E cultura é meu campo
de atuação. Mas, o que eu entendo de arquitetura e restau-
ro? De projetos, cronogramas e orçamentos de restauro
de patrimônio material? Nada. Poderia aprender? Sim.
Como gestores e fazedores de projetos podemos aprender
e avançar por uma área desconhecida. Mas aprendizado
leva tempo e alguns mais que outros. Para eu me capacitar e ter segurança para realizar um projeto de restauro de
patrimônio arquitetônico histórico-cultural eu precisaria
de um tempo que não era compatível com o prazo que o
investidor demandava. E para o projeto com os vídeos de
minidocumentários? Sim, estava ao meu alcance. O prazo
era mais curto do que o de restauro do patrimônio, mas
eu tinha alguma noção e a produção de um conteúdo de
audiovisual, por mais que tenha muitas questões técnicas
envolvidas, envolve questões menos complexas para a
minha gama de conhecimento do que arquitetura, restauro e construção civil. Além disso, audiovisual demanda
muito mais contratação de prestação de serviço do que
aquisição de material que, no caso do restauro, trata-se
de uma parte expressiva do projeto. O de restauro era
um projeto com o qual não podíamos nos comprometer
naquele prazo. Pronto, vamos em frente, as oportunidades não deixam de aparecer para quem está aberto a elas
e atento.
Realizar o projeto com os vídeos foi um enorme
aprendizado e, como todo aprendizado, com erros e bati-
das de cabeça pelo caminho, que teriam sido muito maio-
217
Como vender e realizar sua ideia
res se não tivéssemos ido atrás das pessoas que já sabiam
fazer aquilo. Eu descobri que não sabia coisas básicas
como o tipo de câmera para a qualidade e resolução neces-
sárias, não sabia que depois de pronto o vídeo passava por
um tratamento de cor, nem sabia o quanto a montagem
podia transformar o mesmo conteúdo em produtos finais
totalmente diferentes. Quem for do audiovisual e estiver
lendo esse livro, vai pensar: Como assim? Não sabia? É
tão básico! Bom, eu não sabia. E não há vergonha em não
saber. Vergonha é fingir que sabemos e não irmos atrás de
aprender, não procurarmos ajuda de pessoas competentes
que saibam mais do que nós.
Quando decidimos transformar meu livro “Mãe
de Dois” em peça de teatro, eu não tinha a menor ideia
de como montar um espetáculo teatral. Tinha uma noção
muito superficial. Sabia, por exemplo, que era preciso
transformar o livro em texto dramatúrgico. Eu sou jornalista, sei escrever ao menos o feijão com arroz. Poderia ler
umas peças, estudar um pouco e fazer a adaptação. Mas,
eu já havia feito isso? Só na quinta série do ensino funda-
mental, quando adaptei o livro “O Menino Maluquinho”,
do Ziraldo, para um espetáculo na escola que, além de
fazer o texto, eu dirigi, produzi, defini o cenário e o figuri-
no. Naquela época eu achava que podia fazer tudo. Ainda
bem que a gente cresce, aprende e amadurece. Queríamos
produzir um espetáculo profissional do meu livro, então
eu não podia simplesmente colocar o projeto em risco
para me lançar como autora teatral. E queríamos que a
218
maria dolores
peça tivesse humor, pois boa parte do livro trazia situações cômicas.
Fomos em busca de quem sabia fazer aquilo. O
casal de escritores e roteiristas Martha Mendonça e Nelito Fernandes, do site Sensacionalista e de vários progra-
mas de humor da televisão, foram os responsáveis pelo
texto da peça, com base no meu livro. Eles foram incríveis.
Montaram a peça de uma forma que eu jamais teria feito ou
saberia fazer. Um texto de dramaturgia tem suas próprias
características e necessidades, tem movimento e a maior
parte é diálogo, diferente do texto corrido de um livro. Foi
muito legal ver a transformação, aprendi bastante. Produzir teatro foi outro aprendizado fantástico e foi um dos
trabalhos que mais gostei de fazer. Eu era tão por fora do
assunto que achava que, no ensaio, cada ator chegava com
o texto e ia fazendo a cena, com toques do diretor. Não
tinha a menor ideia do que era marcação. E, sem marcação,
não há teatro que funcione. Tudo era pensado e definido.
O lado do palco em que cada atriz entraria, em que velocidade, andando em qual direção, onde pararia, colocaria o
braço, a perna e como movimentaria o rosto. Cada gesto,
cada passo era definido e repetido. Por isso, quando você
vai a um espetáculo mais de uma vez, ele é igual, com os
devidos improvisos e pequenas variações que fazem parte
de tudo o que é ao vivo.
Em 2017 surgiu outro grande desafio. Fomos procu-
rados por uma empresa do setor automotivo. Eles tinham
uma verba e queriam realizar um projeto em uma das
219
Como vender e realizar sua ideia
cidades onde havia uma unidade fabril da empresa e para
onde haviam acabado de transferir a sede. O objetivo era
criar laços com a comunidade, mostrar que a empresa existia, que estava ali e queria o bem da cidade e das pessoas
que ali viviam. Embora trabalhemos principalmente com
cultura, estamos abertos e atentos a outras possibilidades.
De acordo com a verba disponível e o perfil da cidade,
pesquisamos bastante, estudamos, fizemos brainstorm e
chegamos à conclusão de que o projeto mais efetivo seria
uma corrida de rua. E agora, José? Como é que se faz uma
corrida de rua? Fomos atrás de especialistas, da Federa-
ção Paulista de Atletismo e da secretaria de esportes da
cidade. Analisamos projetos e eventos similares. Em toda
a sondagem eu não deixava de perguntar: “O que, para o
público, é a pior coisa que pode acontecer em uma corrida de rua?”. A resposta era unânime: atraso na largada.
Fui descobrir que os atletas, mesmo amadores, se aque-
ciam para correr, se preparavam e o atraso fazia com que
perdessem esse aquecimento, pois havia um tempo certo
entre aquecer e correr. Tivemos alguns problemas, sobre-
tudo no sistema de inscrição, mas foram resolvidos. No
entanto, no dia da corrida, marcada para às 8h30, às 8h30
em ponto um dos árbitros deu o sinal da largada. Foi um
grande sucesso, tanto que reeditamos o evento nos dois
anos seguintes, ampliando a cada ano o número de inscri-
tos, tendo sido interrompido só por causa da pandemia do
covid-19.
Apenas para reforçar e você não esquecer: em
220
maria dolores
todos esses projetos que realizamos e nunca havíamos
feito, deixamos tanto um valor para extras e imprevistos
quanto respeitamos a Regra dos 10%. Quando foi possível
remuneração maior, ótimo (lembra? De 10 a 20%), quando
não deu, ao menos os 10% estavam garantidos. É comum
termos mais extras e imprevistos em projetos de áreas
com as quais ainda não temos muita familiaridade. Mas,
mesmo em projetos novos, de áreas novas, você precisa
prever e trabalhar pela remuneração da empresa. É falta
de profissionalismo e um atraso de vida vir com a conver-
sa “ah, tudo bem se eu não ganhar dinheiro, pelo menos
estou ganhando aprendizado e entrando em outra área”.
Se você quer realizar bons projetos e viver disso, precisa, de uma vez por todas, parar de trabalhar sem receber
dignamente pelo seu trabalho.
Uma dica importante para ir atrás de quem sabe
quando você não sabe o suficiente é pesquisar tanto o
currículo técnico da pessoa quanto o perfil emocional,
ético e de comprometimento profissional. Não adianta ser
um gênio naquilo e não saber cumprir prazos e orçamen-
tos. Nem ser o maior expert no assunto, mas não saber
trabalhar em equipe ou não saber respeitar os outros
profissionais envolvidos. Da mesma forma, não adian-
ta ser um grande talento, mas ser desonesto e antiético.
Porque todos esses pontos fracos vão trazer desgaste e
prejuízos ao seu projeto. Existem vários profissionais
competentes e artistas talentosos de um determinado
perfil que você precisa. Então, é muito melhor que, além
221
Como vender e realizar sua ideia
de bom profissional, seja boa pessoa. O projeto flui muito
melhor. Existem profissionais, fornecedores e artistas que
preferimos não contratar, a não ser que surja uma empre-
sa querendo realizar um grande projeto e só queira fazer
se for com aquele profissional, por uma questão de gosto
pessoal. Podemos até pegar o trabalho, mas já sabemos e
nos preparamos para lidar com o que teremos que lidar.
Isso porque esses profissionais e artistas são excelentes no
quesito talento, mas péssimos nos demais.
Se eu preciso de um artista de um determinado
perfil, para um determinado projeto e público, certamente vou atrás do que, além de competente e talentoso, é
gente boa, cumpridor de prazos e horários e respeitoso no
trato. Essa, no entanto, deve ser uma pesquisa que você
fará. Ouvir conselhos e o que os outros dizem costuma ser
perigoso. Muitas vezes, quando contratamos um artista,
aparece gente para falar: “Ele é tão chato, é isso, é aquilo,
deu um chilique não sei onde etc”. E a nossa experiência
acaba sendo justamente o contrário. Precisamos ter em
mente que, às vezes, o artista ou profissional pareceu difícil
porque o evento ou projeto não forneceu o que foi combinado ou nem a estrutura necessária para que ele fizesse
seu trabalho com qualidade. Isso infelizmente acontece.
Então, pesquise o currículo do profissional, o histórico,
mas não guie suas decisões pelos boatos ou o disse que me
disse, o que, infelizmente, é muito frequente em todas as
esferas. Converse com alguém que já trabalhou ou contratou o profissional. Se a pessoa disser para você que foi difí-
222
maria dolores
cil ou que é um chato, pergunte o que exatamente aconteceu. Ao ouvir a história com mais detalhes, você poderá
ter uma ideia se realmente parece um chato ou se houve
problema na produção que tenha atrapalhado a prestação
de serviço. A equação é: faça bem a sua parte e exija que o
outro faça a dele. Todo mundo sai ganhando.
Os rides de camarim de artistas, por exemplo, às
vezes vem com muita coisa, cujo custo vai além da verba
disponível para tanto. O que nós costumamos fazer é,
primeiro explicar que nossa verba para abastecimento de
camarim é restrita e perguntar o que, daquela lista gigan-
tesca, é realmente essencial e não pode faltar. Também
perguntamos se podemos substituir um item difícil de ser
obtido por outro. Essa conversa clara resolve boa parte
dos problemas financeiros e dos desgastes no dia do evento. Segundo, explicamos para o produtor do artista que
só a banda e os técnicos receberão a pulseira de acesso ao
camarim. Eles podem receber fãs, receber um convidado,
lógico, mas os convidados entram e saem, não tem aces-
so livre e não ficarão ali para sempre. Porque camarim e
backstage não são um ponto de encontro para uma festa,
são um lugar para se preparar para se apresentar e parar
descansar e relaxar depois da apresentação, que é sempre
um desgaste físico e emocional para o artista. Além disso,
camarim e backstage são locais com alta periculosidade,
pois há carregadores transitando com equipamentos, há
ligações elétricas e estruturas pesadas por toda parte. É
um ambiente complexo de trabalho, não é um salão para
223
Como vender e realizar sua ideia
uma balada.
O palco, aliás, é um local super perigoso e só tem
acesso a ele a banda e a equipe técnica. As esposas, espo-
sos, amigos e fãs não sobem, com raras exceções como uma
promoção ou algo assim, mas nesse caso uma situação já
prevista e planejada. Não é seguro e não tem sentido ficar
transitando à toa por ali. Nem nós, da produção, subimos
ao palco. Só se for para resolver algo. Não tem nenhum
trabalho para fazer no palco? Não suba. Essa é uma cultu-
ra profissional que precisamos mudar. Arte e cultura estão
associadas, ainda bem, ao prazer, diversão e entretenimento. Mas nós, que estamos trabalhando, precisamos colocar
e respeitar os limites. O artista vai achar ruim dos amigos
dele não subirem no palco? Pode achar um pouco, mas se
você é profissional, se paga na data combinada, oferece a
estrutura técnica que ele precisa, se o evento é um sucesso
e tem público, não ter os amigos no palco será o de menos.
O artista atendido no que foi combinado ficará fã do seu
projeto e de você, pode ter certeza disso. Principalmente
porque o que acontece com frequência é os artistas caírem
em roubadas, entrarem em projetos ou se apresentarem
eventos sem estrutura adequada e sem receber o cachê
parcial ou integral. E o que você acha que eles preferem?
Ter uma turma de amigos no palco, sem receber o cachê
e sem estrutura? Ou os amigos não subirem no palco e
terem estrutura e receberem o cachê? Nem preciso responder.
224
maria dolores
Não tente ser
quem você não é
225
Como vender e realizar sua ideia
Contei no início deste livro que um dos conselhos
mais importantes que recebi no início da minha carreira
de jornalista – e que serviu para todas as minhas outras
aventuras profissionais – foi “não mude o seu jeito de ser”.
E, embora eu tenha escutado e seguido a orientação, tenho
que me policiar para me manter convicta no meu modo
de ser, no meu modo de trabalhar, de realizar os projetos
e de gerir a empresa junto com meu marido. Pois é tentador a gente tentar se enquadrar em um modelo que está
dando certo. Se deu certo para ele, por que não dará para
mim? Certo? Errado. Cada um precisa descobrir, fortalecer e lutar pela sua forma de ser e estar no mundo, em
todas as esferas. Quantas vezes vi uma empresa produtora
de eventos ou de projetos culturais fazer as coisas de um
jeito diferente ou ter um tipo de cultura organizacional e
me deu vontade de fazer e ser exatamente igual? Muitas.
Quantas vezes vi e ouvi uma pessoa se apresentar ou apresentar suas ideias em uma palestra e quis ser como aquela
pessoa? Inúmeras. Mas nós somos quem somos. Devemos descobrir as nossas habilidades pessoais, aquilo que
nos torna únicos, que está dentro de nós e fazer o melhor
proveito disso. É igual corte de cabelo.
Eu tinha dezoito anos e estava grávida do meu
primeiro filho, Daniel. Já na reta final da gravidez, estava
com a boca e a cara inchadas. Certa manhã uma parente foi entregar alface na casa da minha mãe e estava com
um corte de cabelo lindo. Eu adorei e perguntei onde ela
havia cortado. Ela me deu o nome do cabeleireiro e, no dia
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maria dolores
seguinte, fui até lá. “Robertinho, quero o corte de cabelo
da Daniela da tia Lucimar”. Ele atendeu ao meu pedido. E
eu fiquei parecendo a Jane Fonda nos vídeos VHS de aula
de ginástica com polainas. Um cabelo repicado e volumo-
so, mais anos 80 que isto, impossível. O cabeleireiro pode-
ria ter me explicado que meu cabelo era diferente do da
Daniela, mas acho que ele já devia estar cansado de tentar
explicar para as clientes e não adiantar nada. O cabelo da
Daniela era fino, pouco e mais para ondulado. O meu era
grosso, liso e cheio. Foi a única vez que chorei por causa
da minha aparência. Eu me senti horrorosa. E as fotos da
época podem atestar que, senão horrorosa, parecia ao
menos um personagem parado no tempo.
Cada pessoa tem seus pontos fortes, fracos, sua
luz e sua sombra. Precisamos trabalhar para fortale-
cer os pontos fortes e aprimorar ou amenizar os fracos.
Mas, tentar seguir um modelo pré-estabelecido, tentar se
encaixar em algo que para o outro está dando certo, é um
terreno fértil para o erro. É contar com a sorte. Isso não
significa que não devemos nos inspirar em bons exem-
plos, histórias de sucesso, bons conselhos, livros, cases,
projetos e empresas. Devemos, sim, muito. Mas a palavra
é inspirar, e isso quer dizer realizar uma análise crítica. Ver
o que, daquilo tudo, pode funcionar para a gente e o que
pode não funcionar. Selecionar, saber o que aproveitar ou
não e sem nunca, jamais, em hipótese alguma, mudar a
nossa essência. Manter a essência é o que nos torna autênticos. E ser autêntico costuma ter mais valor para os bons
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Como vender e realizar sua ideia
negócios e para o sucesso do que seguir modelos prontos. Para algumas pessoas essa essência é escancarada, a
pessoa já vem com ela estampada, já sabe como é e o que
tem de melhor. Para outras é uma busca. Para nenhuma é
impossível. Algumas perguntas podem ajudar a descobrir
a nossa essência:
O que me faz sentir bem?
O que eu faço que me envolvo a tal ponto de não ver o
tempo passar?
O que eu faço de melhor?
O que eu faria e que me faria sentir tão bem que poderia
fazer de graça com entusiasmo e satisfação?
Para encontrar a resposta, não se limite à vida
profissional. Pense no seu dia a dia. Pensando sobre mim
mesma, descobri que as coisas em que eu mais me dou
bem e gosto de fazer e que não vejo o tempo passar tem
relação com contar histórias. E isso vale para todas as áreas
da minha vida. Não sou uma mãe que gosta de se sentar
e brincar com os filhos, mas adoro contar histórias, tanto
antes de dormir, lendo livros ou inventando, quanto de
dia, criando narrativas, situações, personagens e aventuras. Então, eu procuro investir nisso para estreitar os laços
com meus filhos e ajudar a criar boas memórias. Já que,
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maria dolores
se depender de mim para eu me sentar e ficar brincando
de blocos, eles crescerão frustrados. Nos relacionamentos
com outras pessoas é também na contação de causos que
eu me sinto bem e me sobressaio. Não sou muito presta-
tiva, como boa parte da minha família, que oferece ajuda,
não tem preguiça e está sempre pronta a fazer tudo para
todo mundo. Eu sou mais preguiçosa, mas adoro contar
histórias e causos. Sempre que nos encontramos eu apro-
veito para divertir as pessoas com minhas histórias e escre-
vi o livro de histórias da família, que dei de presente para
todos no Natal. No meu trabalho de produção de projetos,
criar histórias também é meu ponto forte, serve tanto para
ajudar a criar os conteúdos artísticos dos projetos quanto
para vender os projetos. Vender é contar uma história. Em
todos os nossos projetos nós ministramos palestras e eu
simplesmente amo fazer isso. Encerro a palestra empolga-
da, com as energias recarregadas. Cada um tem aquilo que
faz melhor, aquilo que o torna autêntico. Descubra o quê e
invista nisso, sem deixar o restante de lado. Como vimos,
é preciso entender de planilhas, cronogramas, porcenta-
gens e burocracia. Mas, quando se gosta do que faz, essas
partes que achamos chatas não chegam a tornar nossa
vida ruim, apenas fazem parte do processo.
Apostar na nossa autenticidade não quer dizer ser
um poço de teimosia. A frase “sou assim e pronto” é morte
certa para uma vida boa e para as realizações. Dificilmente
a pessoa teimosa tem uma vida tranquila. Vive batendo
cabeça e causando estragos pelo caminho. Eu tenho uma
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Como vender e realizar sua ideia
personalidade teimosa. Tenho dificuldade para ouvir os
outros e sair do meu ponto de vista. No entanto, me esfor-
ço para melhorar esse ponto fraco, que é horrível. Como
contei aqui, a Marolo só passou a ganhar dinheiro depois
que reconheci que eu não sabia nem podia cuidar da parte
financeira, nem me envolver com ela. Não foi fácil aceitar
isso. Mas foi a melhor coisa para a empresa, para a minha
vida e para as pessoas à minha volta. Ainda sou teimosa e
ainda tenho muito o que melhorar, mas sei o tamanho do
estrago que a teimosia causa e, por isso, me esforço para
diminuí-la.
Bom, é isso. Existem várias maneiras de realizar
projetos, de transformar uma ideia em realidade e ganhar
dinheiro com ela. O que compartilhei aqui com você não é
a única nem a melhor maneira, é apenas a nossa, é a maneira como nós fazemos para realizar nossos projetos. E esse é
um processo dinâmico, que vamos ajustando, melhorando
e inovando a cada dia. Sempre surgem novas ideias, dicas
e percursos antes desconhecidos. De todo modo, acredito
de verdade que ter um ponto de partida atalha e facilita
boa parte da jornada. Se nós tivéssemos recebido algumas
orientações básicas lá atrás, teríamos poupado muitos
erros e prejuízos. Espero que essa nossa experiência possa
ser isso para você, um ponto de partida. E que você crie
seu próprio caminho, realize lindos sonhos e projetos e
tenha uma vida que valha à pena ser vivida. Em nome de
toda a nossa equipe, Boa sorte nessa divertida caminhada!
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Como vender e realizar sua ideia
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Agradecimentos
Em primeiro lugar, agradeço ao Felipe por compartilhar
comigo essa aventura na produção e na vida.
Quando começamos a namorar aos dezesseis anos, jamais
imaginávamos trabalhar com produção e cultura, embora
eu escrevesse e ele fosse músico.
Em meu nome e do Felipe, agradecemos mais uma vez à
nossa família e aos amigos que se tornaram família e que,
juntos, formam essa querida e dedicada equipe Marolo.
Gratidão à Mariana Mariano e Flávia Gomes que, com
seus olhares afiados para produção, apontaram o que estava faltando ou não no texto deste livro, e à Paula Terra
pela revisão.
Nossa gratidão também a todos os que fizeram parte
dessa trajetória, nos apontando caminhos e nos ensinando
muito do que sabemos, em especial a Marilene Gondim,
Milton Nascimento, Paulo Lafayete, Guiomar de Grammont, Gilberto Basílio, Paulo Loures, Antônio Machado
Júnior, Keller Veiga, Pedro Bianco, Luiz Antônio Pilar,
Thomaz Souto Corrêa, Jorge Caldeira, Silvia Venna, João
Sidney Novak Jr, Felipe Campos, Guilherme Corrêa, Marina Caldeira, CBEC e tantos outros que iluminaram essa
jornada. Agradecemos a todos os artistas, fornecedores,
clientes, patrocinadores e parceiros que estiveram conosco em algum momento. E, por fim, nosso agradecimento
especial ao público, sem o qual não existe razão em vender
uma ideia e transformá-la em realidade.
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Como vender e realizar sua ideia
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