Uma abordagem baseada em mecanismo para o tratamento da dor pelo fisioterapeuta. 1. Introdução Os autores nos relatam por meio de uma revisão sistemática da literatura a abordagem baseada em mecanismo para o tratamento da dor com enfoque do profissional fisioterapeuta. O objetivo do artigo é nos proporcionar um ponto de vista geral sobre essa abordagem, abrangendo a avaliação e o tratamento a partir de cinco mecanismos de dor, a saber: nociceptivo, central, neuropático, psicossocial e sistema de movimento. Tal abordagem é baseada no modelo biopsicossocial, considerando a patobiologia, fatores psicológicos e disfunções no sistema de movimento. Para melhor compreensão, faz-se necessário algumas noções quanto aos mecanismos da dor, sendo esses utilizados para descrever fatores relacionados ao desenvolvimento, manutenção ou aumento da dor. É importante ressaltar que diversos mecanismos podem ocorrer em conjunto, bem como, dois pacientes com o mesmo diagnóstico podem apresentar diferentes submecanismos. Nesse sentido, uma abordagem baseada em mecanismo demanda a avaliação de mecanismos específicos da dor, assim como impõe tratamentos apropriados a fim de direcionar as alterações sofridas. Atualmente, a Fisioterapia adota diversos mecanismos de ação ao longo de suas intervenções, logo são considerados tratamentos multimodais. A partir dessas premissas, enfatizamos a importância de ampliarmos o conhecimento sobre como a interação entre esses mecanismos pode auxiliar na identificação, avaliação e tratamento dos mecanismos individuais da dor. Ademais, os mecanismos da dor podem ser classificados em: nociceptivos (periféricos), nociplásticos (não nociceptivos) e neuropáticos, bem como a origem da dor pode ser classificada a partir dos mesmos em: dor nociceptiva (decorrente da ativação do nociceptor, sendo processada através do sistema nervoso central e resultando em dor aguda localizada); dor nociplástica (crônica e mais difundida do que a dor nociceptiva); e a dor neuropática (ocasionada por lesão direta no nervo ou doença no sistema somatossensorial-metabólica). Seja qual for o tipo de dor, as respostas aos tratamentos podem divergir, reafirmando a necessidade de compreensão dos mecanismos subjacentes. Por outro lado, os processos biológicos da dor podem ser influenciados ou influenciarem os fatores que os cercam, como os psicossociais e psicológicos, sendo esse último supostamente crucial na transição da dor aguda para a crônica e um prognóstico para aumento da dor crônica. 2. Avaliação dos mecanismos da dor A consistência da prática fisioterapêutica no que tange ao sistema de movimento com outros mecanismos de dor, tende a maximizar o nível de cuidado tanto para avaliar, quanto para tratar as condições da dor. Ademais, a adoção de uma abordagem baseada em mecanismo, deve contemplar inicialmente a avaliação de sinais e sintomas que pressupõem alterações nos tecidos periféricos e nociceptores, redução da inibição central e/ou aumento da excitabilidade central, assim como, dor neuropática, fatores psicossociais e alterações no padrão de movimento. Tais ações podem auxiliar quanto às prioridades e o direcionamento das intervenções em relação aos mecanismos primários de dor. Os profissionais fisioterapeutas possuem habilidades exclusivas para avaliar disfunção de movimento, sendo que para cada indivíduo as alterações no sistema de movimento ocorrem de uma forma particular, dependendo da tarefa e da variação podendo ser de brandas a severas. Em contrapartida, alguns pacientes podem apresentar inibição motora e outros, facilitação motora, ambas em decorrência da dor. Sendo assim, é de suma importância identificar se a disfunção motora é conseqüência da dor ou uma adaptação volitiva ou reflexiva, devido a sua duração. A fisiologia do processamento da dor, as circunstâncias psicológicas e a função do movimento podem variar vastamente em um mesmo diagnóstico. Bem como, os pacientes podem apresentar apenas certos componentes de um mecanismo de dor ou podem apresentar múltiplos mecanismos de dor referente a um mesmo diagnóstico. A partir da identificação dos mecanismos da dor, o papel da abordagem baseada em mecanismo é promover o tratamento evidenciando esses mecanismos. Sendo assim, destacamos algumas terapias possíveis: exercícios, terapia manual, TENS e educação do paciente, as quais podem agir diretamente nos mecanismos individuais da dor. No que tange às técnicas utilizadas pelos fisioterapeutas existe uma variedade de ações praticadas pelos mesmos, como por exemplo: educação, estratégias de enfrentamento, resolução de problemas, ritmo, relaxamento e imaginação. 2.1 Mecanismos subjacentes e intervenções fisioterapêuticas Para tratamento dos mecanismos nociceptivos, a Fisioterapia atua por meio de: exercícios, porquanto os mesmos contribuem para redução da atividade nociceptora e, por conseguinte, diminuição do canal iônico, além de aumento de substâncias analgésicas endógenas no músculo em exercício, resultando em alteração da função das células imunológicas locais, restaurando o movimento normal da articulação e do tecido; Terapia manual, esta é capaz de ativar os sistemas analgésicos periféricos, assim como reduzir os genes inflamatórios e citocinas responsáveis por ativar nociceptores, além de aumentar os genes de reparo dos tecidos, restituindo o movimento normal da articulação e do tecido conjuntivo. TENS, pode agir em mecanismos distintos da dor nociceptiva, assim como apresenta uma variedade de configurações, como baixa ou alta freqüência. Já com relação ao tratamento de mecanismos centrais, destacamos: a educação, permitindo que os pacientes adquiram conhecimento sobre o contexto de tais mecanismos, além de provocar cognições e comportamentos de dor não adaptativos, os quais resultam em alterações no processamento central da dor; Os exercícios, os quais tornam possível ativar os sistemas inibitórios descendentes e aumentar os opióides endógenos e consequentemente alteração na função da serotonina; A terapia manual, na qual tanto a manipulação articular quanto a massagem, pode modular os mecanismos centrais da dor. Sendo que a segunda pode inibir vias descendentes, produzindo analgesia usando oxitocina; E as TENS, podem aumentar a inibição central e reduzir a excitabilidade central, ativando as vias inibitórias centrais e reduzindo a sensibilização central simultaneamente para reduzir a dor e a hiperalgesia. Com relação aos mecanismos neuropáticos, temos: a terapia por exercícios, sobretudo o aeróbico, antiinflamatórias e os quais macrófagos fazem com (responsáveis que por aumente as citocinas secretarem as citocinas antiinflamatórias no local da lesão). E a terapia manual, quando usadas na mobilização neural, tende a melhorar a compressão do nervo, a cicatrização, assim reduzindo a compressão nervosa na dor neuropática. Nos mecanismos psicossociais, o fisioterapeuta intervém através da: educação, a fim de mudar as crenças e comportamentos que corroboram em angústia, medo, catastrofização e ansiedade; Através do exercício, nesse caso contribui para melhora de fatores psicológicos negativos em relação à dor, e também fatores relativos à aprendizagem, memória, e neurogênese; E da terapia manual, a qual pode reduzir sofrimento psicológico (uma vez que, a massagem diminui o nível de cortisol no sangue), estresse e ansiedade (em pessoas sem dor), entretanto alguns outros acometimentos psicológicos ainda não estão bem definidos. E finalmente, no sistema de movimento, a atuação da Fisioterapia baseia-se em: técnicas educacionais combinada com um programa de exercícios, contribuindo para mudança no padrão de movimento. Ademais, são aplicadas técnicas de relaxamento, biofeedback e técnicas baseadas em terapia-cognitivo-comportamental (reduzindo facilitação motora ou espasmos musculares). Os alongamentos também são eficazes com relação à amplitude de movimento articular rígida ou limitada (resultando em normalização do movimento e redução da dor). Logo, ressalta-se a importância em determinar a dose adequada, o tempo e as combinações de tipos de exercícios. Terapia manual, utilizada com foco no alívio da dor, aumento da amplitude de movimento das articulações e melhora na função, além da normalização da função motora. TENS, a qual proporciona alívio da dor e é capaz de normalizar o movimento, esta e qualquer outra técnica de alívio da dor podem ser utilizadas a fim de direcionar os padrões motores anormais não-voluntários induzidos pela dor ou aumentar a tolerância do paciente ao exercício. Com base nesse contexto, confirma-se a eficiência da intervenção fisioterapêutica, porquanto tende a considerar diversos mecanismos de dor e tratálos simultaneamente. Nesse sentido, os fatores socioculturais também devem ser tratados, permitindo que familiares e médicos proponham uma participação ativa aos pacientes, culminando em maior adesão à intervenção. 3. Conclusão O artigo nos relata de forma adequada sobre a abordagem baseada em mecanismo para o tratamento da dor por meio do profissional fisioterapeuta. Tal abordagem vem se tornando sem dúvidas, uma das mais abrangentes, pois permite ao profissional uma compreensão mais ampla sobre a problemática e abarca preceitos que culminam na otimização, tanto da avaliação quanto do tratamento. Assim como em outros construtos, ainda há o que aprendermos e evoluirmos sobre os mecanismos subjacentes da dor, uma vez que o maior desafio do combate a dor está na ausência de sua percepção, todavia tal abordagem corrobora com uma visão holística sobre o paciente, assim como permite uma dinâmica mais completa e assertiva (multidimensional), a qual legitima o ser biopsicossocial. Ademais, o arcabouço conceitual apresentado através dessa abordagem apóia a aplicação de novos conhecimentos à medida que ocorrem avanços. Acredito que diante dessa abordagem, a ação do fisioterapeuta não se restringe apenas a aplicações de técnicas para o alivio dos sofrimentos e das incapacidades, mas, tem seu foco além da compreensão dos mecanismos. A intervenção baseada em mecanismo permite que o profissional compreenda e atue também na forma de lidar com as situações e preocupações cotidianas dos pacientes, bem como, promove clareza na proposta do tratamento, adequação das terapias priorizando as necessidades individuais, fazendo dessa forma com que haja maior adesão ao tratamento e também consolidando expectativas reais. Tais premissas têm o seu valor na atualidade, porquanto o novo modo de se pensar em ações de saúde tem caminhado no sentido de abarcar o maior número de variáveis possíveis, a fim de promover cura ao sofrimento humano. Sendo assim, não tenho críticas (negativas) a serem relatadas com relação ao artigo e muito menos a abordagem baseada em mecanismo para o tratamento da dor por fisioterapeutas, pois compartilho de uma visão positiva sobre os mesmos.