Universidade Católica de Pernambuco 1° GQ de Processos Grupais Professora Maria Aparecida Craveiro Costa Grupo: Beatriz Lins M. Costa, Brunna Millena Fonseca Lago, Maria Eduarda Valadares, Paulo Ortencio Alves Pereira Neto, Priscila Pedrosa de Santana. 12 Homens e Uma Sentença (1957) Percepção Social O filme 12 Homens e Uma Sentença (1957), dirigido por Sidney Lumet, narra o processo de deliberação do corpo de jurados após um julgamento de um jovem rapaz acusado de matar seu pai. O grupo de doze homens inclui indivíduos de diferentes classes sociais, idades, traços de personalidade, e posturas diante do difícil dever de sentenciar um jovem à pena de morte ou não. Além disso, todos os membros do júri possuem sua própria história de vida e experiências prévias, o que tem um grande peso no decorrer do processo de deliberação. A obra cinematográfica retrata principalmente os fenômenos psicológicos que podem ocorrer quando um grupo de pessoas tem a tarefa de chegar a uma decisão unânime. Durante o filme, o júri passa por diversas fases. No início, ocorre a exatidão dos juízos: o réu é apresentado como culpado e o grupo parece aceitar essa alegação como fato. Todos parecem convencidos que o jovem é realmente culpado e merece a pena de morte. Membros parecem aliviados que o processo será resolvido brevemente, sem grandes conflitos. Essa fase logo chega ao fim quando um dos jurados revela que não está completamente convencido que o julgamento realmente provou que o réu cometeu o crime. Quando o jurado número oito vota contra a maioria, o grupo passa de aliviado para caótico. Muitos dos jurados se mostram cansados e com o desejo de encerrar logo a tarefa e chegar a um veredito, o jurado número oito vira um obstáculo para muitos. O oitavo jurado mostra que tem mais consciência da grande responsabilidade que é sentenciar um jovem à pena de morte. Logo no início da sua campanha por um veredito de inocência, apenas um outro jurado parece estar disposto a escutar seus argumentos. Enquanto a conversa transcorre, diferentes jurados entram na conversa, compartilhando suas próprias experiências de vida e se mostrando cada vez mais dispostos a questionar suas próprias convicções para que o veredito seja mais justo. Durante o processo de deliberação, podemos observar os diversos fatores que afetam o grupo, como o estado do júri, a teoria implícita da personalidade, o efeito de halo, similaridade suposta, estereótipos e expectativas. O estado do júri tem grande efeito no processo de percepção social e trata do fato de como o nosso próprio estado emocional influencia os nossos julgamentos. Podemos projetar o que nós estamos sentindo em situações e pessoas. Podemos ver no filme que o oitavo jurado, era o que tinha mais empatia pelo réu. O jurado que tinha uma relação conturbada com o seu próprio filho, projetou todas as suas frustrações com o filho no réu, acusado de assassinar o pai. Também vale ressaltar que o jurado que estava apressado para ir para um jogo após o julgamento, estava mais aberto a aceitar e se convencer de qualquer explicação minimamente plausível, porque ele estava com pressa e seu foco não estava na tarefa do grupo. O jurado que é idoso e está resfriado apresenta exemplos do fenômeno da teoria implícita da personalidade. Pelo fato do jovem réu ser membro de uma minoria étnica e morar em uma área de baixa renda, o jurado resfriado logo chega à conclusão que ele deve ser também violento. O idoso é enfático ao declarar que ele “sabe do que esse tipo de gente é capaz de fazer”, se referindo ao réu. Ou seja, independentemente das testemunhas e provas que foram mostradas no julgamento, o idoso já tinha uma noção preconcebida do que ocorreu na noite do crime e, provavelmente, acreditava que o menino era culpado. O jurado idoso resfriado também menospreza as testemunhas presentes no julgamento por elas serem da comunidade de baixa renda, tirando conclusões derrogatórias sobre o intelecto de cada uma. Esse tipo de atitude gera conflitos no grupo de jurados também. O jurado ex-favelado se mostra ofendido e irritado após colocações do idoso resfriado. Podemos observar claramente a similaridade suposta logo no início do filme, quando o jurado número cinco ao ouvir as acusações do jurado número sete, referentes ao garoto, retratando que o garoto vinha de um passado conturbado e morava em uma vizinhança onde as atitudes criminosas eram rotina, seriam uma justificativa plausível para confirmar a capacidade do garoto de realizar o crime. Porém, quando o jurado número cinco ouve tal argumento ele não concorda plenamente e conta um pouco da sua história de vida, que também tinha crescido em uma vizinhança não muito favorável para o seu desenvolvimento como cidadão, mas que nem por isso seria capaz de cometer tais crimes, e que o fato do jovem acusado vir de um ambiente pobre e propício à criminalidade não eram fatores determinantes pois o jurado também tinha uma história bem parecida com a do garoto que estava sendo julgado e nem por isso foi incapaz de sobressair esses fatores e crescer na vida. Um outro momento que também podemos notar mais discretamente esta relação sendo feita, é logo no início das acusações, quando o jurado número dois decide não opinar e o jurado número três começa a falar sobre sua relação com seu filho, dando a entender que ele se colocava no lugar daquele pai que havia sido supostamente assassinado pelo seu próprio filho. Ele projeta sua relação com seu filho na relação do pai assassinado com o jovem acusado, tanto que em dois outros momentos ele deixa isso bem claro, quando o jurado número oito começa a rebater as acusações do jurado número três que afirmava que o garoto realmente queria matar o próprio pai por dizer ‘’Quero que você morra’’ retratando a indignação de um pai que tinha muitas brigas com seu filho, e após uma longa discussão entre os jurados três e oito, o jurado número três sai de si, e diz para o jurado número oito“’vou te matar”’, mostrando que qualquer um poderia dizer isso, mas por sua experiência com seu filho ele queria que o garoto fosse culpado para aliviar sua própria culpa como pai. Outro momento e justamente no final do filme, quando o jurado número três vai mudar seu voto de culpado para inocente, que ele cai em prantos e rasga a foto com seu filho, mostrando que em todo momento ele estava se projetando naquele julgamento, pensando que podia ser seu próprio filho quem poderia ter assassinado ele, pois assim como aquele garoto que estava sendo julgado tinha problemas com seu pai, aquele jurado tinha problemas com seu filho. Nós sempre fomos ensinados a não julgar as pessoas precipitadamente e/ou construir um juízo equivocado a respeito delas. Porém, essa prática ainda é comum, na maioria dos ambientes em que estamos inseridos. Frequentemente chegamos a enxergar em nossas percepções a homogeneidade da personalidade de outra pessoa, principalmente em termos de bom e mau. Se temos uma primeira impressão positiva, cercamos esse indivíduo de uma aura positiva, ou, de uma aura negativa se a impressão não for tão boa. Sendo assim, quando nos remetemos ao filme 12 Homens e Uma Sentença é perceptível que o réu, John Savoca, era de uma minoria étnica, o que é considerado uma coisa ruim para muitas pessoas, por isso, todos de imediato pensaram que ele era capaz de cometer um assassinato. Dessa forma, de maneira bastante interessante e reflexiva é possível notar que o oitavo jurado (Henry Fonda) “desmancha” ou busca retirar esse Efeito de Halo em todos os outros homens, tentando, dessa maneira, modificar a forma que todos viam o réu citado acima. Firme, inflexível, rígido, seguro de sua opinião e um pouco arrogante, o jurado quatro (contador) ao ouvir o julgamento do rapaz toma como certeza que ele é culpado. Podemos ver o efeito de Halo no seu julgamento, pelo seu jeito e opiniões irredutíveis, sem muita explicação e ponderação do porquê ele considera o jovem culpado. Esse jurado teve a primeira impressão, os fatos indicavam que o jovem era culpado, então era isso, ele era culpado. Em momentos do filme ele diz: "Esses são os fatos, estão todos aí. Ele é culpado". Devido a essa primeira impressão negativa, o jurado quatro não foi maleável no seu julgamento e nem aberto a uma nova perspectiva, inclusive, ele é o penúltimo a mudar o voto para inocente, e só mudou porque percebeu a contradição na sua própria fala, que sem perceber alegou a suposta inocência do rapaz que estava sendo condenado. No filme em questão é percebido que os jurados não tinham senso de empatia pelo menino, uma vida que poderia ser sacrificada, daquele “estranho”, responsável pela tarde perdida. A voz dissonante é a mais baixa do lugar, o homem elegante contido que raramente gesticula, o rebelde que só solicita pelos argumentos de seus pares, que leva seu tempo no caso, preocupação genuína, em suma, o pedido de humanidade. O senso comum forja fatos frágeis, crenças são impulsionadas por pequenas sensações, a memória é capaz de criar situações impossíveis, evidências teoricamente inabaláveis podem ser apagadas se analisadas de outro ângulo, o homem vê o que quer ver, coloca projeção em outro ângulo. As soluções dos dilemas vêm do questionamento, um recurso cada vez mais raro em nossa sociedade. Desde o início, os jurados, em sua totalidade, se concentram apenas no que aconteceu com o réu no passado e o julgaram, desconsiderando e sem questionar a veracidade das alegações, somente a vida que o acusado levou, onde morava e como viveu, resultando no prejulgamento, pelo fato de suas condições de vida. Esse é o maior e mais grave estereótipo de todos, a segregação e redução total da vida de um indivíduo baseado em sua vida pregressa, de outro país e de diferente realidade econômica. O "fenômeno do senso comum" existe pelo menos desde o final do século XIX, através da obra de Gustave Le Bon “Psicologia das Multidões” e no começo do século XX, com o estudo sobre Psicologia das Massas, de Sigmund Freud, mas infelizmente, a sociedade como um todo continuou a agir de acordo com o bom senso, visivelmente constatável no longa, o réu estava inicialmente condenado por onze dos doze jurados, existia expectativa de que o rapaz respondesse por um crime que não houve sequer o direito de ampla defesa e contraditório, simplesmente por alguns fatos, que não tinham sido contestados. O nono jurado é a favor da absolvição do réu, ele nega o depoimento da mulher que vai contra o menino e menciona, ao final do filme, que acredita ter feito algo importante por ser um homem idoso. É um senhor que desejava ser jovem para que outros jurados pudessem ouvir sua voz, mostrando que na década de 1950 os mais velhos já eram desrespeitados. É possível perceber o forte estereótipo do idoso a todo momento, representado como frágil, incapaz, solitário e “esquecido”, e mesmo sem querer ser ouvido fez questão de se impor e expor. Vale ressaltar que é o primeiro a mudar o voto, em decorrência da identificação, pois, segundo o mesmo “Não é fácil ficar sozinho fazendo papel ridículo para os outros”. A partir do momento em que viu o oitavo jurado naquela posição se compadeceu e refletiu sobre a possibilidade de dar voz a alguém que fora silenciado por todos, tal como o próprio jurado. Não foi comprovado que ele realmente tinha executado o crime. É possível identificar jurados de perfil competitivo (jurados quatro e oito), evasivo (jurado cinco) e colaborativo (jurado um). Em suma, o oitavo jurado, Davis optou por homenagear uma das maiores salvaguardas que um indivíduo tem contra o poder punitivo do Estado: o princípio da presunção de inocência. Precisamos, enquanto psicólogos, estar atentos a qualquer tipo de fator que possa influenciar nossa forma de ver o outro e como correspondemos a ele. Pois, nossos preconceitos atrapalham, ou até mesmo impedem, a relação terapêutica e não nos permite alcançar os objetivos na psicoterapia. "O tratamento psíquico passa pela renúncia, por parte do médico, de toda e qualquer autoridade e vontade de influenciar. Como tudo o que eu julgo saber sobre o paciente não passa de preconceitos ou projeção, é preciso dar a ele a oportunidade de expor de maneira mais completa possível o seu material, sem que seja limitado pelos meus pressupostos teóricos" (PINHEIRO, 2019, p.179). Nossa profissão exige de nós renúncia do lugar de julgador, e reconhecimento de que muitas vezes podemos estar nesse lugar, afinal, só conseguimos mudar algo em nós se reconhecemos que necessitamos de tal mudança. Para avançarmos com nossos pacientes temos que deixar de lado as amarras do olhar condenador, preconceituoso, e trabalharmos as questões que nos travam em relação a esse outro no processo psicoterapêutico. Pois, o terapeuta não é mais um sujeito ativo, mas vivencia junto do paciente um processo de desenvolvimento individual” (PINHEIRO, 2019, p.179).