La Chinoise (Godard, 1967) * no verão, cinco estudantes ocupam um apartamento emprestado para criar uma célula maoista. Estudam, fazem seminários, teatro, depõem para um filme. Mas se desentendem, o grupo se desfaz. Véronique assassina um ministro soviético e, por engano, outra pessoa. A família retoma o apartamento e apaga os sinais das férias. - Guillhaume, o ator: está sempre acentuando a metarrepresentação como recurso teatral ou meio de desestabilizar o real. - Véronique, com sua presunção manipuladora e sua crise de identidade burguesa; - Yvone, “copeira do grupo”: encarna a ingenuidade camponesa, com sua formação ideológica precária e a prostituição eventual; - Francis Jeanson e Omar Diop: modestos sóbrios, apontam as dificuldades da luta revolucionária, sabem que as análises só valem para as situações concretas e que a luta de classes depois da revolução continua; * os militantes maoistas que trabalham teoria e prática no apartamento só conseguem pensar dentro da própria cabeça; * para Godard, interessa abrir cabeças com contradições novas e incômodas, multiplicar conflitos e tornar complexas as questões; - compreender a política fora de uma linha única; * Godard narra como se criava uma célula, como se formavam quadros, de que modo os militantes se inseriam na cultura contemporânea, como o disciplinamento estreito e sério dá origem a um simulacro de guarda vermelha que, por conta própria, parte para a ação direta e o assassinato; * Godard tudo registra como etnógrafo, deixa materiais e personagens falarem por si; * o bombardeio de referências externas é concentrado e quase não há digressões; * narrador introduz uma liberdade de tratamento cinematográfico que é exatamente oposta ao disciplinamento político-partidário; - a montagem simultaneísta: a liberdade de imaginação do cineasta se contrapõe ao regime forçado da teoria e da militância; * apostava Godard na verdade dos jovens que queriam combater a hegemonia esclerosada do PCF e fazer política contra a acomodação do operariado e a submissão geral ao gaullismo; * as personagens ganham a simpatia do espectador por traduzirem de modo burlesco a seriedade dos temas contemporâneos: arte, revolução, comportamento; * Godard não escamoteia as contradições de classe, as clivagens de hierarquia e poder que se reproduzem dentro do apê. * a representação do coletivo revolucionário é estilhaçada - pela encenação autoassumida pontuada por música, máscaras, brinquedos, objetos de consumo, cartazes, quadrinhos – um mundo artisticamente desierarquizado; - pelos conflitos recentes e existenciais que as personagens trazem e quebram o recitativo marxista-leninista; * uma ficção fresca de convenções leves e descartáveis: além de explicitar regras e retórica, fazer falar o que não é representação – o que está fora do apartamento; * um sentimento de exílio mais atual e dilacerante, nascido da V República, da sociedade de consumo, da escalada norte-americana no Vietnã, da miséria do marxismo existente e da história do cinema; * a análise da onda maoista como parte do sistema de alienações culturais da sociedade francesa e capitalista. * o filme diz claro: no sistema das forças políticas existentes não é possível aderir a uma ou escolher.