Uploaded by sofiacpintoribeiro

Casos práticos (1)

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PROCESSO PENAL
Hipóteses práticas
(2014/2015)
(1)
I
Questionário
1. Como se explica a distinção entre fases preliminares e julgamento em
processo penal?
Fase preliminar – visa analisar se há indícios suficientes em ordem a submeter
ou não a causa a julgamento (razão = ninguém se senta no banco dos réus, o
que é muito gravoso, se não houver possibilidade razoável de ser aplicada uma
pena ou medida de segurança – 283º) – compreende o inquérito e a instrução.
Processo principal – visa a jurisdição stricto sensu – houve ou não crime e
responsabilidade dos agentes.
2. O que é o inquérito?
É a 1ª subfase do processo preliminar que compreende todas as diligências
necessárias para saber se há ou não indícios suficientes da prática de um crime
e responsabilidade dos seus agentes – 262º
3. A quem compete?
Ao MP – 263º - direcção e prática (267º) MAS pode delegar nos OPC + há actos
que têm de ser praticados pelo JIC.
4. O Juiz de instrução intervém no inquérito?
Sim, em todos os actos que restrinjam DF – 268º e 269º (ex. buscas, escutas, …)
Qual é o conteúdo do inquérito?
Todas as diligências necessárias… 262/1
1
5. Como termina?
Com a acusação, se houver indícios suficientes; com o arquivamento se não
houver.
6. Quando o Ministério Público arquiva um inquérito, este fica sempre
logo por ali?
Não, o assistente pode requerer a instrução (ofendido ou popular).
7. O que é a instrução?
É uma fase do processo preliminar que visa a comprovação judicial da decisão
de acusar ou arquivar o processo, em ordem a submeter ou não a causa a
julgamento.
8. Tem sempre lugar?
Não, é facultativa – tem de ser requerida – 286/2 + 287º
9. A quem compete?
Ao juiz de instrução criminal – 288/1
10. Qual é o seu conteúdo?
Actos instrutórios + debate instrutório – 289º
11. Como termina?
Com o despacho de pronúncia ou não pronúncia – 307º e 308º
12. A fase de julgamento corresponde à fase de discussão e julgamento?
Não, é todo o processo penal excepto aquilo que teve de ser antecipado em ordem a
analisar se há ou não indícios suficientes – ex. inclui ainda a contestação – 315º
13. Como decorre uma audiência de julgamento?
1º Actos introdutórios (chamada e abertura – 329º + exposições introdutórias – 339º);
2º Produção da prova – 341º - ordem da produção da prova – ver arts. ss.
3º alegações orais – 360º
4º últimas declarações e encerramento – 361º
2
II
Faça um comentário crítico ao Acórdão do TC n.º 84/2010, tendo em conta o
Decreto-Lei n.º 194/2012, de 23 de Agosto (aprova orgânica ASAE e revoga o DL
274/2007).
RESUMO ACÓRDÃO
A. condenada em 1ª instância pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo de fortuna
ou azar – art.º 1º 3º e 108º DL 422/89 de 2 de Dezembro.
Foi interposto recurso para o TRL – julgou inconstitucional os arts.º 3º e 15º do DL 274/2007
por violação do art.º 164º u) CRP – reserva absoluta de competência da AR de criação de órgãos
de polícia criminal/regime das forças de segurança – diploma que aprova a orgânica da ASAE
(autoridade de segurança alimentar e económica).
=
A ASAE não pode proceder à detenção da A. + processo não podia ter seguido a forma de
processo sumário.
DL 274/2007 – previa as seguintes atribuições da ASAE – art.º 3/2
1. z) “proceder à investigação e instrução de processos por contra-ordenação cuja
competência lhe esteja legalmente atribuída, bem como arquivá-los sempre que se
verificar que os factos que constam dos autos não constituem infracção ou não existam
elementos de prova susceptíveis de imputar a prática da infracção a um determinado
agente;”
2. aa) “desenvolver acções de natureza preventiva e repressiva em matéria de jogo
ilícito, promovidas em articulação com o Serviço de Inspecção de Jogos do Turismo de
Portugal, I. P.;”
3. ab) “Colaborar com as autoridades judiciárias nos termos do disposto no Código de
Processo Penal, procedendo à investigação dos crimes cuja competência lhe esteja
especificamente atribuída por lei”
+
Art.º 15º - atribuição de poderes de órgão e autoridade de polícia criminal.
Art.º 16º - direito ao uso e porte de arma ao pessoal de inspeccção da ASAE.
=
Perante este quadro inclui a ASAE no conceito de forças de segurança do art.º 164º u) CRP
porque lhe competia uma actividade de prevenção e detecção criminal.
=
Inconstitucionalidade orgânica por violação de reserva de lei da AR por se tratar de uma
força de segurança e as normas em causa se enquadrarem no regime das forças de
segurança.
TC – entende que a ASAE não cabe no conceito constitucional de forças de segurança,
porque não tem por missão garantir a segurança interna, prevenindo crimes que ponham em
causa o direito à segurança dos cidadãos (27º CRP) + considera irrelevante os arts.º 15º e
16º para a inclusão no conceito de forças de segurança.
Art.º 1º c) CPP – órgãos de polícia criminal “são todas as entidade ou agentes policiais a quem caiba
levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados por este
Código” = significa que se parte da ideia de que o que define a actividade de um órgão, enquanto
3
órgão de polícia criminal, é, não a sua qualificação orgânica ou institucional, mas sim a qualidade
dos actos que pratica”
+
O uso e porte de arma, independentemente da respectiva licença, não é propriamente algo
que seja exclusivo das forças de segurança.
=
TC – não há nenhuma inconstitucionalidade orgânica + de qualquer forma uma coisa é o
regime geral das forças de segurança, outra é o regime específico de cada autoridade que
não se integra na reserva.
Crítica – o Tribunal Constitucional não retira as devidas consequências de fundo. Na
verdade, a ASAE, com estas atribuições (nomeadamente, possibilidade de proceder a
detenções), deveria ser qualificada como força de segurança.
III
Notificado do despacho que designa dia para a audiência, o arguido Etelvino
não apresenta qualquer contestação (cfr. art. 315.º do CPP). No início da
audiência de julgamento, o advogado do assistente (que também deduzira
pedido de indemnização) alega que, por aplicação do artigo 574.º do Código
de Processo Civil, tanto para efeitos civis como para efeitos penais, se devem
considerar os factos como admitidos por acordo. Terá razão?
Pedido de indemnização – 71º - pp. da adesão
Contestação – 315º - 20 dias a contar do despacho liminar – apresenta querendo – a contestação
não tem aqui a importância que tem no processo civil, porque aí factos não contestados são tidos
como admitidos por acordo, aqui vale a presunção de inocência (art.º 32/2 CRP) na sua vertente
in dubio pro reo = não há ónus de contestação, nem ónus de prova – ninguém é obrigado a
colaborar na sua própria condenação – veja-se o art.º 61º - só tem deveres de cooperação do nº3;
+
As falsas declarações em geral não são punidas, mas 359º e 360º CP – se houver dever de as prestar são punidas, mas
quanto ao arguido abrange apenas identidade e antecedentes criminais)
=
Em PC tb só apresento contestação se quiser, problema são os efeitos de não contestar.
Temos lacuna! MAS – 4º 1º analogia – 78/3 pode aplicar-se por analogia? Se fosse processo
cível normal, gerava admissão dos factos; se quando a questão civil é deduzida no âmbito do
processo civil não há essa cominação, por maioria de razão a solução tem de ser a mesma no
processo penal. 2º CPC x pq n se harmoniza com presunção inocencia 3º princípios gerais –
presunção inocencia
4
IV
Duarte é condenado a 5 anos de prisão pela prática de um crime de burla
qualificada. Inconformado com a sentença, Duarte pretende interpor recurso,
invocando que a prova testemunhal produzida no julgamento demonstra
claramente a sua inocência, ao contrário do decidido pelo tribunal. Sucede
que, nos termos do Código de Processo Civil, quando o recurso tem por
objecto a prova gravada acrescem dez dias ao prazo respectivo, mas no
Código de Processo Penal nada se diz a este respeito. Poderá Duarte
beneficiar do acréscimo do prazo, por aplicação subsidiária do preceito
respectivo do Código de Processo Civil?
(Acórdão do S.T.J. n.º 9/2005)
TRP confirmou decisão da 1ª instância que recusou aplicação do prazo de recurso, se o
recorrente pretende impugnar a matéria de facto, solicitando a reapreciação da prova;
já tinha havido decisão em sentido contrário do STJ.
Prazo para interpor recurso – 411º - visa equilíbrio entre necessidades de ponderação e de
elaboração dos interessados relativamente ao uso do direito de interpor recurso + fluidez do
curso do processo, para obtenção da decisão em tempo adequado, evitando que sirva como
expediente dilatório.
Problema que causa a divergência entre decisões = entendimento diferente da
suficiência da regulamentação do recurso em processo penal, quando tenha sido
impugnada a decisão em matéria de facto e as provas tenham sido gravadas – há ou
não uma lacuna (imperfeição contrária ao plano da lei) ≠ silêncio da lei (que apenas
pode levantar críticas do ponto de vista da política legislativa) na circunstância de
não existir uma norma semelhante à do CPC no CPP que leve a aplicar o CPC por
força do art.º 4º CPP?
O sistema do processo penal relativo aos recursos em matéria de facto é coerente, com
autonomia e não apresenta qualquer espaço vazio que precise de ser regulado = não
há uma lacuna de regulamentação.
5
Se nas sucessivas revisões do código o legislador não unificou ou aproximou o regime
dos prazos do processo penal com os do processo civil, foi, porque atendendo às
diferenças entre os modelos e os interesses em confronto, não o entendeu necessário.
=
Ac. STJ AUJ – “quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas
tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo fixado no art.º 411º nº1
do CPP, não sendo subsdiariamente aplicável em processo penal o art.º que alarga o
prazo do CPC”.
=
Duarte não pode beneficiar do acréscimo do prazo.
V
Suponha que entra hoje em vigor a Lei n.º 345-A/2013, de 12 de Dezembro,
que estabelece, além do mais, que:
1) O art. 92.º, n.º 1 do CPP passa a ter a seguinte redacção: «Nos actos
processuais, tanto escritos como orais, utiliza-se a língua portuguesa,
sob pena de nulidade, salvo se se tratar de processo contra cidadão
britânico, caso em que se utiliza, também sob pena de nulidade, a língua
inglesa». Suponha que corre neste momento um processo no qual
David Brown, cidadão britânico, foi acusado de corrupção activa. Que
consequências tem a nova lei nesse processo?
PRINCÍPIO = tempus regit factum ou aplicação imediata – 5/1 – não estamos perante
lei que diz quando há ou não crime, mas perante lei que diz como se procede:
=
Não retroactividade + não ultra-actividade
=
A lei nova aplica-se aos processos futuros e aos actos futuros dos processos
pendentes; não se aplica aos actos iniciados anteriormente à sua vigência (= há
ultra-actividade da lei antiga), cuja validade deve ser julgada de harmonia com a lei
revogada.
Aqui não se verifica nenhuma das excepções:
6
1.
Agravamento sensível da situação processual do arguido – 5/2 – ex. reforma 2007 restringiu âmbito da
prisão preventiva (apenas para crimes com pena superior a 5 anos – 202º) = tiveram de libertar quem estava
preventivamente preso com crimes com pena inferior a 5 anos! Se tivesse sido o contrário e tivesse diminuído pena de
prisão para poder haver prisão preventiva, não podiam ser preventivamente presos agora (aplicação ultraactiva da lei
antiga)!
2.
Quebra da harmonia e unidade dos actos processuais – 5/2 – parte da ideia de que o acto
processual não vale por si mesmo, o processo é um caminho – ex. antes tribunal superior não podia
conhecer da matéria de facto, salvo casos de erro notório na apreciação da prova; legislador veio estabelecer então o
actual 428º - as relações conhecem de facto e de direito – ex. processo que corre segundo lei antiga, não tinha
documentação, nova lei na se pode aplicar, não há prova registada, não pode haver repetição da audiência de julgamento
(5/1 não permite, porque era válida – ultra-actividade da lei anterior); em 98 isto aconteceu, mas havia disposição
transitória = problema concreto não se levantou – quando lei nova que processo passado tivesse decorrido
de outra forma, não se permite aplicação da nova lei.
3.
Pp. do juiz natural – 32/9 – tem por finalidade evitar a designação arbitrária de um juiz ou
tribunal para resolver um caso determinado. As normas, tanto orgânicas como processuais, têm
de conter regras que permitam determinar o tribunal que há-de intervir em cada caso em atenção
a critérios objetivos. Não é admissível que a norma autorize a determinação discricionária do
tribunal ou tribunais que hão-de intervir no processo.
4.
Problema das chamadas “Leis processuais materiais” – categoria trazida pelo Prof. Taipa de
Carvalho com apoio GMS e JFD – determinados institutos processuais dos quais depende
punição concreta do arguido têm uma natureza mista e deviam estar sujeito a aplicação da lei
penal no tempo e não processual penal (2º CP):
(1) Prescrição do procedimento criminal – instituto misto – epígrafe “extinção da
responsabilidade criminal” – antes de extinguir processo, extingue efeito jurídico material
do crime = é antes de mais um instituto substantivo.
(2) Condições de procedibilidade (queixa, acusação particular) – aqui JLM discorda que seja
uma lei processual material – se o particular não se queixar/acusar não pode haver processo,
JML diz que chegamos a esta solução pela aplicação do art.º 5º, não precisamos de aplicar o
art.º 2º CP.
2) Diminuiu para metade os prazos estabelecidos no artigo 215.º do CPP.
Que consequências tem esse facto na situação de Diogo Vaz, que, de
acordo com a antiga lei só teria de ser libertado dentro de 6 meses,
muito embora, de acordo com a nova lei, devesse ser libertado hoje?
Aplicação imediata da lei nova = libertação imediata – 5/1.
Não se aplica nenhuma excepção do nº2.
Art.º 215º é uma norma processual material? Categoria trazida pelo Prof. Taipa de
Carvalho com apoio GMS e JFD – determinados institutos processuais dos quais depende
punição concreta do arguido têm uma natureza mista e deviam estar sujeito a aplicação da lei
penal no tempo e não processual penal (2º CP):
Ex. 1. Prescrição do procedimento criminal – instituto misto – epígrafe “extinção da
responsabilidade criminal” – antes de extinguir processo, extingue efeito jurídico material do
crime = é antes de mais um instituto substantivo.
Ex. 2. Condições de procedibilidade (queixa, acusação particular) – aqui JLM discorda que seja
uma lei processual material – se o particular não se queixar/acusar não pode haver processo,
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JML diz que chegamos a esta solução pela aplicação do art.º 5º, não precisamos de aplicar o art.º
2º CP
NÃO – não interfere com a qualificação de um facto como crime, nem dela depende a punição
concreta! Prisão preventiva é medida de coacção!
VI
A revisão do Código de Processo Penal, introduzida pela Lei n.º 48/2007, de
29 de Agosto, introduziu, entre outras, as seguintes alterações:
1) O princípio da publicidade foi estendido à fase de inquérito (arts. 86.º
ss.);
2) A prisão preventiva, salvo em caso de criminalidade violenta ou
altamente organizada, passou a só poder ser decretada em caso de
existirem fortes indícios da prática de crime doloso a que corresponda
pena de prisão de máximo superior a 5 anos, e não 3 anos como era
antes (art. 202.º);
A que processos se aplicam estas alterações?
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1) ATÉ 2007 – inquérito era secreto, era a regra; hoje é a publicidade, mas pode ser
requerido o segredo; a instrução pública, mas havia situações em que se justificava
prolongar o segredo de justiça.
EXCEPÇÃO AO 5/1 – art.º 5/2- quebra da harmonia e unidade dos actos processuais – 5/2 –
parte da ideia de que o acto processual não vale por si mesmo, o processo é um caminho – ex. antes tribunal
superior não podia conhecer da matéria de facto, salvo casos de erro notório na apreciação da prova; legislador veio estabelecer
então o actual 428º - as relações conhecem de facto e de direito – ex. processo que corre segundo lei antiga, não tinha
documentação, nova lei na se pode aplicar, não há prova registada, não pode haver repetição da audiência de julgamento (5/1 não
permite, porque era válida – ultra-actividade da lei anterior); em 98 isto aconteceu, mas havia disposição transitória = problema
concreto não se levantou
– quando lei nova pressupõe que processo passado tivesse decorrido de outra
forma, não se permite aplicação da nova lei.
= só se aplica aos processos novos.
ERRADO!!
JOANA COLAÇO – não quebra harmonia, aplica-se a regra!
2) REGRA – 5/1 – aplicação imediata (+ favorável ao arguido preso preventivamente)
VII
Na sequência de uma denúncia apresentada por António, por crime de furto
qualificado, é instaurado o competente inquérito, no dia 5 de Setembro de
1998. Iniciadas as investigações surgem indícios de que o agente do crime
será Bento.
1. Será obrigatório o interrogatório de Bento durante o inquérito,
sabendo-se que na redacção do CPP anterior à Lei n.º 59/98, de 25 de
Agosto, não existia qualquer preceito com o mesmo conteúdo do art.
272.º do mesmo diploma, na redacção introduzida pela mesma Lei?
Alteração CPP – quando entrou em vigor? Ver Lei para ver se há disposição
transitória – entrou em vigor a 15 de Setembro de 1998.
Inquérito instaurado a 5 de Setembro.
9
Interrogatório é mais um mecanismo de defesa = em nada o prejudica, pode
sempre exercer direito ao silêncio.
Também não quebra harmonia.
= aplicação imediata – art.º 5º nº1
2. Suponha agora que o processo foi instaurado em 1996 e que Bento é
condenado. Inconformado, o defensor de Bento interpõe recurso da
sentença no dia 15 de Dezembro de 1998. São aplicáveis ao julgamento
do recurso as alterações introduzidas ao CPP pela Lei n.º 59/98, de 25
de Agosto?
Alterações – 1 de Janeiro de 99 entraram em vigor (com excepção dos arts.º
do nº2 do art.º 10º).
Processo decorreu em 1996. Aplicam-se alterações? Tribunal de recurso
pode conhecer da matéria de facto, prova vai ser reapreciada MAS regras do
CPP alteraram-se quanto à produção de prova = quebra da harmonia – art.º
5º nº2 b)
VIII
Na sequência da apresentação de denúncia contra Carlos, em que lhe é
imputada a prática de um crime de furto qualificado (art. 204.º, n.º 1, do CP),
o M.P. instaura o competente inquérito no dia 2 de Julho de 2012. Obtida
fundada suspeita da prática deste crime, Carlos é interrogado na qualidade de
arguido pelo M.P. no dia 4 de Março de 2013 e confessa todos os factos que
lhe foram imputados. Responda às seguintes questões:
1. Se Carlos não comparecer na audiência de julgamento as suas
declarações podem ser lidas, nos termos do art. 357.º, n.º 1, al. b), do
CPP?
10
Alteração ao art.º 357º em 2013. Há disposições transitórias? Há art.º 4º - entrou em
vigor a 24 de Março de 2013.
Inquérito – 2 de Julho de 2012.
4 de março – interrogatório.
=
Quando entra em vigor já tinha sido interrogado MAS 4º nº2 da lei prevê que aos
arguidos cujo interrogatório já tenha sido realizado, continua a aplicar-se lei
anterior – ultra-actividade da lei anterior.
2. Suponha agora que o interrogatório de Carlos só tem lugar no dia 1 de
Abril de 2013. A sua resposta é a mesma?
Aí interrogatório já é após a entrada em vigor da lei. Art.º 4º nº2 a contrario =
aplicação da lei nova.
MAS – depois é que podemos ir ao art.º 5º pq antes temos norma transitória.
Não cai em excepções do nº2 do art.º 5º - problema é 141º nº4 b) MAS em
todo o caso mesmo que seja avisado, não agrava posição do arguido?
Agrava! Pode ser usado contra ele. Lei antiga era mais favorável.
MAS – JLM – não há fundamento constitucional no 5º nº2 a) = não deve
prevalecer sobre outra norma de direito transitório = vale 4º nº2!!
3. Supondo que Carlos vem a ser absolvido pela 1.ª instância e
condenado pela Relação, na sequência de recurso interposto pelo M.P.,
a uma pena de 2 anos de prisão, será este acórdão susceptível de
recurso para o S.T.J., sabendo-se que este recurso deixou de ser
admissível em virtude das alterações introduzidas ao art. 400.º do CPP
pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro?
(Acórdão do STJ nº 4/2009, D.R., I.ª Série-A, de 19/03/2009)
ALTERAÇÃO LEGISLATIVA
11
Redacção anterior – não era admissível recurso «de acórdãos condenatórios proferidos, em
recurso, pelas relações, que confirmem decisão de lª instância, em processo por crime a que
seja aplicável pena de prisão não superior a oito anos, mesmo em caso de concurso de
infracções» = a admissibilidade do recurso era aferida em função da pena abstractamente
aplicada ao crime que estivesse em causa.
Após a Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto – passou a não ser admissível recurso «de acórdãos
condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações que confirmem decisão de lª instância e
apliquem pena de prisão não superior a 8 anos» = com a nova redacção introduzida, a
admissibilidade do recurso é aferida em função da pena concretamente aplicada no caso.
Ac. STJ AUJ 18/02/2099
Acórdão recorrido – estando em causa processo iniciado antes da vigência da Lei 48/2007 de
29/08, que veio estabelecer a alínea f) do nº 1 do artigo 400° do Código de Processo Penal, é
admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que
confirmem decisão de primeira instância e aplique pena de prisão não superior a 8 (oito) anos
= há que afastar a aplicação da lei nova, no caso em apreciação, por força do art.º 5º nº2 a) limitação do direito de defesa, porque retira um grau de jurisdição (não pode recorrer para STJ
se aplicarmos lei nova, porque a 1ª instância aplicou pena de prisão não superior a 8 anos).
Acórdão fundamento de 10/01/2008 – STJ decidiu em sentido oposto sobre a mesma questão
de direito e no domínio da mesma legislação – decidiu que a nova redacção do artigo 400º, nº
1, alínea f) do CPP, após a Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, é imediatamente aplicável no caso
de acórdão proferido no domínio de vigência da lei nova.
Regra – 5/1 – razão = consideração do interesse público que domina todo o direito processual
e que pressupõe que a nova lei é a que melhor (e mais actualmente) corresponde aos
interesses prosseguidos e a realizar pelo direito processual.
Art.º 61º nº1 i) CPP – direito do arguido de recorrer, nos termos da lei, das decisões que lhe
sejam desfavoráveis = o estatuto do arguido não contempla um (irrestrito ou abstracto) direito
ao recurso, mas apenas o direito de recorrer das decisões que lhe sejam desfavoráveis nas
condições e segundo os pressupostos que a lei fixar.
MAS – limite = CRP – faz ascender o direito ao recurso à natureza de garantia constitucional
integrante do direito de defesa – artigo 32º nº 1 da CRP.
12
Perante a existência de uma decisão desfavorável, impor-se-á ainda verificar se tal decisão é,
«nos termos da lei», susceptível de recurso, e em que termos, de acordo com as regras e os
critérios de admissibilidade dos recursos – no caso de decisão condenatória, a verificação da
existência dos pressupostos dos quais, «nos termos da lei», depende a recorribilidade
(admissibilidade, instâncias e graus de recurso) só pode ocorrer quando seja proferida a
decisão.
RAZÃO = é o conteúdo da decisão que permite aferir, perante a natureza «desfavorável» da
decisão, quais os termos e a amplitude da recorribilidade.
=
O momento em que é proferida a decisão será «aquele em que se configura o exercício do
direito de dela recorrer, no pressuposto de que só depois de conhecida a decisão final surge
na esfera jurídica dos sujeitos processuais por ela afectados, na decorrência de um abstracto
direito constitucional ao recurso, o concreto “direito material” em determinado prazo, deste
ou daquele recurso ordinário ou extraordinário»
=
Momento relevante para verificar a admissibilidade de recurso = prolação da sentença.
=
STJ fixou a seguinte jurisprudência:
«Nos termos dos artigos 432º, nº 1, alínea b), e 400º, nº 1, alínea f) do CPP, na redacção
anterior à entrada em vigor da Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, é recorrível o acórdão
condenatório proferido, em recurso, pela relação, após a entrada em vigor da referida Lei,
em processo por crime a que seja aplicável pena de prisão superior a oito anos, que confirme
decisão de 1ª instância anterior àquela data».
MAS – declarações de voto = momento relevante não é o da prolação da sentença, mas o da
constituição como arguido:
“o acto que consubstancia o exercício do direito de defesa não é mais do que a concretização
de um direito que já está inscrito no estatuto do arguido e que lhe assiste pelo simples facto
de o ser” = é da constituição como arguido que geneticamente nascem os direitos que se irão
conformar e exercitar ao longo do processo.
=
13
O direito a recorrer não nasce pelo facto de, em concreto, se recorrer de uma determinada
decisão; consta já do estatuto do arguido desde o momento da sua constituição como tal e
pelo simples facto de o ser.
=
Daqui deriva que o momento em relação ao qual se deve aferir da maior ou menor amplitude
qualitativa do direito de defesa com vista aplicar no tempo da lei processual- artigo 5 do CPP- é
aquele em que é formatado o estatuto do arguido em função da sua constituição como tal.
JLM – momento relevante é o da constituição como arguido.
Se assumirmos que é o momento da decisão, afastamos a utilidade do art.º 5º
nº2 a)! Tudo o que acontecer até à decisão não releva.
IX
O Ministério Público deduziu acusação contra José Leal, imputando-lhe a
prática de um crime de falsificação de documentos, em concurso efectivo com
um crime de burla qualificada, por factos praticados em 1998. Quando os
autos são remetidos para julgamento está já em vigor a nova redacção do CPP,
introduzida pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro. O arguido
presta termo de identidade e residência nos termos da redacção do art. 196.º
do CPP introduzida por este diploma e é notificado do despacho que designa
o dia para a audiência de julgamento.
Na primeira data designada para a audiência de julgamento o arguido não
comparece, e o tribunal considera que a sua presença no início da audiência
não é indispensável para a descoberta da verdade.
Pode a audiência de julgamento ter lugar na ausência do arguido, nos termos
do disposto no art. 333.º da redacção em vigor do CPP, à data da audiência,
sendo certo que, de acordo com a redacção vigente na data da prática dos
factos, nesta situação a audiência era obrigatoriamente adiada?
(Acórdão do S.T.J. de 24/03/2004, C.J., 2004, t. I, pp. 232 e segs.)
AC. STJ 24/03/2004
 Factos praticados entre Outubro de 1994 e Outubro de 1999.
14
 Arguido não compareceu a julgamento, no dia 18/02/03, mas a audiência iniciou-se e foi
produzida prova.
 Foi marcada nova audiência para 18/03/03 – não compareceu novamente, mas tinha
enviado fax pedindo o adiamento.
 Arguido foi condenado
 Vem requerer nova audiência na qual possa exercer o seu direito ao contraditório, por ter
sido julgado à revelia quando não estavam presentes os pressupostos que legitimariam
esse julgamento.
=
1. O processo iniciou-se antes da entrada em vigor das alterações ao CPP:
(1) Alterou-se, entre outros, o art.º 333º de modo a permitir o julgamento imediato
do arguido faltoso, desde que observadas determinadas formalidades e garantias.
Antes – esta faculdade era mais restrita – ex. agora, o julgamento à revelia do
arguido pode ter lugar logo na primeira data designada para a audiência, enquanto
que, até 1 de Janeiro de 2001, havia necessariamente dois adiamentos, desde que
o próprio não desse o seu consentimento.
(2) Revogação do art. 380º-A - na sequência da possibilidade do julgamento à revelia,
permitia
ao
arguido
ausente
requerer
novo
julgamento.
2. Não há norma transitória no DL 320-C/2000 = Art.º 5º CPP
Nº2 a) - a lei processual não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua
vigência quando da sua aplicação imediata possa resultar agravamento sensível e
ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do
seu direito de defesa.
=
Comparando o quadro legislativo vigente na data em que o crime foi cometido e o
processo se iniciou com o que o substituiu, parece inquestionável que o primeiro
oferecia mais vastas garantias de defesa do que concede o segundo.
=
ao caso concreto não pode ser aplicada e lei nova, mas sim a lei antiga = nulidade
insanável = invalidade do julgamento + acordo condenatório.
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NO CASO: ele presta termo de identidade e residência já ao abrigo da nova lei, mas quando
ocorreram factos estava em vigor a lei antiga. Aplicação imediata da lei nova =
1. Quebra da harmonia? Prestou termo de identidade e residência ao abrigo da lei nova e
depois querem aplicar-lhe lei nova = não há problema nenhum.
2. Agravamento da situação do arguido? Sim, antes podia adiar 2 vezes.
X
Em determinado processo, que corre termos contra Fernando Oliveira, pela
eventual prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, e se
encontra em fase de julgamento, o juiz profere o seguinte despacho:
«Quando os presentes autos tiveram início, o crime de emissão de cheque
sem provisão era um crime público, nos termos do Decreto-Lei n.º 454/91.
Hoje, em virtude do disposto no art. 11.º-A do mesmo diploma, na redacção
que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 316/97, o procedimento criminal por
este crime depende de queixa. Acontece que, analisados os autos, conclui-se
que não foi apresentada queixa. Ora, o art. 2.º, n.º 4, do Código Penal,
determina que, em casos de sucessão de leis, deve aplicar-se ao agente o
regime que, concretamente, se mostrar mais favorável. Assim, sendo
claramente mais favorável o actual regime (que subordinou o exercício da
acção penal à existência de queixa) e concluindo-se que não foi exercido tal
direito de queixa nos seis meses posteriores à entrada em vigor da nova lei,
impõe-se julgar extinto o procedimento criminal contra o arguido,
relativamente a estes factos, por falta de legitimidade do Ministério Público
em prosseguir a acção penal (arts. 29.º, n.º 4 da Constituição da República
Portuguesa)».
O juiz decidiu bem?
(«Assento» n.º 4/99, D.R., I.ª Série-A, de 30/03/99 e Acórdão do S.T.J. de 05/04/2001, C.J., 2001, t. II,
pp. 176 e segs.)
ASSENTO Nº4/99
PROBLEMA = o crime de emissão de cheque sem cobertura, ocorrido na vigência do
DL 54/81 de 28 de Dezembro tem natureza pública, sendo por isso irrelevante para
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efeitos de se extinguir o procedimento criminal, a desistência de queixa feita pelo
queixoso?
Acórdão recorrido – julgou válida e relevante a desistência de queixa apresentada.
Acórdão fundamento – natureza pública do crime e irrelevância da desistência de
queixa.
PROBLEMA = discutia-se natureza do crime de emissão de cheque sem cobertura.
ANTES – crime semi-público.
APÓS DL 454/91 – crime público (decalcava-se do crime de burla)
DL 316/97 – o procedimento criminal por este crime depende de queixa = semi-
público.
STJ – “no domínio do CP de 1982, o crime de emissão de cheque sem provisão, previsto
e punido pelo art.º 11/1 do DL 454/91 de 28 de Dezembro, tinha a natureza pública,
sendo ineficaz a desistência de queixa pelo ofendido, sem prejuízo do disposto nos
arts.º 313/2 e 303º do mesmo Código.”
Problema do assento era anterior ao 11-A
AC. STJ 5/04/2001
Crime continuado (art.º 32º CP) de burla:
AO TEMPO DA PRÁTICA DO FACTO E INÍCIO DO PROCESSO = crime público.
ALTERAÇÃO LEGISLATIVA = crime-semi-público.
Acórdão recorrido – julgou extinto o processo por falta de legitimidade do MP, uma
vez que a lei nova faz depender o processo de queixa = aplicação do art.º 2/4 CP.
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CONTUDO – um dos ofendidos tinha dado conhecimento ao MP logo no dia a seguir
ao facto. EM TODO O CASO, era desnecessário, porque ao tempo do inicio do
processo, o MP podia iniciá-lo oficiosamente.
NOVA LEI não acarreta ilegitimidade do MP – “o que já se iniciou legitimamente,
iniciado está e permanece”
NOVA LEI =
1. Se processo ainda não se iniciou – depende de queixa.
2. Se processo já se iniciou – não depende de queixa, mas releva a desistência.
Problema das chamadas “Leis processuais materiais” – categoria trazida pelo Prof.
Taipa de Carvalho com apoio GMS e JFD – determinados institutos processuais dos
quais depende punição concreta do arguido têm uma natureza mista e deviam estar
sujeito a aplicação da lei penal no tempo e não processual penal (2º CP):
1. Prescrição do procedimento criminal – instituto misto – epígrafe “extinção da
responsabilidade criminal” – antes de extinguir processo, extingue efeito
jurídico material do crime = é antes de mais um instituto substantivo daí se
aplicar 2º (JLM), não é uma norma processual material ao contrário do que esta
doutrina diz
2. Condições de procedibilidade (queixa, acusação particular) – aqui JLM
discorda que seja uma lei processual material – se o particular não se
queixar/acusar não pode haver processo, JML diz que chegamos a esta
solução pela aplicação do art.º 5º, não precisamos de aplicar o art.º 2º CP +
as condições de procedibilidade são questões meramente processuais +
prescrição aplica-se art.º 2º mas precisamente porque tem efeitos materiais,
não é lei processual material. Discorda de GMS, porque ou bem que se
aplica regras de processo penal e volta tudo para trás ou aplica-se 5º e não
há nada que fazer estas distinções pq aplicação imediata!
APLICAÇÃO PRÁTICA
JLM/jurisprudência
dominante
Crime público passa a ser
semi-público ou particular
Retira as consequências do
art.º 5º nº1 sem necessidade
de recorrer ao art.º 2º CP:
1. Se o processo já está
a correr, no crime
semi-público há a
possibilidade
de
desistir da queixa
Crime semi-público ou particular passa a ser público
Aplicação do art.º 5º
+
Se não estivermos na fase de julgamento, pode haver um
agravamento processual da posição do arguido (art.º 5/2 a)) =
há ultra-actividade da lei antiga, podendo haver desistência da
queixa (mesmo quando é semi-público e já houve queixa e já
estamos no inquérito)
18
2. Se o crime passa a
particular, temos de
distinguir:
(1) Fase de inquérito
–
necessário
constituir
assistente para
deduzir acusação
particular.
(2) Fase de instrução
ou julgamento –
possibilidade de
desistência
da
queixa.
GMS – adere à teoria
das normas
processuais
materiais, mas com
nuances
Doutrina das leis
processuais materiais
O momento relevante para o
início do prazo de queixa é o
momento da entrada em
vigor da nova lei, porque
antes disso o ofendido não
sabia.
Aplica o art.º 2º nº4 CP,
porque se trata de uma lei
processual penal material
mas
de
forma
mais
moderada
=
pp.
da
retroactividade da lei mais
favorável ao arguido:
1. Fase de inquérito – o
processo deve voltar
atrás e o MP
depende de queixa
ou acusação do
assistente
para
promover o processo
2. Fase da instrução ou
julgamento
–
o
ofendido
pode
desistir da queixa
Art.º 2º nº4 CP
=
Aplica-se ultra-activamente a lei antiga, por ser mais favorável
ao arguido.
1. Se estiver na fase de inquérito = possibilidade de
desistência da queixa
2. Fase da instrução ou julgamento – temos de distinguir:
(1) Crime semi-público – ainda pode haver desistência
da queixa
(2) Crime particular – já não há qualquer vantagem
em aplicar ultra-activamente a lei mais favorável
O momento relevante para o
início do prazo de queixa é o
momento da prática do facto
– protecção do arguido.
Aplica-se retroactivamente a Aplica-se ultra-activamente a lei antiga, por ser mais favorável
lei nova, por ser mais ao arguido (2/4 CP)
favorável ao arguido (art.º 2º
nº4 CP). Não importa fase
≠GMS
Momento relevante para o
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início do prazo de queixa =
momento da entrada em
vigor da nova lei, porque
antes o ofendido não sabia.
Na SOLUÇÃO o PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO encontra-se de acordo com a
posição do PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA E DO PROF. TAIPA DE
CARVALHO; a divergência assenta no FUNDAMENTO.
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