See discussions, stats, and author profiles for this publication at: https://www.researchgate.net/publication/338532297 Há gamificação na Psicologia brasileira? Article in Perspectivas em Psicologia · October 2019 DOI: 10.14393/PPv23n1a2019-51040 CITATIONS READS 0 143 2 authors, including: Adriano Furtado Holanda Universidade Federal do Paraná 174 PUBLICATIONS 887 CITATIONS SEE PROFILE All content following this page was uploaded by Adriano Furtado Holanda on 21 January 2020. The user has requested enhancement of the downloaded file. Volume 23, N. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019. HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Rafael Goulart Lodi Adriano Furtado Holanda (Universidade Federal do Paraná – UFPR – Curitiba – PR) Resumo Este artigo é uma revisão bibliográfica sistemática sobre estudos acerca do fenômeno da gamificação em periódicos brasileiros de Psicologia. Gamificação pode ser definida como “o uso de elementos de design de jogos em contextos que não são de jogos”, e tem como propósito propiciar o engajamento ou desempenho dos indivíduos em alguma atividade. Não foram encontrados artigos que abordassem explicitamente esse tema. Decidiu-se expandir a pesquisa para fenômenos relacionados, como jogos educativos. Foram encontrados e analisados 24 artigos. Os resultados apresentam grande diversidade de abordagens teóricas, amostras, métodos e contextos de intervenção. As conclusões sugerem a eficácia do uso de recursos lúdicos em atividades não lúdicas. Mais pesquisas são recomendadas para se esclarecer os impactos da gamificação. Palavras-chave: Gamificação, Revisão Bibliográfica Sistemática; Jogo; Lúdico; Ludificação. Abstract Is There Gamification in Brazilian Psychology? - A Systematic Bibliographic Review This paper is a systematic literature review about studies concerning gamification in Brazilian Psychology journals. Gamification can be defined as “the use of game design elements in non-game contexts”, and its purpose is the affordance of individuals´ engagement or performance in some task. No papers that dealt explicitly with this theme were found. It was decided to expand the research to related phenomena, such as educational games. 24 papers were found and analyzed. The results present great diversity of theoretical approaches, samples, methods and contexts of intervention. The conclusions suggest the efficacy of the use of ludic resources in non-ludic activities. More research is recommended to identify gamification´s impact. Keywords: Gamification, Systematic Literature Review, Game, Ludic, Ludification. 112 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Deterding et. al. (2011) apresentam Introdução os O fenômeno chamado de debates acompanharam terminológicos que o da surgimento gamificação ainda é recente no meio gamificação e propõem uma definição que acadêmico, e um nicho de pesquisa que a não apenas se beneficia, como requer a semelhantes, como os “jogos sérios”; que realização de investigações de maneira a se caracterizam por serem jogos completos propiciar um entendimento mais preciso de projetados com objetivos primários que sua extensão e repercussões. Deterding, não o entretenimento (como educação ou Dixon, Khaled e Nacke (2011) definem marketing, gamificação como “o uso de elementos de gamificação visa tornar outros contextos e design de jogos em contextos que não são atividades mais motivadoras através da de jogos”1. Já Hamari, Koivisto e Sarsa implementação de elementos do design de (2014) a definem como “um processo de jogos, dos traços característicos e comuns aprimorar de aos jogos, ainda que não necessariamente motivacionais2” exclusivos destes. Para isso, sugerem o uso (motivacional affordances) de maneira a dos termos “joguidade” ou “gamidade” promover “experiências gamificantes” (gamefulness) (gameful experiences) “desenvolver (gameful design). O primeiro termo se serviços “propiciadores através e distinga de p. outros ex.). e Ao “design fenômenos contrário, a gamificante” respostas comportamentais” (further refere à característica de algo que se behavioral outcomes)” A principal aproxima e se parece com um jogo, proposta por trás desta abordagem é enquanto o segundo se refere a uma aproveitar o potencial de promoção de perspectiva de design que concede essa engajamento e motivação latente nos aparência de jogo sobre o projeto em que é jogos, e aplicá-lo a outros contextos nos aplicada. quais estas duas características estejam defasadas. Considerando a importância de definições claras acerca dos objetos que se pretende estudar, faz-se também necessário definir o que se entende por “jogo”. 1 Todas as traduções são feitas dos originais em inglês, pelos autores. 2 O termo foi utilizado originalmente em inglês. Como não há tradução oficial, optamos por utilizar uma tradução livre própria. Ao longo deste artigo, outros termos entre aspas seguidos de um termo em inglês, em itálico entre parênteses, seguem o mesmo padrão. Decidiu-se orientar este artigo pela definição de Huizinga (2008): 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA Numa tentativa de resumir as padrão de indícios positivos acerca da características formais do jogo, eficácia da gamificação, porém ressalvam poderíamos considerá-lo uma que alguns estudos relatam uma eficácia conscientemente apenas marginal, e que há ainda a tomada como "não-séria" e exterior à necessidade de explorar a repercussão em vida habitual, mas ao mesmo tempo diversos contextos diferentes. Também capaz de absorver o jogador de apontam que não foi possível realizar uma maneira intensa e total. É uma metanálise atividade desligada de todo e qualquer metodologias e variáveis, apontando ainda interesse material, com a qual não se que pode obter qualquer lucro, praticada claramente recorrentes na literatura. atividade livre, devido também à não há variedade de metodologias dentro de limites espaciais e temporais Nesta mesma revisão, Hamari et. próprios, segundo uma certa ordem e al. (2014) também identificam que a certas regras. (p.16) gamificação é um fenômeno multidisciplinar. Por um lado, deriva de Se reconhece que esta definição não é a única existente, nem exaure o conjunto variado de fenômenos que podem ser reunidos sob o termo “jogo”. Dito isto, optou-se por ela tanto por sua importância histórica, quanto por ser compatível com a maneira que o termo “jogo” é utilizado nas definições de gamificação. acadêmica existente, Hamari et. al. (2014) uma revisão bibliográfica sistemática acerca de estudos quantitativos e qualitativos sobre o tema gamificação, e refinam sua análise a artigos que abordam respostas comportamentais e psicológicas, elementos de jogo Computação, no que tange a teoria do desenvolvimento de jogos, usabilidade e confecção de jogos eletrônicos. Por outro, ela se ocupa, essencialmente, da análise e aplicação de elementos motivadores do comportamento humano. Considerando esta perspectiva, a Psicologia se constitui Buscando reconhecer a produção realizam conhecimentos do Design e da Ciência da utilizados como “gamificantes”, e áreas de implementação da gamificação. Eles concluem que há um como um dos gamificação e, pilares teóricos portanto, da torna-se responsável em parte (em conjunto com as outras áreas citadas) por investigar a validade das respectivas hipóteses propostas. A pertinência à Psicologia do estudo da gamificação decorre não apenas do fato de os fenômenos acerca do comportamento humano serem próprios 114 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA desta área, como também pelas evidências comportamentos que indicam que ela pode se constituir (como o aprendizado de certos temas ou como um recurso precioso em áreas de habilidades, por exemplo). Nesse esquema, atuação da própria Psicologia, como a o design do jogo é entendido como um educação. No contexto da Psicologia processo de modelagem do comportamento nacional, Panosso, Souza e Haydu (2015) do próprio designer que, a partir do realizam uma revisão de literatura sobre feedback advindo das partidas testes, pode pesquisas empíricas com jogos educativos gradativamente e analisam os artigos sob a ótica da Análise comportamentos de decisão do design, e do um assim conseguir determinar que elementos potencial promissor dos jogos como do jogo eliciam que tipos de respostas ferramenta de comportamentais nos jogadores; e por fim contingências que contribuam para o identificar os elementos pertinentes para a aprendizado; e apontam que o jogo pode modelagem visada. Perkoski et. al. (2016) ser entendido como uma ferramenta que também cria um contexto propício para modelagem processo do design iterativo para a de comportamentos, uma vez que suas observação regras estabelecem jogadores enquanto estão jogando, pois contingências claras de reforçamento e segundo a Análise do Comportamento, esta punição é a forma mais fidedigna de perceber as Comportamento, de e sugerindo estabelecimento objetivos para determinados comportamentos. de antemão refinar ressaltam do contingências Benevides, Gris, Perkoski e Souza visados a seus importância comportamento de controle de do dos um comportamento; uma vez que o relato (2016) examinam, a partir da perspectiva verbal dos jogadores pode analítico-comportamental, o processo do correspondente com elas. não ser design iterativo3 de jogos. Esta abordagem Desurvire, Caplan e Toth (2004) visa realizar um protótipo de jogo o quanto em seu artigo sobre o uso da heurística na antes durante o processo de design e, a avaliação da jogabilidade, chegam a partir de repetidas partidas testes, ir conclusão aprimorando gradualmente o jogo de investigar se é possível identificar noções maneira gerais do design de jogos que antecipem que ele elicie certos certas “Iterativo” se difere de “interativo” e se refere a um processo de repetição, no qual cada resultado parcial serve de fundamento para aprimorar o resultado final. 3 semelhante. experiências Eles pelos buscam jogadores. Percebem que, ainda que se possam derivar orientações para o design do jogo a 115 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA partir de relatos e experiência dos indivíduos engajados na pesquisadores, o sucesso da eliciação de atividade. Defende que o sucesso na certas e abordagem da gamificação consiste em afetivas só pode ser avaliado com base na identificar quais elementos de jogos se observação dos jogadores enquanto jogam. relacionam com que tipos de motivação, e Porém, concluem que o método heurístico como implementar estes elementos a um de fazer suposições acerca de relatos é útil contexto que não é de jogo. Também nas etapas iniciais do design, pois colabora propõe que existem quatro fases de para a criação de hipóteses a serem envolvimento do jogador, cada uma se testadas no processo do design iterativo. beneficiando de tipos diferentes, que também respostas de jogadores comportamentais Em relação às formas de avaliar a de motivação pode ser experiência de jogo, Nacke, Drachen e reproduzida em outros contextos. Assim, Göbel (2010) propõe alguns métodos: afirma testagem psicofisiológica (que inclui o uso gamificação bem-sucedida deve ter em de aparelhos como eletroencefalograma e vista que os tipos de motivação dos eletromiograma); usuários rastreamento ocular; que uma implementação provavelmente se de alterarão análise de dados comportamentais baseado durante momentos diferentes da atividade, no registro dos comportamentos emitidos e que é importante identificar que tipo de ao longo do jogo e entrevistas quantitativas motivação rege cada momento. e qualitativas. É importante ressaltar que estes autores estão considerando Por fim, é interessante citar alguns casos de gamificação, de maneira a metodologias de análise voltadas para propiciar jogos digitais e, portanto, algumas destas desdobramentos práticos. Hamari (2013) propostas podem não ser tão pertinentes na realizou um experimento de gamificação análise de jogos analógicos. em um site de vendas e trocas online. Sua Outro modelo de análise no abordagem uma se ideia deu por de meio seus da contexto da gamificação é o Octalysis, implementação de um sistema de insígnias, desenvolvida por Chou (2016) que propõe que eram liberadas à medida que os que a motivação gerada por ela pode ser usuários realizavam certas ações, como resumida de completar certo número de transações ou “motivadores fundamentais” (core drives); avaliar certo número de usuários e sendo que cada tipo de motivador traz produtos. Além de uma figurinha em seu consequências perfil, as insígnias não resultavam em em oito categorias diferentes para a 116 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA nenhum ganho aos usuários. Os usuários moléculas que se registraram no site após o início do algoritmos de previsão tem dificuldade de experimento distribuídos produzir modelos pertinentes. Frente a esse aleatoriamente em quatro grupos distintos: problema, foi criado o programa “Foldit”; um tinha acesso tanto ao critério de que permite a qualquer usuário de internet liberação à (ainda que leigo em biologia e química) visualização das insígnias liberadas por mexer com modelos virtuais de proteínas e outros usuários, outro tinha apenas acesso os desafia a apresentar a forma mais aos critérios de liberação (não sabendo as eficiente insígnias de outros usuários), outro apenas assemelhando-se a um quebra-cabeça 3D. podia visualizar as insígnias dos outros A usuários (além das suas próprias) mas não voluntários sabia os critérios de liberação, e o último modelo grupo não tinha acesso a nenhuma das avançar uma pesquisa sobre o vírus da duas AIDS. foram das insígnias informações quanto (podendo apenas de proteína de partir se dobramento deste programa, conseguiram que enrolam, ajudou desta, jogadores produzir um pesquisadores a visualizar suas próprias insígnias, mas sem Em vista desta breve revisão, se saber como liberá-las). Os resultados percebe que a gamificação é um fenômeno demonstraram um aumento na atividade no novo, complexo e rico em possibilidades site por parte dos usuários que tinham de algum tipo de informação sobre as Psicologia. Assim, se tratando de uma insígnias grupos). nova área de estudo, é pertinente que se Porém, este aumento foi extremamente estabeleça um cenário da produção atual marginal, e não houve uma grande sobre este tema, a fim de esclarecer o que diferença entre os três primeiros grupos. O já foi investigado, e expor métodos estudo conclui que o tema precisa ser mais utilizados e bem explorado e, considerando a lógica (Conforto, Amaral utilitária e clara por trás de um site de Considerando que a maioria dos artigos vendas, sugere que o contexto na qual a citados por Deterding et. al. (2011) e gamificação se dá pode ser determinante Hamari et. al. (2014) são de origem para sua viabilidade e sucesso. estrangeira, e que não há um destaque (os três primeiros pesquisa, especialmente conclusões e para a alcançadas Silva, 2011). Khatib et. al. (2011) apresentam claro de artigos em Psicologia, este um caso de gamificação bem-sucedido. No trabalho tem o objetivo de levantar a ramo de pesquisa sobre a forma como 117 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA produção científica acerca da gamificação forma, decidimos extrapolar a noção de com recorte na Psicologia brasileira. “elementos de design de jogos”; e tanto jogos completos, quanto atividades lúdicas sem Método regras bem definidas, foram considerados válidos na busca de artigos Realizou-se busca por artigos em pertinentes à proposta da pesquisa. A título duas bases de dados: Scielo e Pepsic. A de síntese de linguagem, ao longo deste escolha dessas bases foi feita em função do artigo nos referiremos a esse conjunto de escopo da revisão ser limitado a artigos fenômenos como “recursos lúdicos”. brasileiros e em português. As buscas Então, realizadas na plataforma Scielo, foram subsequentes refinadas pelas seguintes áreas temáticas: Game AND Design; Design AND Jogos; Ciências Sociais “Design de Jogos”; Ludificação; Jogo e Aplicadas e Multidisciplinar (segundo a “Ludic”. Por fim, logo no início da categorização Scielo); e Ciências sociais, pesquisa de artigos pela palavra-chave interdisciplinar; Humanidades, “jogo” na plataforma Pepsic, encontramos multidisciplinar; Psicologia, uma quantidade significativa de artigos multidisciplinar; Psicologia; Psicologia, que usavam o termo no referencial teórico aplicada; Psicologia, biológica; Psicologia, de Winnicott (1989). Esses artigos foram clínica; educacional; excluídos da procura, pois nesses casos o Psicologia, psicanálise e Psicologia, social conceito de jogo implicava um fenômeno (segundo à categorização Web of Science). consideravelmente Humanas; Psicologia, Ciências realizamos com as buscas palavras-chave: distinto daquele A busca foi feita através de definido por Huizinga (2008). Assim, foi palavras-chave no título ou resumo dos adotada a palavra-chave modificada “Jogo artigos. As palavras-chave inicialmente AND NOT Winnicott”, ao invés de apenas foram: Gamification e Gamificação. Não jogo. foram encontrados resultados para esses termos. Percebendo-se a ausência de Os resultados dessa primeira busca são apresentados na Tabela 1. artigos que tratavam explicitamente do fenômeno da gamificação, optamos por expandir a busca para palavras-chaves relacionadas, visando identificar artigos que se aproximassem do tema. Dessa 118 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Palavra-chave (Scielo) Número Palavra-chave (Pepsic) Número Gamification Gamificação. Game AND Design Design AND Jogos “Design de Jogos” Ludificação Jogo 0 0 0 2 0 0 156 0 0 4 3 0 0 239 “Ludic” 14 Gamification Gamificação. Game AND Design Design AND Jogos “Design de Jogos” Ludificação Jogo AND NOT Winnicott “Ludic” 35 Tabela 1 - Resultados da 1a busca A partir desses resultados, ou uma brincadeira, no sentido de realizamos a leitura dos resumos dos atividade lúdica; mas à uma forma artigos e excluímos aqueles que: 1) não figurativa (ex. “Jogo de Poder”; “Jogo de usavam o recurso lúdico como um Palavras”; “estar em jogo”). Após essa instrumento de intervenção (Por exemplo, seleção, e retirando-se os artigos repetidos, artigos de relato e análise de brincadeiras chegamos a 82 artigos; discriminados por infantis espontâneas, não inseridas e/ou suas palavras-chaves, apresentados na mediadas pelos autores); 2) o termo “jogo” Tabela 2: não se refere a um jogo digital, analógico Palavra-chave (Scielo) Gamification Gamificação. Game AND Design Design AND Jogos “Design de Jogos” Ludificação Jogo Número 0 0 0 0 0 0 35 “Ludic” Tabela 2 - Resultados da 2a busca 3 Esses 82 artigos foram lidos na Palavra-chave (Pepsic) Gamification Gamificação. Game AND Design Design AND Jogos “Design de Jogos” Ludificação Jogo AND NOT Winnicott “Ludic” explicitamente; Número 0 0 3 1 0 0 36 4 2) examinavam íntegra e então realizamos uma terceira intervenções experimentais com recursos seleção; apenas com os artigos que se lúdicos. enquadravam nos seguintes critérios: 1) Artigos que apenas citavam ou investigavam os recursos lúdicos como relatavam pontualmente o uso de recursos variáveis independentes, ainda que não lúdicos para algum fim, sem elaborar uma 119 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA investigação metódica dos efeitos da teóricos foram excluídos. intervenção ou artigos exclusivamente Resultados Os artigos analisados foram lidos resultados; e elementos motivadores. Cada na íntegra e os dados extraídos para categoria, incluindo suas subcategorias, comparação foram organizados em 12 será apresentada a seguir. categorias: ano de publicação; referencial teórico; contexto da intervenção; tipo de pesquisa; número de Ano de Publicação participantes; variável dependente; natureza do recurso Essa categoria se refere ao ano de lúdico; mediação da intervenção; método publicação do artigo. Os resultados são de análise; existência de grupo controle; apresentados no Gráfico 1. Gráfico 1 - Ano de Publicação Agrupamos esses artigos em intervalos de cinco anos e calculamos sua porcentagem cumulativa. Os resultados são apresentados na Tabela 3. 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Período Quantidade de Artigos Porcentagem Cumulativa Últimos 5 Anos 8 33,3% Últimos 10 Anos 21 87,5% Últimos 15 Anos 23 95,6% Últimos 20 Anos Tabela 3 - Período de Publicação 24 100% Referencial Teórico Essa categoria se refere a que declarou se orientar para realizar a abordagem teórica da Psicologia o estudo Referencial Teórico Análise Experimental do Comportamento Epistemologia Genética Não Especificado Psicologia Analítica Terapia CognitivaComportamental Ecologia e Política Cognitiva Psicologia Cognitiva Psicodrama Psicologia Histórico-Cultural Psico-Oncologia Teoria dos Sistemas Ecológicos Sociodrama-Pedagógico Tabela 4 - Referencial Teórico investigação e a análise dos resultados. Quantidade de Artigos Porcentagem 5 20,8% 4 4 2 16,7% 16,7% 8,2% 2 8,2% 1 1 1 1 1 1 1 4,2% 4,2% 4,2% 4,2% 4,2% 4,2% 4,2% Contexto de Intervenção a promoção do aprendizado de novos conhecimentos Essa refere dos participantes da intervenção. Os artigos ambiente de intervenção da pesquisa; tanto agrupados nesta categoria tinham como o ambiente físico na qual ela ocorreu, objeto de estudo o impacto do recurso quanto experimental lúdico em algum aspecto da promoção de relacionada. A partir da leitura dos artigos, aprendizados. O contexto de saúde se identificamos dois contextos distintos: refere educação e saúde. designados para o tratamento de condições orientação se habilidades ao à categoria e a ambientes principalmente O contexto de educação se refere a que prejudiquem o bem-estar físico ou ambientes principalmente designados para subjetivo dos participantes da intervenção. 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Os artigos agrupados nesta categoria desenvolvimento de habilidades para o tinham como objeto de estudo o impacto tratamento de condições prejudiciais ao do recurso lúdico em algum aspecto do bem-estar dos sujeitos da pesquisa. Esses tratamento ou promoção de bem-estar. artigos foram agrupados em uma terceira Alguns artigos apresentaram uma categoria educação e saúde, e não foram interseção significativa dessas áreas, por contabilizados nas investigarem o impacto dos recursos anteriores (Tabela 5). duas categorias lúdicos no aprendizado de conteúdos e Contexto Educação Saúde Educação e Saúde Tabela 5 - Contexto da Intervenção Quantidade de Artigos 17 4 3 Porcentagem 70,8% 16,7% 12,5% Além disso identificamos, em cada contexto, subcategorias dos ambientes específicos de intervenção. Digno de nota, no contexto educação, foi a maioria de estudos realizados no ensino fundamental (9 de 17 artigos). Tipo de Pesquisa qualitativa-quantitativa. Os resultados se encontram na Tabela 6. Essa categoria distingue as pesquisas em qualitativa, quantitativa e Tipo de Pesquisa Qualitativa Quantitativa Qualitativa-Quantitativa Tabela 6 - Tipos de Pesquisa Quantidade de Artigos 13 6 5 Número e Idade dos Participantes Porcentagem 54,2% 25% 20,8% que houvesse um padrão claro. Em função disso, decidimos não criar categorias. Houve grande variedade de tamanhos de amostra e faixas etárias, sem Variável Dependente Essa categoria se refere à variável dependente da qual a intervenção com o 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA recurso lúdico era variável independente. inclui as pesquisas que analisaram o A partir dos dados analisados, traçamos impacto da intervenção sobre o aquisição e três de desenvolvimento de habilidades cognitivas específicos; ou comportamentais, que não se limitam a desenvolvimento de habilidades; e efeitos conteúdos específicos (como capacidade terapêuticos de categorias: aprendizado conhecimentos (Os resultados são leitura e escrita, habilidades de apresentados na Tabela 7): (a) A categoria interação interpessoal, e de reflexão e aprendizado de conhecimentos específicos escolha de hábitos alimentares); (c) A inclui as pesquisas que buscaram analisar o categoria efeitos terapêuticos inclui as impacto a pesquisas que buscaram analisar o impacto memorização e compreensão de conteúdos da intervenção sobre o bem-estar físico ou objetivos; tais como regras de acentuação subjetivo dos participantes (como redução gramatical e fatos sobre DNA; (b) A de ansiedade e superação de dificuldades categoria desenvolvimento de habilidades neuromotoras). da intervenção sobre Variável Dependente Aprendizado de conteúdos específicos Desenvolvimento de Habilidades Efeitos Terapêuticos Tabela 7 - Variável Dependente Quantidade de Artigos Porcentagem 5 20,8% 15 4 62,5% 16,7% Natureza do Recurso Lúdico encerramento do jogo; (c) Brincadeiras A partir dos artigos analisados, analógicas são requerem o atividades uso de que não equipamentos decidimos agrupar os resultados nas eletrônicos; e que se assemelham a jogos seguintes categorias: (a) Jogos analógicos contendo se referem a jogos que não necessitam de comportamentos equipamentos serem atividade, porém, ao contrário dos jogos, jogados, e possuem regras que estipulam não possuem condições pré-estabelecidas claramente uma condição de vitória e de vitória ou encerramento; (d) A categoria encerramento do jogo; (b) Jogos digitais se outros abarca casos particulares como referem a jogos que requerem o uso de jogos equipamentos serem elementos analógicos quanto digitais), e jogados, e possuem regras que estipulam recursos lúdicos como uso de filmes para claramente uma condição de vitória e promover debates. eletrônicos eletrônicos para para regras híbridos que dos (que orientam os participantes na utilizam tanto 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA É importante ressaltar que, por conterem mais de uma forma de intervenção, alguns artigos foram incluídos em mais de uma categoria (Tabela 8). Natureza do Recurso Lúdico Quantidade de Artigos 15 Jogos analógicos 2 Jogos digitais 7 Brincadeiras analógicas 3 Outros Tabela 8 - Natureza do Recurso Lúdico Mediação da Intervenção Essa categoria se refere à presença Porcentagem 62,5% 8,3% 29,2% 12,5% desafios específicos na realizada. Intervenções não foram aquelas nas quais apenas intervenção participantes, esclarecendo seu entendida como o acompanhamento dos funcionamento, mas eles pesquisadores interagirem ou recurso outros lúdico, supervisores sem lúdico se apresentou o recurso mediadas ou ausência de mediação durante a com o intervenção aos deixando qualquer tipo de treinados previamente por eles (como pais assistência ou ajuste na atividade. Os e professores), durante a atividade, de resultados estão na Tabela 9. maneira a conduzir, orientar ou propor Mediação da Intervenção Mediada Não Mediada Tabela 9 - Mediação da Intervenção Quantidade de Artigos 19 5 Método de Análise Porcentagem 79,2% 20,8% intervenção. Esses registros foram gravações audiovisuais das atividades ou Essa categoria refere aos diários de campo, e são de natureza instrumentos e métodos utilizados para qualitativa; (b) avaliar os resultados das intervenções. A qualitativos inclui partir resultados foram obtidos de relatos dos da análise dos artigos ou Análise artigos outros de relatos nos quais desenvolvemos quatro categorias para participantes classificá-los. (a) Observação qualitativa: pertinentes (como pais e professores). os resultados foram parcialmente obtidos Esses relatos incluem entrevistas gravadas da análise dos registros de observação dos e escritas, questionários qualitativos e participantes antes, durante, e depois da relatos espontâneos observadores dirigidos aos 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA pesquisadores ao longo da pesquisa; (c) quantitativos Análise de testes, nos quais os resultados diferentes partidas), mas não representa o foram integral ou parcialmente obtidos de uso de testes consolidados. Essa categoria testes psicométricos ou de proficiência em só inclui artigos nos quais o recurso lúdico alguma habilidade ou conhecimento; (d) utilizado foi um jogo de regras, pois a Análise de desempenho em jogo inclui análise foi realizada em função das artigos nos quais os resultados foram condições de vitória, não presente nas parcialmente da brincadeiras e outros recursos lúdicos. variação de desempenho dos participantes Além disso, ressalta-se que os artigos ao longo de múltiplas partidas do jogo de poderiam ser enquadrados em mais de uma regras. Essa categoria se diferencia de categoria. obtidos da análise (como pontuação em observação qualitativa e análise de testes, pois se pauta em dados objetivos e Método de Análise Observação qualitativa Análise de relatos qualitativos Análise de testes Análise de desempenho em jogo Tabela 10 - Método de Análise Quantidade de Artigos 18 17 9 8 Existência de Grupo Controle Porcentagem 75% 70,8% 37,5% 33,3% comparado com o grupo experimental no qual se realizou a intervenção com o Essa categoria se refere à existência ou não de um grupo controle a ser recurso lúdico. Os resultados se encontram na Tabela 11 . Existência de Grupo Controle Quantidade de Artigos 3 Sim 21 Não Tabela 11 - Existência de Grupo Controle Resultados Porcentagem 12,5% 87,5% questão. Dois padrões foram observados e organizados nas seguintes categorias: Essa categoria se refere aos resultados concluídos pelos estudos acerca da eficiência da intervenção com recurso lúdico sobre a variável dependente em melhora significativa; e melhora marginal ou relação inconclusiva. Melhora significativa se refere a artigos que sugerem que houve uma 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA melhora notável na variável dependente intervenção com recursos lúdicos. estudada, e que pode ser atribuída à Também inclui artigos nos quais se intervenção com recursos lúdicos. Já a observou alguma melhora na variável categoria melhora marginal ou relação dependente, porém não ficou clara a inconclusiva se refere a artigos que relação entre ela e a intervenção com registram melhorias insignificantes na recursos lúdicos. Os dados se encontram variável dependente estudada em relação à na tabela 12. Resultados Melhora significativa Melhora marginal ou relação inconclusiva Tabela 12 - Resultados Quantidade de Artigos 18 Porcentagem 75% 6 25% Motivadores Fundamentais Desenvolvimento e Conquista são classificados os recursos lúdicos que Essa categoria buscou identificar os propiciam aos participantes a sensação de “motivadores aquisição e aprimoramento de habilidades principais elementos fundamentais” (core drives) que atuavam e/ou em cada intervenção, baseado no modelo Empoderamento Octalysis Foram Feedback são classificados os recursos observados cinco dos oito motivadores lúdicos que permitem os participantes fundamentais: Sentido Épico e Chamado; descobrir e utilizar formas diversas de se Desenvolvimento alcançar de Chou Empoderamento (2016). e Conquista; a conquista um de da mesmo prêmios. Em Criatividade e objetivo, ou da Criatividade e apresentam aos participantes, respostas Influência Social e claras de seu desempenho na atividade e Relacionamento; e Imprevisibilidade e do impacto de suas ações. Em Influência Curiosidade. Social e Relacionamento são classificados Feedback; Em Sentido Épico e Chamado são os recursos lúdicos que promovem a classificados os recursos lúdicos que interação e criação lançam os participantes em uma imersão interpessoais. narrativa, não necessariamente fantástica, Curiosidade são classificados os recursos mas que produz um sentido à atividade lúdicos que promovem uma sensação de sobre a qual ocorreu a intervenção, que incerteza e/ou confrontam os participantes estava ausente antes de sua inserção. Em com algo desconhecido que pode ser Em de vínculos Imprevisibilidade e 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA explorado. Ressalta-se que as intervenções motivador fundamental. Os resultados são de cada artigo podiam conter mais de um apresentados na tabela 13. Motivador Fundamental Quantidade de Artigos 12 Sentido Épico e Chamado 15 Desenvolvimento e Conquista Empoderamento da 19 Criatividade e Feedback Influência Social e 5 Relacionamento Imprevisibilidade e 3 Curiosidade Tabela 13 - Motivadores Fundamentais Porcentagem 50% 62,5% 79,2% 20,8% 12,5% aumento ocorreu ao longo do mesmo Discussão período. Inclusive, poderíamos especular O primeiro fato digno de nota é a que o pico de produção nacional em 2014 total ausência de artigos que utilizassem os seria uma repercussão da visibilidade que o termos ou assunto ganhou no exterior. Todavia, a mesmo ludificação. Este já é um forte redução na produção nacional nos anos indicativo da novidade do fenômeno no seguintes vai na contramão da tendência contexto da Psicologia brasileira. Outro internacional. fato que suporta a emergência do tema são apontamentos, visto que há poucos dados as datas de publicação. Embora o artigo para mais antigo seja de 1998, é notável que afirmação mais formal. Vale lembrar que 87,5% da bibliografia tenha sido produzida nenhum dos artigos trata exatamente de nos últimos 10 anos. gamificação, porém podemos perceber que gamificação, gamification Segundo Deterding et. al. (2011), o houve Esses realizarmos crescimento são qualquer na apenas tipo produção de de primeiro uso do termo gamification remete pesquisas com jogos educativos; o que ao ano de 2008, porém ele só alcançou pode ser interpretado como um reflexo da maior visibilidade por volta de 2010. Na difusão gradual do tema, ainda que de revisão de Hamari et. al. (2014), só se maneira implícita e incipiente. encontrou artigos a partir de 2010, e o ano Em relação às abordagens teóricas de maior incidência foi 2013. Embora não sobre as quais os estudos se pautam, possamos o observamos uma considerável variedade, surgimento do termo e a produção sendo identificadas 11 abordagens. Duas brasileira, é interessante notar que seu dessas se destacaram em produção: a traçar correlações entre 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA Análise Experimental do Comportamento e propriamente a recurso utilizado com certa frequência por Epistemologia novamente, haja Genética. um ser associado à idade infanto-juvenil. traçarmos afirmações, podemos considerar Similarmente, poderíamos supor que a que essas abordagens se sobressaíram pois ausência costumam ter um viés mais pragmático e organizacionais ocorre porque, se há experimental, maior intervenções implicitamente gamificadas proximidade com o contexto de educação, ou próximas disso, elas provavelmente se onde observamos o maior número de pautam por elementos mais sutis e de intervenções. Talvez seja apenas questão menor de relacionados a jogos, que por serem além até de que dados representam para tempo poucos Embora, ditas, terem estudos sobre de estudos probabilidade contextos de serem gamificação sejam apropriados de maneira associados mais homogênea pelas diversas abordagens incompatíveis com um ambiente adulto da Psicologia. Por fim, notamos a ausência “sério”. de pesquisas orientadas pela Psicanálise; o utilizadas na procura podem ter sido que pode estar relacionado à eliminação impróprias explícita de Winnicott, durante a busca por propostas de gamificação incipientes em artigos. contextos organizacionais. Quanto ao contexto de intervenção, sobressaiu-se educação, significativamente em especial o à em infância, Assim, para as seriam palavras-chaves identificar possíveis Em relação ao tipo das pesquisas, a observamos aproximadamente que metade ensino era exclusivamente qualitativa; e os demais fundamental. Também é notável a ausência divididos de quantitativa e organizacionais e de comportamento de Quanto amostras, consumo. Esta mesma ausência é notada variedade de número e faixa etária. por Hamari et. al. (2014), que em sua Consideramos que isso se deve à variedade revisão, que de abordagens teóricas e de métodos de investiguem gamificação em contextos análise dos resultados, o que também explícitos de marketing. Em relação à aponta para uma variedade de parâmetros predominância de estudos em educação, distintos que impossibilitam uma meta- podemos supor que está relacionada ao uso análise dos artigos, e dificultam fazer de jogos educativos que, embora, não generalizações que contemplem todos eles. estudos constituam não voltados encontra intervenções a contextos artigos de às maneira similar entre qualitativa-quantitativa. houve grande gamificadas 113 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA Quanto às variáveis dependentes orientam as ações (como ter que lançar identificadas, observamos um predomínio uma bola de volta ao companheiro após ele da categoria desenvolvimento de tê-la lançado a você), mas sem envolvê-las menor da em uma rede de consequências pré- categoria efeitos terapêuticos, parece estar estipuladas que conduzem a um final com relacionada de um vencedor (se a bola não for devolvida, intervenções em contexto de saúde. Em não existe nenhuma sanção ou resposta relação à natureza dos recursos lúdicos, pré-definida), pode ser entendida como um destacaram-se os jogos analógicos. Por um conjunto de elementos de design de jogo. lado, supomos a popularidade de seu uso Assim, pensar o processo de gamificação por serem mais acessíveis que jogos como a transformação de alguma atividade digitais, e por suas regras propiciarem um cotidiana ambiente no qual os comportamentos facilitar a compreensão deste fenômeno e esperados e as respectivas recompensas suas possibilidades de intervenção. habilidades. A à menor incidência frequência são claras; o que Panosso et. al. (2015) em uma Notamos brincadeira, uma pode considerável apontam como sendo uma das vantagens predominância em relação à mediação do uso de jogos. Por outro, a quantidade de junto ao recurso lúdico. Essa mediação, intervenções que constituía no acompanhamento e realizadas com jogos completos, e tendo em vista a ausência de auxílio estudos explícitos sobre gamificação, pode intervenção, indica o reconhecimento dos ser interpretada como um indício do pesquisadores de que o recurso lúdico desconhecimento de estático não seria tão eficiente. Seria mais gamificação. Assim, parece ainda haver eficaz a mediação, no sentido de ajustar os alguma confusão entre esse conceito e desafios ao longo da atividade para jogos educativos e pedagógicos. corresponderem Nesta dos às durante habilidades a do participante. Esse reconhecimento pode ser interessante apontar que as brincadeiras interpretado como uma aproximação da analógicas representam o recurso lúdico compreensão adequada sobre gamificação, que mais se aproxima de uma abordagem uma vez que não é um jogo ou brincadeira genuinamente gamificada, pois trata-se da em inserção de um recurso que é quase um resultados, jogo Uma elementos pertinentes e sua integração sob brincadeira, por poder conter “regras” que medida no contexto de não-jogo, para regras, mas também participantes é de categoria métodos dos não é. si que implicaria em melhores mas a extração de seus 114 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA eliciar as reações específicas desejadas estudada, eles não apresentaram evidências (Chou, 2016). objetivas criteriosas o suficiente para poder Sobre os métodos de análise de resultados, houve predominância abordagens parcial ou de integralmente fazer afirmações firmes em relação a essa influência, ou mesmo se esses resultados eram causados pelas intervenções. qualitativas. É interessante apontar que Há também que se problematizar o todos os estudos que se pautaram sobre a método de análise de desempenho em análise de relatos, também se pautaram em jogo. observação qualitativa. Por um lado, essa instrumento de intervenção também seria o análise qualitativa é pertinente por dois instrumento de medição. Dessa forma, motivos. Primeiro, como apontado por poderia se dizer que seus resultados seriam Perkoski et. al. (2016), a observação dos enviesados pelo fato de que, ao longo de comportamentos durante a intervenção diversas partidas, o participante estaria com o recurso lúdico, é mais precisa que a “treinando” seu desempenho sobre o análise de relatos na identificação de próprio instrumento de medição. Ainda comportamentos emitidos, pois registra os assim, a melhora do desempenho do jogo acontecimentos em primeira mão. Ao pode ser tomada como um indicativo do contrário da análise dos comportamentos potencial de intervenções gamificadas, relatados, que pode não ser exatamente senão por outro motivo que a capacidade correspondente aos de engajar os indivíduos em tarefas apresentados. Segundo; comportamentos a análise Ele repetitivas, implica que que o próprio propiciam o qualitativa pode propiciar uma melhor desenvolvimento de habilidades. Todavia, identificação e compreensão de elementos defendemos que a testagem antes e depois motivadores relacionados em maior parte à da experiência subjetiva dos participantes, no instrumento propriamente desenvolvido referencial de Chou (2016); como as para esse fim, é um método mais adequado categorias de Sentido Épico e Chamado; de avaliação dos resultados. intervenção Desenvolvimento; e Empoderamento da Criatividade. os meio de um Ainda em relação aos métodos, observamos que a amostra de alguns dos Por outro lado, apesar de em sua maioria por quantitativos foi pequena, exclusivamente contendo menos de 30, e em outros casos, a influência menos de 10 participantes. Assim, apesar positiva dos recursos lúdicos na variável dos métodos de análise de dados serem qualitativos artigos estudos apontarem 115 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA mais criteriosos nestes estudos, o tamanho amostras de amostra pode limitar a capacidade de participantes, respectivamente), com grupo generalização dos resultados. Por fim, controle apontamos que nenhum estudo utilizou resultados, que apontam com convicção instrumentos de medição psicofisiológica, para um incremento significativo nas como sugeridos por Nacke et. al. (2010). variáveis investigadas em função dos Embora sua pertinência dependa do tipo de recursos lúdicos. Apesar disso, alguns dos variável que se pretende estudar, sendo que outros artigos que observaram resultados nenhum artigo necessidade chegou desses a consideráveis e validação (93 e estatística 96 dos apontar a positivos se basearam somente em uma instrumentos, é análise qualitativa que não permite interessante notar esta ausência, nem que sustentar firmemente suas conclusões. Em seja para apontar mais um nicho de relação aos 25% dos artigos que não pesquisa que ainda pode ser explorada. mostraram resultados conclusivos, metade Um outro dado a destacar foi a deles (Pellizzetti e Souza, 2014; Panosso e baixa quantidade de artigos que utilizaram Souza, 2014; Souza e Hübner, 2010) eram um grupo controle em suas intervenções: estudos quantitativos, sem grupo controle e apenas três. Desses, dois tratavam de com amostras pequenas (três, dois e nove estudos quantitativos e um de qualitativo- participantes, respectivamente). Estes três quantitativo. Isso implica uma fragilização estudos observaram incrementos apenas das conclusões dos outros estudos, já que marginais nas variáveis estudadas, e sem eles apenas compararam as variações relações claras com os recursos lúdicos dentro do próprio grupo. A partir desse utilizados. Apesar de serem criteriosos em dado, recomendamos que estudos futuros, suas análises, pode-se apontar que tanto a mesmo qualitativos, incluam um grupo ausência de grupos controle quanto o controle. tamanho da amostra, sugerem que esses Em relação aos resultados resultados não podem ser generalizados observados, 75% dos artigos afirmaram ter como uma ineficácia da intervenção com havido melhoras significativas na variável recursos lúdicos. Justamente, as autoras investigada, fruto da intervenção com apontam que mais pesquisas devem ser recursos lúdicos. De notável menção são realizadas antes de se chegar a alguma os estudos de Costa, Soares e Lima (2007) conclusão sólida. e Oliva e Moura (1998), sendo ambos Os estudos exclusivamente quantitativos, com qualitativo outros e artigos, de caráter qualitativo-quantitativo, 116 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA também apresentam resultados apontado por Panosso et. al. (2015) e inconclusivos e afirmam a necessidade de Perkoski et. al. (2016). Ele se manifestou mais pesquisas. Ao todo, os artigos principalmente através das regras de jogos apontam, com maior ou menor grau de que tornavam evidentes aos participantes significância, para a eficiência dos recursos tanto as consequências das jogadas, quanto lúdicos na promoção de aprendizados e seu progresso em direção à vitória. efeitos terapêuticos. Há que ressalvarmos Este motivador foi seguido de perto que o rol de contextos de intervenção, por Desenvolvimento e Conquista; e variáveis dependentes e natureza dos Sentido Épico e Chamado. O segundo recursos lúdicos é diverso, de forma que motivador se manifestou principalmente não se pode ainda afirmar absolutamente pela que a intervenção com recursos lúdicos é aprimoramento produzida por partidas eficaz em todos os casos, pois cada um tem consecutivas de um mesmo jogo. Sua suas particularidades, como afirma Chou relação com o motivador Feedback é (2016). Dito isso, as perspectivas de evidente, pois o reconhecimento de suas pesquisa sobre gamificação são ricas e ações e progresso no jogo, induz no abundantes, e ainda há muito para ser jogador a sensação de desenvolvimento. O explorado. motivador Sentido Épico e Chamado se sensação de progresso e O último dado analisado foram os manifestou pela imersão narrativa que motivadores fundamentais de Chou (2016), alguns recursos lúdicos promoveram, tais presentes nos recursos lúdicos utilizados como RPGs (Role Playing Games), que nos estudos. Observamos que o motivador são jogos nos quais o jogador representa mais frequente foi Empoderamento da um papel de um personagem dentro de Criatividade uma e Feedback; mais narrativa compartilhada. A especificamente em função do feedback. justificativa de sua motivação se baseia no Esse fácil sentido pessoal que a atividade assume reconhecimento do usuário do recurso para o usuário do recurso lúdico. Assim, lúdico das uma atividade que seria apenas uma tarefa consequências de suas ações, justifica a a ser cumprida por obrigação, ao ser promoção da motivação pela discriminação dotada de algum significado pessoal para o clara das contingências que regem o usuário, se torna algo mais prazeroso, ou comportamento naquele no mínimo, menos aversivo. É interessante contexto. O que vai ao encontro ao destacar que, apesar do adjetivo “épico”, traço, de que seu do implica progresso indivíduo o e 117 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA esse sentido pode ser algo relativamente Este fato é interessante, pois, trivial, como é o caso do estudo de Oliva e apesar de Chou (2016) afirmar que Moura (1998); no qual o engajamento dos nenhum participantes em uma aplicação de teste “bom” ou “ruim”, e que se pode produzir psicométrico é incrementado por ele experiências engajadoras e agradáveis a aparentar na superfície ser uma preparação partir de para um jogo de dominó. “chapéus brancos” são os motivadores Dentro de seu modelo, Chou (2016) mais motivador é quaisquer frequentemente intrinsecamente combinações; associados a traça algumas categorias nas quais os experiências motivadores fundamentais são inseridos. categorização de Chou (2016) guarda Uma três semelhanças com os brancos” fundamentais da Análise (white hat), três como “chapéus pretos” Comportamento, de (black hat) e dois como ambivalentes. Os reforço negativo e punição propostos por motivadores são Skinner (1953), segundo os quais haveriam aqueles que mobilizam os sujeitos a partir estímulos que aumentam ou diminuem a de recompensas e indução de sensações de probabilidade poder, Os comportamentos no futuro, e podem gerar motivadores “chapéus pretos” são aqueles comportamentos respondentes agradáveis que mobilizam os sujeitos a partir de ou aversivos. dessas motivadores categorias como “chapéus “chapéus crescimento define brancos” e bem-estar. prazerosas. os da reforço Essa conceitos do positivo, emissão de ameaças e remoção de estímulos aversivos. Assim, a predominância desses Os motivadores ambivalentes são aqueles motivadores “chapéus brancos”, ao serem que dependendo do contexto podem se entendidos como reforçadores positivos, comportar de uma forma ou de outra. É contribuem para o ambiente ideal de interessante notar que os três motivadores modelagem mais presentes são os classificados como aprendizagem apontado por Panosso et. al. “chapéus brancos”. Os de comportamentos e outros dois (2015). Aliás, é interessante apontar que o menor potencial dos recursos lúdicos pode ser motivadores identificados em frequência; Interação Social e reconhecido e justificado não só a partir Relacionamento; e Imprevisibilidade e dos Curiosidade, Comportamento, mas também de outras são respectivamente ambivalentes e “chapéu preto”. conceitos da Análise do abordagens teóricas. Do ponto de vista da teoria do 118 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA fluxo (Csikszentmihalyi, 1990), o uso dos elementos pertinentes de design de jogos Considerações Finais poderia conceder a uma atividade, a característica de adequar sua dificuldade Após a realização do presente correspondente à habilidade dos sujeitos exame, envolvidos, produzindo a sensação de limitações. Notavelmente, assume-se que fluxo que manteria a atividade motivadora. esta revisão não analisou artigos tratando Do ponto de vista de Vygotsky (1978), de pode-se entender os recursos lúdicos como previamente por Deterding et. al. (2011) e instrumentos de mediação nas atividades Hamari et. al. (2014). Esta questão foi que possibilitam a aquisição de funções explicitada psicológicas superiores, bem como o exposição do método. Como apontado, não desenvolvimento de novas habilidades. Do encontramos artigos que contivessem o uso ponto de vista da Epistemologia Genética, explícito do termo gamificação. Com o se pode entender os recursos lúdicos como intuito de levantar estudos próximos ao propiciadores de um ambiente de reflexão fenômeno e quem sabe até encontrar algum e repetição de habilidades já aprendidas, o artigo que tratasse exatamente sobre que contribuiria para sua consolidação gamificação, ainda que não intitulada (Piaget, 1962). como tal, optou-se pela procura de certas Essas demonstrações de diferentes há que gamificação, se tal reconhecer como brevemente palavras-chaves que definido durante se suas a imaginou perspectivas foram feitas de maneira representar elementos prováveis de uma extremamente breve, e não pretendeu ser pesquisa sobre este tema. uma lista absoluta de teorias ou trazer uma A decisão pelas palavras-chaves explicação exaustiva de seus conceitos; escolhidas foi orientada pelos fenômenos e apenas da objetos que remetiam mais claramente à Psicologia os fenômenos dos jogos e do noção de gamificação, a saber: o jogo e brincar já foram considerados por diversos seu adjetivo “lúdico”. Além disso, optou- autores, e não se restringem a alguma se por uma definição específica de jogo, abordagem específica. Com essa exposição dentre tantas possíveis, o que também pretendemos que implica um viés na pesquisa. Em função independentemente do referencial teórico dessas escolhas, não foram investigadas que se adote, há a possibilidade de se produções que se pautassem em conceitos trabalhar com jogos e com gamificação. de demonstrar que, apontar dentro jogo explicitamente distintos do 119 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 RAFAEL GOULART LODI, ADRIANO FURTADO HOLANDA adotado; e também não foi possível estudos que abordassem, explorar elementos motivacionais sutis dos tangencialmente o tema. Para tanto se jogos, que não tivessem uma relação tão optou por agrupar jogos, e fenômenos evidente com o conceito de jogo. Aliás, semelhantes de lazer, como brincadeiras, grande parte das dificuldades encontradas sob o termo “recurso lúdico”. Em um e das limitações consequentes derivaram primeiro momento, essa decisão permitiu da complicada tarefa de definir um prosseguir com trabalho de maneira que os fenômeno tão multifacetado quanto o jogo. fenômenos Isso implicou no uso de certos termos evidentes, ainda que a definição possa ser heurísticos, como “recursos lúdicos”, que questionada. embora possa não constituir uma boa limitações, crê-se que essa decisão foi definição epistemológica, teve um intuito pertinente e não chegou a prejudicar o pragmático de sumarização. Da mesma estudo. considerados E, ainda que ficassem reconhecendo estas forma, não é difícil encontrar entre as Dito isso, cabe aqui adereçar a definições de gamificação de Deterding et. pergunta no título deste artigo. A partir dos al. (2011) e dos motivadores fundamentais resultados levantados não foi possível de Chou (2016) termos que possam parecer encontrar instâncias de trabalho sobre ambíguos ou projetar uma considerável gamificação na literatura brasileira de zona cinzenta no campo das categorias. Os Psicologia. Todavia, os estudos sobre o próprios autores comentam em seu artigo impacto de recursos lúdicos em outros que a definição que utilizam de “elementos contextos apontam para uma exploração característicos de jogo” é explicitamente tangente à gamificação, o que pode ser heurística e tem um grande espaço para visto como um estágio incipiente de debate (Deterding et. al. 2011). interesse sobre ela. A proposta de Chou (2016) Por fim, em relação aos artigos também alarga tanto o conceito do que examinados, observou-se uma variedade pode ser um caso de gamificação, que de poderia se perguntar o que não pode ser tamanho um exemplo de gamificação. Embora participantes, definições claras sejam importantes no abordagens teóricas. Tudo isso sugere a âmbito de pesquisas científicas; o intuito abrangência da gamificação e aponta a deste artigo não foi consolidar uma vasta gama de possibilidades de atuação definição de gamificação, mas identificar para o profissional, tanto em pesquisa contextos, de variáveis dependentes, amostra, idade métodos de análise dos e 120 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 HÁ GAMIFICAÇÃO NA PSICOLOGIA BRASILEIRA? - UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA SISTEMÁTICA quanto em intervenção. amostras suficientemente grandes, e com Em relação aos resultados, há boa tratamentos comparados com grupos sugestão do potencial de recursos lúdicos controle. Assim espera-se que este trabalho como diversas contribua para o início da sistematização intervenções. Porém, é notável a ausência da produção acerca da gamificação no de pesquisas com grupo controle, bem contexto da Psicologia brasileira, e sirva de como ponto de partida para que novas pesquisas incrementadores abundância de de pesquisas qualitativas, e pesquisas quantitativas com possam desbravar amostras pequenas. Recomenda-se então promissor fenômeno. este que estudos futuros sejam realizados, incluindo análises quantitativas complexo e Alea iacta est. com Referências Chou, Y. (2016). Actionable gamification: beyond points, badges, and leaderboards. Fremont, Estados Unidos da América: Octalysis Media. Conforto, E. C., Amaral, D. C., & Silva, L. (2011). Roteiro para revisão bibliográfica sistemática: Aplicação no desenvolvimento de productos e gerenciamento de projetos. In Instituto de Gestão de Desenvolvimento do Produto, Congresso Brasileiro de Gestão de Desenvolvimento de Produto—CBGDP (12 p.). Porto Alegre: IBGDP. Csikszentmihalyi, M. (1990). 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E-mail: lodiuni@gmail.com Adriano Furtado Holanda, graduado em Psicologia (1987), mestrado em Psicologia Clínica pela Universidade de Brasília (1993) e doutorado em Psicologia pela PUC-Campinas (2002). Professor Associado e Orientador de Mestrado da Universidade Federal do Paraná. E-mail: aholanda@yahoo.com Recebido em: 28/01/2019. Aprovado em: 25/06/2019. 114 Perspectivas em Psicologia, Uberlândia, vol. 23, n. 1, pp. 112 - 138, Jan/Jun, 2019 – ISSN 2237-6917 View publication stats