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FIGURAS DE LINGUAGEM 176 a 192

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Capítulo
17
Recursos estilísticos:
figuras de linguagem
Figuras de linguagem
GABRIEL, Pedro. Eu me chamo Antônio. Disponível em: <http://
eumechamoantonio.tumblr.com/image/123889335260>.
Acesso em: 7 mar. 2016.
GABRIEL, Pedro. Eu me chamo Antônio. Disponível em: <http://
eumechamoantonio.tumblr.com/image/124524647835>.
Acesso em: 7 mar. 2016.
Singra: navega, segue caminho sobre as águas.
1. O escritor Pedro Gabriel produz poesias visuais em um
suporte inusitado: guardanapos de papel.
> No texto acima, o autor recorre a uma imagem para
definir o mar. Qual é essa imagem?
2. Se levarmos em conta a realidade, podemos afirmar que
a imagem criada é contraditória.
3. Mais uma vez, uma definição está na base do poema
visual. Nesse caso, o que está sendo definido?
> Que elementos não verbais aparecem no poema?
4. Nos dois poemas, Pedro Gabriel recorre a diferentes pro-
cedimentos para elaborar as definições dos termos mar
e partir. Qual é a diferença entre os dois procedimentos?
a) Explique por que é possível fazer essa afirmação sobre
5. Considere a seguinte imagem do segundo poema: “a sauda-
b) Para que essa contradição deixe de existir, como o leitor
6. Qual é a importância da criação de imagens para a cons-
a imagem.
deve interpretar essa imagem?
de sangra”. De que modo ela deve ser entendida pelo leitor?
trução dos poemas visuais de Pedro Gabriel?
Como vimos no Capítulo 12, a linguagem não tem uma existência em si, desvinculada do seu uso. Ela
é uma atividade humana. Por esse motivo, podemos manipulá-la em função de objetivos específicos:
comunicar-nos, expressar emoções, impressionar, persuadir, etc. Para que esses objetivos possam
ser alcançados, precisamos aprender a utilizar recursos que criem efeitos de sentido variados. Para
produzir certos efeitos, utilizamos as figuras de linguagem.
174
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Considere, agora, outro poema visual do mesmo autor.
© Pedro Gabriel/httP:www.eumechamoantonio.com
© Pedro Gabriel/httP:www.eumechamoantonio.com
Leia atentamente este poema visual.
Gramática
Tome nota
Figuras de linguagem são recursos estilísticos utilizados no nível dos sons, das palavras, das estruturas sintáticas ou do significado para dar maior valor expressivo à linguagem.
Figuras sonoras
Em contextos diferentes, os falantes sentem a necessidade de explorar sons para produzir efeitos
de sentido. O uso mais frequente de alguns desses efeitos sonoros fez com que passassem a designar
figuras de linguagem específicas. Veremos, a seguir, algumas delas.
• Onomatopeia
Chamamos de onomatopeia as palavras especiais criadas para representar sons específicos
(“vozes” de animais, ruídos associados a determinadas emoções e comportamentos humanos, barulhos da natureza, etc.). Observe.
Rick Kirkman e Jerry Scott
© 2016 KinG Features syndicate/iPress
Esclarecer aos alunos que,
em inglês (língua em que
a tira foi escrita originalmente), o termo flip-flops
significa sandália de dedo.
SCOtt, Jerry; KIRKmAn,
Rick. Zoé & Zezé. O Globo.
Rio de Janeiro, 16 jun. 2001.
todo o trabalho de humor, na tira, parte da representação dos sons feitos pelos chinelos das
crianças enquanto o pai, ainda sonolento, toma seu café da manhã. Para atender à solicitação da
filha (“Adivinha o que estamos usando?”), o pai recorre a uma onomatopeia que reproduz o som das
sandálias de borracha (flip-flop). O curioso é que, no último quadro, a menina pergunta ao irmão de
onde o pai tira “essas palavras”. Ora, a “palavra” em questão é justamente a onomatopeia criada para
representar o som, aparentemente insuportável, produzido pelas sandálias de borracha.
• Aliteração
Você já deve ter observado que um dos recursos utilizados em poemas ou letras de música é a
repetição de um mesmo som consonantal. Veja o texto do primeiro quadrinho, em que Calvin supostamente tenta criar um haicai.
Calvin
Bill Watterson
calvin & hobbes, bill watterson © 1990 watterson/dist.
by universal uclicK
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Zoé & Zezé
Se julgar necessário, explicar aos alunos que haicai é uma forma poética
oriental composta segundo
regras muito precisas. Todo
haicai deve ser formado
por 17 sílabas distribuídas
em versos de 5 a 7 sílabas
métricas. Também deve
conter um termo referente
a uma das estações do ano
(kigô). A “composição”
feita por Calvin não tem tais
características, apesar de ele
afirmar que fez um “haicai
aliterado”.
WAttERSOn, Bill. Calvin
e Haroldo: deu “tilt” no
progresso científico.
São Paulo: Conrad, 2009.
p. 115.
A fala de Calvin é construída a partir da repetição do fonema consonantal /f/. A intenção do menino
parece ser, com a enumeração de uma série de adjetivos e substantivos iniciados pelo mesmo som,
evocar as características positivas do seu tigre Haroldo, que acaba despertando com o falatório de Calvin.
A repetição de fonemas consonantais é chamada de aliteração. É frequentemente introduzida em
um texto para provocar efeitos sensoriais.
175
• Assonância
É possível também criar um efeito semelhante ao da aliteração a partir da repetição de sons
vocálicos. Observe.
Lira
esta lira conspira
com a palavra proibida
e pela vida mantém o seu arsenal
ginga a própria ira
quando delira com seu punhal
esta lira conspira
com os segredos do berimbau.
A assonância é a repetição de sons vocálicos em sílabas acentuadas. no poema, observamos a
assonância do /i/.
• Paronomásia
Em alguns casos, os textos exploram uma semelhança sonora e gráfica entre palavras de significados distintos (parônimos). Observe o exemplo.
Adão Iturrusgarai
© adão iturrusGarai
Meus Patos Donald
ItURRUSGARAI, Adão. Disponível em: <http://adao.blog.uol.com.br/
arch2013-03-01_2013-03-31.html>. Acesso em: 7 mar. 2016.
Quando essa semelhança sonora e gráfica é intencionalmente utilizada no texto para ressaltar as
diferenças de sentido, ocorre uma figura sonora chamada de paronomásia.
Lembre-se
Parônimos são palavras de significados diferentes que apresentam grafia e pronúncia muito semelhantes. Exemplo: eminente (superior) / iminente (prestes a acontecer, próximo).
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
CUtI. Cadernos negros: poemas
afro-brasileiros. São Paulo:
Quilombhoje, 2004. v. 27, p. 27.
Gramática
atividades
Leia atentamente o texto a seguir para responder
às questões 1 e 2.
a) Qual o tipo de recurso utilizado por Caco Galhardo?
b) Explique por que esse recurso desempenha uma
função expressiva no texto.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Sobre os calafrios de geladeira
Minha geladeira sofre de calafrios à noite. Durmo tarde, às vezes vejo um filme atrás do outro,
mas sou interrompido pelos calafrios da geladeira. Da cozinha, vem o barulho, brrr, cruoc, téc!
A geladeira é nova, o calafrio da geladeira velha,
que durou mais de vinte anos (que Deus a tenha),
era brrrrrrrrrrrrrunhonnnn tomp! Bzzzzzzzzzzzz.
Barulho de geladeira velha, estava acostumado a
ele. A geladeira nova faz brrr, cruoc, téc! Estranho.
Ainda não me acostumei. Talvez não me acostume nunca. Por que tinha de trocar de geladeira?
Se eu fosse uma geladeira, também sofreria
desses calafrios no meio da noite. Uma existência gélida, inerte, repetitiva, monótona até
a medula. Abre a porta e fecha a porta e aqueles
tupperwares. Sempre frio, inverno constante,
alimentos conservados e a solidão no escuro
da cozinha. Daí os tremores. [...]
GALHARDO, Caco. Caco Galhardo Corporation.
Uol Blog. Disponível em: <http://blogdogalhardo.zip.
net/arch2009-10-25_2009-10-31.html>.
Acesso em: 7 mar. 2016. (Fragmento).
Tupperwares: utensílios domésticos plásticos
denominados por sua conhecida marca, utilizados,
em geral, para acondicionar alimentos.
1. Por que o autor resolveu escrever um texto sobre sua
geladeira?
> Como ele explica o problema da geladeira nova e o
da velha?
2. Para caracterizar esse problema, o autor utiliza um
recurso linguístico. Transcreva em seu caderno os
trechos em que esse recurso ocorre.
Figuras de palavra
Quando usamos uma palavra em um contexto pouco esperado, ela pode adquirir um novo sentido. Alguns deslocamentos de contexto são tão frequentes na língua, que passaram
a ser reconhecidos como recursos de estilo chamados de
figuras de palavra.
• Metonímia
A metonímia ocorre quando uma palavra é utilizada em
lugar de outra, para designar algo que mantém uma relação
Leia atentamente a letra da canção abaixo para
responder às questões 3 e 4.
Dentro
de
dentro
entro
centro
sem
centro
entro
dentro
de
dentro
entro
centro
sem
centro
dentro
AntUnES, Arnaldo. In: AntUnES, Arnaldo. Nome. BmG, 1993.
Disponível em: <http://www.arnaldoantunes.com.br>.
Acesso em: 28 mar. 2016.
3. O trabalho poético do texto tem como base o uso de
uma figura de linguagem. Qual é ela?
> De que maneira essa figura é utilizada no texto?
4. Considerando o título da canção e o significado das
expressões que a compõem, qual seria o “tema” dessa
composição? Justifique.
> Por que o uso reiterado de uma mesma figura de
linguagem torna-se essencial para a construção do
sentido da canção?
de “proximidade” (contiguidade) com o referente da palavra
substituída.
Há várias situações em que isso pode ocorrer. Algumas
das relações que levam a um uso metonímico de alguma
palavra ou expressão ocorrem quando se toma:
• a parte pelo todo: Muitas mãos foram responsáveis pela
construção de Brasília.
• o continente pelo conteúdo: João é bom de garfo.
• o autor pela obra: Sempre que tenho alguma dúvida,
recorro ao Houaiss.
• a marca pelo produto: Você me empresta o durex?
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Na tira abaixo, o efeito de humor é construído a partir de uma metonímia. Para fazer referência ao
tamanho do rebanho de seu pai, o menino louro faz uma referência à parte (“cabeças”) em lugar do
todo (“boi”). Chico Bento, interpretando literalmente o que foi dito, comenta que seu pai tem somente
um boi, "mais ele tá interinho". observe.
Mauricio de Sousa
© Mauricio de SouSa editora Ltda
Turma da Mônica
SouSa, Mauricio de.
Turma da Mônica.
O Estado de S. Paulo.
São Paulo, 19 jul. 2010.
Antonomásia
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
a antonomásia pode ser entendida como um tipo de metonímia que consiste na identificação de
uma pessoa não por seu nome, mas por uma característica ou atributo que a distingue das demais.
observe o exemplo: Castro Alves, o famoso poeta romântico, costuma ser chamado de Poeta dos Escravos por ter escrito muitos poemas que denunciavam o sofrimento dos escravos no Brasil do século XIX.
Sinédoque
um outro tipo de metonímia é a sinédoque. Ela ocorre quando há a substituição de uma palavra
por outra que sofre, no contexto, uma redução ou ampliação do seu sentido básico. um conhecido
exemplo de sinédoque ocorre no capítulo “Das negativas”, do romance Memórias póstumas de Brás
Cubas (Machado de assis). após fazer uma série de ponderações sobre sua vida, o narrador afirma:
Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor
do meu rosto.
aSSiS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas.
18. ed. São Paulo: Ática, 1992. p. 176. (Série Bom Livro). (Fragmento).
Nesse trecho, o sentido dos termos “pão” e “suor” está sendo ampliado. No contexto, “pão” refere-se a “alimento”, e “suor”, a “trabalho”. Para enfatizar o fato de a personagem nunca ter trabalhado na
vida, Machado de assis recorre a uma sinédoque.
• Comparação (símile)
a comparação (ou símile) ocorre quando elementos de universos diferentes são aproximados por
meio de um termo específico (como, feito, tal qual, qual, assim como, tal, etc.). observe a tira abaixo.
Cibele Santos
© cibeLe SantoS
Mulher de 30
SaNToS, Cibele. Mulher
de 30. Disponível em:
<http://www.mulher30.
com.br/2009/07/
metaforas.html>.
acesso em: 7 mar. 2016.
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Gramática
na discussão com o namorado, a moça recorre a uma comparação (“Você não sabe que o amor
é como uma flor?”) para que o rapaz entenda a necessidade de dar a ela uma atenção constante.
Quando vê que os termos (amor/flor) utilizados para a comparação não fazem sentido para Armando,
troca o segundo termo da comparação para algo mais próximo dos interesses do rapaz: “O amor é
como o motor do carro”. Aí sim ele compreende o que ela quer dizer.
• Metáfora
A mais conhecida das figuras de palavra, a metáfora, baseia-se na transferência (a palavra
grega metaphorá significa “transporte”) de um termo para um contexto de significação que não
lhe é próprio. As metáforas são criadas a partir de uma relação de semelhança que pressupõe um
processo anterior de comparação. Pode-se dizer, portanto, que a comparação está na base da
formação das metáforas.
Jornais e revistas costumam usar metáforas em manchetes e títulos de reportagens para resumir
a essência do que será dito, ou para chamar a atenção dos leitores.
SAÚDE
Prédios doentes. Ar-condicionado sem manutenção, poeira, goteiras e
Galileu. São Paulo: Globo,
ano 2010, ed. 229,
n. 229, p. 20, ago. 2010.
MEio AMbiEntE
O semeador dos oceanos. Fabien Cousteau, neto do lendário
explorador francês Jacques Cousteau, cria ONG para “plantar”espécies
marítimas no mundo inteiro
Galileu. São Paulo: Globo,
ano 2010, ed. 229,
n. 229, p. 15, ago. 2010.
nos exemplos, tanto a caracterização de edifícios como “doentes” (com problemas de manutenção), como a identificação de Fabien Cousteau como “semeador dos oceanos” (alguém que
reintroduz espécies marítimas em diferentes oceanos) são feitas por meio de metáforas.
O uso de metáforas é tão frequente na linguagem que há até quem afirme que através delas
compreendemos o mundo.
• Catacrese
Os Pescoçudos
Caco Galhardo
© caco Galhardo/FolhaPress
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
infiltrações. Atenção aos sintomas. Pois nesse mal quem sente as dores é você
GALHARDO, Caco. Os pescoçudos. Folha
de S.Paulo. São Paulo, 3 jan. 2002.
Como se chama a parte da caneta que se projeta para baixo a partir da tampa? na tira acima, essa
parte é chamada de “bracinho”. Poderíamos, também, pensar em perninha. nos dois casos, reconhecemos
alguma semelhança entre a parte que desejamos nomear e os conceitos de braço e perna.
A catacrese ocorre quando, na falta de uma palavra específica para designar determinado
objeto, utiliza-se uma outra a partir de alguma semelhança conceitual. “Bracinho”, portanto, é um
exemplo de catacrese.
muitos casos de catacrese já estão integrados à língua, porque são comumente usados pelos
falantes, que nem se dão mais conta dos mecanismos semânticos que deram origem a essas soluções:
pé da mesa, embarcar em avião, dente de alho, barriga da perna, bico da chaleira, etc.
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A sinestesia ocorre pela associação, em uma mesma
expressão, de sensações percebidas por diferentes órgãos
de sentido. Ela pode ser vista como uma forma específica
de metáfora, na qual são relacionados diferentes elementos
sensoriais.
na manchete e no olho apresentados a seguir, a sinestesia é usada para evocar, no leitor, uma característica de
Elza Soares, cantora brasileira conhecida por sua “voz rouca”.
Adorável voz torta
Elza Soares mistura ritmos e traz parcerias
inusitadas em seu 29o disco
Uma. São Paulo: Símbolo, ano 3, n. 23, ago. 2002.
Essa manchete e olho constituíam uma chamada de capa
para uma entrevista com Elza Soares, da qual reproduzimos
a seguir um pequeno trecho em que a própria cantora diz ter
“uma corda vocal meio torta”.
[...]
UMA E a história de que você tem uma corda vocal a
mais, é verdade?
ELZA Não tenho uma corda a mais, tenho uma corda
meio torrrrrta [risos].
Uma. São Paulo: Símbolo, ano 3, n. 23, ago. 2002. (Fragmento).
A chamada da matéria e a resposta de Elza fazem alusão
à voz (audição) torta (visão) da cantora, provocando a associação entre percepções sensoriais diferentes.
Um uso intenso dessa figura de palavra foi feito pelos
poetas simbolistas, ao final do século XIX.
O uso literário das sinestesias
A sinestesia é um recurso expressivo importante para a
literatura, particularmente para a poesia. Os poetas simbolistas usavam com frequência as sinestesias para sugerir
diferentes sensações.
atividades
Leia a tira a seguir para responder às questões 1 e 2.
Clara Gomes
© clara Gomes
Bichinhos de jardim
GOmES, Clara. Bichinhos de
jardim. Disponível em:
<http://bichinhosdejardim.
com/2011/09/10/>.
Acesso em: 29 jan. 2016.
1. Na tira, a personagem Maria Joana menciona definições que seriam usadas por alguns especialistas para a vida. Transcreva-as no caderno.
a) Na base dessas definições está uma figura de palavra. Qual é essa figura?
b) Explique a relação existente entre cada um dos especialistas mencionados por Maria Joana
e o modo como definem o que é a vida.
2. A visão que Maria Joana tem da vida é compatível com as outras definições apresentadas na
tira? Por quê?
Leia atentamente o texto a seguir para responder às questões 3 e 4.
Quando se separou, fez questão de levar a velha máquina de escrever azul. O tempo passou
e a solidão foi se assentando em gosto amargo deixado pelas noites em branco. Até que, em
uma delas, ouviu um tec-tec-tec: a Olivetti havia lhe dado um poema de Neruda. Aí vieram
textos de Leminski, Quintana, Cabral, Fuks… Escrevia outros de volta. Meses depois, tec-tec,
um endereço. Lá chegando, um sorriso lindo abriu a porta e lhe mostrou sua Olivetti, também
azul. Na manhã seguinte, ao voltar para casa, ele lançou o seu notebook pela janela.
SAKAmOtO, Leonardo. Pequenos contos para começar o dia. São Paulo: Expressão Popular, 2012. p. 29.
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Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
• Sinestesia
Gramática
3. Quais são as metonímias empregadas por Leonardo Sakamoto em seu texto?
a) Explique como elas foram criadas.
b) Qual é a importância dessas metonímias no texto?
4. Além da metonímia, Sakamoto faz uso de uma figura sonora em seu texto.
a) Qual é o nome dessa figura sonora?
b) Transcreva em seu caderno os trechos em que ela ocorre.
c) Com base em elementos do texto, explique a função dessa figura na definição do contexto
do miniconto.
A charge a seguir serve de base para as questões 5 e 6.
LUtE. Hoje em Dia. Belo Horizonte,
27 fev. 2014. Disponível em: <http://
www.blogdolute.blogspot.com.br/
search?updated-min=
2013-12-31t18:00:00-08:00
&updated-max=2014-03-31t18:
47:00-03:00&max-results=
50&start=200&by-date=false>.
Acesso em: 29 jan. 2016.
5. Qual é a questão tematizada na charge?
> Quais elementos da charge reforçam a identificação dessa questão pelo leitor?
6. Para responder à pergunta feita pelo filho, o pai recorre a uma figura de linguagem.
a) Qual é o nome dessa figura de linguagem?
b) Explique como ela foi construída.
c) Como o uso dessa figura de linguagem contribui para a compreensão da crítica feita na
charge? Justifique.
Figuras de sintaxe (ou de construção)
Observe as tiras a seguir e responda às questões de 1 a 3.
Frank & Ernest
FranK & ernest, bob thaves © 2007 thaves/
dist. by universal uclicK
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
© lute
Lute
Bob Thaves
tHAVES, Bob. Frank
& Ernest. O Estado
de S. Paulo. São
Paulo, 16 nov. 2007.
181
Mark Cullum & John Marshall
© 2016 KinG Features syndicate/iPress
Gente como a gente
CULLUm, mark; mARSHALL, John. Gente como a gente. O Globo. Rio de Janeiro, 3 jan. 1997.
1. As duas tiras começam de modo semelhante. Explique.
2. O que há de surpreendente no modo como as perguntas feitas são interpretadas?
3. Há, na segunda tira, uma fala que explicita a razão do mal-entendido. Qual é?
> Considerando essa fala, explique como foi criado o humor das tiras.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As duas tiras exploram uma situação muito comum: alguém sente um incômodo físico e procura
um remédio que resolva o problema. O fato de o verbo curar não aparecer na fala das personagens
que estão se sentindo mal exemplifica a possibilidade de omitirmos alguns termos, na língua,
quando o contexto permite identificá-los sem problema. Em situações como essas, não se imagina
que alguém deseje um enjoo ou uma dor de cabeça. Os autores das tiras exploram justamente a
interpretação menos provável para provocar o efeito de humor.
Tome nota
nem sempre os textos apresentam frases estruturadas do modo esperado. É frequente ocorrerem
inversões, omissões e repetições que levam a uma maior expressividade. As alterações intencionais das
estruturas sintáticas são chamadas de figuras de sintaxe.
• Elipse
no caso das duas tiras analisadas, observamos que a omissão de um verbo (curar) criou a ambiguidade que desencadeou o efeito de humor. Sempre que o termo omitido puder ser identificado a
partir do contexto criado pelo texto, tem-se uma figura de sintaxe denominada elipse.
Zeugma
Existe uma forma particular de elipse, denominada zeugma, que ocorre quando o termo omitido
em um enunciado foi utilizado anteriormente. Observe.
Alexandre Beck
© alexandre becK
Armandinho
BECK, Alexandre. Armandinho Quatro. Florianópolis: A.C. Beck, 2015. p. 52.
no texto da tira, observamos a ocorrência de zeugmas: o verbo quero, explicitado na primeira
oração (“Quero levar pouca coisa...”) fica pressuposto nas três orações seguintes (“... e [quero] viajar
sem muita pressa! [Quero] seguir leve pela vida... e [quero] dar valor ao que interessa!).
182
Gramática
• Anacoluto
• Hipérbato
Às vezes observamos uma inesperada mudança de rumo
na construção sintática de um enunciado. Observe.
na língua portuguesa, a ordem típica das orações
é Sujeito  Verbo  Complemento(s)  Adjunto(s)
adverbial(is):
Fomos ver o rio. E pouco andamos, porque já estava
entrando pelas estrebarias. O marizeiro que ficava embaixo, a correnteza corria por cima dele. Era um mar d’água
roncando.
REGO, José Lins do. Menino de engenho. 22. ed. Rio de Janeiro:
José Olympio, 1976. p. 27. (Fragmento).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Marizeiro: regionalismo para designar uma árvore frondosa, nativa
do nordeste, de flores amarelas e frutos comestíveis quando
cozidos. também chamada de umari.
O narrador do livro Menino de engenho, nesse trecho,
fala sobre a enchente do rio Paraíba. no início do terceiro
período, depois de definir o tópico — o marizeiro — o texto
muda de direção, criando a sensação de uma “frase quebrada”, de algo que ficou solto na estrutura. As estruturas
sintáticas da oração se reorganizam em torno de um novo
sujeito — a correnteza — e tudo o que é dito desse momento
em diante (“corria por cima dele”) liga-se a esse sujeito, na
mesma oração.
A interrupção ou quebra de uma oração que se havia
iniciado por uma palavra ou locução, seguida de uma estrutura que não se integra à parte interrompida, é chamada de
anacoluto. Os anacolutos chamam a atenção do leitor para
aquilo que se deseja salientar (topicalizar) em um texto.
• Anáfora
Quando produzimos inversões nessa ordem (por exemplo:
Um DVD, Paulo comprou ontem.), criamos figuras de sintaxe
denominadas, genericamente, hipérbatos. a
Sínquise
Algumas inversões são tão radicais que chegam a provocar ambiguidade ou a dificultar a compreensão do que
está sendo dito. nesse caso, a figura de sintaxe recebe o
nome de sínquise. O escritor Raymond Queneau, em um de
seus exercícios de estilo, escreve um texto inteiramente
constituído por sínquises.
Sínquises
Ridículo raparigo, que eu me vendo lotado um dia em
ônibus da linha S, por tração talvez o esticado pescoço, no
chapéu cordão eu um percebi. Arrogante e em lacrimejante
tom, que contra o senhor ele ao seu lado protesta, encontra-se. Encontrões lhe pois daria este, vez gente cada que desce.
Vago senta sobre e se se um lugar dito precipita, isto. Paço no
de Roma, dou mais com ele ouvindo tarde, duas horas que
no seu sobretudo outro botar, aconselha-o um amigo botão.
QUEnEAU, Raymond. Exercícios de estilo.
tradução de Luiz Rezende. Rio de Janeiro: Imago, 1995. p. 27.
......................................................................
A repetição de palavras no início de versos ou, nos textos
em prosa, no início de orações cria uma figura de sintaxe
chamada de anáfora. Veja.
que tudo passe
passe a noite
passe a peste
passe o verão
passe o inverno
passe a guerra
e passe a paz
Paulo (s) comprou (v) um DVD (c) ontem (a).
passe o que nasce
passe o que nem
passe o que faz
passe o que faz-se
que tudo passe
e passe muito bem
LEmInSKI, Paulo. Toda poesia. São Paulo:
Companhia das Letras, 2013. p. 85.
nos versos do poema, as anáforas (passe/passe o
que) possibilitam ao eu lírico construir uma enumeração
que permite a expressão final de um desejo positivo: independentemente do que aconteça na vida das pessoas
(“noite”, “peste”, “verão”, inverno”, etc.), que tudo acabe
bem (“passe muito bem”).
• Polissíndeto
A coordenação de vários termos da oração por meio de
conjunções, especialmente as aditivas (e, nem), dá origem à
figura de sintaxe chamada de polissíndeto. Um exemplo de
polissíndeto ocorre em um belo conto de Clarice Lispector
em que pessoas comuns repartem os alimentos de uma ceia.
A repartição dos pães
[...] Em nome de nada era hora de comer. Em nome de ninguém, era bom. Sem nenhum sonho. E nós pouco a pouco a
par do dia, pouco a pouco anonimizados, crescendo, maiores,
à altura da vida possível. Então, como fidalgos camponeses,
aceitamos a mesa.
[...] Comíamos. Como uma horda de seres vivos, cobríamos
gradualmente a terra. Ocupados como quem lavra a existência, e planta, e colhe, e mata, e vive, e morre, e come. Comi
com a honestidade de quem não engana o que come: comi
aquela comida e não o seu nome.
LISPECtOR, Clarice. Felicidade clandestina.
Rio de Janeiro: Rocco, 1998. p. 90. (Fragmento).
a Alguns gramáticos, como Celso Cunha, identificam um tipo particular de hipérbato – a anástrofe –, constituído pela inversão entre um termo da oração e
seu adjunto. Um exemplo clássico são os dois primeiros versos do Hino Nacional: “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas / De um povo heroico o brado
retumbante”. Se julgar interessante, explicar essa forma particular de inversão aos alunos.
183
a repetição da conjunção e chama a atenção do leitor
para o trabalho da criação literária, porque enfatiza os verbos
utilizados para identificar as ações básicas relacionadas à
alimentação (plantar, colher, matar, viver, morrer, comer).
• Pleonasmo
Em alguns casos, o desejo de enfatizar uma ideia leva à
utilização de palavras ou expressões que, à primeira vista,
pareceriam desnecessárias. observe os versos de Camões.
Nessa passagem, Vasco da Gama relata, ao rei de Melinde,
a visão de um fenômeno natural produzido pela eletricidade
da atmosfera: uma pequena chama aparece na extremidade
dos mastros dos navios ou nos filamentos dos cabos. Esse
fenômeno é conhecido como fogo de santelmo ou lume vivo.
o espanto do Gama diante da visão de um fenômeno raro é
traduzido, nos versos, pela utilização pleonástica do particípio do verbo ver (visto).
Tome nota
Vi, claramente visto, o lume vivo
Que a marítima gente tem por Santo,
Em tempo de tormenta e vento esquivo,
De tempestade escura e triste pranto.
CaMõES, Luís Vaz de. Obras completas.
Rio de Janeiro: Nova aguilar, 1998. p. 118. (Fragmento).
alguns pleonasmos são considerados vícios de linguagem e devem ser evitados. Eles ocorrem sempre que a ideia
repetida informa uma obviedade e não desempenha qualquer função expressiva no enunciado. Exemplos comuns de
pleonasmos viciosos são as expressões subir para cima,
descer para baixo, entrar para dentro, sair para fora, ser o
principal protagonista, etc. a
atividades
Leia atentamente o texto abaixo para responder às
questões de 1 a 4.
Sermão da planície
(para não ser escutado)
Bem-aventurados os que não entendem nem
aspiram a entender de futebol, pois deles é o reino
da tranquilidade.
Bem-aventurados os que, por entenderem de futebol, não se expõem ao risco de assistir às partidas,
pois não voltam com decepção ou enfarte.
Bem-aventurados os que não têm paixão clubista,
pois não sofrem de janeiro a janeiro, com apenas
umas colherinhas de alegria a título de bálsamo, ou
nem isto.
Bem-aventurados os que não escalam, pois não
terão suas mães agravadas, seu sexo contestado e sua
integridade física ameaçada, ao saírem do estádio.
Bem-aventurados os que não são escalados, pois
escapam das vaias, projéteis, contusões, fraturas, e
mesmo da glória precária de um dia.
Bem-aventurados os que não são cronistas esportivos, pois não carecem de explicar o inexplicável e
racionalizar a loucura. [...]
Bem-aventurados os que nasceram, viveram e se
foram antes de 1863, quando se codificaram as leis
do futebol, pois escaparam dos tormentos da torcida,
inclusive dos ataques cardíacos infligidos tanto pela
derrota como pela vitória do time bem-amado. [...]
Bem-aventurados os que, depois de escutar este
sermão, aplicarem todo o ardor infantil no peito ma-
184
duro para desejar a vitória do selecionado brasileiro
nesta e em todas as futuras Copas do Mundo, como
faz o velho sermoneiro desencantado, mas torcedor
assim mesmo, pois para o diabo vá a razão quando o
futebol invade o coração.
aNDRaDE, Carlos Drummond de.
As palavras que ninguém diz.
Seleção de Luzia de Maria.
Rio de Janeiro: Record, 2004.
p. 87-90. (Fragmento).
1. A crônica transcrita faz alusão ao Sermão da montanha, em que Cristo fala aos seus discípulos sobre as
bem-aventuranças. Leia um trecho deste sermão.
Sermão da montanha:
bem-aventuranças
[...] Bem-aventurados os pobres de espírito, porque
deles é o reino dos céus.
Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a
terra.
Bem-aventurados os que choram, porque serão
consolados. [...]
MaTEuS. Bíblia sagrada: novo testamento. 15. ed.
São Paulo: Paulinas, 1962. cap. 5, vers. 1-11, p. 1181.
(Fragmento).
> Que elementos do sermão bíblico são recuperados
pela crônica? Justifique sua resposta, mostrando
as semelhanças e diferenças entre os elementos
identificados nos dois textos.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
a Se julgar necessário, explicar aos alunos que o substantivo protagonista refere-se necessariamente à
personagem principal. Falar em principal protagonista, portanto, é cometer um pleonasmo vicioso.
Gramática
2. O Sermão da planície trata das “bem-aventuranças”
relacionadas ao futebol. Explique brevemente quem
seriam os “bem-aventurados” segundo o texto.
a) O último parágrafo do texto contradiz todas as afir-
mações anteriores do “sermoneiro desencantado”.
Por quê?
b) O que, no texto, explica a expressão entre parênteses apresentada no título?
3. Todos os parágrafos do texto são iniciados por uma
mesma expressão. Transcreva-a no caderno.
a) Qual é a figura de linguagem que se caracteriza pelo
uso desse recurso?
b) De que maneira o uso dessa figura de linguagem
contribui para a estrutura do texto?
4. No título de seu “sermão”, Drummond cria, em di-
ferentes momentos, uma relação de oposição com o
texto no qual se inspirou. Explique por quê.
Se julgar necessário, retomar com os alunos o estudo da ironia, apresentado no Capítulo 16.
Non Sequitur
Wiley Miller
non sequitur, wiley miller © 2004 wiley miller/dist. by universal uclicK
Além do trabalho com a linguagem nos níveis sonoro,
lexical e sintático, também temos a possibilidade de provocar alterações no plano do significado (semântico). Quando
manipulamos o sentido das palavras e expressões, criamos
figuras de pensamento. Uma das mais conhecidas figuras
de pensamento é a ironia, que já estudamos no Capítulo 16.
Veremos, agora, algumas outras.
substituí-las por termos que atenuam a ideia original. Sempre
que fazemos isso, criamos um eufemismo. Observe a placa
no cartum abaixo.
• Hipérbole
O humor do cartum abaixo é produzido pelo exagero na
resposta de Julio.
Julio e Gina
Caco Galhardo
caco Galhardo/FolhaPress
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Figuras de pensamento
mILLER, Wiley. Non Sequitur Panel,
21 fev. 2004. Disponível em: <http://www.
gocomics.com/nonsequitur/2004/02/21>.
Acesso em: 7 mar. 2016.
GALHARDO, Caco. Julio & Gina. Folha
de S.Paulo. São Paulo, 15 out. 2007.
Quando ele afirma estar casado há cinco mil anos, sugere
que seu casamento é tão ruim que parece durar uma eternidade. todas as vezes que nos referimos a algo de modo
exagerado, criamos uma hipérbole.
• Eufemismo
Quando desejamos evitar o uso de palavras ou expressões desagradáveis ou excessivamente fortes, podemos
A placa orienta os caminhantes a tomarem cuidado
com o que podem encontrar em um campo onde pastam
bois e vacas. A referência óbvia aos excrementos bovinos
é evitada. Em seu lugar, aparece o eufemismo “material
relacionado a bovinos”.
• Prosopopeia
Em textos literários, histórias em quadrinhos e cartuns
é frequente observarmos a atribuição de características
humanas a animais e objetos inanimados. Esse processo é
denominado prosopopeia ou personificação.
185
na tira a seguir, atribui-se ao chapéu um sentimento próprio de um ser humano: a capacidade
de ficar desapontado.
Charles Schulz
Peanuts, charles schulz © 1988 Peanuts worldwide
llc./dist. by universal uclicK
Minduim
SCHULZ, Charles. minduim. Jornal da Tarde.
São Paulo, 11 fev. 2003.
A associação de ideias contrárias, por meio de palavras ou enunciados de sentido oposto, dá origem à figura de pensamento conhecida como antítese. O uso de antíteses é muito comum em textos
literários. Para expressar a dificuldade de traduzir em palavras a inspiração que toma conta do poeta,
Olavo Bilac, na estrofe a seguir, recorre à associação de opostos.
nos versos, turbilhão de lava/sepulcro de
neve e Palavra pesada/Ideia leve são antíteses
utilizadas para criar imagens que melhor traduzam a dificuldade de encontrar palavras para dar
expressão ao pensamento.
O Pensamento ferve, e é um turbilhão de lava:
A Forma, fria e espessa, é um sepulcro de neve...
E a Palavra pesada abafa a Ideia leve,
Que, perfume e clarão, refulgia e voava.
BILAC, Olavo. Inania verba. Poesias. São Paulo: martins Fontes,
1997. p. 145. (Coleção Poetas do Brasil). (Fragmento).
também é possível criar efeitos de humor pela oposição de ideias. nesse caso, é o contexto que
define a associação de contrários e permite reconhecer as antíteses. Observe.
Iotti
© iotti
Radicci
IOttI. Mixórdia: o menos pior do Radicci.
Porto Alegre: L&Pm, 2001. p. 102.
Para a esposa frustrada, o marido é a “pintura rupestre” por oposição à “escultura grega”. São as
características atribuídas às personagens que conferem o sentido contrário a essas ideias.
• Paradoxo
Em alguns casos, observamos a associação de termos contraditórios, inconciliáveis. Essa figura de
pensamento é denominada paradoxo. A diferença entre a antítese e o paradoxo pode ser constatada
quando observamos que os termos contraditórios, no paradoxo, referem-se a uma mesma ideia. no
caso da antítese, temos duas ideias que se opõem.
186
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
• Antítese
Gramática
na tira a seguir, ocorre um paradoxo quando Hagar fala em “fingir sinceramente”.
Chris Browne
BROWnE, Chris. Hagar.
Folha de S.Paulo. São
Paulo, 12 dez. 2003.
• Gradação
• Apóstrofe
Quando criamos uma sequência de palavras ou expressões que estabelecem uma progressão (ascendente ou
descendente), surge a figura de pensamento chamada de
gradação.
na poesia, um recurso muito utilizado é a interpelação
de uma pessoa (real ou imaginária), presente ou ausente,
como uma forma de enfatizar uma ideia ou expressão. Esse
recurso é chamado de apóstrofe. Observe.
Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?
Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes
Embuçado nos céus?
Há dois mil anos te mandei meu grito,
Que embalde desde então corre o infinito...
Onde estás, Senhor Deus?...
[...] Convocados os súditos, transformados em soldados os
que antes eram pedreiros, harmonizados os seis pela ameaça
comum, recebem, atacam, destroçam, anulam o invasor. E
ainda úmidos da batalha, sem sequer reunir a tropa, sobem
os seis com seus cavalos no primeiro barco que encontram,
e a remo, a vela, vencem o rio rumo ao reino que havia sido
do velho e que, sem defesa, será deles.
ALVES, Castro. Obra completa. Rio de Janeiro: nova Aguilar,
1986. p. 290-293. (Fragmento).
COLASAntI, marina. Entre eles, água e mágoa. Com certeza tenho
amor. 1. ed. digital. São Paulo: Global, 2015. e-book. Posição 454.
© by marina Colasanti. (Fragmento).
Embuçado: encoberto, oculto.
Embalde: inutilmente, em vão.
nos conhecidos versos de “Vozes d’África”, o eu lírico é
o continente africano que, indignado pelo destino de seus
filhos, capturados e vendidos como escravos, dirige-se a
Deus por meio de apóstrofes: Deus! ó Deus!; Senhor Deus.
no trecho do conto de marina Colasanti, observamos uma
gradação entre as ações recebem  atacam  destroçam
 anulam.
atividades
Observe atentamente a tira a seguir para responder às questões 1 e 2.
O incrível Homem-legenda
Adão Iturrusgarai
© adão iturrusGarai
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
© 2016 KinG Features syndicate/iPress
Hagar
Stand-up: termo
originado da
expressão
stand-up comedy
(do inglês), que
designa um
espetáculo de
humor em que um
único comediante
se apresenta,
geralmente,
em pé.
ItURRUSGARAI, Adão. O incrível Homem-legenda.
Folha de S.Paulo. São Paulo, 10 nov. 2010.
1. Na tira, é possível identificar um eufemismo. Qual é ele?
> Por que a expressão identificada é um eufemismo?
2. Explique de que maneira a personagem Homem-legenda contribui para a identificação dessa
figura de pensamento e para a construção do humor da tira.
187
Leia o cartum abaixo para responder às questões 3 e 4.
Guilherme Bandeira
BAnDEIRA, Guilherme. Objetos
InAnimados. Disponível em:
<https://www.facebook.com/
objetosinanimadoscartoon/
photos/a.24659158875
9209.61835.24658258
5426776/87818036226
6992/?type=1&theater>.
Acesso em: 7 mar. 2016.
3. Quais são as duas personagens do cartum e o que representam?
> Que situação é protagonizada por essas personagens?
4. Qual é o recurso estilístico utilizado pelo Cérebro para deixar clara sua condenação ao comportamento do Coração?
> Considere o título, a natureza das personagens e o recurso estilístico presente no cartum. De
que modo Guilherme Bandeira utiliza esses elementos para criar o seu cartum?
Enem e vestibulares
1. (Fuvest)
Leia a seguinte mensagem publicitária de uma empresa da área de logística:
A gente anda na linha para levar sua
empresa mais longe
Mudamos o jeito de transportar contêineres no Brasil e Mercosul. Através do modal ferroviário, oferecemos
soluções logísticas econômicas, seguras e sustentáveis.
2. (Fuvest)
Ditadura/Democracia
A diferença entre uma democracia e um país totalitário é que numa democracia todo mundo reclama,
ninguém vive satisfeito. Mas se você perguntar a qualquer cidadão de uma ditadura o que acha de seu país,
ele responde, sem hesitação: “Não posso me queixar”.
FERnAnDES, millôr. Ditadura/Democracia.
Millôr definitivo: a bíblia do caos. São Paulo:
L&Pm Editores, 2014.
a) Visando a obter maior expressividade, recorre-se,
no título da mensagem, ao emprego de expressão
com duplo sentido. Qual é essa expressão? Explique
o efeito produzido por ela.
b) Segundo o anúncio, uma das vantagens do produto
(transporte ferroviário) nele oferecido é o fato de
esse produto ser “sustentável”. Cite um motivo que
justifique tal afirmação.
188
a) Para produzir o efeito de humor que o caracteriza,
esse texto emprega o recurso da ambiguidade? Justifique sua resposta.
b) No caderno, reescreva a segunda parte do texto
(de “Mas” até “queixar”), pondo no plural a palavra
“cidadão” e fazendo as modificações necessárias.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
© Guilherme bandeira
Objetos InAnimados
Gramática
Usos dos recursos estilísticos
Em textos mais subjetivos ou intimistas, as figuras de linguagem aparecem como importantes
recursos estilísticos. Elas ajudam o autor a traduzir emoções e sentimentos para seus leitores,
por meio de imagens muitas vezes inesperadas.
no texto a seguir, o alpinista mark Jenkins compartilha com seus leitores uma experiência marcante:
a tentativa de alcançar o cume do Hkakabo Razi, a montanha mais alta do Sudeste Asiático, localizada
ao norte de mianmar, na fronteira com o tibete.
Fim da linha
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Como um pico escondido nas selvas de Mianmar
quase exterminou um grupo de escaladores de elite
[...] Renan e eu aguardamos, encolhidos no vento. Batemos os pés,
estapeamos nossas mãos enluvadas. A distância não nos permite
conversar. Ficamos ali, juntos, mas solitários, na face do penhasco
rebocado de neve a 5 quilômetros do chão. Após meia hora começamos a congelar. Uma hora depois perdemos a sensibilidade dos
dedos das mãos e dos pés. “Não aguento mais”, grita Renan por trás da
barba congelada. “Meus pés dormiram. Tenho de começar a avançar.”
Não sabemos o que Cory está fazendo lá em cima, mas o frio é tanto
que isso não importa. Renan começa a escalar, e logo eu o imito. Estamos ligados pela corda, por isso é crucial que nenhum de nós caia. [...]
Renan e eu paramos em uma pequena reentrância na rocha voltada
para a face norte da montanha. Através da neve soprada pelo vento,
vemos Cory percorrendo outro trecho. Será perigoso demais se Renan e eu continuarmos a avançar. Temos de esperar de novo. Ficamos
bem próximos, mas ainda congelando. O vento redemoinha em torno
do nosso corpo, uiva e morde como uma hiena invisível. “Meus pés
não suportam mais o frio”, reclama Renan. Ele quer dizer que estão
prestes a gangrenar pelo gelo.
No mínimo pela décima vez nessa expedição, eu me pergunto se é o
fim da tentativa de escalar o pico mais alto de Mianmar – aventura que
nos levou aos limites físicos e emocionais. Bem abaixo de nós, as demais
pessoas do nosso grupo nos incentivam mentalmente. Taylor Rees,
administradora do acampamento-base, está nos pés da montanha.
No dia anterior, deixamos Hilaree O’Neill e Emily Harrington no acampamento 3, uma barraca aninhada em uma crista onde nosso exausto
grupo teve uma discussão feia para decidir quem tentaria subir ao cume.
[...] Enfim, quando Cory contorna uma rocha, avançamos. Uma
hora depois nos reagrupamos em uma saliência estreita. Nosso objetivo continua acima de nós: o topo da crista oeste, cintilante como
um fio de espada. [...]
JEnKInS, mark. Fim da linha. National Geographic.
Setembro 2015. p. 82-83. (Fragmento).
A antítese que inicia o texto reflete a intensidade do desafio a ser enfrentado pelo grupo de
escaladores. A metáfora é usada para descrever a
aparência do penhasco e a dificuldade encontrada
para fixação durante a escalada. Os hipérbatos
(que terminam com os elementos da gradação)
contribuem para criar a tensão no leitor: a cada
instante, um problema maior surge para os
alpinistas. A metáfora na fala de Renan traduz o
desconforto provocado pelo frio.
nessa passagem do texto, o hipérbato enfatiza a
dificuldade encontrada pelos escaladores em razão
das condições naturais. Em meio ao que parece
ser uma tempestade de vento e neve, destacada
pela comparação, ganha maior destaque o uso que
Renan faz de um eufemismo para falar da condição
dos seus pés: o narrador esclarece que os pés do
amigo estão prestes a gangrenar.
nesse relato pessoal de uma experiência
marcante, podemos identificar o grande planejamento e preparo necessários para enfrentar
os desafios da natureza. Um hipérbato e uma
catacrese chamam a atenção do leitor para a
distância entre o ponto do acampamento-base
e o local em que se encontram os alpinistas.
A tentativa de se incorporarem à montanha é
expressa pela metáfora utilizada para se referir
ao acampamento: como pássaros, os humanos
se aninham a uma crista da gigantesca pedra.
O hipérbato, nesse trecho do relato, destaca
os obstáculos a serem vencidos a cada instante.
A comparação final enfatiza o grande perigo em
que se encontram o narrador e seus companheiros
de aventura.
Para descrever a situação de risco em que se encontrava o grupo de alpinistas durante uma
perigosa aventura, mark Jenkins adota um tom bastante pessoal para seu relato. Isso se explica
pela intenção do autor de levar o leitor a experimentar a sensação de perigo e de risco iminente
de morte enfrentados pelo grupo. Os diferentes recursos estilísticos desempenham papel importante para alcançar esse propósito. Uma descrição objetiva das características da montanha e
Figuras de
palavra
Figuras de
sintaxe
Figuras de
pensamento
189
Hkakabo Razi, a mais alta montanha de mianmar, na Ásia, 2015.
A análise do texto revela que era importante para mark
Jenkins narrar a expedição de modo envolvente. Por isso,
criou imagens que pudessem aproximar o leitor dos sentimentos e das impressões que teve enquanto participava
da arriscada escalada. Em contextos como esse, figuras de
palavra (como a metáfora, a comparação e a catacrese),
de sintaxe (como o hipérbato) e de pensamento (como
a antítese, o eufemismo e a gradação) permitem que o
leitor se aproxime da experiência vivida pelo autor do texto.
Pratique
Veja orientações no Guia de recursos.
Com base no que você aprendeu sobre os recursos
estilísticos, faça uma análise do texto transcrito a seguir
de modo semelhante ao que foi feito no relato de mark
Jenkins. no caderno, transcreva os trechos em que ocorrem as figuras de linguagem, especificando as figuras
de palavra, de sintaxe ou de pensamento utilizadas pelo
autor do texto.
Eu sou o melhor no que faço, mas
o que faço não é nada bonito
Meu pai me chama de Wolverine. É o nosso apelido
secreto.
Não tenho o queixo quadrado e a baixa estatura do
desenho da Marvel Comics. Muito menos a suíça e o
cabelo alvoroçado do ator Hugh Jackman, que interpreta
o herói no cinema. A referência física não contribui para
nossas semelhanças.
190
Ele me compara ao personagem pelo meu alto poder de cicatrização. Eu me desespero e logo me [sic]
ressuscito, eu caio e logo levanto.
Não morro de uma única vez. Não desisto. Não me
entrego mesmo quando não vejo a saída. Quando não
há porta, eu espero no escuro até ser a porta.
A ansiedade que me enerva acaba por aumentar
minha vontade de ver de novo a luz.
Tenho fúria de viver.
Não há perda que seja total. Alguém pode me machucar terrivelmente, mas não me leva. [...] sei cavar a
terra por dentro da terra. Penso nos filhos, penso nos
amigos, penso na literatura e sigo adiante. Cambalear ainda é caminhar. A chuva lava minha ferida e o
vento seca.
A carne da memória se recompõe de algum jeito.
Talvez seja um excesso de sofrimento na infância que
me preparou para o pior no futuro.
Eu sobrevivi a tanta coisa.
[...]
Sobrevivi, vou sobreviver, mesmo que não acredite
na hora.
Só não entendia onde meu pai enxergava as garras
retráteis de Logan:
— E as garras das mãos, pai?
— São as palavras, meu filho. Você se defende com a
linguagem ou se agarra nela para não morrer.
CARPInEJAR, Fabrício. Me ajude a chorar.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2014. p. 35-37.
(Fragmento).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
cory richards/national GeoGraPhic creative
das condições climáticas não seria suficiente para traduzir os riscos ocorridos nos momentos
mais difíceis da escalada.
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