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texto estudo dirigido pode r de polícia pdf

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O poder de polícia e a liberdade de
locomoção: estado de necessidade
administrativo em tempos de
pandemia ambiental*
Police power and freedom of
locomotion: state of administrative
need in environmental pandemic
times
Magno Federici Gomes**
Amanda Rodrigues Alves***
*
Trabalho financiado pelo Projeto Edital nº 03/2019 de Incentivo à Pesquisa da Escola Superior
Dom Helder Câmara, resultante dos Grupos de Pesquisas (CNPq): Regulação Ambiental da
Atividade Econômica Sustentável (Rega), Negesp, Metamorfose Jurídica e Cedis (FCT-PT).
Artigo recebido em 29 de dezembro de 2020 e aprovado em 27 de março de 2021. DOI: https://
doi.org/10.12660/rda.v282.2023.88640.
** Estágio pós-doutoral em direito público e educação pela Universidade Nova de LisboaPortugal (Bolsa Capes/BEX 3642/07-0). Estágios pós-doutorais em direito civil e processual
civil, doutor em direito e mestre em direito processual, pela Universidad de Deusto-Espanha
(Bolsa da Cátedra Unesco e do Gobierno Vasco-Espanha). Mestre em educação pela PUC Mi­
nas. Professor do Departamento de Direito Público Formal da Universidade Federal de Juiz de
Fora (UFJF). Integrante dos Grupos de Pesquisa: Responsabilidade Civil e Processo Am­bien­tal
(Recipro)/CNPq-BRA, Centro de Investigação & Desenvolvimento sobre Direito e So­cie­dade
(Cedis)/FCT-PT e Metamorfose Jurídica/CNPq-BRA. E-mail: magno.federici@ufjf.br.
*** Mestre em direito ambiental e desenvolvimento sustentável pela Dom Helder Câmara Escola
de Direito. Pós-graduada em ciências penais pela faculdade Milton Campos. Pós-graduada
em docência jurídica pela Faculdade Arnaldo. Graduada em processos gerenciais com ênfase
no terceiro setor pela Universidade Estadual de Minas Gerais. Graduada em direito pela Dom
Helder Câmara Escola de Direito. Integrante do Grupo de Pesquisa: Regulação Ambiental
da Atividade Econômica Sustentável (Rega). Nucleadora no Instituto Movimento Ecos.
Advogada sócia no escritório Rodrigues Alves e Sella Sociedade de Advogados. Professora de
processo penal no Prolabore cursos preparatórios para concursos, situado em Belo Horizonte
(MG). E-mail: amanda@rasadvocacia.com.br.
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RE VI S T A D E D I R EIT O A DMINIST R A T IV O
RESUMO
O poder de polícia é a capacidade do Estado de intervir na esfera privada,
restringindo bens e direitos, em prol do interesse público, sendo tal poder
legitimado pelo estado democrático de direito. Ocorre que, diante de
situações de emergência, o poder de polícia muitas vezes não encontra
respaldo legal. Assim, o problema do presente estudo é verificar se a
pandemia causada pela Covid-19 pode ser enquadrada como situação de
emergência e, assim o sendo, se de fato justifica um estado de necessidade
administrativo, capaz de relativizar ou mesmo suspender garantias
fundamentais, entre elas a liberdade de locomoção. Para realizar o estudo,
foi utilizado raciocínio dedutivo e metodologia teórico-jurídica. Diante
do estudo, foi possível observar que em conjunturas excepcionais e de
anomia, a exemplo de situações de calamidade pública, o Estado pode se
valer do estado de necessidade administrativo, desde que o faça de forma
racional e técnica.
PALAVRAS-CHAVE
poder de polícia — direito de locomoção — estado de necessidade
administrativo — democracia — pandemia
ABSTRACT
Police power is a capacity that the state has to intervene in the private
sphere, restricting assets and rights, in the interest of the public interest,
and this power is legitimized by the democratic rule of law. It happens
that emergency shoes the police power often does not find legal support.
Thus, the objective of the present study is to verify if the pandemic caused
by Covid-19 can be classified as an emergency situation, and if so, a state of
administrative need is justified, capable of relativizing or even suspending
fundamental guarantees, among them the freedom of movement. In
order to carry out the study, deductive reasoning and theoretical-legal
methodology were used, based on bibliographic sources and analysis of
jurisprudence and national and international legislation, as long as it is
done in a rational and technical way.
KEYWORDS
police power — right of locomotion — state of administrative necessity —
democracy — pandemic
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
Introdução
O poder de polícia, enquanto incumbência estatal de intervir nas relações
privadas, de forma a discipliná-las e impor limites ao gozo de bens e direitos,
é legitimado em um estado democrático de direito, em que a população se
submete a tal ingerência visando o melhor interesse da coletividade.
Dessa forma, cabe ao Estado, com base na proporcionalidade, fazer
escolhas, desde que baseadas em lei. Todavia, diante de uma situação de
anormalidade, o poder público pode se deparar com um cenário jamais viven­
ciado e que demandará um agir em prol do coletivo.
A tais situações excepcionais, em que o Estado precisa agir, mesmo
que não amparado por lei, convencionou-se chamar de estado de necessidade
administrativo, uma espécie de estado de exceção que precisa ser instaurado
em prol da ordem e do bem comum.
Destarte, o problema que será respondido pelo presente estudo refe­
renciará se a pandemia causada pela Covid-19 será capaz de gerar uma
situação emergencial e se ensejará um estado de necessidade administrativo,
e, a partir de então, analisar-se-á se a atuação do poder público infringiu ou
infringirá direitos fundamentais, em especial a liberdade de ir e vir.
A justificativa da pesquisa assentar-se-á na necessidade de discussão
acerca dos limites da atuação estatal, mesmo em situações excepcionais. Em
vista disso, o objetivo será analisar o poder de polícia e seus limites, em uma
sociedade democrática. Ademais, o estudo se voltará para a Lei nº 13.979/2020
e a liberdade de locomoção, bem como o estado de exceção instituído pela
Pandemia Mundial de Sars Covid-19, um verdadeiro acidente ambiental.1
Para tanto, utilizar-se-á a metodologia teórico-jurídica e raciocínio dedu­
tivo, a partir de fontes bibliográficas e análise de jurisprudências e legislação
nacional e internacional. O marco teórico utilizado será a obra Poder de polícia,
ordenação, regulação: transformações político-jurídicas, econômicas e institucionais
do direito administrativo ordenador, de Binenbojm,2 que aborda em seu estudo
os elementos estruturantes do estado de necessidade administrativo e que
1
2
Justifica-se essa afirmativa pela suspeita, ainda não confirmada, de que a origem do Sars
Covid-19 foi, a princípio, o vírus de um morcego que contaminou um pangolim dentro de
mercado de animais vivos que, posteriormente, foi consumido pela espécie humana, gerando
uma pandemia mundial jamais vista nos tempos modernos.
BINENBOJM, Gustavo. Poder de polícia, ordenação, regulação: transformações político-jurídicas,
econômicas e institucionais do direito administrativo ordenador. Belo Horizonte: Fórum,
2016.
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serão imprescindíveis à resolução do problema central, que demonstrará se
o Estado brasileiro, ao relativizar a liberdade de locomoção, como medida
preventiva à Covid-19, agiu de forma arbitrária ou legítima.
Os objetivos pretendidos serão atingidos em análises compartilhadas
na seguinte estrutura: o primeiro capítulo abordará o conceito do poder de
polícia e os limites de tal poder em uma ordem democrática. O segundo
capí­tulo, por sua vez, abarcará a liberdade de locomoção enquanto garan­tia
fundamental, bem como fará breves considerações acerca da Lei nº 13.979/
2020, que apresentou como medidas de prevenção à Covid-19 a quaren­tena
e o isolamento, intervenções capazes de relativizar a liberdade de ir e vir do
indivíduo. Por fim, o capítulo derradeiro trará à baila o problema central da
pesquisa, qual seja: a aplicação do poder de polícia nas situações de emer­
gência e o estado de necessidade ante uma pandemia tão peculiar quanto a
causada pela Covid-19.
1. Poder de polícia: democracia e limites
Os termos política e polícia, etimologicamente, possuem a mesma origem,
já que ambos advêm do latim politia ou do grego politea. Apesar de serem pro­
venientes da mesma palavra, os conceitos diferem desde a sua origem. Na
Grécia e Roma antigas, a política refletia uma forma de governo democrática,
baseada no discurso e na participação dos membros da pólis.
Para Binenbojm, a política possuía relação direta com viver na pólis e de
“estar submetido a uma forma de governo de membros autônomos e iguais,
na qual as questões de interesse comum eram resolvidas mediante recurso às
palavras e à persuasão, e não por meio da força e da violência”.3
De forma diversa, a polícia ou o poder de polícia, era adstrito ao âmbito
familiar, à esfera privada. Ao chefe da casa incumbia criar regras, que eram
impostas aos que ali viviam. Segundo Binenbojm, a polícia possuía “natureza
pré-política, aplicável à vida fora da pólis, ou seja, à vida da casa e da família,
na qual o patriarca — pater familias — comandava seus subordinados com
poderes despóticos e incontestáveis”.4
3
4
Ibid., p. 27.
Ibid.
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Tal poder de polícia com origem na Antiguidade ganhou força na Idade
Moderna. No entanto, em vez de ser exercido pelo chefe da família, a polícia
passou para as mãos do soberano, ou seja, do príncipe.
A célebre frase “o Estado sou eu”, de Luiz XIV da França, no século XVII,
retrata bem a posição ocupada pelo soberano. Sob a justificativa de que o
príncipe era um enviado de Deus, a ele incumbia impor normas limitadoras
de liberdades individuais, que eram aceitas sem questionamentos. O poder de
polícia não possuía justificativa legal, mas divina.
Com a Revolução Francesa e o iluminismo, propulsores da era moderna,
o poder soberano é questionado de forma a dar ao estado de polícia lugar ao
estado de direito, em que o poder de polícia passa a ser exercido dentro dos
limites legais.
Pode parecer um contrassenso pensar que os direitos fundamentais de
primeira dimensão foram legitimados exatamente em tal período, afinal,
trata-se de direitos que visam a abstenção do poder estatal.
Os direitos de primeira geração realçam o princípio da liberdade. São os
direitos civis e políticos, reconhecidos nas Revoluções Francesa e Americana.
Caracterizam-se por impor ao Estado um dever de abstenção, de não fazer, de
não interferência, de não intromissão no espaço de autodeterminação de cada
indivíduo.5
Na verdade, esse aparente contrassenso entre a legitimação do poder de
polícia e o surgimento dos direitos fundamentais de primeira dimensão não
existe. Na era contemporânea, o Estado absolutista é sucedido pelo estado de
direito, que não prega a ausência do Estado, mas sim sua presença e atuação
baseada em ditames legais, cuja base é a vontade popular e não mais a vontade
única e irrestrita do soberano.
Dessa maneira, vemos que o direito à democracia participativa é pilar de sus­
tentação do Estado Democrático de Direito, sem o qual não há que se falar
em Estado Democrático. O povo é o titular do poder absoluto no Estado
Democrático de Direito, e como tal, sua voz deve ganhar força em torno de
modificações a serem operadas no arcabouço da sociedade e do direito.6
5
6
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito constitucional descomplicado. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2009. p. 93.
GOMES, Magno Federici; FERREIRA, Leandro José. A dimensão jurídico-política da
sustentabilidade e o direito fundamental à razoável duração do procedimento. Revista do
Direito, Santa Cruz do Sul, v. 2, n. 52, p. 93-111, maio/set. 2017. p. 100-101.
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Nesse novo cenário, as liberdades individuais assumem papel de
relevância, podendo ser afastadas em casos excepcionais, previamente
estabelecidos em lei. A partir de então é que o poder de polícia passa a ter
contornos semelhantes aos que se tem nos dias atuais, visto que é funda­
mentado na legalidade.
Para que se entenda os limites do poder de polícia, essencial à compreen­
são do presente estudo, faz-se mister apresentar seu conceito.
No Brasil, tal conceito é expresso no art. 78 do Código Tributário Nacional
(CTN), que destaca:
Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limi­
tando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato
ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança,
à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao
exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização
do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos
direitos individuais ou coletivos.7
Para Di Pietro, o poder de polícia é a “atividade do Estado consistente
em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse
público”,8 em consonância com o que prevê a legislação pátria. No mesmo
sentido entende Binenbojm, ao destacar que o poder de polícia é um
[…] conjunto de regulações sobre a atividade privada, desvinculadas ou com­
plementares a relações especiais de sujeição (estatutárias ou contratuais),
dotadas ou não de força coercitiva, conforme o caso, que erigem um sistema
de incentivos voltados à promoção de comportamentos socialmente desejáveis
e ao desestímulo de comportamentos indesejáveis, de acordo com objetivos
político-jurídicos predeterminados.9
Ao que parece, os conceitos atuais apresentados anteriormente não dife­
rem muito daquele apresentado por Meirelles em 1972, em plena ditadura
militar. Para o autor, o poder de polícia nada mais é do que a possibilidade
que o Estado tem “de restringir o uso e gozo de bens ou direitos individuais,
em benefício da coletividade ou do próprio Estado”.10
7
8
9
10
BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Diário Oficial da
União, Brasília, 27 out. 1966. s.p.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 104.
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 71.
MEIRELLES, Hely Lopes. Poder de polícia e segurança nacional. Revista dos Tribunais, v. 61,
n. 445, p. 287-298, nov. 1972. p. 289.
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MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
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Mello aborda o poder de polícia de uma forma mais ampla, subdividindo-o
em poder de polícia amplo (em que se compreendem os atos de polícia do
Legislativo, ou seja, as normas limitadoras) e poder de polícia restrito (que
abrange os atos do Poder Executivo). Apesar de apresentar tal diferenciação,
para Mello o conceito stricto sensu diz respeito somente aos atos do Executivo,
vez que o poder de polícia propriamente dito pertence a uma função típica da
administração pública.11
Verifica-se que o poder de polícia é atividade pertencente à administra­
ção pública, portanto, inserto no ramo do direito administrativo. Ocorre que,
como defende Binenbojm, “houve no Brasil, pós Constituição de 1988, uma
guinada democrático-constitucional do direito administrativo”.12
O estado de direito, a partir de então, passa a ser um estado democrático
de direito, em que as diversas searas do direito devem, em sua integralidade,
ter por fim não a norma em si, mas seu cumprimento em consonância aos
ditames constitucionais, e, principalmente, com as garantias fundamentais.
Assim, embora o conceito de poder de polícia não tenha tido alteração
substancial pré e pós-Constituição da República de 1988 (CR/88), resta claro
que o fundamento de sua aplicação necessita ser repensado ante o estado de­
mocrático de direito, em que as garantias fundamentais assumem especial
relevância.
Sob a máxima da garantia da ordem ou da supremacia do interesse
público sobre o privado, muitas vezes o Estado toma para si as liberdades
indi­viduais dos governados.
A princípio, tal premissa não possui conotação pejorativa, afinal, é
exatamente na possibilidade de o Estado restringir direitos e bens que se
assenta o poder de polícia, o que encontra fundamento na própria vontade
popular. A problemática surge nos limites da atuação estatal, ou seja, até
que ponto as garantias individuais podem ser afastadas em prol de um bem
comum.
Para solucionar tal impasse, é necessário estabelecer um paralelo entre a
atuação estatal e a democracia, que concede ao Estado poderes amplos, mas
não irrestritos.
11
12
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21. ed. São Paulo: Malheiros,
2006. p. 780.
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 37.
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Pode-se dizer que a teoria democrática contemporânea estruturou-se a partir
do paradigma liberal, reconhecendo no Estado o aparato da administração
pública, orientado no interesse da sociedade, limitando a política à função de
agregar e impor os interesses sociais privados ao âmbito estatal — identificado
com o espaço público, por excelência.13
Dessa forma, são os interesses da sociedade, expressos democratica­mente
no texto constitucional, que limitam o poder estatal. O Estado é livre para
tomar decisões em prol da sociedade, mas tais regras não podem ferir o or­
denamento vigente e preestabelecido pela vontade popular. Exatamente por
isso, ao Estado cabe fazer escolhas fundadas na legalidade, respeitando-se,
em especial, as garantias tidas como fundamentais, que em regra são
inafastáveis, se consubstanciando em limites ao poder do governado.
Nesse sentido, para que a ordenação estatal não seja revertida em tirania,
é necessário que na tomada de decisão o Estado adote a proporcionalidade,
tal como destaca Binenbojm:
A legitimidade das medidas de ordenação dependerá da observância, entre
outros fatores, da lógica da proporcionalidade, em seus três exames suces­
sivos: (i) adequação (exigência de que a medida restritiva seja apta a promover
razoavelmente o direito fundamental ou o objetivo de interesse geral con­
traposto); (ii) necessidade (exigência que a medida restritiva não possa ser
substituída por outra que cumpra a mesma finalidade de forma razoável, mas
de maneira menos gravosa ao direito restringido); e (iii) proporcionalidade em
sentido estrito (exigência de que, consoante algum critério válido de análise de
custo-benefício, seja possível afirmar que o grau de importância da promoção
do direito fundamental ou do objetivo de interesse geral justifique a gravidade
da restrição imposta ao direito em questão.14
Desse modo, para Binenbojm, tais exigências devem permear as tomadas
de decisões do Estado, mesmo que baseadas na legalidade. No entanto,
existem situações atípicas e emergenciais que não possuem solução legal, mas
que exigem do Estado uma atuação célere e eficiente, cuja legitimidade vai
além da adoção da proporcionalidade, conforme será visto adiante.
13
14
MARONA, Marjorie. Contribuições de Hannah Arendt e Habermas para a teoria democrática
contemporânea. Revista Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 6, n. 11, p. 45-60, jan./jun. 2009.
p. 58.
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 119-120.
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MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
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2. A garantia constitucional à liberdade de locomoção e a
Lei nº 13.979/2020
O direito de liberdade de locomoção é garantia fundamental prevista no
art. 5º, XV, da CR/88, que dispõe: “é livre a locomoção no território nacional
em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar,
permanecer ou dele sair com seus bens”.15
A regra, em qualquer estado democrático de direito, é que todos possam
se locomover livremente, sendo a liberdade do indivíduo uma garantia de
primeira dimensão, cerne da Revolução Francesa e do próprio liberalismo.
Não há um conceito único do que vem a ser liberdade, e desde Aristóteles,
no século V a.C., a temática já era objeto de estudo. O conceito apresentado
por ele há mais de 25 séculos ainda é bem aceito pela filosofia. Para Aristóteles:
[…] ser livre é aquele que tem em si mesmo o princípio para agir ou não agir,
isto é, aquele que é causa interna de sua ação ou da decisão de não agir. A
li­berda­de é concebida como o poder pleno e incondicional da vontade para
deter­mi­nar a si mesma ou para ser autodeterminada. É pensada, também, como
ausência de constrangimentos externos e internos, isto é, como uma capacidade
que não encontra obstáculos para se realizar, nem é forçada por coisa alguma
para agir. Trata-se da espontaneidade plena do agente, que dá a si mesmo os
motivos e os fins de sua ação, sem ser constrangido ou forçado por nada ou por
ninguém.16
Verifica-se que, para Aristóteles, a liberdade pode ser sintetizada como a
capacidade de decidir e de agir conforme tal decisão.
A liberdade de locomoção pode ser pensada dentro da perspectiva aris­
totélica de liberdade como o direito de ir e vir livremente, sem embaraços, de
acordo com a autodeterminação.
Fato é que tal liberdade de locomover-se, mesmo dentro do Estado nacio­
nal, apesar de ser uma garantia fundamental, encontra-se relativizada pelas
medidas de prevenção adotadas ante a pandemia causada pela Covid-19.
Mesmo sendo um dos direitos mais valorizados por qualquer indivíduo,
a liberdade, assim como qualquer outro direito, por mais fundamental que
seja, não se reveste de caráter absoluto.
15
16
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado
Federal, Centro Gráfico, 1988. s.p.
CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 4. ed. São Paulo: Ática, 1997. p. 360.
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Nesse sentido, a doutrina e a jurisprudência têm enfatizado que os direitos
e garantias fundamentais expõem-se a restrições autorizadas, expressa ou
implicitamente, pelo texto da própria Constituição, já que não podem servir
como manto para acobertar abusos do indivíduo em prejuízo à ordem pública.
Assim, normas infraconstitucionais — lei, medida provisória e outras —
podem impor restrições ao exercício de direito fundamental consagrado na
Constituição.17
Em razão disso, o Estado brasileiro, devido à Covid-19, doença viral que
surpreendeu o mundo no fim do ano de 2019, resolveu, no início do ano de
2020, publicar a Lei nº 13.979/2020, que disciplina medidas de prevenção à
doença, entre elas algumas limitadoras do direito de ir e vir.
A publicação da referida lei se deu no dia 6 de fevereiro de 2020 e trouxe
como medidas de enfrentamento ao Covid-19, entre outras, a possibilidade
de isolamento e quarentena, que serão objeto do presente estudo e que foram
conceituadas pela Lei nº 13.979/2020 nos seguintes moldes:
I — isolamento: separação de pessoas doentes ou contaminadas, ou de ba­
gagens, meios de transporte, mercadorias ou encomendas postais afetadas, de
outros, de maneira a evitar a contaminação ou a propagação do coronavírus;
II — quarentena: restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de
contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres,
animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de
maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus.18
Apesar de muitas vezes serem utilizados como sinônimos, os termos
qua­rentena e isolamento não são confundem. No isolamento, as pessoas a
serem separadas das demais são aquelas que, comprovadamente, estão con­
tami­nadas pelo vírus. Já na quarentena o afastamento deve se dar em caso de
sus­peita da doença.
Por ser uma lei geral, que não trouxe mais detalhes acerca das formas e
períodos de quarentena e isolamento, ela foi disciplinada por portarias, entre
as quais se destaca a Portaria nº 356 de 2020 e a Portaria Interministerial nº 05
de 2020.
A Portaria nº 356 do Ministério da Saúde, publicada em 11 de março
de 2020, a fim de sanar as omissões da lei federal, regulamentou prazos e
condições das medidas de isolamento e quarentena.
17
18
Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino, Direito constitucional descomplicado, op. cit., p. 99.
BRASIL. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. Dispõe sobre as medidas para enfrentamento
da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus
responsável pelo surto de 2019. Diário Oficial da União, Brasília, 6 fev. 2020a. s.p.
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Segundo a Portaria, o isolamento deve ocorrer em domicílio ou hospital,
inclusive para casos de pessoas que tenham sido diagnosticadas com a
Covid-19 e estiverem assintomáticas. Além disso,
[…] a medida de isolamento somente poderá ser determinada por prescrição
médica ou por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, por um
prazo máximo de 14 (quatorze) dias, podendo se estender por até igual período,
conforme resultado laboratorial que comprove o risco de transmissão.19
No que se refere à quarentena, a Portaria nº 356 pouco esclareceu acerca
do direito de ir e vir das pessoas suspeitas de contaminação, ressaltando
que a medida “será determinada mediante ato administrativo formal e devi­
damente motivado e deverá ser editada por Secretário de Saúde do Estado, do
Município, do Distrito Federal ou Ministro de Estado da Saúde ou superiores
em cada nível de gestão”.20
Quanto ao tempo de duração, destacou que a “quarentena será adotada
pelo prazo de até 40 (quarenta) dias, podendo se estender pelo tempo ne­
cessário para reduzir a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos
serviços de saúde no território”.21
Importante esclarecer que a referida portaria deixou claro que o iso­
lamento e a quarentena não são medidas facultativas, mas obrigatórias,
salientando no art. 5º que o descumprimento das mesmas é capaz de gerar
responsabilidade.
Para sanar qualquer dúvida sobre os tipos de responsabilidade em caso
de descumprimento, a Portaria interministerial nº 05 de 2020, editada pelos
Ministérios da Saúde e da Justiça e já revogada,22 trouxe, expressamente, a
pos­sibilidade de incriminação por descumprimento, decorrente de violação
dos arts. 268 e 330, ambos do Código Penal (CP), que preveem os crimes de
infração de medida sanitária preventiva e de desobediência, respectivamente.
Cumpre mencionar que os objetos da pesquisa foram as normas federais,
sendo certo que a competência para legislar sobre saúde pública é concorrente,
19
20
21
22
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n. 356, de 11 de março de 2020. Gabinete do Ministro,
Brasília, 11 mar. 2020b. s.p.
Ibid.
Ibid.
A Portaria interministerial nº 05 de 2020 foi revogada pela Portaria interministerial nº 09 de
2020, publicada em 27 de março de 2020. Apesar de sua revogação, as condutas daqueles que
infringem as medidas de quarentena e de isolamento podem restar tipificadas nos arts. 268 e
330, ambos do CP, ainda vigentes.
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inclusive, sendo possível que estados, municípios e o Distrito Federal criem
medidas mais restritivas do que as adotadas em nível nacional, o que foi refe­
rendado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ADI 6.341 e
da ADPF 672.
Destaca-se mais uma vez que o objeto de estudo são as medidas de iso­
lamento e quarentena adotadas pelo poder público, não obstante existam
outros atos policiais mais rigorosos, a exemplo do lockdown23 ou do toque de
recolher, em que o direito de ir e vir é ainda mais afetado, e que também
demandariam um estudo mais aprofundado acerca dos seus contornos e
constitucionalidade.
3. O poder de polícia em situações de emergência e o estado
de necessidade administrativo em tempos de pandemia
Existem situações em que o Estado precisa agir, mesmo que para tanto
não esteja amparado pela lei. Trata-se de situações que fogem à normalidade
e à própria previsibilidade legal, como o denominado estado de necessidade
administrativo, que pode ser conceituado como:
[…] uma espécie de cláusula habilitadora, com efeitos derrogatórios, sus­
pensivos ou até criativos, de uma atuação da Administração Pública in­ter­
ventiva e ordenadora na sociedade, não prevista em lei ou contrária a esta,
integrando o conceito de legalidade alternativa, sem prescindir da constatação
de circunstâncias excepcionais que clamam por uma ação urgente e necessária,
posto o resguardo do interesse maior sopesado e ponderado.24
Impende destacar que o estado de necessidade pode assumir contornos
distintos a depender da área do direito a que está inserido. A exemplo, para
23
24
Acerca do lockdown e da restrição de vias terrestres determinadas pelo poder público em razão
da Covid-19, há artigo sobre o tema publicado por Chaves Júnior e Pádua, que concluem pela
desproporcionalidade de tais medidas, valendo-se para o estudo do teste de proporcionalidade
proposto por Mathias Klatt, em que a proporcionalidade é aferida em cinco passos: objetivo
legítimo, meio legítimo, adequação, necessidade e sopesamento. Para Chaves e Pádua, as
medidas por eles estudadas não cumprem as exigências do teste de proporcionalidade de
Klatt, vez que reprovadas em relação a três dos cinco elementos do teste, quais sejam: meio
legítimo, necessidade e sopesamento. (CHAVES JÚNIOR, Airto; PÁDUA, Thiago Aguiar de.
Liberdade em discricionariedade?: restrições ao direito de liberdade no contexto pandêmico.
Revista Novos Estudos Jurídicos, Itajaí, n. 3, v. 25, p. 674-703, set./dez 2020. p. 698 e ss.).
MIRANDA, Juliana Gomes. A teoria da excepcionalidade administrativa: a juridicização do estado
de necessidade. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2010. p. 116.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
a seara jurídica constitucional, o estado de necessidade foi assim conceituado
pelos doutrinadores portugueses Amaral e Garcia:
A expressão estado de necessidade diz respeito a situações de desordem e
de perigo geral, perante as quais o exercício das funções constitucionalmente
previstas dos poderes públicos é insuficiente para satisfazer as necessidades
coletivas emergentes, exigindo-se aos poderes públicos o recurso a meios extra­
ordinários de ação que, desde logo, restrinjam os direitos individuais.25
Eles reconhecem que o estado de necessidade constitucional é uma espé­
cie de estado de exceção, o que não significa dizer que os atos públicos pos­
sam ser realizados sem amparo na lei em sentido amplo. Segundo Amaral e
Garcia, o que existe é uma imprevisibilidade dos modos de agir, mas não dos
fundamentos de agir, que devem obediência aos preceitos constitucionais,
ou seja, “não é um estado de exceção ao direito, mas um estado em que a
necessidade determina o afastamento das normas jurídicas formais e obriga à
sujeição ao direito como um todo, como um bloco de princípios interligados,
geradores de justiça e paz em sociedade”.26 Dessa forma, “o exercício do direito
de necessidade da Administração só surge quando se rompe a normalidade
administrativa, tal como o exercício do direito de necessidade constitucional
surge quando se rompe a normalidade constitucional”.27
No Brasil, apesar do estado de necessidade constitucional ou estado de
exceção estar previsto por meio das figuras do estado de defesa e do estado
de sítio,28 o estado de necessidade administrativo não se encontra definido no
ordenamento pátrio, diferentemente de outros países, como Portugal, que no
art. 3º, n. 2, do Decreto-Lei 442/91 (Código do Procedimento Administrativo
Português), prevê expressamente o seguinte:
25
26
27
28
AMARAL, Diogo Freitas do; GARCIA, Maria da Glória F. P. D. O estado de necessidade e
a urgência em direito administrativo. Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, ano 59, v. II,
p. 447-518, abr. 1999. p. 468.
Ibid., p. 469.
Ibid., p. 486.
Estado de sítio e estado de defesa são medidas de exceção. O primeiro, mais grave, autoriza a
legalidade constitucional extraordinária, suspendendo-se direitos e garantias dos indivíduos,
em casos de “comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem
a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa e declaração de estado de guerra
ou resposta a agressão armada estrangeira”, conforme previsto no art. 137 da CR/88. Lado
outro, o estado de defesa visa “preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e
determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade
institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza” (BRASIL.
Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal,
Centro Gráfico, 1988).
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
185
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RE VI S T A D E D I R EIT O A DMINIST R A T IV O
Os atos administrativos praticados em estado de necessidade, com preterição
das regras estabelecidas neste Código, são válidos, desde que os seus resultados
não pudessem ter sido alcançados de outro modo, mas os lesados terão o direito
de ser indenizados nos termos gerais da responsabilidade da Administração.29
Conclui-se que no ordenamento português o estado de necessidade
administrativo deve ser aplicado como a ultima ratio, ou seja, quando a finali­
dade almejada não puder ser alcançada em razão de condutas amparadas
legalmente.
Um grande exemplo mundial de estado de necessidade administrativo
foi o adotado pelos Estados Unidos da América, quando ocorreu o atentado
às torres gêmeas em 2011. O terrorismo, como situação de grave perigo, de­
mandava uma atitude mais enérgica do Estado. Em vista disso, diversas ga­
rantias fundamentais foram relativizadas, entre elas a restrição da liberdade
de centenas de pessoas, a princípio, sem qualquer motivo legal a justificar-lhe. “Imediatamente após o 11 de setembro, o governo efetuou a captura de
centenas de pessoas, sobretudo estrangeiros, e praticamente todas, até onde
pude perceber, com sobrenome muçulmano ou árabe.”30
Tais pessoas tiveram diversos direitos violados, entre eles a impossi­
bilidade de se comunicar com um advogado ou mesmo com a família após
a prisão. Seus nomes não foram divulgados como prisioneiros, ou seja, não
havia informação pública sobre a prisão e não houve devido processo legal,
sob a justificativa da segurança nacional.
Para ter acesso aos nomes dos presos, organizações da sociedade civil
in­gressaram com uma ação para que o Estado fosse obrigado a ceder os dados
daqueles que se encontravam custodiados.
Apesar das sérias violações aos direitos humanos, o Tribunal negou
o pedido formulado, argumentando ser “papel do Executivo melhorar e
exercer sua perícia na proteção da segurança nacional. Não cabe aos tribunais
questionar as decisões do executivo tomadas em prol da consecução do papel
precípuo desse poder”.31
Verifica-se que no caso em apreço uma situação excepcional autorizou
que fossem afastadas as garantias fundamentais individuais em prol da
segurança nacional.
29
30
31
PORTUGAL. Decreto-Lei 442, de 15 de novembro de 1991. Código do Procedimento Administrativo
Português.
CHEVIGNY, Paul. A repressão nos Estados Unidos após o atentado de 11 de setembro. Sur
Revista Internacional de Direitos Humanos, São Paulo, ano 1, n. 1, p. 159, 1. sem. 2004.
Ibid., p. 160.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
Quanto à Covid-19, e sob o fundamento do bem comum, assentado na
garantia fundamental à saúde pública, diversas outras garantias fundamentais
têm sido relativizadas, como o direito de reunião, direito à educação, à
segurança, ao trabalho e o direito à locomoção, objeto do presente estudo.
Assim, resta a reflexão: sendo as garantias fundamentais limites ao poder
de polícia, há algum caso em que, diante da ponderação de valores, o interesse
público pode se sobrepor a elas?
A bem da verdade, existem estudiosos, como Carl Schmitt, que defendem
um verdadeiro estado de exceção em situações de emergência. Em tais pe­
ríodos, não só algumas garantias fundamentais precisam ser relativizadas,
mas o próprio estado de direito e, por conseguinte, a democracia, haja
vista que:
Os sistemas jurídicos das democracias liberais não podem esperar especificar
as condições substantivas que vão contar como uma emergência, porque as
emergências são por natureza imprevistas, ou mesmo os procedimentos
que serão usados para acionar e alocar poderes de emergência, porque esses
procedimentos estarão vulneráveis a serem descartados quando uma emer­
gência assim exigir. Em geral, de acordo com uma versão de Schmitt, “não
se pode usar a lei para determinar quando a legalidade deve ser suspensa”.
Na maioria, pensou Schmitt, o legalismo liberal pode especificar quem tem o
poder para determinar se há uma emergência, mas não os procedimentos ou
condições substantivas pelas quais e sob as quais os poderes de emergência são
acionados.32 [tradução nossa]33
Em reflexão sobre o estado de exceção, o filósofo Giorgio Agamben, por
outro lado, aduz que a exceção possui “estreita relação com a guerra civil,
a insurreição e a resistência”,34 vez que se opõe à normalidade e permite
uma tomada de poder justificada no medo. O grande problema, por certo,
32
33
34
VERMEULE, Adrian. Our schmittian administrative law. Harvard Law Review, Cambridge,
v. 122, p. 1095-1149, 2009. p. 1099-1100.
Tradução livre de: “The legal systems of liberal democracies cannot expect to specify as substantive
conditions that’ will count as an emergency, because emergencies are by nature unforeseen, or even the
procedures that will be used to trigger and allocate emergency powers, because these procedures must be
vulnerable to be discarded when an emergency so requires. In general, according to a version of Schmitt,
“one cannot use the law to determine when legality should be suspended.” In most, Schmitt, liberal
legalism can specify who has the power to determine if there is an emergency, but not the procedures or
substantive conditions under which and under which emergency powers are deployed”.
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução de Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo, 2004.
p. 12.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
187
188
RE VI S T A D E D I R EIT O A DMINIST R A T IV O
é delimitar os limites do estado de exceção, de modo que ele não se torne a
regra e que governos tiranos se valham da anomia como um pretexto para a
tomada de poder e a relativização, ou mesmo, de afastamento, de garantias
fundamentais.
Como é cediço, não há hierarquia entre as garantias fundamentais, sendo
a análise do caso concreto primordial à solução a ser adotada, principalmente
em situações de emergência, em que a atuação do Estado deve ser não só
eficaz, mas, sobretudo, célere.
Assim, para que a decisão administrativa seja a mais razoável e de­
mo­crática possível ante um estado de necessidade, Binenbojm destaca que
“a atua­ção extraordinária da Administração Pública pode ser legitimada
por um regime de juridicidade contra legem”,35 desde que fundada em cinco
“ele­mentos estruturantes”, quais sejam:
i) a excepcionalidade do perigo, atual ou iminente; (ii) o seu caráter necessa­
riamente transitório; (iii) a boa-fé das autoridades adminis­trativas; (iv) a pro­
porcionalidade das medidas adotadas à essenciali­dade dos bens, direitos ou
interesses a preservar; (v) a sua sujeição a mecanismos de accountability, inclusive
mediante responsabilização civil do Estado pelos danos eventualmente
resultantes para terceiros.36
Feitas tais ponderações e partindo dos elementos estruturantes elencados
pelo autor, é possível analisar se a opção administrativa brasileira, no que se
refere à limitação do direito de ir e vir do indivíduo em tempos de pandemia,
seja em razão da quarentena ou do isolamento, pode ser tida como legítima.
O primeiro dos elementos a ser observado é o perigo, que não basta por
si só. Deve se tratar de um perigo excepcional, atual ou mesmo iminente, que
está acontecendo ou prestes a acontecer.
Se analisarmos o caso brasileiro, certamente tal requisito resta satisfeito.
A publicação da Lei nº 13.979/2020, que trouxe como medidas de enfrenta­
mento à Covid-19 o isolamento e a quarentena, se deu em meio a um perigo
excepcional e iminente. No dia 6 de fevereiro de 2020, data da publicação da
lei, o mundo já conhecia o alto grau de contaminação do novo coronavírus.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), “o surto de Covid-19 tem
35
36
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 149.
Ibid., p. 149.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
sido o teste mais urgente das capacidades nacionais para responder a uma
emergência de saúde em mais de um século”37 (tradução nossa).38
Apesar da reconhecida gravidade da doença no mundo, o primeiro caso
da Covid-19 só veio a ser confirmado no Brasil em 26 de fevereiro, segundo
dados do Ministério da Saúde.39 Dessa forma, não havia um risco atual em
nível nacional, mas uma iminência de um perigo excepcional, o que justificaria
a adoção de uma atuação extraordinária por parte da administração pública.
Se atual ou iminente, o que justifica uma atitude estatal de forma célere
é a urgência que permeia a problemática, sendo ela apenas um dos requisitos
do instituto analisado e não se confunde com a urgência como forma de
atuação da administração pública. Assim, situações de urgência, por si só,
não justificam o afastamento de normas administrativas. A urgência é natural
em um cenário de administração pública e o Estado pode e deve agir em tais
casos amparado pela estrita legalidade. Nesse sentido:
Quer a verificação dos pressupostos do estado de necessidade e da urgência
quer as actuações concretamente desenvolvidas no respectivo enquadramento
estão sujeitas a controlo jurisdicional, porquanto em ambos os casos se está
perante actuações jurídicas: no primeiro, a licitude da actuação deve ser ava­
liada no quadro do ordenamento jurídico no seu todo, e em particular, no
quadro da Constituição; no segundo, deve ser ponderada no âmbito mais
restrito da legalidade administrativa.40
O segundo dos elementos, por sua vez, é a transitoriedade. A restrição
de direitos, previamente concebidos e legalmente constituídos, não pode ser
feita ad eternum, sob pena de trasmudar-se em verdadeira tirania. Assim, cabe
ao Estado delimitar as medidas excepcionais a um determinado período ou
mesmo a uma situação específica.
37
38
39
40
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. World health statistics 2020: a visual summary.
2020a. Disponível em: https://www.who.int/data/gho/whs-2020-visual-summary. Acesso em:
14 ago. 2020. s.p.
Tradução livre de: “The outbreak of COVID-19 has been the most urgent test of national capacities to
respond to a health emergency in more than a century. This chart presents the epidemiological curve for
COVID-19 from 11 January to 5 May: how the virus spread rapidly and globally, affecting nearly every
country and territory”.
“O Ministério da Saúde confirmou, nesta quarta-feira (26/2), o primeiro caso de novo
coronavírus em São Paulo. O homem de 61 anos deu entrada no Hospital Israelita Albert
Einstein, nesta terça-feira (25/2), com histórico de viagem para Itália, região da Lombardia.
O Ministério da Saúde, em conjunto com as secretarias estadual e municipal de São Paulo,
investigava o caso desde então” (AQUINO, Vanessa; MONTEIRO, Natália. Brasil confirma
primeiro caso da doença. Agenda Saúde (Ministério da Saúde), Brasília, 26 fev. 2020. s.p.).
Diogo Freitas do Amaral e Maria da Glória F. P. D. Garcia, O estado de necessidade e a
urgência em direito administrativo, op. cit., p. 518.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
189
190
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Foi exatamente o que previu a Lei nº 13.979/2020, no seu art. 8º, que
assim dispôs: “esta Lei vigorará enquanto perdurar o estado de emergência
internacional pelo coronavírus responsável pelo surto de 2019”.41
A previsão de transitoriedade das medidas é expressa, que durarão
somente enquanto persistir o estado de emergência causado pela Covid-19,
em nível internacional. Apesar de ser incerto o tempo de duração do estado
de emergência, resta claro que a legislação está vinculada a uma circunstância
temporal, o que também legitima a atuação estatal.
A transitoriedade é um requisito de extrema importância e precisa ser
reconhecido como tal. O estado de exceção, como o próprio nome já pre­
nuncia, é a exceção e não pode ser usado dentro de situações corriqueiras de
anormalidade,42 como uma “armadilha” por governos totalitários, para justi­
ficarem atos políticos ilegais e/ou inconstitucionais em tempos de crise.
Outro requisito é a boa-fé da administração pública na adoção das
medidas excepcionais que limitem direitos. Tal requisito é difícil de ser ana­
lisado no caso concreto, já que demanda uma visão global da atitude adotada.
Para Binenbojm, essa boa-fé pública “se constata da sinceridade com que
expõe as limitações das medidas ordinárias para fazer frente às exigências do
momento e do fato de a situação de perigo não lhe ser imputável”.43
Apesar das críticas acerca das medidas adotadas, muitas vezes prove­nien­
tes de divergências políticas e partidárias, percebe-se que, em nível nacional,
as medidas de prevenção à Covid-19, principalmente as referentes à quaren­
tena e ao isolamento, foram dotadas de boa-fé. Um parâmetro que pode ser
utilizado para apreciar a boa-fé é se valer de experiências internacionais.
A frase “fique em casa” ficou mundialmente conhecida e grande parte dos
países adotou medidas que limitam o direito de ir e vir da população.
Entre os países que adotaram a restrição na circulação de pessoas como
medida de prevenção e que fechou suas fronteiras estava a Nova Zelândia.
Considerado nos tempos atuais um dos países mais democráticos do mundo,
a Nova Zelândia tomou medidas duras já no início da pandemia e, em razão
disso, juntamente com o apoio da comunidade local, foi o primeiro país a
41
42
43
Brasil. Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, op. cit.
Para Santos, a atual pandemia foi capaz de realçar a “anormalidade da exceção”, já vivenciada
com a crise do capitalismo, o que, segundo o sociólogo, já perdura por 40 anos. É essa
naturalização da exceção que justifica cortes em gastos com saúde ou mesmo a precarização
do trabalho (SANTOS, Boaventura de Sousa. A cruel pedagogia do vírus. Coimbra: Almedina,
2020. p. 5-6).
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 149.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
“a eliminar a transmissão comunitária do novo coronavírus”,44 isso em abril
do ano de 2020.
Como muito bem destacado pelo ministro Barroso,
o isolamento social é a recomendação pacífica das autoridades sanitárias de
todo o mundo. Não há alternativa, porque, se muitas pessoas contraírem a
doença ao mesmo tempo, o sistema de saúde não suportará. Em alguns lugares,
já não está suportando. O isolamento continua a ser a medida recomendada e
praticada pelos países onde o combate à doença deu certo, para contornar a
ascensão da curva.45
Além da experiência internacional, cumpre frisar que foram apresentadas
as recomendações pela OMS para minimizar o surto da Covid-19, estando
entre elas:
Fique em casa e isole-se mesmo com sintomas menores, como tosse, dor de
cabeça, febre baixa, até se recuperar. Peça a alguém para trazer suprimentos.
Se precisar sair de casa, use uma máscara para evitar infectar outras pessoas.
Por quê? Evitar o contato com outras pessoas irá protegê-los de possíveis vírus
Covid-19 e outros46 [tradução nossa]47
Dessa forma, a medida preventiva adotada no Brasil também vai ao
encontro das recomendações da OMS, o que corrobora a boa-fé do Estado em
buscar alternativas razoáveis à contenção do vírus.
O quarto elemento estruturante é a proporcionalidade, que abarca a
neces­sidade, a adequação e a proporcionalidade em sentido estrito, cujos con­
ceitos já foram apresentados.
No caso em análise, as medidas adotadas se enquadram na concepção
de proporcionalidade. O isolamento e a quarentena são opções adequadas à
contenção da Covid-19, na medida em que visam promover dois importantes
direitos fundamentais: a saúde e a vida.
44
45
46
47
NOVA Zelândia anuncia fim da transmissão local comunitária de covid-19. Agência Brasil,
Brasília, 30 abr. 2020. s.p.
BARROSO, Luís Roberto. Responsabilidade civil e administrativa de agentes públicos e atos
relacionados com a pandemia de Covid-19. Revista Direito Administrativo, Rio de Janeiro,
v. 279, n. 2, p. 295-317, maio/ago. 2020. p. 307.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Coronavirus disease (Covid-19) advice for the public,
2020b.
Tradução livre de: “Stay home and self-isolate even with minor symptoms such as cough, headache,
mild fever, until you recover. Have someone bring you supplies. If you need to leave your house, wear
a mask to avoid infecting others. Why? Avoiding contact with others will protect them from possible
COVID-19 and other viroses”.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
191
192
RE VI S T A D E D I R EIT O A DMINIST R A T IV O
Não restam dúvidas que são medidas necessárias. Enquanto a vacinação
não for uma realidade para a grande maioria das pessoas no país, a pre­
venção por meio do distanciamento das pessoas deve ser priorizada, como
recomendado pela OMS.
Já no que diz respeito à proporcionalidade em sentido estrito, apesar de
no Brasil a competência ser concorrente para legislar sobre saúde pública, e
existirem leis mais restritivas do que outras, em âmbito nacional, a limitação
da liberdade de locomoção imposta é justificada em um sopesamento de
custo-benefício, na ponderação de que “segundo os postulados da doutrina
da proporcionalidade, é uma forma de aplicar a lei. Não deve ser confundido
com métodos subjetivistas ou intuicionistas”48 (tradução nossa).49
Para Klatt, Meister e Costa Neto, a ponderação (ou sopesamento) possui
grande relevância na análise da proporcionalidade, pois é exatamente em
tal etapa que são aferidas as “circunstâncias jurídicas do caso concreto”,50
ou seja, é quando se verifica no caso posto qual dos princípios colidentes deve
se sobrepor. Apesar de depender de uma análise casuística, a ponderação
também deve se basear em uma técnica, o que torna a decisão mais objetiva.
Em vista disso, tais autores apresentam o que eles próprios chamaram de
um verdadeiro “guia para a estruturação da aferição do sopesamento”,51
em que deve ser considerado na análise do aplicador do direito o grau de
interferência sobre uma garantia fundamental, sendo certo que essa deve
ser sopesada levando-se em conta o objetivo a ser alcançado. Desse modo, o
objetivo acaba se tornando um limitador da interferência estatal, na medida
em que a técnica admite intervenções leves em face de objetivos sérios, mas
inadmite intervenções sérias para objetivos menos ambiciosos.
A partir dessa técnica, e diante do caso sob análise, é de se concluir que o
sério direito mitigado de ir e vir é justificado em um objetivo sério, que visa a
manutenção da saúde e da vida da população em geral e que depende de uma
fundamentação racional.
Feitas tais considerações e retomando o conceito de Binenbojm, o quinto
e último elemento apresentado por ele é a sujeição da administração pública a
48
49
50
51
BOROWSKI, Martin. Derechos absolutos y proporcionalidad. Revista Derecho del Estado,
Bogotá, n. 48, p. 297-339, jan./abr. 2021. p. 305.
Tradução livre de: “Conforme los postulados de la doctrina de la proporcionalidad, es un método de
aplicación del derecho. No debe ser confundido con métodos subjetivistas o intuicionistas”.
KLATT, Matthias; MEISTER, Moritz; COSTA NETO, João. A máxima da proporcionalidade:
um elemento estrutural do constitucionalismo global. Observatório da Jurisdição Constitucional,
Brasília, ano 7, n. 1, p. 23-41, jan./jun. 2014. p. 25.
Ibid., p. 31.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
MAGNO FEDERICI GOMES, AMANDA RODRIGUES ALVES
| O poder de polícia e a liberdade de locomoção…
mecanismos de accountability. Para o autor, tal postura por parte do Estado é
salutar uma vez que “os terceiros afetados pelas providências administrativas
não poderão valer-se da tutela jurisdicional injuntiva contra eventuais ofensas
a suas posições subjetivas”.52 Exatamente por isso que a tomada de decisões do
Estado, principalmente em situações de emergência, demanda transparência
e uma minuciosa prestação de contas.
No Brasil, em relação aos dados da Covid-19, muitas críticas vêm sendo
feitas acerca de possíveis subnotificações, mas a grande problemática envolve
os gastos públicos. O governo federal, através do Projeto de Emenda Consti­
tucional nº 10 — PEC 10/2020, aprovou o intitulado orçamento de guerra,
dando origem à Emenda Constitucional nº 106, cujo objetivo é flexibilizar as
regras de licitação, adequando-as à vigência de calamidade pública.53
Além disso, o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou “Reco­
mendações para transparência de contratações emergenciais em resposta à
Covid-19”.54 Para o órgão:
O Brasil e o mundo encontram-se em um período absolutamente excepcional
que demanda a adoção de medidas emergenciais para o enfrentamento e con­
tenção da pandemia causada pela COVID-19. A flexibilização das regras para
a realização de contratações públicas é entendida, assim, como uma medida
necessária para possibilitar que governos respondam de maneira célere aos
desafios que o cenário impõe, especialmente na área da saúde.55
Tais normas e recomendações, apesar de objetivarem uma maior trans­
parência das contratações, certamente também geram uma maior vulne­
rabilidade dos cofres públicos. Por isso a fiscalização deve ocorrer não apenas
antes das contratações, mas durante e a posteriori. Caso haja qualquer irre­
gularidade, deverá ser possível a responsabilização do Estado.
Apesar de o estado de necessidade ser uma causa excludente de ilicitude,
nos termos do art. 188 do Código Civil brasileiro,56 é mais que cediço que não
52
53
54
55
56
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 150.
BRASIL. Constituição (1988). Emenda constitucional n. 106, de 7 de maio de 2020. Institui
regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento de calamidade
pública nacional decorrente de pandemia. Diário Oficial da União, Brasília, 7 maio 2020c.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). Recomendações para transparência de contratações
emergenciais em resposta à Covid-19. São Paulo: TCU, 2020.
Ibid., p. 2.
Art. 188. Não constituem atos ilícitos: […] II — a deterioração ou destruição da coisa alheia,
ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o
ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não
excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo (BRASIL. Lei nº 10.406, de 10
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
193
194
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são somente os atos ilícitos que geram o dever de indenizar. “Embora menos
comum, atos lícitos, conformes ao direito, podem, também, em certos casos,
empenhar dever de reparação.”57
Conforme afirma Binenbojm, “a responsabilização civil do Estado pelos
danos resultantes da atuação dos poderes de necessidade da Administração é
corolário da regra da responsabilidade objetiva, fundada na teoria do risco
administrativo e da repartição equitativa dos ônus sociais”.58
Nesse cenário, a fiscalização não deve advir apenas de órgãos estatais,
mas de toda a sociedade civil, afinal o “espaço público é um espaço de corres­
ponsabilidade entre o conjunto das instituições públicas e representativas e a
sociedade”59 (tradução nossa),60 sendo certo que essa última, caso seja lesada,
poderá pleitear a responsabilização objetiva do Estado.
Feita a análise dos elementos estruturantes, e estando os mesmos cum­
pridos, razoavelmente, no atual estado de emergência mundial, resta respon­
der a indagação: é possível que ante a situação de exceção, como salientou
Carl Shmitt, direitos e garantias fundamentais sejam afastados?
Certamente que os direitos fundamentais não foram alçados a tal pata­mar
por mera liberalidade. Foram pensados, discutidos e, diante da importância
que representam na ordem social e individual, foram consagrados como
fundamentais. Desse modo, em regra, não podem ser afastados, salvo nos casos
de estado de defesa e estado de sítio, nos moldes previamente estabelecidos
nos artigos 136 a 139 da CR/88.
Em razão da Covid-19, no dia 20 de março de 2020, entrou em vigor no
Brasil o estado de calamidade pública, diferente do estado de defesa ou de
sítio. Dessa forma, pelo fato de a CR/88 não fazer ressalvas quanto ao estado
de calamidade pública, entende-se que as garantias fundamentais sejam
preservadas.
Ocorre que, mesmo não estando diante de um estado de defesa ou de
sítio, não há dúvidas de que a situação é de emergência, sendo indispensável
a adoção de um estado de necessidade administrativo, o que vem sendo
57
58
59
60
de janeiro de 2002. Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, 11 jan. 2002).
BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 11.
Gustavo Binenbojm, Poder de polícia, ordenação, regulação, op. cit., p. 150.
SUBIRATS, Joan. Como ser yo mismo, ser como los demás y sentirme reconocido en mi ser
distinto: el reto de la nueva ciudadanía. Revista Argumentum, Vitória, v. 5, n. 1, p. 270-281, jan./
jun. 2013. p. 270.
Tradução livre de: “el espacio público es un ámbito de co-rresponsabilidad entre el conjunto de
instituciones públicas y representativas y la sociedad”.
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
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feito, o que acaba culminando com a relativização de algumas das garantias
fundamentais, entre elas o direito de locomoção.
Ante o cenário de caos, o que se deve evitar é a anulação de uma garantia
fundamental. Por certo que, em razão do quadro de pandemia vivenciado,
seria mais eficaz para a contenção da doença que todos, indistintamente, se
mantivessem em casa por três semanas,61 que segundo a OMS é o período
máximo de transmissão da doença. No entanto, é óbvio que tal medida anularia
não só o direito de locomoção, mas diversas outras garantias fundamentais.
Assim, diante do estudo realizado e do estado de necessidade adminis­
trativo, constata-se que a legislação em nível federal que regulamentou a li­
mitação do direito de ir e vir, especialmente no que tange ao isolamento e à
quarentena, é legítima.
No entanto, não restam dúvidas que o cenário atual demonstrou a rele­
vância de se criarem normas, ainda que gerais, que sirvam de orientação
a um estado de necessidade administrativo, a exemplo do que existe em
Portugal. Tal previsão seria capaz de retomar, mesmo em meio ao caos,
uma sensação de que o estado democrático de direito está presente e que as
escolhas administrativas não são feitas por mera liberalidade, mas se fundam
na vontade popular externada por meio do texto legal.
Considerações finais
O trabalho em questão teve por foco analisar o estado de necessidade
admi­nistrativo e a importância de ele ser adotado em situações emergenciais,
tal qual a vivenciada com a pandemia causada pela Covid-19.
Não há dúvidas de que em qualquer Estado o poder de polícia é im­
prescindível à ordem e ao bem comum, sendo razoável que se reconheça a
supremacia do interesse público sobre o privado. Todavia, em um Estado que
se pretende democrático, tal poder deve se valer de uma ordenação legítima,
assentada na vontade popular, que se exterioriza pela lei previamente
estabelecida.
61
Maria Van Kerkhove disse, no dia 29 de julho de 2020, que pessoas que apresentam o quadro
grave da Covid-19 podem transmitir o vírus por até três semanas após o início dos sintomas,
enquanto esse período para pacientes com a forma leve ou moderada é de até nove dias (OMS:
pacientes graves de Covid-19 podem transmitir vírus por até 3 semanas. Correio Braziliense,
2020).
Rev. Direito Adm., Rio de Janeiro, v. 282, n. 1, p. 173-201, jan./abr. 2023.
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Como se viu, em situações excepcionais, o Estado poderá se deparar com
uma anomia, o que não pode ser um empecilho à atuação pública uma vez
que é exatamente em tais situações que a população mais precisa de uma
resposta rápida dos governantes, a fim de minimizar o caos.
Em meio a uma situação emergencial decorrente do Covid-19, o
Estado brasileiro decretou estado de calamidade pública e criou, às pressas,
legislações e planos de ações para minimizar o surto da doença, bem como as
consequências dela advindas.
Entre tais medidas, foi necessário limitar a liberdade de locomoção dos
indivíduos, consubstanciadas, entre outras, na quarentena e no isolamento,
que determina que pessoas contaminadas e suspeitas de contaminação pela
Covid-19 devem permanecer em seus respectivos domicílios ou hospital para
que não infectem outras pessoas.
O objetivo da presente pesquisa foi concluído, na medida em que se
cons­tatou que tais medidas foram necessárias à situação de emergência, que
demandou o reconhecimento do estado de necessidade administrativo e, por
via de consequência, a relativização de garantias fundamentais, como a de
locomoção, que foi o objeto do estudo.
Diante de tal constatação foram analisados os elementos estruturantes
do estado de necessidade administrativo, tendo sido verificado que todos
eles, em maior ou menor escala, estavam presentes na adoção das medidas de
restrição de liberdade analisadas.
Assim, a limitação imposta pelo poder público se mostrou razoável e
legítima, o que não afasta a necessidade e a urgência de o Estado, a partir
da realidade vivenciada, criar normas que regulem o estado de necessidade
admi­nistrativo no país, a exemplo do que já existe em Portugal, e o que é
indis­pensável a qualquer estado democrático de direito.
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