Ricardo Lugon
Psiquiatra – Capsi de Novo Hamburgo
Professor da Faculdade IENH
Mestrando FACED/UFRGS
• Quem pode aprender?
• Quem pode dizer como é a maneira de um outro alguém aprender?
• Existem ‘condições’ predifinidas que permitem ou impedem que alguem se proponha a experiência de ensinar e/ou aprender com outro alguém?
• A quem se dirigem as políticas da Educação
Inclusiva?
• A Convenção e a questão do conceito de deficiência
• Diagnósticos
– Processo diagnóstico e classificação diagnóstica
• O “fato” TDA/H
• Medicalização
• “Existe ou não existe o TDAH?”
• Perguntas mais refinadas
– O que as classificações contemporâneas descrevem como TDA/H pode ser explicado em algum nível biológico?
– A existência da classificação produz
“materialidades”? (discursos, processos identitários, mercados, demandas...)
– TDA/H ↔ Metilfenidato?
O Campo da Deficiência:
Mudanças de Paradigma a partir da Convenção
• “...a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras
atitudinais e ambientais que impedem a sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com os outros. (ONU,
2007)
• A deficiência não é uma condição intrínseca ao sujeito que vive uma determinada condição, mas
é efeito do encontro de sujeitos com barreiras as mais diversas que obstaculizam ou até mesmo impedem a fruição dos direitos por parte de um sujeito que vive uma condição peculiar
(Angelucci, 2015)
• Nota Técnica 04/2014
– “...não se pode considerar imprescindível a apresentação de laudo médico (diagnóstico clínico) por parte do aluno com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação, uma vez que o AEE caracteriza-se por atendimento pedagógico e não
clínico. (...) o professor do AEE, poderá articular-se com profissionais da área da saúde, tornando-se o laudo médico, neste caso, um documento (...) complementar (...) O importante é que o direito das pessoas com deficiência à educação não poderá ser cerceado pela exigência de laudo médico
• Sistemas classificatórios
– Agrupe os seguintes animais:
• Lesma
• Lula gigante
• Baleia
• Ornitorrinco
• Girafa
• Cobra
• Sapo
• “Sabidamente não há classificação do universo que não seja arbitrária e conjectural.
A razão para isso é muito simples: não sabemos o que é o universo” (Borges)
• Diagnosticar: enfoque narrativo-funcional, com análise sistêmica e interpretativa, pra propiciar a compreensão do caso e o manejo clínico
• Diagnóstico não se reduz a uma classificação:
Diagnosticar ≠ classificar
• A classificação deve servir ao diagnóstico e não o contrário. Isto é, a classificação não deve dirigir e constranger em demasia o processo diagnóstico.
• Duas Dimensões: Processo Diagnóstico e Classificação
Diagnóstica
• “o nome da doença NUNCA pode ser o sobrenome da pessoa”
– “Aquele é o João, nosso aluno autista”
• Queixas, os sintomas, os sinais e, eventualmente, os resultados dos exames complementares apresentados pelo sujeito a ser “diagnosticado” – agrupados, condensados e abordados em suas formas gerais – servem para definir uma classe ou categoria nosológica onde o mesmo possa ser alocado
• Função estatística, epidemiológica, administrativa e financeira; função de comunicação entre profissionais
• Enfoque descritivo formal da psicopatologia, através de categorias e dimensões pra facilitar o registro epidemiológico, a pesquisa acadêmica, a gestão de recursos financeiros e a comunicação entre profissionais
– Classificar = Padronizar
• Os atos de nomear e de estabelecer categorias em geral favorecem a idéia de “doença” como uma entidade natural que tem existência própria e independente. REIFICAÇÃO
• Os fenômenos psicopatológicos não são simples objetos naturais estáveis. As formas de sofrimento mental se modificam ao longo do tempo e dependem em larga medida da matriz cultural utilizada para descrever e elaborar a experiência
• Classificações tentam produzir pontos estáveis que organizam nosso olhar sobre a realidade que queremos conhecer e sobre a qual desejamos agir. (Bezerra Jr,
2013)
• Permitem agrupar experiências, seres e objetos, estabelecendo mapas que permitem demarcar fronteiras normativas estre estes. Como todo mapa, elas necessariamente operam a partir de reduções, escolhas, exclusões, privilégios, decididos pragmaticamente em função de interesses presentes no contexto de sua criação.
• Estas classificações supõem um autor, um agente, um principio classificador e um eixo organizador
• Têm uma destinação, visa um objetivo
• Têm um contexto de criação e uma história
• Surgem como resposta às exigências presentes num determinado horizonte histórico e se constitui tendo como referências classificações que a precederam. (Bezerra Jr,
2013)
• As classificações podem ser tomadas como sintomas de suas épocas: a histeria e a neurastenia são testemunhas eloquentes dos impasses que atravessam as metropoles urbanas ocidentais do final do sec XIX; a depressão e o
TDAH são chaves de interpretação dos imperativos e dilemas que assolam os sujeitos no início do século XXI
• Teorias psiquiátricas não apenas descrevem os sintomas dos pacientes, eles os moldam, ao criarem novos roteiros de identificação e designação das experiências de sofrimento, além de indicar modos de responder, técnica e socialmente a elas. O encontro com o diagnóstico modifica sensivelmente a maneira como o próprio sujeito pensa a si próprio, a maneira como interpreta as próprias emoções, o modo de se conduzir na relação com os outros (Bezerra Jr,
2013)
• Trata-se de investigação clínica e intervenção terapêutica simultâneas: não há bom diagnóstico sem vínculo, e a construção de vínculo já é terapêutica
• Diagnosticar = singularizar
• Visa compreender, de forma abrangente e detalhada, a natureza das dificuldades de um sujeito singular, o que inclui o diagnóstico funcional e nosológico.
– O resultado final é a construção de uma narrativa aberta a respeito desse sujeito, procurando relacionar seu passado e seus problemas atuais com as possíveis causas subjacentes, sejam estas internas – biológicas ou psicológicas – ou relacionadas ao seu contexto de vida – ecológico ou social
P ROCESSO
• Aberto
• Contextual
• Narrativo
• Singular
C LASSIFICAÇÃO
• Fechada
• Centrada no Indivíduo
• Descritiva
• Generalizável
• Dimensões inseparáveis e não hierarquizadas
– Eixo subjetivo: transcende as “psicoterapias”
• “Quem fala”? “emergência do sujeito”
• Qual o lugar no mundo: inclusão
• Apoio aos cuidadores: despatologizar sem negar
– Eixo instrumental: transcende os treinamentos
• Aquisição de habilidades e competências nas mais diferentes esferas
– Eixo corpo: transcende o “ajuste de remédio”
• Intervenções psicossociais integradas produzem melhores respostas farmacológicas
(Caliman, 2009)
• O TDAH deve ser analisado como um objeto empírico e social criado na constelação política, econômica e científica característica da segunda metade do século XX.
– Contexto pós-guerra, de declínio da Psicanálise americana, alta concorrência no mercado
– o processo de biologização das doenças mentais vinculado às descobertas psicofarmacológicas;
– o desenvolvimento do campo neurocientífico e de suas tecnologias de imagem cerebral;
• Estreitamento conceitual: das décadas de 40 a 60
1) Distúrbio emocional (“emotional disturbance”)
2) Doença Cerebral Mínima (MBD) (assume etiologia orgânica)
3) Transtorno hipercinético (limita a um sintoma)
(neurologia)
4) Déficit de atenção limita a uma teoria causal para o sintoma (dsm psiquiatria)
5) Reabilitação do metilfenidato (lançado em 1955 como antidepressivo, em 1961 para crianças)
Resumo dos encaminhamentos à Neurologia
2º Semestre 2015
Encaminhamentos
(adultos, crianças e adolescentes)
Encaminhamentos de crianças e adolescentes
“Encaminhamentos clínicos”
Cefaleia
Epilepsia/convulsões
Outros
“Encaminhamentos educacionais”
Inclui menção a TDA/H ou hiperatividade
Não inclui menção a TDA/H ou hiperatividade
(justificativas educacionais inespecíficas para o encaminhamento)
Inclui documento proveniente da escola
Inclui menção à sugestão ou influência da escola no encaminhamento
800
203
125
31
29
64
65
26
39
6
14
• Medicina normatizando preceitos para a aprendizagem adequada e estendendo-se para o não-aprender.
• Transforma os problemas pedagógicos e políticos em questões biológicas, médicas.
• Cria entidades nosológicas das doenças do nãoaprender-na-escola (dislexia, TDA/H tipo desatento etc) e para elas propõe solução. (MOYSÉS, 2001)
• O não aprendizado é tido exclusivamente como falha do/no corpo do sujeito não-aprendente.
• Demandas por diagnósticos, como se através deles o educador encontrasse uma metodologia de ensino
“correta” (GUARIDO; VOLTOLINI, 2009)
• “É claro que você está se sentido tão bem assim, essas coisinhas estão entupidas de antidepressivos”