Uploaded by Natália Rodrigues

OSE 208 final Site-18-23

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Transmissão: Caminhos da Energia
O segmento de transmissão é estratégico e condicionante para o desenvolvimento nacional. Neste fascículo,
teremos como mentor o Eng. Eletricista Rogério Pereira de Camargo, que é atualmente uma referência nacional
no tema. Com MBA em Gestão de Negócios pelo IBMEC, Pós-Graduação em Eng. de Manutenção pela UFRJ,
Admin. pela FAAP, cursando Pós-graduação Master em ESG e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela FIA
Business School, Rogério Camargo atua desde 1994 como Gestor e Diretor Técnico na implantação e operação e
manutenção de projetos de transmissão para investidores nacionais e internacionais.
Capítulo 1
A evolução do sistema de transmissão
no Brasil de 2000 a 2024
Quando fui convidado para escrever os capítulos do fascículo
que o mundo passou nos últimos anos, do ponto de vista de ESG
sobre Transmissão: Caminhos da Energia, me senti muito honrado e
e da necessidade de adaptação às novas regras de compliance e
ao mesmo tempo com muita responsabilidade.
governança, já demonstram uma grande necessidade de alteração
Atuo no setor de transmissão desde os primeiros leilões em 2000,
no olhar para a gestão desses projetos, até mesmo a fim de preparar
após o RESE-B (modelo de reestruturação do setor elétrico brasileiro
o empreendimento para a fase operacional, com uma melhor
implantado no final da década de 90). Neste primeiro capítulo, além de
gestão de riscos do ponto de vista ambiental, social, governança
mostrar os dados históricos e estatísticos da evolução e crescimento das
e operacional. Obviamente, sem deixar de citar o cenário atual de
linhas de transmissão, subestações e da capacidade de transformação
exposição a eventos climáticos extremos, resiliência das redes, novas
que podemos encontrar nos relatórios da EPE (Empresa de Pesquisa
tecnologias de controle, novas cargas (data centers) e eletrificação
Energética), irei registrar algo muito particular, uma visão de quem
da economia, integração regional (renováveis), novas plantas de
vivenciou diversos projetos neste período, tanto do ponto de vista de
hidrogênio de baixo carbono, uso da inteligência artificial para a
implantação como da operação, assim como, algumas propostas de
gestão de ativos e uso de ferramentas computacionais para melhor
aprimoramento e evolução na gestão destes projetos.
controle da performance operacional.
Para melhor ilustrar esses 24 anos de um segmento que vem
Fascículo
passando por transformações, em vez de simplesmente juntar dados
Outro cenário interessante a se analisar é o crescimento da
malha de transmissão de energia elétrica ao longo das décadas.
oficiais, irei fazer um registro mais autoral, mas antes disso, já adianto
A evolução do segmento de transmissão é algo que sempre
que o setor requer aprimoramento e evolução. Vivenciei diversos
comento, acompanha o crescimento econômico e a evolução, não
fatos interessantes durante minha trajetória profissional, adquirida
só do setor de energia, mas do país como um todo, isso fica claro,
através do trabalho em diversas empresas e investidores do setor,
quando olhamos os mapas de evolução física do sistema interligado,
alguns dos quais, compartilharei neste artigo.
ressaltando o desenvolvimento das fontes de geração hidráulica na
Os projetos de transmissão são projetos lineares, ou seja,
região norte, o desenvolvimento industrial das regiões sul e sudeste,
atravessam, em alguns casos, diversos estados da federação,
o desenvolvimento da região centro-oeste com o agronegócio, o
biomas, áreas sensíveis ambientalmente, realidades sociais distintas,
aumento das fontes renováveis solar e eólica nas regiões nordeste,
entre outras externalidades positivas e negativas. Somente
norte de Minas, Bahia e Goiás, e também no Piauí, o chamado
observando essas características, verificamos que a evolução
corredor do sol.
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No início dos anos 2000 (2001/2002), o Brasil passou por
selecionar players e investidores qualificados com capacitação
uma crise que levou ao racionamento de energia elétrica, e os
técnica e financeira para implantação dos projetos dentro dos
principais fatores causadores foram a falta de infraestrutura
prazos exigidos pelo planejamento do setor.
de transmissão e a carência de interligações regionais para
Foram diversos os casos de investidores aventureiros que
cumprirem a função de interligação/integração energética entre
venceram a disputa pelos lotes, mas não tiveram capacidade
os subsistemas norte-nordeste e sul-sudeste.
financeira para implantação, causando diversos problemas para
Nesse período, foram ofertados, no segundo leilão de
o segmento de transmissão e para os órgãos de controle que
transmissão, dois projetos estruturantes: a interligação norte-
tiveram, em alguns casos, relicitar os lotes, em outros casos, os
sul II e a interligação sudeste nordeste, um deles foi vencido
mesmos foram negociados no mercado secundário para outros
por um investidor que não deu prosseguimento ao projeto e o
investidores, causando também um problema para a operação
vendeu/repassou no mercado secundário para outro investidor,
que precisou gerenciar o sistema de transmissão, muitas vezes
este leilão, pela pouca concorrência, foi vencido com deságio
com restrições, causados pelos atrasos na entrada em operação
próximo de zero, proporcionando assim, uma excelente taxa de
destes lotes.
retorno.
Os
Ainda como registro relevante para este período pioneiro,
processos
de
leilão
reverso
que
remuneram
o
foram os problemas envolvendo o óleo isolante com excesso de
investimento pela receita anual permitida (RAP), pago em
enxofre corrosivo, somente nestes dois projetos citados acima,
parcelas mensais, sempre atraíram muitos investidores privados,
falharam mais de 18 reatores e transformadores em 230 e 500 kV,
pela previsibilidade e garantia do retorno do investimento em
alguns deles com explosões. Nesta mesma época, houve falhas
um contrato de concessão com a união, por um período médio
recorrentes em diversas outras concessões de transmissão,
de 30 anos.
envolvendo praticamente todos os fabricantes de reatores e
Neste segundo leilão, conforme citei, foram colocados em
transformadores do mercado nacional.
disputa, dois grandes projetos estruturantes: a interligação
Esse fato se tornou um case internacional, que levou a
norte-sul II - composta por 1.278 km de linhas em 500 kV com
alterações nas normas e nos métodos de ensaios para verificação
equipamentos FACTS (Flexible Alternating Current Transmission);
da presença e contaminação por excesso de enxofre corrosivo
06 subestações, atravessando GO, TO, MA e DF e interligação
em óleos isolantes.
sudeste-nordeste com aproximadamente 1.139 km de linhas
Outro ponto que merece destaque e que iremos discutir em
em 230 e 500 kV, 04 subestações, atravessando os estados
outros capítulos é a questão do licenciamento ambiental, por ser
de GO e BA. Estes projetos, contribuíram naquele momento
um projeto linear, em alguns casos as linhas atravessam áreas de
para melhorar o intercâmbio energético, mitigando o risco de
sensibilidade ambiental, comunidades indígenas e quilombolas,
racionamento de energia, por conta da complementaridade
determinando um processo em alguns casos de licenciamento
hidrológica entre as regiões norte-sul e sudeste do Brasil.
trifásico, com a necessidade de licença prévia, de instalação e
Um dos desafios dos reguladores que gostaria de registrar
operação, para o caso do traçado da linha ultrapassar mais de
no segmento de transmissão são: os parâmetros/requisitos para
um estado da federação, o licenciamento deverá ser realizado
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pelo IBAMA. Por isso, muito tem se discutido para que os projetos
A partir do RESE-B, na década de 90, com a diminuição
sejam leiloados já com a licença prévia, porém esse tema ainda é
da integração entre as empresas, a formação de mão de obra
objeto de discussão entre os órgãos licenciadores e investidores.
técnica e qualificada ficou por conta dos novos controladores
Um ponto que acredito merece maior atenção dos órgãos
das empresas privatizadas, que na minha opinião, não
reguladores e fiscalizadores, até mesmo para a fase de edital, é
investiram na formação dos profissionais de forma coordenada.
a gestão da implantação com a necessidade de um maior rigor,
Uma sugestão seria a formação de escolas específicas nos
quanto ao acompanhamento, fiscalização e a penalização para
moldes do SENAI, que formam profissionais para a indústria,
projetos, onde ocorrem, durante a implantação, acidentes de
com a capacitação de técnicos especializados para a operação
trabalho com gravidade severa e/ou fatal.
e manutenção, bem como o treinamento de engenheiros
Nestes 24 anos, durante a implantação, por conta da pressão
especializados, principalmente envolvendo as novas tecnologias
pelo prazo de conclusão da obra em busca da antecipação da
FACTS, BESS, Plantas de Hidrogênio e Sistemas de Proteção,
receita, já ocorreram diversos acidentes de trabalho em uma
Controle e Supervisão, além, obviamente, dos equipamentos
quantidade bastante elevada. Talvez a ideia de se estabelecer
de conexão, máquinas e linhas de transmissão. O segmento de
uma penalização para a concessionária, de não receber a receita
energias renováveis já deu alguns passos neste sentido, porém
antecipada em caso de acidentes fatais, traria um maior rigor
os segmentos de transmissão e geração hidráulica perderam
para a prevenção dos acidentes de trabalho em toda a cadeia
muito da formação que era organizada e realizada de forma
produtiva do setor de transmissão, outra sugestão, seria a
coordenada e setorial pelas empresas.
proibição na participação nos próximos leilões de transmissão.
O setor elétrico como área que serve de insumo para
Sobre a cadeia produtiva, tanto a empresa contratada para
construção e montagem, como a concessionária, que possui
quase todos os segmentos da economia, tem a necessidade de
a
formação coordenada de mão de obra especializada, e deveria
responsabilidade frente à União, através do contrato de concessão,
ter um olhar mais atento dos órgãos de estado, entendo que
deverão responder solidariamente, em casos de acidentes do trabalho.
isso está acima dos interesses corporativos, indo ao encontro do
Quando falamos em Operação e Manutenção (O&M), o
desenvolvimento econômico do País.
segmento de transmissão é remunerado pela disponibilidade
Outro ponto que merece destaque é a gestão de riscos
das funções de transmissão, nos primeiros projetos implantados
na elaboração dos planos de negócios dos investidores, que
por investidores privados, havia uma dificuldade enorme para
utilizam da antecipação da obra como elemento de ganho
estruturar as equipes de O&M qualificadas para suportar os
financeiro em seus cálculos de taxas de retorno, transferindo
processos de execução, tanto de operação, manutenção e
depois, o risco da não conclusão da obra para a União, e em
engenharia de operação e manutenção. Atualmente existem
última análise, com prejuízo aos consumidores finais. Como
algumas prestadoras de serviços, mas devido ao crescimento
sugestão, também deveria haver, no meu ponto de vista, uma
exponencial do segmento, essa carência de mão de obra
penalidade severa para os investidores que não conseguirem
qualificada no setor ainda permanece, principalmente de
cumprir com os cronogramas contratados, e que não fizeram
profissionais com competências e capacitações em controle e
suas devidas análises de riscos, para, em caso de atrasos na obra,
sistemas proteção de equipamentos FACTS (Flexible Alternating
ou descumprimento do contrato, serem punidos também com a
Current Transmission).
impossibilidade da participação em futuros leilões.
Fascículo
Cenários de Referência: Investimentos
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Cenário de Referência: Linhas de Transmissão
Fascículo
Cenário de referência: Subestações
Podemos observar um crescimento bastante expressivo do
dificuldade da gestão de diversos contratos de concessão
nível de investimento no segmento de transmissão, onde temos
oriundos dos leilões de transmissão. Outro ponto que necessita
que considerar a necessidade de olhar para todos os aspectos do
de atenção é a ação dos lobbies com o objetivo de obter ganhos
ecossistema que envolve esse segmento, são eles: investidores;
financeiros e muitas vezes, olhando em perspectiva, caminhando
empresas de engenharia consultiva; empresas de construção
no sentido contrário à modicidade tarifária.
e montagem; fabricantes de equipamentos; e principalmente,
Há ainda a necessidade de aprimoramento da regulação,
como balancear os interesses econômicos com a segurança
para que haja um sinal econômico com o objetivo de incentivar
sistêmica o equilíbrio econômico dos contratos frente a
a inovação tecnológica, sendo que este sinal, venha para dentro
modicidade tarifária.
dos projetos licitados, e não fiquem a nível das autorizações,
com taxas de retorno mais elevadas, favorecendo somente
CONSIDERAÇÕES FINAIS
algumas concessionárias específicas.
Teremos diversos temas para as edições futuras, onde
As linhas de transmissão, como diz o título deste fascículo,
iremos aprofundar em segmentos como O&M, Gestão de Ativos,
são os caminhos da energia, por conta disso, possuem diversos
ESG, Leilões, dentre outros assuntos de interesse, voltados para
aspectos como: a complexidade do sistema interligado e a
o segmento de transmissão. Até o próximo capítulo!
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