THE UNANTICIPATED CONSEQUENCES OF PURPOSIVE SOCIAL ACTION (resumido) Robert Merton Conhecimento O problema mais óbvio para uma antecipação correta das consequências de uma ação é dado pelo conhecimento disponível pelo indivíduo ou grupo tomador da decisão. Esta limitação pode ser melhor compreendida supondo o caso mais simples em que a falta do conhecimento adequado é a única barreira para uma antecipação correta. Obviamente, podem ser encontrados um grande número de razões concretas para o conhecimento inadequado, assim como classificar os grupos de fatores mais importantes. O primeiro grupo de razões provém do tipo de conhecimento obtido usualmente pelas ciências que estudam o comportamento humano. O cientista social encontra invariavelmente associações estocásticas (conjecturais) e não associações funcionais, como na maioria das ciências naturais. Ou seja, no estudo do comportamento humano, são encontrados diferentes conjuntos de valores de uma variável quando associada a diferentes valores de outra variável. Em linguagem informal, as consequências esperadas de um ato repetido várias vezes não são constantes, ainda que haja um grupo limitado de consequências, das quais qualquer uma pode decorrer do ato em cada cenário. Em alguns casos, nós podemos conhecer o suficiente para prever estatisticamente o conjunto de consequências, porém é impossível prever com exatidão os resultados de um caso particular. Nossa classificação dos atos e situações nunca envolve categorias perfeitamente homogêneas, nem mesmo categorias nas quais o grau de homogeneidade é suficiente para prever eventos específicos. Nós temos aqui o paradoxo de que enquanto as experiências passadas são a única fonte das nossas expectativas - sob a suposição de que alguns atos do passado, presente e futuro são suficientemente parecidos para serem agrupados na mesma categoria -, estas experiências são de fato diferentes. Na medida que essas diferenças são relevantes para o resultado da ação e as precauções para os diferentes cenários são ignoradas, o resultado será diferente do esperado. Como apontado por Poincaré “[...] pequenas diferenças nas condições iniciais produzem grandes alterações no fenômeno final [...] Previsões se tornam impossíveis e nós temos fenômenos inesperados. ” Desvios das consequências usuais podem ser antecipados pelo agente que reconhece as diferenças entre a situação atual e a situação similar anterior. Porém, na medida que essas diferenças não podem ser incluídas num subconjunto de regras gerais, a direção e a magnitude desses desvios não podem ser previstos. Então, é claro, que o conhecimento limitado que guia a ação abre caminho para uma gama de resultados inesperados de comportamento. Embora não exista nenhuma fórmula que indique a quantidade exata de conhecimento para fazer uma previsão, pode-se dizer que consequências são inesperadas quando um conhecimento preciso de muitos detalhes e fatos (em oposição a princípios gerais) são requeridos para uma previsão com alto grau de consistência. Em outras palavras, “consequências do acaso” são aquelas que decorem de uma série de interações entre forças e circunstâncias tão complexas e numerosas que tornam sua previsão algo para além de nosso alcance. Devemos provavelmente distinguir as “consequências do acaso” das “consequências da ignorância”, uma vez que não estão relacionadas ao conhecimento que realmente temos à disposição, mas a algum conhecimento que pode teoricamente ser obtido. A importância da ignorância é reforçada pelas exigências da vida prática que nos obrigam a agir com confiança mesmo que a informação em que nos baseamos para a tomada de decisão não seja completa. Como Knight observou corretamente, geralmente agimos não com base no conhecimento científico, mas em opiniões e estimativas pessoais. Assim, situações que exigem ações imediatas (ou que parecem para o agente exigir), envolverão ignorância de certos aspectos e trarão resultados inesperados. Além disso, mesmo em situações que ações imediatas não são exigidas, há um problema econômico para obter informação, pois tempo e energia são recursos escassos e o comportamento econômico está preocupado com a alocação racional desses recursos. É irracional agir de modo que os custos para obter as informações e prever os resultados sejam maiores do que o benefício esperado com a realização da atividade. Por outro lado, não existem apenas limites econômicos que tornam imprudente não agir até que o máximo de incerteza possível seja eliminada. Há também limites psicológicos, já que previsões excessivas deste tipo inibem qualquer tipo de ação. O erro Um segundo fator determinante para as consequências não intencionadas da ação é o erro. Erros podem ocorrer, é claro, em qualquer fase da ação intencional: nós podemos errar em nossa avaliação da situação presente, em nossas inferências disso para a situação objetivo futura, em nossa seleção de uma linha de ação, ou finalmente na execução da ação escolhida. Uma falácia comum é supor que as ações no passado levaram a um resultado desejado vão continuar a fazê-lo. Esta suposição está associada ao hábito. Em nossa prática diária, a ação habitual de fato frequentemente resulta em sucesso. Mas e exatamente porque o hábito é uma maneira de agir que levou a certos resultados que ele tem a tendência de ser automático e não refletido. De modo que o agente é incapaz de reconhecer que alguns procedimentos que tiveram êxito em certas circunstâncias não necessariamente terão em todas as condições. O erro pode também envolver casos em que o protagonista participa em um ou mais aspectos pertinentes da situação que afeta o resultado da ação. Pode-se pensar desde um simples casos de negligência (falta de rigor no exame da situação), até a recusa em considerar aspectos de um problema. Este último caso tem sido amplamente analisado na literatura psiquiátrica. Em casos de wishfulfilment, o envolvimento emocional leva a uma distorção da situação objetiva e do curso provável dos eventos; a ação planejada sobre condições imaginárias irá inevitavelmente gerar consequências não intencionadas. O problema do “interesse imediato” O terceiro tipo de fator diz respeito ao problema do “interesse imediato”, ou da “urgência do interesse”. Refere-se a situações em que a preocupação primordial do agente com as consequências imediatas excluem considerações sobre as consequências futuras ou distintas da mesma ação. Os fatores mais comuns ligados à urgência do interesse dizem respeito a necessidades psicológicas ou valores culturais. Exemplo disso encontramos na economia clássica, segundo a qual o esforço individual de aplicar o capital onde for mais rentável tende a produzir o melhor resultado possível para a sociedade. Conforme disse Adam Smith, “através de uma mão invisível para promover um fim que não fazia parte de sua intenção”. O mesmo que ocorre em relação ao “interesse imediato” ocorre em relação aos valores. A clássica análise da influência dos valores é o estudo feito por Weber em seu livro “A Ética protestante e o espírito do capitalismo”. Ele acertou ao mostrar que o ascetismo ativo levou, originalmente, à poupança e a geração de capital, mas também a seu próprio declínio (da própria ética do ascetismo) através da acumulação de riqueza e propriedades gerada pela diminuição do consumo e do trabalho produtivo intensivo. A ação que envolve a urgência do interesse pode ser racional relativamente às prioridades de um certo foco ou momento, mas irracional em um sentido mais amplo associado à organização de vida de um indivíduo. Racional no sentido de realizar um objetivo específico; irracional no sentido de que pode prejudicar a realização de fins não prioritários em um certo momento, mas que não obstante formam uma parte essencial da escala completa de valores de um indivíduo. Uma ação particular não é feita em um vácuo social ou psicológico, seus efeitos serão ramificadas em outras esferas de valor e de interesse. Por exemplo, o controle de natalidade por razões econômicas influencia a composição das famílias, com profundas consequências psicológicas sobre a formação do caráter. O elemento “dinâmico” da escolha social Atividades orientadas por certos valores geram processos que acabam transformando a própria escala de valores que os produziram. Isto se deve em parte ao fato de que (1) um sistema de valores implica em certas atitudes específicas e (2) os indivíduos não estão preocupados com as consequências dessas ações, mas com a satisfação subjetiva do dever bem realizado. O problema é que a sociedade é um sistema complexo de inter-relacionamento, e toda ação humana tende a produzir ramificações. Suas consequências não se restringem à área específica na qual ela estava originalmente focada. As consequências ocorrem em áreas interconexas, em regra ignoradas no momento da ação. É em função dessa interconexão que consequências da ação em áreas adjacentes tendem a impactar o sistema central de valores. Aqui se encontra o paradoxo essencial da ação social: a “realização” de valores pode levar ao seu abandono. A previsão dos desenvolvimentos futuros de uma ação social são frequentemente insustentáveis precisamente porque a própria previsão se torna um elemento novo agindo sobre a situação concreta, tendendo a mudar seu curso inicial. Isto não acontece em áreas que não dizem respeito à ação humana. A previsão do retorno do cometa Halley não influencia em nenhum sentido a órbita do cometa; mas para citar um exemplo real, as previsões de Marx sobre a crescente concentração do capital e aumento da miséria das massas influenciou o próprio processo que ele previu. Ao menos uma das consequências da pregação socialista no século XIX foi a disseminação da organização trabalhista e os decorrentes ganhos de negociações coletivas, dessa forma diminuindo drasticamente, ou mesmo eliminando, os resultados previstos por Marx. Publicação original: American Sociological Review Vol. 1, No. 6 (Dec., 1936), pp. 894-904 Robert K. Merton