OBJETO DO PROCESSO E ALTERAÇÃO DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA VER ALTERAÇÃO DE FACTOS E VINCULAÇÃO TEMÁTICA EM PROCESSO PENAL Teresa Pizarro Beleza* / Frederico de Lacerda da Costa Pinto**/*** Noções Introdutórias Esta matéria é a mais difícil no PP: o Tem que ver com a evolução do processo, a dinâmica do caso e a interação entre os factos e o direito. Começaremos por olhar para um caso = perceber qual é o problema que está em causa, que problemas se colocam e onde é que se colocam. o + Veremos com atenção a diferença entre a variação do objeto do processo (que são variações factuais) e aquilo que são alterações da qualificação jurídica (que prossupõem que os factos se mantêm, mas o enquadramento jurídico se altera). Caso: o o o o Imaginemos que A apresenta um queixa criminal dizendo que X disparou três tiros contra si e que o atirador tinha intenção de a matar. Temos uma notícia de infração + o inquérito será aberto a partir do enquadramento indiciário – 131º CP mais 22º CP = tentativa de homicídio. Agora, imaginemos que o autor dos disparos diz que efetivamente disparou os três tiros, mas não para matar, só para assustar. Assim sendo, não havia dolo: Esta situação não pode ser enquadrada como tentativa de homicídio. + Se o que o X quisesse fazer era assustar a vítima, seria um crime de ameaça - 153º CP. Análise: o Temos como base factual: Os três tiros disparados por X em direção a A; Os tiros não acertaram na vítima; A vítima sentiu que era vítima da tentativa de homicídio, mas X afasta essa ideia dizendo que era só para assustar. o = Temos aqui uma notícia do crime que apresenta certos factos, mas que vão ter de ser enquadrados ao longo do processo. o O MP vai ter de investigar, no contexto em que é dúbio se houve tentativa de homicídio e é dúbio se houve apenas uma ameaça ou uma defesa meramente nominal ou unilateral. o Suponhamos que o MP conclui que o X apenas queria assustar = faz uma acusação pelo 153º CP – crime de ameaça. o Face a isto, o que o arguido pode fazer é requerer a abertura de instrução: Ao fazê-lo terá de apresentar os factos e há um que se manifesta decisivo. = Não se contesta se foram disparados os três tiros, mas se há dolo. o Abrindo instrução, imagine-se que o tribunal entende que existiu uma tentativa de homicídio - 131º CP - e que faz a pronúncia para o caso ir a julgamento: O caso vai a julgamento com esses elementos e o tribunal chega à conclusão que existiam várias circunstâncias agravantes como premeditação. Evidenciamos assim 2 ideias: o 1º - É perfeitamente normal existirem variações de factos ao longo do processo. o 2º - Reter que aquilo que se considera provado que permite a invocação de certos tipos incriminadores depende da prova sobre esses factos e do tipo incriminador aplicável. o + A factualidade objetiva parece ser a mesma, mas altera-se a factualidade subjetiva ao apurar melhor a história = os factos vão variando. Agora, a temática do objeto do processo é até que ponto é que essa variação é admissível = o que vamos agora perceber é se podem variar em qualquer sentido ou significado ou se haverá algum momento em que os factos se consideram cristalizados. o Exemplo: Imaginemos que não houve instrução e tudo aquilo que foi apurado nessa fase é relevado factualmente na audiência julgamento. Queremos então perceber como deve proceder o juiz que recebe o caso de ameaças, mas no julgamento percebe que se trata de algo bastante mais grave, uma tentativa de homicídio ainda para mais com agravantes. Um caso enquadrado como crime de ameaças teria ido para o tribunal singular = há uma incompetência porque o tribunal singular não tem competência para julgar tentativas de homicídio. o Nota – O tema da incompetência é um tema que se coloca depois do problema da variação do objeto do processo: O que temos no fundo é uma variação do objeto do processo com uma alteração substancial dos factos e uma alteração de qualificação jurídica, mas que geram novos factos e novos crimes, que não são da competência do tribunal singular. A variação do objeto do processo: conceito, função e limites O problema da variação do objeto do processo consiste exatamente em tentar perceber o (i) quais são as variações factuais que são admissíveis; o (ii) se isso depende ou não das fases processuais; o (iii) quais são as consequências práticas de essas variações ocorrerem nalguma fase processual em específico. Nota: o Os factos podem alterar-se, variando o dolo e variando a prova sobre o dolo e sobre os factos = é possível inclusivamente admitir um espetro de possibilidades do ponto de vista fático e jurídico. o Exemplo – caso do bebé que foi deixado no ecoponto dos plásticos: Em função dos factos, podemos estar a falar de diversos enquadramento jurídicos substantivos: Tentativa de Homicídio – 131º CP e 22º CP. Tentativa de Homicídio Qualificado - 132º CP + 22º CP. Tentativa de infanticídio - 136º CP + 22º CP. Exposição ou abandono - 138º CP. No fundo, no inquérito são apurados os factos e o processo vai evoluir consoante esse apuramento e os enquadramentos jurídicos que não são estáticos e podem mudar de forma absoluta. O objeto do processo são os factos que se imputam ao arguido: o Não são o total de questões totais de direito, mas os factos que foram apurados. Função destes factos: o Permitem conjugar as normas jurídicas aplicáveis = princípio da tipicidade. O problema num PP de estrutura mista, completado pelo princípio da investigação. o Se quem julga não acusa, então os factos que vão a julgamento têm de estar estabilizados pela acusação. o MAS o nosso sistema não tem uma estrutura básica acusatória, temos é um princípio da acusação. o Ora, a partir do momento em que se diz que o juiz pode e deve investigar, então isso quer dizer que o julgamento deve poder revelar alguma coisa, senão ele não poderia investigar = ele pode e deve investigar a verdade dos factos. Valores Envolvidos no Problema da Estabilidade e do Objeto do Processo Direito de Defesa e Contraditório Ora, para o arguido se defender e exercer o contraditório tem de saber quais são os factos que lhe são imputados: o = Pelo menos a partir de certo momento, o próprio direito de defesa do arguido pressupõe a estabilização do acervo dos factos que lhe são imputáveis. O momento para a estabilização tende a ser o da ‘acusação’: o Quando é deduzida a acusação, têm de estar indicados os factos, com um certo enquadramento – 283º/Nº3/b). o + O arguido defende-se perante essa acusação. Conclusão: o O problema da variação do objeto do processo é também um problema associado ao direito de defesa do arguido. Se um regime legal for mais permissivo quanto às variações do objeto do processo, então isso é mais erosivo para a defesa do arguido. Se, pelo contrário, o regime for menos permissivo, isso é mais garantística da defesa do arguido. Princípio da Acusação e Estrutura Acusatória Já foi estabelecido que a acusação delimita o caso que vai a julgamento, não se fazendo um julgamento sem acusação: o No fundo, pressupõe-se que o objeto do processo do julgamento é o da acusação. o No entanto, há também o princípio da investigação. MAS se os factos puderem variar, isto quer dizer que o tribunal de julgamento pode estar a investigar acusar e julgar factos que não estavam na acusação, o que pode pôr em causa a estrutura acusatória. o = Temos de saber até que ponto estamos dentro do PA. No problema do objeto do processo está também implícito o próprio regime da estrutura acusatória que não consente variações muito significativas na fase do julgamento, pois tem de existir acusação antes. o O tribunal de julgamento julgará dentro daquilo por que o arguido for acusado. Congruência da Estrutura Acusatória com a Defesa e o Contraditório: o O princípio da acusação e a estrutura da acusatória, nas limitações que trazem para o problema da variação do objeto do processo, são congruentes com as razões que levam a exigir, no fundo, num certo momento que estejam já estabilizados clarificados os factos de que se vai defender. Segurança Jurídica – Caso Julgado, Litispendência e “Ne bis in idem” Algumas figuras pressupõem que esteja clarificado se o crime em causa já foi ou não julgado: o O facto de termos um caso julgado significa que há uma certa situação que já foi decidida e, portanto, não pode ser reapreciada. o + Se assim é, temos de conseguir apurar o que é que já foi decidido e com critérios. Problema - Imaginemos que, no tal exemplo em que o X dispara três tiros contra o A, o arguido X chega a ser julgado pelo crime de ameaças e depois vai para o Facebook dizer “ahahah, enganei-os todos! Falhei, mas para a próxima não falho”. Aí teríamos uma versão diferente da história e levanta-se o problema: é possível um novo processo? Esse processo já foi julgado ou não? Pode haver novo julgamento perante estas declarações? + Também se refere à litispendência - porque podiam estar concomitantes dois processos (o de ameaças e o de tentativa de homicídio). o = aquilo que está a ser julgado não pode estar a ser julgado noutro caso ao mesmo tempo. + “ne bis in idem” - estabelece que ninguém pode ser julgado duas vezes pelo mesmo crime, o que que pressupõe que há uma situação que já foi julgada. o A CRP diz crime, não diz factos - o que significa que são os factos e o enquadramento. o Exemplo - Uma pessoa deu um par de estalos a outra e foi julgada por ofensas à integridade física. Porém, isso aconteceu publicamente, portanto há uma dimensão ofensiva da honra associada ao par de estalos que gera ou segunda queixa. Questão = se pode haver um novo processo por crime contra a honra com base nos mesmos factos = isto pressupõe saber o que é que foi julgado no mesmo processo e como é que se apura a repetição de julgados. Conclusão: o Há figuras fundamentais do DPP que pressupõem que se clarifique quando o objeto do processo está definido, quando pode haver variações e ainda o que é que já foi julgado e o que é que está a ser eventualmente repetido. o O CPP não trata disso porque não tem regras específicas sobre o caso julgado = tudo o que temos é a CRP e normas sobre variação do objeto do processo. Princípios Fundamentais CN diz que um PP com estrutura acusatória deve, em matéria do objeto do processo, respeitar 4 princípios fundamentais. Princípio da Identidade do Objeto do Processo Prof. Castanheira Neves: o Formula esta exigência como devendo existir uma identidade entre o acusado, o conhecido e o decidido. Deve ser o mesmo acontecimento que é acusado pelo MP, conhecido pelo TJ e decidido. Então, entre a acusação, aquilo que o tribunal conhece e a decisão deve encontrar-se uma situação de permanência em termos de conteúdo: o = Reforça a ideia de que a acusação cristaliza o objeto do processo. o + aquilo que o tribunal conhece, conhece dentro dos limites da acusação. Exemplo: o Imagine-se que há uma acusação pelo crime de introdução em casa alheia (190º CP) e furto qualificado (204º CP) que ocorreu em abril, mas o juiz conhece um outro assalto semelhante em janeiro. o Segundo o PIOP, essa segunda situação não pode ser conhecida nem decidida porque não consta do acusado. Princípio da Estabilidade O PdE dita que o objeto do processo deve manter-se estável a partir de certo momento: o O momento é, normalmente, o da acusação. o Essa estabilidade garante a congruência entre o acusado, o conhecido e o decidido. O conhecimento factual não deve oscilar, entre as fases, de modo que o SJ saiba o que lhe está a ser imputado. MAS a estabilidade não é aritmética, nem total, nem absoluta: o 1º - A própria natureza do julgamento pode fazer com que surjam factos não anteriormente revelados. Não há contraditório antes do julgamento, portanto a própria natureza desta fase pode fazer com que se revelem factos que não eram antes conhecidos. o 2º - Num sistema como o nosso, em que o tribunal tem poderes autónomos de investigação (complementares à EA) = é mais fácil acontecerem variações que põem em causa a estabilidade do objeto processual: Pode haver várias verdades a vir ao de cima numa fase de julgamento contraditória cujo titular tem o poder-dever de investigar a verdade material. Princípio da Indivisibilidade Este PI do acontecimento que é levado a julgamento diz-nos que a unidade do acontecimento histórica não é divisível e deve ser tomado como um todo enquanto história que vai na acusação. o Exemplo - Numa agressão de X a A, houve primeiro um empurrão, depois socos e pontapés e em terceiro lugar houve arremesso de objetos à cabeça da vítima: Se a agressão de X a A é definida com esses parâmetros empíricos = se foi isso mesmo que aconteceu = essa unidade é indivisível. Não podemos tratar o empurrão como ofensa à integridade física simples (143º CP), os socos como ofensa grave (144º CP) a o arremesso como uma tentativa autónoma de ofensa grave. = O tribunal tem de tratar essa matéria como conjunto, caso contrário, estaria a segmentar a realidade (atribuindo qualificações jurídicas parcelares.) O PI pressupõe que o acontecimento histórico-social é tratado em conjunto, e não como partes autónomas. o No caso anterior = poderíamos então ter um crime de ofensas à integridade física (englobando tudo) ou uma tentativa de roubo com ofensas instrumentais. o Não significa que não haja segmentos, até com diferentes agentes, mas estes acontecimentos que até se podem passar em intervalos de cinco minutos, são tratados em conjunto. Nota – a questão do concurso de crimes é posterior a tudo isto: o O acervo de factos não é divisível, gere ou não gere concursos. o O concurso é sempre resultado de um objeto de processo que já se delimitou. Princípio da Consumpção De acordo com o PdC, aquilo que o tribunal decide no julgamento abrange tudo o que foi conhecido + tudo o que estava numa unidade histórica com o que foi conhecido e que, não tendo sido, devia ter sido conhecido. Exemplo: o Imaginemos que durante um ano há um trabalhador que, ao fechar as contas, tira 10 euros da caixa registadora todos os meses. = É uma situação de abuso de confiança (205º CP), em que em cada mês ele tira uma pequena quantia que é relativamente insignificante. o Imagine-se que é descoberto e é apresentada uma queixa de abuso de confiança por se ter apropriado ilegitimamente de 120 euros entre janeiro e dezembro de 2019. o = Isto é tratado como um crime continuado: Em vez de serem imputados 12 crimes de apropriação de 10 euros em cada mês, a fragmentação de ações é tratada como uma única realização típica. o Através do PdC: Os factos entre janeiro e dezembro são todos tratados. + Não se pode depois tentar tratar autonomamente um processo só com os valores dos 3 meses já tratados (princípio da indivisibilidade) = seria violador do caso julgado. = A decisão por abuso de confiança de 120 euros abrange os 120 euros e as várias frações que foram retiradas em cada um dos meses. Também, o PdC estabelece que aquilo que o tribunal decide abrange também tudo o que devia ter sido conhecido: o Exemplo - Imagine-se que, afinal, nos meses de abril, maio e junho, como houve maior movimento, em vez de tirar 10 euros, o funcionário tirou 20, o que significa mais 30 euros no fim do ano. Ora, o tribunal não contemplou esses 30 euros na sua decisão. Quid júris o PdC: Se o caso foi mal investigado e por isso a decisão não abrangeu meses em que foram retiradas quantias maiores, estes valores estão consumidos pelo objeto do processo do crime continuado de janeiro e dezembro. = É uma proteção do caso julgado contra aquilo que efetivamente foi conhecido proibindo que se conheça aquilo que por deficiência de investigação ou de acusação devia ter sido conhecido e não foi. Visa maximizar a investigação e garantir a segurança jurídica alargando o caso julgado àquilo que não foi conhecido, mas devia ter sido conhecido: Permite não se duplicarem ou triplicarem processos e crimes – é proibido. É por isto que o MP tem alguma resistência a deduzir acusação porque sabe que uma vez acusado não pode corrigir. o No fundo, a decisão do tribunal abrange tudo o que aconteceu e tudo o que devia ter conhecido, em termos de fazer parte da mesma atualidade histórica. = é uma garantia do caso julgado = abrange tudo aquilo que foi conhecido mas também aquilo que no âmbito do abuso de confiança devia ter sido conhecido. Bem ou mal investigado, tudo o que está no mesmo caso não pode voltar renascer para dar origem a novos crimes. Nota - isto vale para todos os crimes. + Exemplo – crime não duradouro: o Imagine-se que uma pessoa tenta matar outra colocando uma bomba no carro desta. Quando a pessoa vítima entra no carro, esquece-se de qualquer coisa, sai e, portanto, a bomba explode, destrói o carro e não mata a pessoa por esse acaso. = Do ponto de vista factual temos uma tentativa de homicídio qualificado e o tribunal conhece esta história do ponto de vista factual = é isso que vai a julgamento e o tribunal condena por esse crime (22º CP + 132º CP). o Depois disso, é iniciado por queixa ou por iniciativa própria do MP uma nova queixa por dano (212º CP) ao veículo que foi destruído: Este pedaço de acontecimento já foi conhecido e o tribunal não se pronunciou sobre o dano. = Esse facto histórico já foi avaliado, o tribunal não conheceu e devia era tê-lo conhecido. PdC dita que já não é possível conhecer porque já se esgotaram os efeitos sobre o facto. Modelos de Solução do Problema O modelo rígido e o modelo flexível - Avaliação Crítica Nota: o São possíveis dois modelos de solução do problema da estabilidade e do objeto do processo. o + Seria possível o legislador optar por um, por outro, ou por adotar soluções intermédias. Modelo Rígido: o O que está acusado é o que pode ser conhecido. o Aplicando-se um modelo rígido, não poderiam existir variações algumas depois da acusação. o Vantagem: Aumenta a segurança jurídica, obriga a uma investigação mais apurada, um julgamento mais rígido. o Desvantagem: Acaba por sacrificar alguma coisa da verdade material. Modelo Flexível: o Estabelece que uma vez deduzida acusação, ela pode ser completada em julgamento com os factos que forem surgindo. o Vantagem: Aumenta a adesão à verdade material, investigação mais completa. o Desvantagem: Sacrifica a segurança do arguido porque, assim sendo, poderia ser acusado por uma coisa e vir a ser condenado por outra. A evolução do regime do CPP e a solução de 2007: um modelo tendencialmente rígido O modelo adotado pelo nosso CPP é um modelo tendencialmente rígido em relação às alterações substanciais de facto. o “Tendencialmente Rígido”: Em regra, o tribunal não pode conhecer as ASF mas pode conhecer as alterações não substanciais de facto. = modelo rígido quanto às ASF. = tendencialmente flexível quanto às ANSF. o Notas – em função das fases processuais: Liberdade no inquérito; Aparente rigidez na instrução; Rigidez tendencial no julgamento. Referentes Legais e Doutrinários – 1º/f), 303º, 309º, 358º, 359º e 379º Ponto de Vista Doutrinário Do ponto de vista doutrinário, concorda-se que o objeto do processo deve manter-se essencialmente idêntico entre o acusado, o conhecido e o decidido… A questão é COMO? o Não temos no CPP um critério para aferir essa identidade – não temos na lei um conceito de identidade. o O que temos é um critério para aferir as variações de identidade - são conceitos que são de fronteira, para saber quando é que existe algum limite à decisão. Conceitos: o Conceito de alteração substancial de factos; o Conceito de alteração não substancial de factos; o Conceito de alteração da qualificação jurídica. Ponto de Vista Legal O CPP só define o primeiro conceito elencado pela doutrina– ASF – 1º/f). o Este artigo dá conteúdo ao conceito de ASF. o Depois, vai se aplicando essa definição ao longo do CPP = dizendo o que é ou não permitido por ser ou não ser uma alteração substancial de facto. = vão dizendo as condições e limites para que se possa conhecer as alterações sejam ou não substanciais. o Em regra, ASF não são permitidas. O que seja ANSF pode ser permitido em certas condições. Ou seja, o CPP não exige essa identidade como a doutrina. o Aqui, é a partir de uma peça fundamental – a acusação – que se afere as variações do objeto na fase do inquérito, visto que se trabalha a partir da acusação. Artigos -> 303º (instrução) até 309º (nulidade). Nota – no 303º não se lê que o objeto tem de ser idêntico, o que regula são as variações factuais. Isto permite explanar o que é que o TIC pode conhecer. o + Para a matéria do julgamento, pronúncia de decisão: É usada a mesma técnica jurídica. Não diz que tem de ser idêntica a decisão e a acusação, mas que há limites decisórios: Se há uma AFNS - 358º; o Permite variar os factos. AFS - 359º; o não permite variar os factos. Mera alteração de qualificação jurídica – 358º/Nº3; Casos de nulidade - 379º: o Não se diz que a pronúncia tem de ser igual à acusação, o que acontece é que se usa o conceito de alteração substancial de factos como uma alteração “intolerável” que em princípio não pode ser aceite. V. 311º - usa a alteração substancial para a recusa parcial da acusação. Normas para recurso – 379º, 424º. Nota - A técnica jurídica do nosso CPP não é a mesma que usada noutros sistemas jurídicos próximos do nosso, na EU é diferente: o A nossa lei não trata como sendo um problema de identidade do objeto como faz a doutrina - para aplicar a lei, esse problema concretiza-se através do o conceito operativo de alteração de factos substancial ou não substancial e por isso os referendos fundamentais são estes. Existem outras normas: 284º - acusação particular que estabelece a vinculação temática; 286º - requerimento da instrução; 311º - usa a alteração substancial para a recusa parcial da acusação. O Conceito de Alteração Substancial de Facto no CPP e a Estrutura Bipartida: (i) Alteração de factos e (ii) sua qualificação como substancial Nota Introdutória No 1º/f) lemos que a alteração substancial de factos é aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicável. MAS esta definição do CPP é incompleta. o Na verdade, o conceito de alteração substancial de facto tem uma estrutura bipartida – pressupõe 2 operações hermenêuticas de concretização: 1º - Pressupõe que exista uma alteração de factos; 2º - Pressupõe que essa possa ser qualificada como substancial o Ela só nos diz quando é que é uma ASF, e não quando há uma alteração de factos. = a realidade “alteração de factos” não está definida, o que está é a sua qualificação enquanto substancial. Assim, para aplicarmos corretamente este conceito nas várias normas que o referem, o intérprete tem de: o 1º - saber o que é uma alteração de factos. Tem de ser qualificado pela doutrina. o 2º - saber quando é que é “substancial” e quando é “não substancial”. Esta é resolvida no CPP. Alteração de Factos Como não está definido na lei, cabe à doutrina determinar quando é que há uma alteração de factos + formular critérios. FCP: o Fez o seu próprio critério: (i) Variação do complexo fático que existe no processo (e não outros factos distintos ou outro acontecimento histórico social) (ii) Critério da necessidade de contraditório: novos factos, modificação de factos ou supressão de factos – necessidade audição dos interessados. (i) Variação do complexo fático que existe no processo (e não outros factos distintos ou outro acontecimento histórico social) Uma variação de factos é uma variação da base factual (que pode dar origem a uma alteração substancial ou não substancial) = é uma modificação de factos que já estão no processo. o =/= Se não for uma variação mas uma adição de factos novos (que não alteram aquela história, mas sim acrescentam outra história) aí já não é uma alteração de factos. o TPB usa a expressão de “factos completamente novos”. Exemplo – caso em que se julga o crime de furto em abril: o O assalto da casa em janeiro que surgiu no julgamento do caso do assalto de abril é uma outra história, um outro complexo fático e não uma variação do primeiro. = são factos completamente novos. Não podem ser conhecidos pelo tribunal porque nem sequer são uma modificação dos factos que estão no processo. Resumindo: o Só existe alteração de factos quando existe modificação do complexo fático que já está no processo e não o aparecimento de factos completamente distintos que pertencem a outra história. (ii) Critério da necessidade de contraditório: novos factos, modificação de factos ou supressão de factos – necessidade audição dos interessados Quando é que existe uma modificação que deve ser conhecida como alteração de factos, independentemente de depois se concluir se é substancial ou não? O que é que existe de comum entre os artigos 358º e 359º? o = Padrão Mínimo: Se existir uma alteração de factos, motivam o contraditório. A qualificação como substancial ou não substancial é uma qualificação que se faz sobre uma realidade que já existe – nos dois casos ocorre o conceito comum que é a alteração de factos. o Quando é que motivam o contraditório? Quando são acrescentados outros factos ao que lá estão; São alterados ou são suprimidos os que lá estão. Alteração = Altera-se alguma coisa no facto que implica que em parte ele subsiste mas se modifique algum aspeto. o e.g foi subtraído um relógio mas em vez de ser um Tissot é um Ómega. = Não estamos a discutir um outro relógio, simplesmente há uma alteração da marca do relógio, o facto é modificado. Supressão = Arguido tem expetativa de contraditório, porque os factos estavam lá, e depois desapareceram. o Acaba, também, por ser uma alteração dos factos. Razão do Contraditório: o A necessidade do contraditório (nos casos em que são acrescentados novos factos, são alterados ou são suprimidos) deve-se ao facto do sujeito processual, que pode ser afetado com essa alteração, não conhecer tal facto. o Com o contraditório = arguido fica a conhecer o conteúdo factual: O arguido é acusado, vai a julgamento. o o Conhece o conteúdo da acusação e pode pronunciar-se sobre ela apresentando uma contestação. Então, para haver alteração de factos tem de haver modificação do conteúdo factual que faça funcionar no mínimo o contraditório, alterando-se um facto. Explicação Prática: Exige-se contraditório quando aparece algo que não estava na acusação ou quando houve uma modificação (=dizia-se uma coisa de uma maneira, mas passou a dizer se de outra maneira.) Nestes casos, o arguido pronunciou-se sobre uma coisa e está a ser julgado de forma diferente. Resumo - Critério O padrão mínimo de haver uma alteração de factos é quando esta alteração corresponde a uma variação factual que motiva o contraditório. Em que casos é motivado o contraditório? o Quando seja um novo facto, uma modificação ou uma supressão de factos. Qualificação como Substancial - pena máxima mais grave ou crime diverso (agressão típica a outro bem jurídico) O nosso CPP utiliza dois critérios. 1º - Critério Quantitativo – 1º/f): o Há uma ASF quando a alteração de factos der origem a uma pena mais grave. 2º - Critério Qualitativo: o Quando a alteração de factos não gera uma pena mais grave, mas faz com que seja outro crime. o Nota – Conceito de Crime Diverso: A lei não diz o que é um crime diverso = é a doutrina que o faz. Teresa Beleza: Critério da agressão típica a outro bem jurídico. o =/= o crime não é diverso quando for uma agressão ao mesmo BJ. + TPB apresenta o conceito de alteração de factos substancial como tendo uma dimensão naturalística (ser uma alteração de factos) e uma dimensão normativa (a sua qualificação como substantiva) FCP: Defende que nos devemos orientar pelo critério de BJ da TPB: o É o mais seguro; o Está minimamente de acordo com o princípio da fragmentariedade do DP. o É preferível a qualquer outro critério. Densificação – Casos discutidos na Doutrina Portuguesa: o Estudo de FCP e TPB sobre o conceito de alteração de factos. o Existe a tendência jurisprudencial de fazer uma interpretação restritiva, no sentido de que há variações que são meras concretizações da acusação que não constituem alteração de factos: o Especificação de factos mais genéricos, pormenores irrelevantes para a realização típica (como alterações na quantidade de droga ou alterações descritivas sobre o conjunto de objetos furtados) Uma nova imputação adicional, que não conste da acusação, é um novo facto: Exemplo - acusação por burla qualificada e decisão por burla qualificada em concurso efetivo com falsificação de documentos. = Vendo relógio que roubei e digo à pessoa que ele foi propriedade de Churchill. MP acusa alguém de BQ e TJ diz que há BQ mas essa falsificação de documentos é um crime autónomo. o = O acontecimento histórico é o mesmo, não se pode separar. o Se o tribunal entende que há falsificação de documentos, tem de considerar tudo no mesmo conjunto = princípio da indivisibilidade. Momentos Processuais de Fixação do Objeto do Processo antes e depois da Acusação Regra = os factos fixam-se na acusação. o Isto faz parte da própria estrutura acusatória. o Mas há duas exceções – em alguns casos, é possível haver uma fixação do objeto do processo antes da acusação e noutros casos, depois da acusação. Quando falamos da alteração do objeto do processo, referimo-nos a dois momentos = a acusação e a pronúncia = podemos partir de 2 princípios fundamentais para responder em que momento do processo é que se fixa o objeto do processo. Princípio 1 – Em regra, o objeto do processo fixa-se na acusação: o No momento de acusação (283º ou 285º) fixa-se um objeto do processo + a partir daí começam a aferir-se as variações factuais em relação a esse objeto do processo. Princípio 2 – Em regra, o objeto do processo é variável antes da acusação: o Isto porque o objeto só se fixa na acusação = durante o inquérito não há cristalização do objeto do processo. o Exceções – Doutor Souto Moura: Há situações em que mesmo antes da acusação se identifica um conjunto de factos imputáveis ao agente dos quais se retiram consequências jurídicas e esses factos ficam cristalizados. Nestes casos, existe uma fixação do objeto do processo mesmo antes da acusação. Existe um efeito preclusivo semelhante ao caso julgado. o A partir do momento em que os factos foram processualmente monitorizados, esses factos não podem voltar a ser utilizados/apreciados. Casos: Arquivamento em caso de dispensa de pena – 280º; Suspensão provisória do processo com arquivamento subsequente – 281º; Situações de mediação; Homologação da desistência. Outros Momentos Relevantes Requerimento de Abertura de Instrução: o Caso em que se pode alterar o objeto do processo mesmo depois da acusação. o Resulta do confronto do 284º (acusação pelo assistente) e 287º (RAI pelo assistente). o = O assistente pode, dentro do que foi o âmbito do inquérito, introduzir factos e pedir prova para factos que não foram do inquérito. O requerimento do 287º é um momento de regulação do objeto do processo. Aqui, ele introduz esses factos diversos ou alterados, de forma LEGAL no processo. Isto porque, materialmente, o RAI é uma acusação. o Exemplo: MP faz acusação pelo 131º - homicídio simples. Assistente entende que aquilo é tentativa de homicídio, mas qualificada. Não invoca só uma diferente qualificação jurídica, como acrescenta factos. Como passa de mais grave para menos grave = alteração substancial de factos. O assistente não pode deduzir acusação pelo 284º: Há uma limitação legal ao conteúdo factual da acusação do assistente. Ele pode acrescentar outros factos desde que não implique alteração substancial. Se o assistente acrescenta factos que fazem com que a tentativa de homicídio passe para homicídio qualificada, tem de ser através do RAI - 287º: Este permite dizer que o objeto do processo pode ser substancialmente alterado pelo assistente. Estes factos serão atendidos pelo Juiz de Instrução = vai poder conhecer o conteúdo da acusação, do RAI e o que for apresentado pela defesa. Na pronúncia após o debate instrutório, o tribunal não pode conhecer alterações substanciais de facto em relação à acusação ou à RAI: o Se o fizer, a decisão instrutória é nula = confronto do 303º/Nº3 e 309º/Nº1. o 303º - proibição de conhecimento de alterações substanciais. o 309º/Nº1 Pode ser uma nulidade parcial da decisão instrutória: A decisão instrutória será nula na parte em que ultrapasse o conteúdo da acusação e do RAI e daí signifique uma alteração substancial de factos. o 309º/Nº2: Estabelece que esta nulidade tem de ser arguida no prazo de 8 dias a contar da notificação da pronúncia. = é proibido conhecer na pronúncia factos que impliquem uma alteração substancial em relação à acusação e ao RAI, isso gera uma invalidade parcial ou total, MAS é uma nulidade mista dependente de arguição e dependente do prazo: Se não for arguida dentro do prazo, a invalidade fica sanada com o decurso do prazo. Passado o prazo, a alteração fica legitimada = vai a julgamento já não como uma alteração substancial, mas como uma variação tacitamente consentida no objeto do processo. Exemplo – 309º/Nº2: Imagine-se que o MP acusa por homicídio privilegiado (133º/Nº1 CP). O assistente no RAI diz que é homicídio simples (131º CP). É produzida prova e um juiz completamente delirante diz que há homicídio qualificado (132º CP): o = Esta pronúncia, na parte que factualmente exceda o conteúdo da acusação e do RAI, é nula: Excede o conteúdo máximo da imputação, que era o conteúdo que estava no RAI. o MAS se não for arguida dentro do prazo de oito dias, vai a julgamento mesmo assim porque a invalidade está sanada pelo decurso do prazo. o = O tribunal de julgamento poderia conhecer o crime como homicídio qualificado. No saneamento do processo - 311º: o Primeiro, o legislador contempla a possibilidade de haver saneamento. o Segundo, a possibilidade de existir uma rejeição parcial de algumas acusações se implicarem uma alteração substancial de factos – 311º/Nº2/b): O juiz de julgamento pode controlar o princípio da vinculação temática em matéria das acusações: Pode controlar a acusação do assistente, que está tematicamente vinculada à do MP – 284º; Pode controlar a acusação do MP, que está tematicamente vinculada, nos crimes particulares, à do assistente – 285º; MAS este poder é condicionado: 1º - O juiz não pode alterar positivamente o objeto do processo no saneamento: o = Não pode acrescentar factos novos. 2º - Só pode exercer esse poder se não tiver havido instrução: o Se tiver havido instrução, prevalece a decisão instrutória, do JIC = o JJ não pode controlar estas acusações. No julgamento e sentença: o Aqui importa ver qual é o referente para o juiz de julgamento em termos de vinculação temática. o Temos de saber qual é o referente para a sentença para sabermos se houve ou não alteração substancial e isso depende de ter ou não havido instrução: Se houve instrução, o juiz do julgamento está vinculado à pronúncia; Se não houve instrução, o conteúdo da sentença está dependente da acusação pública, eventual acusação particular e eventual contestação apresentada pelo arguido. No recurso: o Se existir recurso, o tribunal de recurso faz um julgamento cujo conteúdo factual é aquilo que estiver na sentença do tribunal da primeira instância. o MAS nem sempre a agravação de responsabilidade em recurso é ilegítima. o Critério – 409º - proibição de reformatio in peju. O tribunal de recurso não pode, em alguns casos, atribuir uma pena mais grave do que foi atribuído em primeira instância. Esta proibição não é absoluta - o tribunal superior só está condicionado em 2 situações: o Ser o recurso exclusivamente interposto pelo arguido; o Ser o recurso interposto pelo MP a favor do arguido. o -> basicamente, este princípio significa uma proibição decisória de agravar a responsabilidade do recorrente. Se, porventura, o recurso for interposto pelo MP e pelo arguido por razões diferentes já não vigora esse princípio. + Também não vigora sempre que o MP recorra em sentido desfavorável ao arguido. o Nota - este não é problema de objeto do processo, mas de vinculação temática do tribunal de recurso ao tribunal da primeira instância: Esta limitação decisória tem razões próprias relacionadas com as garantias de defesa e não é um problema do objeto do processo. o Resumo: (i) O tribunal de recurso também está limitado pelo regime das alterações substanciais. (ii) Pode haver limitações decisórias que resultam da reformatio in peju mas isso não se confunde com o objeto do processo; e (iii) As limitações só existem nos casos previstos do 409º. Delimitação Positiva e Negativa do Problema Casos que não são alterações substanciais de factos – 358º e 359º: o A falta de provas de factos favoráveis; o O regime dos factos completamente novos; o A alteração da qualificação jurídica. A falta de provas de factos favoráveis A falta de provas de factos favoráveis pode gerar uma situação em que não se imputa um crime menos grave, mas um mais grave. Exemplo: o Imaginemos que é feita uma acusação pelo crime de homicídio privilegiado tentado com emoção violenta e a compreensibilidade dessa emoção (133º CP + 22º CP) – ou seja, com circunstâncias que o atenuam. o No julgamento, prova-se que houve tentativa de homicídio, mas não se prova a emoção violenta. Ou seja, não estão provadas as circunstâncias que privilegiam o homicídio privilegiado. = Essa emoção era um facto favorável porque diminuía a culpa do arguido. O facto de estar no processo beneficia o agente, mas depois não se prova na audiência do julgado. o Se não se prova, deixamos de ter uma situação enquadrável no homicídio privilegiado (133º CP), mas no homicídio simples (131º CP). = A falta de prova de um facto favorável não dá origem a alteração de factos: o Os factos estão lá, foram conhecidos, simplesmente não se consideram provados. Não há alteração de factos, não se alteraram nem se suprimiram factos. o O que temos na verdade é uma alteração da qualificação jurídica. o A falta de prova do facto favorável tem como consequência a aplicação do crime mais grave. O regime dos factos completamente novos Factos completamente novo: o = Factos que surgem e são estranhos à unidade histórico-social dos acontecimentos levados para o processo. Estes factos completamente novos não são alterações do objeto do processo, são novos objetos do processo. Exemplo – Assaltos: o Imagine-se que o arguido é acusado de assaltar uma vivenda em abril de 2018. o Depois, em julgamento, prova-se que o mesmo arguido tinha assaltado na mesma rua outra vivenda em janeiro de 2018. É um facto completamente novo. = Não é a variação do crime da acusação, é um outro crime = com outro objeto, noutra casa, noutra altura. É uma unidade histórico-social completamente autónoma e distinta da outra. Regime aplicável: o Não se aplica o 358º nem o 359º - estas normas estão pensadas para a variação da alteração dos factos que são levados a julgamento. Aqui não há alteração de factos, há é novos factos. Se estes factos completamente novos fossem conhecidos seria uma violação da estrutura acusatória. o Então, o regime aplicável é o de não permitir que perturbem o processo onde surgem e enviá-los como notícia do crime de um novo inquérito. Os factos completamente novos não podem ser apropriados pelo processo em que surgem. o O que acontece é que se extrai certidão e o MP dá origem a um processo autónomo. Alteração da qualificação jurídica A alteração da qualificação jurídica é uma situação em que não se alteram os factos, mas aplicam-se aos mesmos factos um diferente enquadramento jurídico. 2 situações: o Se for alteração de factos – 358º ou 359º. o Se não for alteração de factos: Ou é um facto completamente novo que dá origem a novo processo; Ou, não sendo um facto completamente novo, há uma alteração da qualificação jurídica e aplica-se o 358º/Nº3. 358º/Nº3 – remete para o Nº1. Teoria – AQJ No inquérito: o Pode acontecer que o inquérito comece com um enquadramento jurídico e depois venha a ter outro quando se ponderam os vários elementos. o Como o inquérito não é uma fase de contraditório, não é matéria do 358º/Nº3. Na instrução: o Aqui já é possível operar a mudança da qualificação jurídica, mas tem o de se respeitar o contraditório. o Respeitar o contraditório – 303º/Nº5: A nossa lei exige expressamente que se cumpra o contraditório – Nº5; Se não se respeitar – 309º - nulidade da decisão instrutória para a alteração substancial de factos. o Mas no 303º temos várias situações: A alteração substancial é só uma delas. O 309º só comina com a nulidade a ASF que aconteça na pronúncia. = Se for uma mera alteração da qualificação jurídica = mera irregularidade - 118º. -> Isto tem que ver com o princípio da legalidade = só há nulidade se a lei declarar isto expressamente. Então, para a AQJ, se não houver contraditório, não há nulidade, há é irregularidade. No julgamento: o Desde 1998 – regime específico do 358º/Nº3, que remete para o Nº1: Basicamente, à AQJ aplica-se o regime da ANSF. o = Havendo uma AQJ, o tribunal concede à defesa o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa = direito ao contraditório. Aqui, surgia o problema sobre o desvalor do ato processual, se não fosse dado tempo à defesa para fazer a preparação - temos que introduzir aqui dados históricos – o que aconteceu historicamente que faz com que tenhamos um problema jurídico? 379º/Nº1/b) – prevê a hipótese de condenação por factos diversos. Já existia antes do 358º/Nº3. Até 1998, não existia o 358º/Nº3, só existia o Nº1 e Nº2 = não havia enquadramento jurídico para AQJ: A doutrina discutia se a alteração da qualificação jurídica era ou não livre, ou se tinha algum condicionamento. A norma estava prevista para factos diversos, que depois seriam uma alteração substancial ou não substancial de factos. o + Quando a norma do 359º/Nº1/b) refere factos diversos é porque foi construída para uma situação em que não existia o Nº3. + Se a norma refere factos diversos, não contempla a situação da mera AQJ: Nesta não há factos diversos, os factos são os mesmos com outro enquadramento. O 379º foi feito antes, quando não existia o 358º/Nº3 – o 358º literalmente não comporta a AQJ MAS a intenção do legislador no 379º é conferir tutela jurídica ao regime do 358º e 359º: FCP – devemos fazer uma interpretação extensiva e atualista do 379º/Nº1/b) e contemplar todas as situações do 358º e 359º, mesmo que no caso de AQJ não haja ´factos diversos’. = Na fase de julgamento, a AQJ tem de respeitar o contraditório exigido pelo 358º/Nº3. o Se não respeitar, origina a nulidade da sentença – 379º/Nº1/b). -> Por interpretação extensiva e atualista. Porque é que o legislador incluiu a qualificação jurídica aqui? O código foi feito em 1987. Nessa altura, a doutrina entendia que existiam limitações à decisão do tribunal em matéria de factos, mas não em matéria jurídica: o Isto porque esta é uma matéria técnica e entendia-se que o arguido se defendia dos factos e não do seu enquadramento técnico. A doutrina moderna não aceitou isto e veio dizer que o arguido tanto se defende dos factos como do enquadramento jurídico + o contraditório pode abranger também questões de direito. o o = Não é correto fazer um leitura diferente porque condiciona a decisão sobre a atribuição de responsabilidade e não é compatível com o contraditório. A nível de jurisprudência: Acórdão STJ 2/93: o Veio afirmar que o tribunal, não alterando os factos, poderia utilizar qualquer enquadramento jurídico. = ou seja, que não havia limites à qualificação jurídica por um tribunal. Acordão TC 449/97 – o caso subiu ao TC: o Veio dizer que esta alteração jurídica é livre mas há limites – está condicionada aos valores do sistema, sob pena de violação das garantias de defesa. o Havia vários entendimentos: STJ e Jurisprudência entendiam que a AQJ era possível, a divergência era sobre as condições em que isto se podia fazer. A doutrina entendia que se devia respeitar o contraditório. TPB – entendia que havia lacuna no código, mas dizia que a situação era semelhante à do 358º/Nº1 – devia-se aplicar por analogia. = A AQJ pode estar sujeita ao regime de AF mas não é AF, é uma realidade diferente. Podia-se, então, colocar outro EJ para os mesmos factos. FD – a situação já estava prevista no próprio 358º/Nº1 por ser uma AQJ = no fundo, não é uma alteração substancial de factos, donde será remetida para essa norma. o Acórdão deu razão a TPB: Não está previsto, mas tem de ser tratado como matéria sujeita a contraditório. Legislador, em 1998, resolveu o problema através da alteração da lei 358º/Nº3: A matéria não é alteração de factos, mas está sujeita ao mesmo regime. Assim = pode alterar-se a qualificação jurídica, mas tem de se dar oportunidade à defesa para se pronunciar: o Se o fizer, altera livre e legalmente a qualificação jurídica. o Se não, viola o contraditório e incorre numa nulidade. Para FCP: Temos de fazer uma interpretação atualista do 379º/Nº1/b): A CRP estabelece que o PP respeita todas as garantias de defesa: Não distingue entre a matéria de facto e a de direito. + O contraditório faz-se em relação a questão de factos e questões de direito. Por isso a solução do 359º/Nº3 é correta: A AQF não é completamente livre, tem de ser sujeita a contraditório. Caso contrário = nulidade por violação do 358º e por violação do 379º/Nº1/b) Resumo A alteração da qualificação jurídica é livre, porém, não obstante, é condicionada em certas fases: o No inquérito – livre, mas com os efeitos referidos seguidamente. Há uma maior liberdade, do ponto de vista genérico. o Na instrução – AQJ condicionada: 303º/Nº5 – contraditório. Efeito de não haver contraditório: 309º/Nº1 – não contempla a AQJ: o Então, se for ASF, tem de ser sujeita ao contraditório; o Se for AQJ, e não for sujeita ao contraditório, é uma mera irregularidade. 118º - mera irregularidade. o No julgamento – AQJ condicionada: 358º/Nº3 - o tribunal concede o tempo estritamente necessário para a defesa. = Necessidade de Contraditório – é a oportunidade da defesa se pronunciar. 379º - temos de fazer uma interpretação extensiva atualista. =Efeito será a nulidade, se se violar o regime do contraditório. Efeitos da Alteração da Qualificação Jurídica – Consequências Jurídicas Temos 4 temas. Conclusão = há liberdade de alteração da qualificação jurídica no inquérito, mas isso não quer dizer que não haja efeitos dessa alteração. Competência do Tribunal Se muda a qualificação jurídica, pode passar-se para um crime com pena mais grave, o que pode mudar a competência do tribunal. Admissibilidade das Medidas de Coação Pode mudar o regime das medidas de coação porque estas medidas dependem do crime que for imputado - se se muda a qualificação jurídica dos factos pode deixar de existir o crime que era imputado e que justificava a medida de coação. Isso acontece sempre que há um catálogo: o Exemplo – prisão preventiva: O catálogo do 202º evidencia os crimes que justificam essa medida. Se a qualificação jurídica passar a ser outra que não consta do catálogo pode deixar de se justificar a medida de coação. + Quando se muda a qualificação jurídica no inquérito, pode estar-se a pôr em causa as medidas de coação aplicadas pelo que têm de ser imediatamente revistas. Admissibilidade de Certos Meios de Prova Exemplo – escutas telefónicas – 187º: o Apenas são admissíveis em relação a certos crimes que correspondem a um catálogo. o Igualmente aqui, se se muda a qualificação jurídica, pode estar a mudar-se completamente a admissibilidade do regime de certos meios de provas, se já não corresponderem a crimes do ‘catálogo’. Exigência de Pressupostos Processuais (queixa, prazos de prescrição) Exemplo – Caso em que se se alterar a qualificação jurídica, pode passar-se de um crime público para um crime semipúblico: o Se passarmos para um crime SP, sem queixa o processo não poderá continuar. + Posição de Germano Marques da Silva sobre a AQJ Considera que a AQJ é particularmente significativa e gera limitações à competência decisória do tribunal do julgamento. Porquê? o Dantes, referia que a AQJ implicaria sempre uma alteração dos factos. o Agora refere que a AQJ implica alterações da competência do tribunal, possível recurso ao júri e possibilidade de confissão. o + Sempre que o tribunal altera a qualificação jurídica, fica limitado pela pena do crime anteriormente imputado: Leitura semelhante à do 16º/Nº3 - mecanismo de reenvio dos processos do tribunal coletivo para o tribunal singular. Exemplo: Imaginemos uma tentativa de homicídio privilegiado (133º CP, 22º CP) em que depois, o tribunal na fase de julgamento considera que é uma tentativa de homicídio simples (131º CP + 22º CP). Para GMS, o facto de uma série de pressupostos processuais se terem desencadeado com base nesse crime limita a competência decisória do tribunal de julgamento. o = Não poderia decidir para além da pena do homicídio privilegiado. Poderia imputar na forma simples, mas estaria limitado pelo enquadramento anterior que levou o arguido a julgamento. Visão crítica: o É um argumento interessante que reforça as garantias de defesa, mas que não tem qualquer base legal. o Na nossa lei esta limitação aos poderes decisórios do tribunal teria de estar explicita/expressa: (como está, e.g, a proibição de reformation in pejus ou do 16º/Nº3). PORTANTO uma AQJ pode sim levar à aplicação de uma pena mais grave do que o crime inicialmente imputado. o Única exigência = que se respeite o contraditório. o + Razão mais substancial: Entre nós, o julgamento é a fase central de atribuição da responsabilidade = a acusação é meramente indiciária. Não é possível limitar os poderes decisórios do tribunal com base numa imputação meramente indiciária. Para que isso fosse possível, teria de haver lei expressa. + Entendimento da Católica Têm uma perspetiva diferente da ideia defendida por GMS, criticada por TPB: o Ideia original de GMS - sempre que se alterava a qualificação jurídica, se altera os factos. + A consciência da ilicitude enquanto pressuposto da culpa tinha uma certa cristalização. Quando se imputa crime, tem de haver consistência da ilicitude. Se se muda o crime, altera-se factos. Na verdade, o GMS mistura consciência do tipo com consciência de ilicitude: CI é que o facto contraria a ordem jurídica, e não de um tipo em concreto. + A consciência da ilicitude tanto pode ser efetiva como pode ser elegível, permite um juízo de censura. + A consciência de ilicitude não é um facto empírico, o agente não tem consciência da ilicitude, mas deveria ter. -> Com isto, TPB neutralizou o argumento de GMS e regressou à questão de que se pode ter AQJ sem se ter uma alteração dos factos. A questão tem surgido de maneira diferente nos profs da UCP: o Ideia de que quando se altera o tipo incriminador está-se a produzir uma decisão que independentemente da questão da consciência da ilicitude, pode ser uma situação que é desfavorável ao arguido. Tem de haver limites de consciência desta alteração quando essa alteração puser em causa o direito de defesa. o Os da UCP vão mais longe: Se a acusação tem de estabelecer um certo EJ e o TJulg quiser alterar ele pode mas prevê-se limitação decisória. Exemplo: A acusação era por HP e a pena máxima era 5 anos. Se o MP fez uma acusação e depois o TJ altera, então o tribunal pode fazê-lo mas está limitado pela pena mais grave que vier da acusação. o Pena HP até 5 anos, a do HS até aos 16. o O Tjulg pode alterar a qualificação jurídica de HP para HS MAS não pode condenar por pena superior a 5 anos. Isto não é assim tão estranho = o mesmo acontece com o 16º/Nº3. Ora TPB e FCP pronunciam-se contra: o 1º - Não se pode fazer comparação com 16º/Nº3 e Nº4: Aqui não temos comparação totalmente explícita. o 2º - Isto, do ponto de vista processual e substancial não é admissível = esta doutrina está-nos a dizer que deixa de aplicar o 133º e começa a aplicar 131º com a norma do 131º, violando o princípio da legalidade. o 3º - Isto é um absurdo, porque o tribunal deixa de aplicar um crime e aplica uma norma de sanção e depois … Regime das Variações do Objeto do Processo Nota Prévia Ocorrendo uma alteração, há 2 tipos de problemas: o Saber o que acontece aos novos factos, às alterações: Regime das variações do objeto do processo; Saber se se trata de uma alteração do 358º (ASF) ou do 359º (ANSF) o Isto verifica-se pelo efeito da alteração: Se der origem a uma pena mais grave ou a um crime diverso = é substancial. Se não = é não substancial. o Isto é essencial = porque depois os regimes são diferentes. Quando é que os novos factos são autonomizáveis; o Saber o que acontece ao processo em que os factos surgem: Efeitos das alterações substanciais de facto; Alteração Não Substancial dos Factos – 358º Temos uma ANSF quando não se gera uma pena mais grave nem é um crime mais grave. ➔ Se for respeitado o contraditório, a alteração é lícita 358º/Nº1 - havendo uma ANSF, o tribunal tem de respeitar o contraditório: o Tem de dar um prazo à defesa para se pronunciar sobre a alteração. Se for cumprida essa exigência, legitima-se a alteração, independentemente do que a defesa diga: o Mesmo que a defesa discorde, se oponha ou não diga nada deixando passar o prazo sem se pronunciar, a alteração é lícita. Resumo: o Se cumprida a exigência de dar um prazo para preparação da defesa, o processo incorpora legalmente os novos factos que consubstanciam uma ANSF. ➔ Se não for respeitado o contraditório, a alteração é ilícita e não pode ser conhecida Se o tribunal conhecer uma alteração de factos fora do regime do contraditório, a decisão é ilícita e dá origem a uma nulidade parcial nessa parte – 379º/Nº1/b). V. 358º/Nº1 - Exige o prazo para o exercício do contraditório. ➔ Se os factos foram apresentados pelo arguido, não é necessário o contraditório Estes factos podem ser apresentados durante a contestação ou durante a própria audiência do julgamento. = Os factos apresentados pelo arguido entram automática e licitamente no objeto do processo - não é necessário contraditório. o Ou seja, entendemos que a lei só exige que seja dado contraditório quando o arguido não conhece o facto. + Não está previsto o contraditórios dos outros sujeitos processuais: o A norma só refere o contraditório do arguido, não fala do contraditório do MP ou do assistente. Não há qualquer nulidade, nem sequer há irregularidade, se não for dado ao MP ou a assistente para se pronunciar. Isto vem do facto do legislador ter de respeitar o especial valor, dado ao processo, relativo às garantias de defesa do arguido. o Isto quer dizer que não se pode exigir que seja dado prazo ao MP ou ao assistente enquanto condição legal do conhecimento. Alteração Substancial dos Factos – 359º ASF = se gera uma pena mais grave ou um crime mais grave. ➔ Se existir acordo o processo continua com as alterações substanciais 359º/Nº3 e Nº4 – prevê o “caso julgado de consenso”. Admite-se que, se existir uma ASF no processo, é possível reformular substancialmente o objeto do processo se houver um acordo entre todos os sujeitos processuais, tribunal, MP, assistente, arguido e defensor do arguido. o Limite desta faculdade de acordo: Não pode determinar a incompetência do tribunal. E.g: Se o caso estiver num tribunal singular, e a consideração da ASF alterar para passar a ser da competência do tribunal coletivo, deixa de ser possível o acordo. o Não existe para factos completamente novos, apenas para ASF. Note-se que um acordo entre todos os sujeitos processuais é algo muito difícil de conseguir: o Pouco provável que o arguido e o seu defensor aceitem alargar o objeto do processo substancialmente. ➔ Se os novos factos tiverem autonomia, será instaurado um novo inquérito 359º/Nº1 e Nº2 - estabelecem o regime geral que se deve seguir nestes casos. Regime: o Perante novos factos autonomizáveis que alterem substancialmente o objeto do processo, o tribunal não os pode conhecer: Tem de extrair certidão + será instaurado novo inquérito. A comunicação da alteração substancial de factos ao MP vale como denúncia para ele proceda pelos novos factos se eles forem autonomizáveis – 303º/Nº4. Regra geral (e excetuando quando há acordo) há uma proibição de conhecimento dos factos que geram uma ASF. o = É por isto que dizemos que o regime do DRT PT, especialmente a partir de 2007, é tendencialmente rígido = pouco provável que no processo em curso se façam ASF. ➔ Se os novos factos não tiverem autonomia, não podem ser tomados em conta pelo tribunal para efeito de condenação (ou ficam preteridos (PPA) ou são usados para determinar a sanção (FCP)) A solução deste caso, dos novos factos sem autonomia que não podem ser enviados para outro processo, é uma grande dúvida na doutrina e na lei. 359º/Nº1: o Estabelece que não podem ser tomados em conta para efeito de condenação no processo em curso. Interpretações: o PPA: Os factos ficam esquecidos, não são considerados, ficam preteridos. Se eles saem do processo e tribunal não os pode conhecer, então não se pode motivar um novo caso em função desse crime = esses factos não poderão motivar uma condenação por crime. o FCP: Pelo contrário, defende que podem ser conhecidos para efeito de determinação da sanção. Discorda da interpretação do PPA - esclarece que esta está associada à reforma de 2007: O 359º/Nº1 acrescentou a expressão “nem implica extinção da instância”. o Isto foi importante, porque havia quem entendesse que no caso de alteração substancial de factos, o melhor era terminar o processo e iniciar um novo com que contemplasse todo o complexo factual (os já existentes e os novos). o Tal não seria admissível porque quando começa o julgamento só podemos ter 2 decisões - condenação ou absolvição. = A suspensão da instância ou outras decisões formais do mesmo género não existem no PP. Quer isto dizer que os factos ou ficam ou saem, mas em qualquer das situações o processo prossegue. o Assim, pelo exposto, não deve ser aceite esta interpretação que vai no sentido de preterir os factos novos sem autonomia, pelo facto da sua contemplação ter de provocar uma suspensão da instância, hipótese que foi excluída pela reforma de 2007. o A interpretação de PPA não só não tem apoio em termos históricos (1º) como: 2º - Não tem apoio na letra da lei: Não significa uma proibição de conhecimento como critério de determinação da pena. 3º - O 71º/Nº2 CP tem um sistema aberto de atenuantes e agravantes pelo que qualquer circunstância de facto pode ser tida em conta para determinação da pena. Não faz qualquer sentido o direito substancial penal ser mais rígido que o direito substantivo. Assim, para FCP, a solução correta quando há ASF sem autonomia é que não são alterações substanciais do objeto, mas meras alterações de factos para ponderação da medida da pena. = Vai-se usar esse facto para determinar a pena concreta. As variações de factos de determinação da pena concreta nunca foram tratadas como alteração do objeto do processo porque o sistema de agravantes e atenuantes é um sistema aberto. Esta solução é a correta porque gera uma maior congruência entre o DP e o DPP e respeita a evolução histórica do preceito. Quando é que os novos factos são autonomizáveis? Depende de 2 requisitos: 1º - Tem de ser um facto que tenha por si tipicidade: o Se o novo facto não corresponde a um tipo de crime, não tem autonomia funcional = não pode motivar a abertura de inquérito. o Exemplos: 1 - Imaginemos que, num crime de homicídio, surge uma premeditação ou um motivo fútil, ou uma relação de parentesco: 1. Estes factos não são autónomos porque não têm tipicidade. 2 – Caso em que é imputado ao arguido um crime de furto simples, mas comprova-se em julgamento que é um furto agravado pela introdução em casa alheia. 1. Este facto novo que surge no processo (introdução em casa alheia) corresponde por si a um tipo autónomo = justifica a abertura de novo inquérito, sai do processo. o Se o facto tiver tipicidade pode sair do processo e dar origem a outro inquérito, se puder constituir uma ‘matéria autónoma do inquérito’. 2º - Os factos não têm autonomia se implicarem uma alteração do objeto que está em curso: o Ou seja, o facto (para ter autonomia) tem de ser capaz de sair do processo sem perturbar ou alterar o objeto do processo. = Se o alterar, é porque está intrinsecamente ligado e não é autónomo. o Exemplo – Tortura: Se nós pegarmos na tortura como facto de um homicídio, ficamos com 2 processos em que num se discute o homicídio e noutro a tortura – isto iria descaracterizar o objeto do processo. (assim, para FCP, o facto não pode sair e é utilizado como elemento de averiguação da situação concreta). -> Num caso como estes, o julgamento deve-se fazer com base no 131º + a tortura funciona como circunstancia agravante concreta. Resumo: o Os factos, para serem autonomizáveis, têm de ter autonomia própria perante a lei e autonomia perante o objeto que já existe. o Verificados estes 2 requisitos, o objeto do processo é cindível. o + Consideração extra – um regime tendencialmente rígido obriga a que seja cumprido o princípio da acusação: Não há julgamento sem acusação prévia. Uma vez feita a acusação, o MP não pode nem a retirar nem a modificar substancialmente. 1. = Não há uma desistência do MP como há para os crimes particulares e semipúblicos. Lado perverso deste sistema = o MP acusa por excesso, para permitir variações para baixo: 1. E.g – o MP raramente acusa pelo homicídio privilegiado, acusa antes pelo homicídio simples e, se for caso disso, depois altera-se para baixo. Efeitos das Alterações Substanciais de Factos sobre o Processo em curso Esta questão está simplificada desde 2007: o Até 2007, era a doutrina que dava a resposta. Houve várias interpretações que ficaram ultrapassadas pela evolução da lei. o Ou seja, sabemos que saem os factos, mas precisamos de saber o que é que acontece ao processo. o Opiniões: Havia quem entendesse que o processo se suspendia - ficava a aguardar nova acusação com tudo. Havia quem entendesse que essa mesma solução se aplicava à audiência de julgamento que ficava suspensa a aguardar a reformulação do objeto que vinha doutro processo, + Havia quem entendesse que isso só se podia aplicar na instrução e não no julgamento. o Em 2007 - o legislador veio acabar com essa incerteza. Notas Prévias: o 1º - A questão sobre os efeitos no processo só se coloca para as alterações substanciais não autonomizáveis: As autonomizáveis saem do processo + legislador estabelece que não há extinção da instância (359º/Nº1) – o 1º processo continua, e se os factos tiverem autonomia, mais tarde se faz um outro processo. o 2º - Os efeitos variam consoante a fase processual. Efeitos - Fases No inquérito: o Não há problema de existir uma variação factual porque o inquérito não está cristalizado e pode incorporar todas as vicissitudes contratuais. = O inquérito tem capacidade jurídica para absorver as ASF autonomizáveis. Tem possibilidade de gerar outros inquéritos autónomos. No fundo, as ASF são normalmente incorporadas no inquérito, gerando apenas um alargamento da investigação. Na instrução: o O problema já tem uma certa complexidade. Especialmente porque já houve uma cristalização de factos. Se forem ASF autonomizáveis – 303º - devem sair do processo. o Atentemos no regime antes de 2007 - Exemplo: Imagine-se que há uma acusação pelo crime de homicídio simples (131º CP) e durante a instrução começam a revelar-se factos que apontam para o homicídio qualificado (132º/Nº2 CP), que causariam agravante. (Não houve constituição de assistente e os factos começaram a surgir na instrução.) Como esta é um fase preliminar: Havia quem entendesse que o processo pelo homicídio simples se suspendia, havia um novo processo pelo homicídio qualificado com novo inquérito e nova acusação mais complexa, que se juntavam os dois processos e seguiam para o julgamento. o Esta tese, de que o primeiro se suspendia e aguardava a reformulação que vinha de um segundo processo, era especialmente complexa = significava que havia dois processos dentro do mesmo processo, duas acusações com o mesmo objeto, e levantava problemas de prazos de prescrição. o -> O legislador acrescentou, e bem, na parte final do 303º/Nº3 que “nem implica extinção do processo”, arrumando este assunto. Desde 2007 = não há absolvições da instância nem suspensões de instância. o Soluções – ASF não autonomizáveis: 303º/Nº3 - elas não podem sair. Soluções: Acordo dos Sujeitos Processuais – 359º/Nº3 por analogia: o Pensamento de que se os sujeitos processuais podem acordar a reformulação do objeto do processo na fase do julgamento (359º), então, por maioria de razão, também o podem fazer na fase da instrução. + Se o juiz de instrução conhecer uma ASF que não podia conhecer = nulidade da pronúncia que tem de ser arguida em 8 dias, 309º/Nº2 contrario sensu: o Depois desse prazo, se ninguém denúncia, a nulidade já não pode ser arguida e portanto, sana-se por decurso do prazo. = Então, a inércia dos sujeitos processuais pode levar à reformulação do processo. o Há, aqui, uma convalidação da pronúncia que conheceu de forma ilícita uma alteração substancial de factos não autonomizáveis e que, por inércia dos sujeitos processuais, passa a ser inatacável. o Isto acaba por também convalidar o argumento anterior, para dizer que é possível o acordo = se é possível por inércia, então também é possível por acordo. No julgamento: o Relembrando – casos de ASF – vai a julgamento um homicídio e surge a premeditação, sendo esse facto não autonomizável. o Ou há acordo = caso julgado consenso – 359º/Nº3. o Ou então ASF são conhecidos para determinação da medida da pena (FCP) ou são preteridos (PPA). Resumo A questão só é pertinente para as ASF não autonomizáveis: o As autonomizáveis devem ser objeto de denúncia para novo inquérito ser aberto. Efeitos dependem das fases: o No inquérito em curso: Sem problemas, porque o inquérito absorve as alterações substanciais de factos. o Na instrução: O 303º/Nº3 (após 2007) afasta todas as teses de suspensão da instância; O processo pode absorver as alterações substanciais de factos não autonomizáveis por acordo dos sujeitos processuais (359º/Nº3 por analogia) ou por inércia destes (não arguirem nulidade no prazo de 8 dias, 309º/Nº2 a contrario sensu) o No julgamento: Ou há acordo (359º/Nº3) ou os novos factos (alteração substancial de factos não autonomizáveis) ficam preteridas (PPA) ou são usadas para determinar a sanção (FCP) Casos da Última Aula – Objeto do Processo Caso 1 - O MP acusa X por homicídio (131º CP) + no julgamento prova-se que houve avidez e premeditação (132º/Nº1 e Nº2 e) e j). O que é que o TJ pode decidir? Temos factos e depois começam a surgir factos que provam agravação. Metodologia: o 1º - Em rigor, deviamos provar que existe uma alteração de factos: Isto porque se adicionam factos que não eram conhecidos até aí aos factos que estão no processo. Adiciona-se às circunstâncias nas quais foi realizado o homicídio, é um aditamento de factos aos factos principais que estão no processo. o 2º - A alteração de factos é substancial? Temos 2 critérios – qualitativo (tipo de crime) e quantitativo (pena legal) Aqui, o crime não é diverso, mas é uma penal legal mais grave: No homicídio simples – 16 anos. Neste, com premeditação e avidez, passa a ser 25 anos. = Corresponde a ASF – 1º/f) – “agravação dos limites máximos da pena”. o 3º - Devemos perguntar se o tribunal pode conhecer, quando o caso vai a julgamento – matéria dos efeitos da ASF: Estamos perante reformulação legalmente permitida do objeto do processo. Por parte do assistente: Como estamos perante uma ASF, temos de ir pelo RAI do 287º. o O 284º permite que o assistente pode aditar factos mas só pode ser ANSF. Estamos perante ASF não autonomizáveis: Tribunal pode conhecer os factos da acusação e do RAI: o Para PPA, os factos seriam preteridos. o Para FCP, os factos devem ser utilizados para determinar a sanção. o O RAI reforma o objeto do processo, passa a incluir a factualidade do 131º e circunstância do 132º, a pronúncia pode ser feita pelo 132º. Caso 2 – O MP acusa X de homicídio (131º CP) Caso 3 - O MP acusa X de ter no seu estabelecimento máquinas de jogo ilegais (108º DL 422/98). As máquinas são ilegais (jogos de fortuna e azar) de acordo com uma perícia para onde a acusação remete. O Tribunal na sentença condena X por jogo ilegal e descreve como factos na sentença os factos que estão na perícia (mas não na acusação). Porque sem os factos da perícia, não se poderia concluir que as maquinas são ilegais. Os factos relevantes para a decisão são tanto os que estão presentes na acusação como na perícia. A questão que se coloca é se a sentença é ou não legal por estar a usar factos que não estão na acusação. 283º - Temos de ver o que é que é obrigatório constar da acusação: o b) – a narração dos factos sintética: Percebemos que esta narração não tem de ser exaustiva. Resolução do Tribunal: o Decidiu que a acusação não era ilegal, porque a narração que a lei exige é uma narração sintética. o Ao mesmo tempo, disse que era um método pouco aconselhável mas possível: Mas percebeu-se pela sentença que o tribunal não gostou da forma como a acusação geriu aqueles factos, apesar de considerar que estava respeitada a acusação - entendendo que a remissão da acusação para a perícia incorporava como factualidade aquilo que estava descrito. Caso 4 – O MP acusa X de homicídio privilegiado por compreensível emoção violenta (133º CP). O Tribunal considera que não está provado o estado emotivo e que, a existir, não seria compreensível, e condena X por homicídio simples (131º CP). Pode fazê-lo? Ao dizer que não aplica HP, o passo seguinte numa relação de especialidade entre as normas seria passar para condenação por homicídio simples. O problema aqui é que o crime tem pena até 5 anos e sai com um crime imputado com pena de 8 a 16. Isto é um caso de alteração de qualificação jurídica. Pode condenar por homicídio simples? o Pode, respeitando o contraditório – 359º/Nº4. o Tem de informar os SP desta nova alteração de qualificação jurídica e dar tempo para se pronunciar. Mas Escola da Católica: o Se o MP fez uma acusação e depois o TJ altera, então o tribunal pode fazê-lo mas está limitado pela pena mais grave que vier da acusação = 5 anos.