Uploaded by Ana Beatriz Gens

Objeto do Processo

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OBJETO DO PROCESSO E ALTERAÇÃO DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA
VER ALTERAÇÃO DE FACTOS E VINCULAÇÃO TEMÁTICA EM PROCESSO PENAL Teresa Pizarro
Beleza* / Frederico de Lacerda da Costa Pinto**/***
Noções Introdutórias
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
Esta matéria é a mais difícil no PP:
o Tem que ver com a evolução do processo, a dinâmica do caso e a interação
entre os factos e o direito.
Começaremos por olhar para um caso = perceber qual é o problema que está em
causa, que problemas se colocam e onde é que se colocam.
o + Veremos com atenção a diferença entre a variação do objeto do processo
(que são variações factuais) e aquilo que são alterações da qualificação
jurídica (que prossupõem que os factos se mantêm, mas o enquadramento
jurídico se altera).
Caso:
o
o
o
o

Imaginemos que A apresenta um queixa criminal dizendo que X disparou três tiros
contra si e que o atirador tinha intenção de a matar.
Temos uma notícia de infração + o inquérito será aberto a partir do enquadramento
indiciário – 131º CP mais 22º CP = tentativa de homicídio.
Agora, imaginemos que o autor dos disparos diz que efetivamente disparou os três
tiros, mas não para matar, só para assustar.
Assim sendo, não havia dolo:
 Esta situação não pode ser enquadrada como tentativa de homicídio.
 + Se o que o X quisesse fazer era assustar a vítima, seria um crime de ameaça
- 153º CP.
Análise:
o Temos como base factual:
 Os três tiros disparados por X em direção a A;
 Os tiros não acertaram na vítima;
 A vítima sentiu que era vítima da tentativa de homicídio, mas X afasta
essa ideia dizendo que era só para assustar.
o = Temos aqui uma notícia do crime que apresenta certos factos, mas que vão
ter de ser enquadrados ao longo do processo.
o O MP vai ter de investigar, no contexto em que é dúbio se houve tentativa de
homicídio e é dúbio se houve apenas uma ameaça ou uma defesa
meramente nominal ou unilateral.
o Suponhamos que o MP conclui que o X apenas queria assustar = faz uma
acusação pelo 153º CP – crime de ameaça.
o Face a isto, o que o arguido pode fazer é requerer a abertura de instrução:
 Ao fazê-lo terá de apresentar os factos e há um que se manifesta
decisivo.
 = Não se contesta se foram disparados os três tiros, mas se há dolo.
o Abrindo instrução, imagine-se que o tribunal entende que existiu uma
tentativa de homicídio - 131º CP - e que faz a pronúncia para o caso ir a
julgamento:
 O caso vai a julgamento com esses elementos e o tribunal chega à
conclusão que existiam várias circunstâncias agravantes como
premeditação.
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Evidenciamos assim 2 ideias:
o 1º - É perfeitamente normal existirem variações de factos ao longo do
processo.
o 2º - Reter que aquilo que se considera provado que permite a invocação de
certos tipos incriminadores depende da prova sobre esses factos e do tipo
incriminador aplicável.
o + A factualidade objetiva parece ser a mesma, mas altera-se a factualidade
subjetiva ao apurar melhor a história = os factos vão variando.
Agora, a temática do objeto do processo é até que ponto é que essa variação é
admissível = o que vamos agora perceber é se podem variar em qualquer sentido ou
significado ou se haverá algum momento em que os factos se consideram
cristalizados.
o Exemplo:
 Imaginemos que não houve instrução e tudo aquilo que foi apurado
nessa fase é relevado factualmente na audiência julgamento.
 Queremos então perceber como deve proceder o juiz que recebe o
caso de ameaças, mas no julgamento percebe que se trata de algo
bastante mais grave, uma tentativa de homicídio ainda para mais com
agravantes.
 Um caso enquadrado como crime de ameaças teria ido para o
tribunal singular = há uma incompetência porque o tribunal
singular não tem competência para julgar tentativas de
homicídio.
o Nota – O tema da incompetência é um tema que se coloca depois do
problema da variação do objeto do processo:
 O que temos no fundo é uma variação do objeto do processo com uma
alteração substancial dos factos e uma alteração de qualificação
jurídica, mas que geram novos factos e novos crimes, que não são da
competência do tribunal singular.
A variação do objeto do processo: conceito, função e limites
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O problema da variação do objeto do processo consiste exatamente em tentar
perceber
o (i) quais são as variações factuais que são admissíveis;
o (ii) se isso depende ou não das fases processuais;
o (iii) quais são as consequências práticas de essas variações ocorrerem
nalguma fase processual em específico.
Nota:
o Os factos podem alterar-se, variando o dolo e variando a prova sobre o dolo e
sobre os factos = é possível inclusivamente admitir um espetro de
possibilidades do ponto de vista fático e jurídico.
o Exemplo – caso do bebé que foi deixado no ecoponto dos plásticos:
 Em função dos factos, podemos estar a falar de diversos
enquadramento jurídicos substantivos:
 Tentativa de Homicídio – 131º CP e 22º CP.
 Tentativa de Homicídio Qualificado - 132º CP + 22º CP.
 Tentativa de infanticídio - 136º CP + 22º CP.



 Exposição ou abandono - 138º CP.
 No fundo, no inquérito são apurados os factos e o processo vai
evoluir consoante esse apuramento e os enquadramentos jurídicos
que não são estáticos e podem mudar de forma absoluta.
O objeto do processo são os factos que se imputam ao arguido:
o Não são o total de questões totais de direito, mas os factos que foram
apurados.
Função destes factos:
o Permitem conjugar as normas jurídicas aplicáveis = princípio da tipicidade.
O problema num PP de estrutura mista, completado pelo princípio da investigação.
o Se quem julga não acusa, então os factos que vão a julgamento têm de estar
estabilizados pela acusação.
o MAS o nosso sistema não tem uma estrutura básica acusatória, temos é um
princípio da acusação.
o Ora, a partir do momento em que se diz que o juiz pode e deve investigar,
então isso quer dizer que o julgamento deve poder revelar alguma coisa,
senão ele não poderia investigar = ele pode e deve investigar a verdade dos
factos.
Valores Envolvidos no Problema da Estabilidade e do Objeto do Processo
Direito de Defesa e Contraditório
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Ora, para o arguido se defender e exercer o contraditório tem de saber quais são os
factos que lhe são imputados:
o = Pelo menos a partir de certo momento, o próprio direito de defesa do
arguido pressupõe a estabilização do acervo dos factos que lhe são
imputáveis.
O momento para a estabilização tende a ser o da ‘acusação’:
o Quando é deduzida a acusação, têm de estar indicados os factos, com um
certo enquadramento – 283º/Nº3/b).
o + O arguido defende-se perante essa acusação.
Conclusão:
o O problema da variação do objeto do processo é também um problema
associado ao direito de defesa do arguido.
 Se um regime legal for mais permissivo quanto às variações do objeto
do processo, então isso é mais erosivo para a defesa do arguido.
 Se, pelo contrário, o regime for menos permissivo, isso é mais
garantística da defesa do arguido.
Princípio da Acusação e Estrutura Acusatória

Já foi estabelecido que a acusação delimita o caso que vai a julgamento, não se
fazendo um julgamento sem acusação:
o No fundo, pressupõe-se que o objeto do processo do julgamento é o da
acusação.
o No entanto, há também o princípio da investigação.
 MAS se os factos puderem variar, isto quer dizer que o tribunal de
julgamento pode estar a investigar acusar e julgar factos que não


estavam na acusação, o que pode pôr em causa a estrutura
acusatória.
o = Temos de saber até que ponto estamos dentro do PA.
No problema do objeto do processo está também implícito o próprio regime da
estrutura acusatória que não consente variações muito significativas na fase do
julgamento, pois tem de existir acusação antes.
o O tribunal de julgamento julgará dentro daquilo por que o arguido for
acusado.
Congruência da Estrutura Acusatória com a Defesa e o Contraditório:
o O princípio da acusação e a estrutura da acusatória, nas limitações que trazem
para o problema da variação do objeto do processo, são congruentes com as
razões que levam a exigir, no fundo, num certo momento que estejam já
estabilizados clarificados os factos de que se vai defender.
Segurança Jurídica – Caso Julgado, Litispendência e “Ne bis in idem”

Algumas figuras pressupõem que esteja clarificado se o crime em causa já foi ou não
julgado:
o O facto de termos um caso julgado significa que há uma certa situação que já
foi decidida e, portanto, não pode ser reapreciada.
o + Se assim é, temos de conseguir apurar o que é que já foi decidido e com
critérios.

Problema - Imaginemos que, no tal exemplo em que o X dispara três tiros contra o
A, o arguido X chega a ser julgado pelo crime de ameaças e depois vai para o Facebook
dizer “ahahah, enganei-os todos! Falhei, mas para a próxima não falho”.

Aí teríamos uma versão diferente da história e levanta-se o problema:
é possível um novo processo? Esse processo já foi julgado ou não? Pode haver novo
julgamento perante estas declarações?


+ Também se refere à litispendência - porque podiam estar concomitantes dois
processos (o de ameaças e o de tentativa de homicídio).
o = aquilo que está a ser julgado não pode estar a ser julgado noutro caso ao
mesmo tempo.
+ “ne bis in idem” - estabelece que ninguém pode ser julgado duas vezes pelo mesmo
crime, o que que pressupõe que há uma situação que já foi julgada.
o A CRP diz crime, não diz factos - o que significa que são os factos e o
enquadramento.
o Exemplo - Uma pessoa deu um par de estalos a outra e foi julgada por ofensas à integridade
física. Porém, isso aconteceu publicamente, portanto há uma dimensão ofensiva da honra
associada ao par de estalos que gera ou segunda queixa.


Questão = se pode haver um novo processo por crime contra a honra
com base nos mesmos factos = isto pressupõe saber o que é que foi
julgado no mesmo processo e como é que se apura a repetição de
julgados.
Conclusão:
o Há figuras fundamentais do DPP que pressupõem que se clarifique quando o
objeto do processo está definido, quando pode haver variações e ainda o que
é que já foi julgado e o que é que está a ser eventualmente repetido.
o O CPP não trata disso porque não tem regras específicas sobre o caso julgado
= tudo o que temos é a CRP e normas sobre variação do objeto do processo.
Princípios Fundamentais
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CN diz que um PP com estrutura acusatória deve, em matéria do objeto do processo,
respeitar 4 princípios fundamentais.
Princípio da Identidade do Objeto do Processo
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Prof. Castanheira Neves:
o Formula esta exigência como devendo existir uma identidade entre o
acusado, o conhecido e o decidido.
 Deve ser o mesmo acontecimento que é acusado pelo MP, conhecido
pelo TJ e decidido.
Então, entre a acusação, aquilo que o tribunal conhece e a decisão deve encontrar-se
uma situação de permanência em termos de conteúdo:
o = Reforça a ideia de que a acusação cristaliza o objeto do processo.
o + aquilo que o tribunal conhece, conhece dentro dos limites da acusação.
Exemplo:
o Imagine-se que há uma acusação pelo crime de introdução em casa alheia
(190º CP) e furto qualificado (204º CP) que ocorreu em abril, mas o juiz
conhece um outro assalto semelhante em janeiro.
o Segundo o PIOP, essa segunda situação não pode ser conhecida nem decidida
porque não consta do acusado.
Princípio da Estabilidade


O PdE dita que o objeto do processo deve manter-se estável a partir de certo
momento:
o O momento é, normalmente, o da acusação.
o Essa estabilidade garante a congruência entre o acusado, o conhecido e o
decidido.
 O conhecimento factual não deve oscilar, entre as fases, de modo que
o SJ saiba o que lhe está a ser imputado.
MAS a estabilidade não é aritmética, nem total, nem absoluta:
o 1º - A própria natureza do julgamento pode fazer com que surjam factos não
anteriormente revelados.
 Não há contraditório antes do julgamento, portanto a própria
natureza desta fase pode fazer com que se revelem factos que não
eram antes conhecidos.
o 2º - Num sistema como o nosso, em que o tribunal tem poderes autónomos
de investigação (complementares à EA) = é mais fácil acontecerem variações
que põem em causa a estabilidade do objeto processual:
 Pode haver várias verdades a vir ao de cima numa fase de julgamento
contraditória cujo titular tem o poder-dever de investigar a verdade
material.
Princípio da Indivisibilidade

Este PI do acontecimento que é levado a julgamento diz-nos que a unidade do
acontecimento histórica não é divisível e deve ser tomado como um todo enquanto
história que vai na acusação.
o


Exemplo - Numa agressão de X a A, houve primeiro um empurrão, depois socos
e pontapés e em terceiro lugar houve arremesso de objetos à cabeça da vítima:
 Se a agressão de X a A é definida com esses parâmetros empíricos = se
foi isso mesmo que aconteceu = essa unidade é indivisível.
 Não podemos tratar o empurrão como ofensa à integridade física
simples (143º CP), os socos como ofensa grave (144º CP) a o
arremesso como uma tentativa autónoma de ofensa grave.
 = O tribunal tem de tratar essa matéria como conjunto, caso contrário,
estaria a segmentar a realidade (atribuindo qualificações jurídicas
parcelares.)
O PI pressupõe que o acontecimento histórico-social é tratado em conjunto, e não
como partes autónomas.
o No caso anterior = poderíamos então ter um crime de ofensas à integridade
física (englobando tudo) ou uma tentativa de roubo com ofensas
instrumentais.
o Não significa que não haja segmentos, até com diferentes agentes, mas estes
acontecimentos que até se podem passar em intervalos de cinco minutos, são
tratados em conjunto.
Nota – a questão do concurso de crimes é posterior a tudo isto:
o O acervo de factos não é divisível, gere ou não gere concursos.
o O concurso é sempre resultado de um objeto de processo que já se delimitou.
Princípio da Consumpção
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
De acordo com o PdC, aquilo que o tribunal decide no julgamento abrange tudo o que
foi conhecido + tudo o que estava numa unidade histórica com o que foi conhecido e
que, não tendo sido, devia ter sido conhecido.
Exemplo:
o Imaginemos que durante um ano há um trabalhador que, ao fechar as contas,
tira 10 euros da caixa registadora todos os meses.
 = É uma situação de abuso de confiança (205º CP), em que em cada
mês ele tira uma pequena quantia que é relativamente insignificante.
o Imagine-se que é descoberto e é apresentada uma queixa de abuso de
confiança por se ter apropriado ilegitimamente de 120 euros entre janeiro e
dezembro de 2019.
o = Isto é tratado como um crime continuado:
 Em vez de serem imputados 12 crimes de apropriação de 10 euros em
cada mês, a fragmentação de ações é tratada como uma única
realização típica.
o Através do PdC:
 Os factos entre janeiro e dezembro são todos tratados.
 + Não se pode depois tentar tratar autonomamente um
processo só com os valores dos 3 meses já tratados (princípio
da indivisibilidade) = seria violador do caso julgado.
 = A decisão por abuso de confiança de 120 euros abrange os 120
euros e as várias frações que foram retiradas em cada um dos meses.
Também, o PdC estabelece que aquilo que o tribunal decide abrange também tudo o
que devia ter sido conhecido:
o


Exemplo - Imagine-se que, afinal, nos meses de abril, maio e junho, como
houve maior movimento, em vez de tirar 10 euros, o funcionário tirou 20, o que
significa mais 30 euros no fim do ano. Ora, o tribunal não contemplou esses
30 euros na sua decisão. Quid júris
o PdC:
 Se o caso foi mal investigado e por isso a decisão não abrangeu meses
em que foram retiradas quantias maiores, estes valores estão
consumidos pelo objeto do processo do crime continuado de janeiro
e dezembro.
 = É uma proteção do caso julgado contra aquilo que efetivamente foi
conhecido proibindo que se conheça aquilo que por deficiência de
investigação ou de acusação devia ter sido conhecido e não foi.
 Visa maximizar a investigação e garantir a segurança jurídica
alargando o caso julgado àquilo que não foi conhecido, mas devia ter
sido conhecido:
 Permite não se duplicarem ou triplicarem processos e crimes –
é proibido.
 É por isto que o MP tem alguma resistência a deduzir acusação
porque sabe que uma vez acusado não pode corrigir.
o No fundo, a decisão do tribunal abrange tudo o que aconteceu e tudo o que
devia ter conhecido, em termos de fazer parte da mesma atualidade histórica.
 = é uma garantia do caso julgado = abrange tudo aquilo que foi
conhecido mas também aquilo que no âmbito do abuso de confiança
devia ter sido conhecido.
 Bem ou mal investigado, tudo o que está no mesmo caso não pode
voltar renascer para dar origem a novos crimes.
Nota - isto vale para todos os crimes.
+ Exemplo – crime não duradouro:
o Imagine-se que uma pessoa tenta matar outra colocando uma bomba no carro
desta. Quando a pessoa vítima entra no carro, esquece-se de qualquer coisa,
sai e, portanto, a bomba explode, destrói o carro e não mata a pessoa por esse
acaso.
 = Do ponto de vista factual temos uma tentativa de homicídio
qualificado e o tribunal conhece esta história do ponto de vista factual
= é isso que vai a julgamento e o tribunal condena por esse crime (22º
CP + 132º CP).
o Depois disso, é iniciado por queixa ou por iniciativa própria do MP uma nova
queixa por dano (212º CP) ao veículo que foi destruído:
 Este pedaço de acontecimento já foi conhecido e o tribunal não se
pronunciou sobre o dano.
 = Esse facto histórico já foi avaliado, o tribunal não conheceu e
devia era tê-lo conhecido.
 PdC dita que já não é possível conhecer porque já se
esgotaram os efeitos sobre o facto.
Modelos de Solução do Problema
O modelo rígido e o modelo flexível - Avaliação Crítica



Nota:
o
São possíveis dois modelos de solução do problema da estabilidade e do
objeto do processo.
o + Seria possível o legislador optar por um, por outro, ou por adotar soluções
intermédias.
Modelo Rígido:
o O que está acusado é o que pode ser conhecido.
o Aplicando-se um modelo rígido, não poderiam existir variações algumas
depois da acusação.
o Vantagem:
 Aumenta a segurança jurídica, obriga a uma investigação mais
apurada, um julgamento mais rígido.
o Desvantagem:
 Acaba por sacrificar alguma coisa da verdade material.
Modelo Flexível:
o Estabelece que uma vez deduzida acusação, ela pode ser completada em
julgamento com os factos que forem surgindo.
o Vantagem:
 Aumenta a adesão à verdade material, investigação mais completa.
o Desvantagem:
 Sacrifica a segurança do arguido porque, assim sendo, poderia ser
acusado por uma coisa e vir a ser condenado por outra.
A evolução do regime do CPP e a solução de 2007: um modelo tendencialmente rígido

O modelo adotado pelo nosso CPP é um modelo tendencialmente rígido em relação às
alterações substanciais de facto.
o “Tendencialmente Rígido”:
 Em regra, o tribunal não pode conhecer as ASF mas pode conhecer as
alterações não substanciais de facto.
 = modelo rígido quanto às ASF.
 = tendencialmente flexível quanto às ANSF.
o Notas – em função das fases processuais:
 Liberdade no inquérito;
 Aparente rigidez na instrução;
 Rigidez tendencial no julgamento.
Referentes Legais e Doutrinários – 1º/f), 303º, 309º, 358º, 359º e 379º
Ponto de Vista Doutrinário


Do ponto de vista doutrinário, concorda-se que o objeto do processo deve manter-se
essencialmente idêntico entre o acusado, o conhecido e o decidido…
A questão é COMO?
o Não temos no CPP um critério para aferir essa identidade – não temos na lei
um conceito de identidade.
o

O que temos é um critério para aferir as variações de identidade - são
conceitos que são de fronteira, para saber quando é que existe algum limite à
decisão.
Conceitos:
o Conceito de alteração substancial de factos;
o Conceito de alteração não substancial de factos;
o Conceito de alteração da qualificação jurídica.
Ponto de Vista Legal



O CPP só define o primeiro conceito elencado pela doutrina– ASF – 1º/f).
o Este artigo dá conteúdo ao conceito de ASF.
o Depois, vai se aplicando essa definição ao longo do CPP = dizendo o que é ou
não permitido por ser ou não ser uma alteração substancial de facto.
 = vão dizendo as condições e limites para que se possa conhecer as
alterações sejam ou não substanciais.
o Em regra, ASF não são permitidas. O que seja ANSF pode ser permitido em
certas condições.
Ou seja, o CPP não exige essa identidade como a doutrina.
o Aqui, é a partir de uma peça fundamental – a acusação – que se afere as
variações do objeto na fase do inquérito, visto que se trabalha a partir da
acusação.
 Artigos -> 303º (instrução) até 309º (nulidade).
 Nota – no 303º não se lê que o objeto tem de ser idêntico, o
que regula são as variações factuais.
 Isto permite explanar o que é que o TIC pode conhecer.
o + Para a matéria do julgamento, pronúncia de decisão:
 É usada a mesma técnica jurídica.
 Não diz que tem de ser idêntica a decisão e a acusação, mas que há
limites decisórios:
 Se há uma AFNS - 358º;
o Permite variar os factos.
 AFS - 359º;
o não permite variar os factos.
 Mera alteração de qualificação jurídica – 358º/Nº3;
 Casos de nulidade - 379º:
o Não se diz que a pronúncia tem de ser igual à
acusação, o que acontece é que se usa o conceito de
alteração substancial de factos como uma alteração
“intolerável” que em princípio não pode ser aceite.
 V. 311º - usa a alteração substancial para a recusa parcial da
acusação.
 Normas para recurso – 379º, 424º.
Nota - A técnica jurídica do nosso CPP não é a mesma que usada noutros sistemas
jurídicos próximos do nosso, na EU é diferente:
o A nossa lei não trata como sendo um problema de identidade do objeto como
faz a doutrina - para aplicar a lei, esse problema concretiza-se através do
o
conceito operativo de alteração de factos substancial ou não substancial e
por isso os referendos fundamentais são estes.
Existem outras normas:
 284º - acusação particular que estabelece a vinculação temática;
 286º - requerimento da instrução;
 311º - usa a alteração substancial para a recusa parcial da acusação.
O Conceito de Alteração Substancial de Facto no CPP e a Estrutura Bipartida: (i) Alteração de
factos e (ii) sua qualificação como substancial
Nota Introdutória



No 1º/f) lemos que a alteração substancial de factos é aquela que tiver por efeito a
imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das
sanções aplicável.
MAS esta definição do CPP é incompleta.
o Na verdade, o conceito de alteração substancial de facto tem uma estrutura
bipartida – pressupõe 2 operações hermenêuticas de concretização:
 1º - Pressupõe que exista uma alteração de factos;
 2º - Pressupõe que essa possa ser qualificada como substancial
o Ela só nos diz quando é que é uma ASF, e não quando há uma alteração de
factos.
 = a realidade “alteração de factos” não está definida, o que está é a
sua qualificação enquanto substancial.
Assim, para aplicarmos corretamente este conceito nas várias normas que o referem,
o intérprete tem de:
o 1º - saber o que é uma alteração de factos.
 Tem de ser qualificado pela doutrina.
o 2º - saber quando é que é “substancial” e quando é “não substancial”.
 Esta é resolvida no CPP.
Alteração de Factos


Como não está definido na lei, cabe à doutrina determinar quando é que há uma
alteração de factos + formular critérios.
FCP:
o Fez o seu próprio critério:
 (i) Variação do complexo fático que existe no processo (e não outros
factos distintos ou outro acontecimento histórico social)
 (ii) Critério da necessidade de contraditório: novos factos,
modificação de factos ou supressão de factos – necessidade audição
dos interessados.
(i) Variação do complexo fático que existe no processo (e não outros factos distintos ou outro
acontecimento histórico social)

Uma variação de factos é uma variação da base factual (que pode dar origem a uma
alteração substancial ou não substancial) = é uma modificação de factos que já estão
no processo.
o


=/= Se não for uma variação mas uma adição de factos novos (que não
alteram aquela história, mas sim acrescentam outra história) aí já não é uma
alteração de factos.
o TPB usa a expressão de “factos completamente novos”.
Exemplo – caso em que se julga o crime de furto em abril:
o O assalto da casa em janeiro que surgiu no julgamento do caso do assalto de
abril é uma outra história, um outro complexo fático e não uma variação do
primeiro.
 = são factos completamente novos.
 Não podem ser conhecidos pelo tribunal porque nem sequer
são uma modificação dos factos que estão no processo.
Resumindo:
o Só existe alteração de factos quando existe modificação do complexo fático
que já está no processo e não o aparecimento de factos completamente
distintos que pertencem a outra história.
(ii) Critério da necessidade de contraditório: novos factos, modificação de factos ou supressão
de factos – necessidade audição dos interessados


Quando é que existe uma modificação que deve ser conhecida como alteração de
factos, independentemente de depois se concluir se é substancial ou não? O que é que
existe de comum entre os artigos 358º e 359º?
o = Padrão Mínimo:
 Se existir uma alteração de factos, motivam o contraditório.
 A qualificação como substancial ou não substancial é uma
qualificação que se faz sobre uma realidade que já existe – nos
dois casos ocorre o conceito comum que é a alteração de
factos.
o Quando é que motivam o contraditório?
 Quando são acrescentados outros factos ao que lá estão;
 São alterados ou são suprimidos os que lá estão.
 Alteração = Altera-se alguma coisa no facto que implica que
em parte ele subsiste mas se modifique algum aspeto.
o e.g foi subtraído um relógio mas em vez de ser um
Tissot é um Ómega.
 = Não estamos a discutir um outro relógio,
simplesmente há uma alteração da marca do
relógio, o facto é modificado.
 Supressão = Arguido tem expetativa de contraditório, porque
os factos estavam lá, e depois desapareceram.
o Acaba, também, por ser uma alteração dos factos.
Razão do Contraditório:
o A necessidade do contraditório (nos casos em que são acrescentados novos
factos, são alterados ou são suprimidos) deve-se ao facto do sujeito
processual, que pode ser afetado com essa alteração, não conhecer tal facto.
o Com o contraditório = arguido fica a conhecer o conteúdo factual:
 O arguido é acusado, vai a julgamento.

o
o
Conhece o conteúdo da acusação e pode pronunciar-se sobre ela
apresentando uma contestação.
Então, para haver alteração de factos tem de haver modificação do conteúdo
factual que faça funcionar no mínimo o contraditório, alterando-se um facto.
Explicação Prática:
 Exige-se contraditório quando aparece algo que não estava na
acusação ou quando houve uma modificação (=dizia-se uma coisa de
uma maneira, mas passou a dizer se de outra maneira.)
 Nestes casos, o arguido pronunciou-se sobre uma coisa e está
a ser julgado de forma diferente.
Resumo - Critério


O padrão mínimo de haver uma alteração de factos é quando esta alteração
corresponde a uma variação factual que motiva o contraditório.
Em que casos é motivado o contraditório?
o Quando seja um novo facto, uma modificação ou uma supressão de factos.
Qualificação como Substancial - pena máxima mais grave ou crime diverso (agressão típica a
outro bem jurídico)




O nosso CPP utiliza dois critérios.
1º - Critério Quantitativo – 1º/f):
o Há uma ASF quando a alteração de factos der origem a uma pena mais grave.
2º - Critério Qualitativo:
o Quando a alteração de factos não gera uma pena mais grave, mas faz com que
seja outro crime.
o Nota – Conceito de Crime Diverso:
 A lei não diz o que é um crime diverso = é a doutrina que o faz.
 Teresa Beleza:
 Critério da agressão típica a outro bem jurídico.
o =/= o crime não é diverso quando for uma agressão ao
mesmo BJ.
 + TPB apresenta o conceito de alteração de factos substancial
como tendo uma dimensão naturalística (ser uma alteração
de factos) e uma dimensão normativa (a sua qualificação
como substantiva)
 FCP:
 Defende que nos devemos orientar pelo critério de BJ da TPB:
o É o mais seguro;
o Está minimamente de acordo com o princípio da
fragmentariedade do DP.
o É preferível a qualquer outro critério.
Densificação – Casos discutidos na Doutrina Portuguesa:
o Estudo de FCP e TPB sobre o conceito de alteração de factos.
o Existe a tendência jurisprudencial de fazer uma interpretação restritiva, no
sentido de que há variações que são meras concretizações da acusação que
não constituem alteração de factos:

o
Especificação de factos mais genéricos, pormenores irrelevantes para
a realização típica (como alterações na quantidade de droga ou
alterações descritivas sobre o conjunto de objetos furtados)
Uma nova imputação adicional, que não conste da acusação, é um novo facto:
 Exemplo - acusação por burla qualificada e decisão por burla
qualificada em concurso efetivo com falsificação de documentos.
 = Vendo relógio que roubei e digo à pessoa que ele foi
propriedade de Churchill.
 MP acusa alguém de BQ e TJ diz que há BQ mas essa
falsificação de documentos é um crime autónomo.
o = O acontecimento histórico é o mesmo, não se pode
separar.
o Se o tribunal entende que há falsificação de
documentos, tem de considerar tudo no mesmo
conjunto = princípio da indivisibilidade.
Momentos Processuais de Fixação do Objeto do Processo antes e depois da Acusação




Regra = os factos fixam-se na acusação.
o Isto faz parte da própria estrutura acusatória.
o Mas há duas exceções – em alguns casos, é possível haver uma fixação do
objeto do processo antes da acusação e noutros casos, depois da acusação.
Quando falamos da alteração do objeto do processo, referimo-nos a dois momentos =
a acusação e a pronúncia = podemos partir de 2 princípios fundamentais para
responder em que momento do processo é que se fixa o objeto do processo.
Princípio 1 – Em regra, o objeto do processo fixa-se na acusação:
o No momento de acusação (283º ou 285º) fixa-se um objeto do processo + a
partir daí começam a aferir-se as variações factuais em relação a esse objeto
do processo.
Princípio 2 – Em regra, o objeto do processo é variável antes da acusação:
o Isto porque o objeto só se fixa na acusação = durante o inquérito não há
cristalização do objeto do processo.
o Exceções – Doutor Souto Moura:
 Há situações em que mesmo antes da acusação se identifica um
conjunto de factos imputáveis ao agente dos quais se retiram
consequências jurídicas e esses factos ficam cristalizados.
 Nestes casos, existe uma fixação do objeto do processo
mesmo antes da acusação.
 Existe um efeito preclusivo semelhante ao caso julgado.
o A partir do momento em que os factos foram
processualmente monitorizados, esses factos não
podem voltar a ser utilizados/apreciados.
 Casos:
 Arquivamento em caso de dispensa de pena – 280º;
 Suspensão provisória do processo com arquivamento
subsequente – 281º;
 Situações de mediação;
 Homologação da desistência.
Outros Momentos Relevantes


Requerimento de Abertura de Instrução:
o Caso em que se pode alterar o objeto do processo mesmo depois da
acusação.
o Resulta do confronto do 284º (acusação pelo assistente) e 287º (RAI pelo
assistente).
o = O assistente pode, dentro do que foi o âmbito do inquérito, introduzir factos
e pedir prova para factos que não foram do inquérito.
 O requerimento do 287º é um momento de regulação do objeto do
processo.
 Aqui, ele introduz esses factos diversos ou alterados, de forma LEGAL
no processo.
 Isto porque, materialmente, o RAI é uma acusação.
o Exemplo:
 MP faz acusação pelo 131º - homicídio simples.
 Assistente entende que aquilo é tentativa de homicídio, mas
qualificada.
 Não invoca só uma diferente qualificação jurídica, como
acrescenta factos.
 Como passa de mais grave para menos grave = alteração
substancial de factos.
 O assistente não pode deduzir acusação pelo 284º:
 Há uma limitação legal ao conteúdo factual da acusação do
assistente.
 Ele pode acrescentar outros factos desde que não implique
alteração substancial.
 Se o assistente acrescenta factos que fazem com que a tentativa de
homicídio passe para homicídio qualificada, tem de ser através do RAI
- 287º:
 Este permite dizer que o objeto do processo pode ser
substancialmente alterado pelo assistente.
 Estes factos serão atendidos pelo Juiz de Instrução = vai poder
conhecer o conteúdo da acusação, do RAI e o que for
apresentado pela defesa.
Na pronúncia após o debate instrutório, o tribunal não pode conhecer alterações
substanciais de facto em relação à acusação ou à RAI:
o Se o fizer, a decisão instrutória é nula = confronto do 303º/Nº3 e 309º/Nº1.
o 303º - proibição de conhecimento de alterações substanciais.
o 309º/Nº1
 Pode ser uma nulidade parcial da decisão instrutória:
 A decisão instrutória será nula na parte em que ultrapasse o
conteúdo da acusação e do RAI e daí signifique uma alteração
substancial de factos.
o 309º/Nº2:
 Estabelece que esta nulidade tem de ser arguida no prazo de 8 dias a
contar da notificação da pronúncia.

= é proibido conhecer na pronúncia factos que impliquem uma alteração substancial
em relação à acusação e ao RAI, isso gera uma invalidade parcial ou total, MAS é


uma nulidade mista dependente de arguição e dependente do prazo:
 Se não for arguida dentro do prazo, a invalidade fica sanada
com o decurso do prazo.
 Passado o prazo, a alteração fica legitimada = vai a julgamento
já não como uma alteração substancial, mas como uma
variação tacitamente consentida no objeto do processo.
 Exemplo – 309º/Nº2:
 Imagine-se que o MP acusa por homicídio privilegiado
(133º/Nº1 CP).
 O assistente no RAI diz que é homicídio simples (131º CP).
 É produzida prova e um juiz completamente delirante diz que
há homicídio qualificado (132º CP):
o = Esta pronúncia, na parte que factualmente exceda o
conteúdo da acusação e do RAI, é nula:
 Excede o conteúdo máximo da imputação,
que era o conteúdo que estava no RAI.
o MAS se não for arguida dentro do prazo de oito dias,
vai a julgamento mesmo assim porque a invalidade
está sanada pelo decurso do prazo.
o = O tribunal de julgamento poderia conhecer o crime
como homicídio qualificado.
No saneamento do processo - 311º:
o Primeiro, o legislador contempla a possibilidade de haver saneamento.
o Segundo, a possibilidade de existir uma rejeição parcial de algumas acusações
se implicarem uma alteração substancial de factos – 311º/Nº2/b):
 O juiz de julgamento pode controlar o princípio da vinculação
temática em matéria das acusações:
 Pode controlar a acusação do assistente, que está
tematicamente vinculada à do MP – 284º;
 Pode controlar a acusação do MP, que está tematicamente
vinculada, nos crimes particulares, à do assistente – 285º;
 MAS este poder é condicionado:
 1º - O juiz não pode alterar positivamente o objeto do
processo no saneamento:
o = Não pode acrescentar factos novos.
 2º - Só pode exercer esse poder se não tiver havido instrução:
o Se tiver havido instrução, prevalece a decisão
instrutória, do JIC = o JJ não pode controlar estas
acusações.
No julgamento e sentença:
o Aqui importa ver qual é o referente para o juiz de julgamento em termos de
vinculação temática.
o Temos de saber qual é o referente para a sentença para sabermos se houve
ou não alteração substancial e isso depende de ter ou não havido instrução:
 Se houve instrução, o juiz do julgamento está vinculado à pronúncia;


Se não houve instrução, o conteúdo da sentença está dependente da
acusação pública, eventual acusação particular e eventual
contestação apresentada pelo arguido.
No recurso:
o Se existir recurso, o tribunal de recurso faz um julgamento cujo conteúdo
factual é aquilo que estiver na sentença do tribunal da primeira instância.
o MAS nem sempre a agravação de responsabilidade em recurso é ilegítima.
o Critério – 409º - proibição de reformatio in peju.
 O tribunal de recurso não pode, em alguns casos, atribuir uma pena
mais grave do que foi atribuído em primeira instância.
 Esta proibição não é absoluta - o tribunal superior só está
condicionado em 2 situações:
o Ser o recurso exclusivamente interposto pelo arguido;
o Ser o recurso interposto pelo MP a favor do arguido.
o -> basicamente, este princípio significa uma proibição
decisória de agravar a responsabilidade do
recorrente.
 Se, porventura, o recurso for interposto pelo MP e pelo arguido por
razões diferentes já não vigora esse princípio.
 + Também não vigora sempre que o MP recorra em sentido
desfavorável ao arguido.
o Nota - este não é problema de objeto do processo, mas de vinculação
temática do tribunal de recurso ao tribunal da primeira instância:
 Esta limitação decisória tem razões próprias relacionadas com as
garantias de defesa e não é um problema do objeto do processo.
o Resumo:
 (i) O tribunal de recurso também está limitado pelo regime das
alterações substanciais.
 (ii) Pode haver limitações decisórias que resultam da reformatio in
peju mas isso não se confunde com o objeto do processo;
 e (iii) As limitações só existem nos casos previstos do 409º.
Delimitação Positiva e Negativa do Problema

Casos que não são alterações substanciais de factos – 358º e 359º:
o A falta de provas de factos favoráveis;
o O regime dos factos completamente novos;
o A alteração da qualificação jurídica.
A falta de provas de factos favoráveis


A falta de provas de factos favoráveis pode gerar uma situação em que não se imputa
um crime menos grave, mas um mais grave.
Exemplo:
o Imaginemos que é feita uma acusação pelo crime de homicídio privilegiado
tentado com emoção violenta e a compreensibilidade dessa emoção (133º CP
+ 22º CP) – ou seja, com circunstâncias que o atenuam.
o No julgamento, prova-se que houve tentativa de homicídio, mas não se prova
a emoção violenta.


Ou seja, não estão provadas as circunstâncias que privilegiam o
homicídio privilegiado.
 = Essa emoção era um facto favorável porque diminuía a
culpa do arguido.
 O facto de estar no processo beneficia o agente, mas depois
não se prova na audiência do julgado.
o Se não se prova, deixamos de ter uma situação enquadrável no homicídio
privilegiado (133º CP), mas no homicídio simples (131º CP).
= A falta de prova de um facto favorável não dá origem a alteração de factos:
o Os factos estão lá, foram conhecidos, simplesmente não se consideram
provados.
 Não há alteração de factos, não se alteraram nem se suprimiram
factos.
o O que temos na verdade é uma alteração da qualificação jurídica.
o A falta de prova do facto favorável tem como consequência a aplicação do
crime mais grave.
O regime dos factos completamente novos




Factos completamente novo:
o = Factos que surgem e são estranhos à unidade histórico-social dos
acontecimentos levados para o processo.
Estes factos completamente novos não são alterações do objeto do processo, são
novos objetos do processo.
Exemplo – Assaltos:
o Imagine-se que o arguido é acusado de assaltar uma vivenda em abril de 2018.
o Depois, em julgamento, prova-se que o mesmo arguido tinha assaltado na
mesma rua outra vivenda em janeiro de 2018.
 É um facto completamente novo.
 = Não é a variação do crime da acusação, é um outro crime = com
outro objeto, noutra casa, noutra altura.
 É uma unidade histórico-social completamente autónoma e
distinta da outra.
Regime aplicável:
o Não se aplica o 358º nem o 359º - estas normas estão pensadas para a
variação da alteração dos factos que são levados a julgamento.
 Aqui não há alteração de factos, há é novos factos.
 Se estes factos completamente novos fossem conhecidos seria uma
violação da estrutura acusatória.
o Então, o regime aplicável é o de não permitir que perturbem o processo onde
surgem e enviá-los como notícia do crime de um novo inquérito.
 Os factos completamente novos não podem ser apropriados pelo
processo em que surgem.
o O que acontece é que se extrai certidão e o MP dá origem a um processo
autónomo.
Alteração da qualificação jurídica


A alteração da qualificação jurídica é uma situação em que não se alteram os factos,
mas aplicam-se aos mesmos factos um diferente enquadramento jurídico.
2 situações:
o Se for alteração de factos – 358º ou 359º.
o Se não for alteração de factos:
 Ou é um facto completamente novo que dá origem a novo processo;
 Ou, não sendo um facto completamente novo, há uma alteração da
qualificação jurídica e aplica-se o 358º/Nº3.
 358º/Nº3 – remete para o Nº1.
Teoria – AQJ



No inquérito:
o Pode acontecer que o inquérito comece com um enquadramento jurídico e
depois venha a ter outro quando se ponderam os vários elementos.
o Como o inquérito não é uma fase de contraditório, não é matéria do
358º/Nº3.
Na instrução:
o Aqui já é possível operar a mudança da qualificação jurídica, mas tem
o de se respeitar o contraditório.
o Respeitar o contraditório – 303º/Nº5:
 A nossa lei exige expressamente que se cumpra o contraditório – Nº5;
 Se não se respeitar – 309º - nulidade da decisão instrutória para a
alteração substancial de factos.
o Mas no 303º temos várias situações:
 A alteração substancial é só uma delas.
 O 309º só comina com a nulidade a ASF que aconteça na pronúncia.
 = Se for uma mera alteração da qualificação jurídica = mera
irregularidade - 118º.
 -> Isto tem que ver com o princípio da legalidade = só há
nulidade se a lei declarar isto expressamente.
 Então, para a AQJ, se não houver contraditório, não há
nulidade, há é irregularidade.
No julgamento:
o Desde 1998 – regime específico do 358º/Nº3, que remete para o Nº1:
 Basicamente, à AQJ aplica-se o regime da ANSF.

o
= Havendo uma AQJ, o tribunal concede à defesa o tempo
estritamente necessário para a preparação da defesa =
direito ao contraditório.
Aqui, surgia o problema sobre o desvalor do ato processual, se não fosse
dado tempo à defesa para fazer a preparação - temos que introduzir aqui
dados históricos – o que aconteceu historicamente que faz com que tenhamos
um problema jurídico?
 379º/Nº1/b) – prevê a hipótese de condenação por factos diversos.
 Já existia antes do 358º/Nº3.
 Até 1998, não existia o 358º/Nº3, só existia o Nº1 e Nº2 = não havia
enquadramento jurídico para AQJ:
 A doutrina discutia se a alteração da qualificação jurídica era
ou não livre, ou se tinha algum condicionamento.
 A norma estava prevista para factos diversos, que depois
seriam uma alteração substancial ou não substancial de factos.
o + Quando a norma do 359º/Nº1/b) refere factos
diversos é porque foi construída para uma situação
em que não existia o Nº3.
 + Se a norma refere factos diversos, não
contempla a situação da mera AQJ:
 Nesta não há factos diversos, os
factos são os mesmos com outro
enquadramento.
 O 379º foi feito antes, quando não existia o 358º/Nº3 – o 358º
literalmente não comporta a AQJ MAS a intenção do legislador no
379º é conferir tutela jurídica ao regime do 358º e 359º:
 FCP – devemos fazer uma interpretação extensiva e atualista
do 379º/Nº1/b) e contemplar todas as situações do 358º e
359º, mesmo que no caso de AQJ não haja ´factos diversos’.
 = Na fase de julgamento, a AQJ tem de respeitar o
contraditório exigido pelo 358º/Nº3.
o Se não respeitar, origina a nulidade da sentença –
379º/Nº1/b).
 -> Por interpretação extensiva e atualista.
 Porque é que o legislador incluiu a qualificação jurídica aqui?
 O código foi feito em 1987.
 Nessa altura, a doutrina entendia que existiam limitações à
decisão do tribunal em matéria de factos, mas não em
matéria jurídica:
o Isto porque esta é uma matéria técnica e entendia-se
que o arguido se defendia dos factos e não do seu
enquadramento técnico.
 A doutrina moderna não aceitou isto e veio dizer que o
arguido tanto se defende dos factos como do enquadramento
jurídico + o contraditório pode abranger também questões de
direito.
o
o
= Não é correto fazer um leitura diferente porque
condiciona a decisão sobre a atribuição de
responsabilidade e não é compatível com o
contraditório.
 A nível de jurisprudência:
 Acórdão STJ 2/93:
o Veio afirmar que o tribunal, não alterando os factos,
poderia utilizar qualquer enquadramento jurídico.
 = ou seja, que não havia limites à qualificação
jurídica por um tribunal.
 Acordão TC 449/97 – o caso subiu ao TC:
o Veio dizer que esta alteração jurídica é livre mas há
limites – está condicionada aos valores do sistema,
sob pena de violação das garantias de defesa.
o Havia vários entendimentos:
 STJ e Jurisprudência entendiam que a AQJ era
possível, a divergência era sobre as condições
em que isto se podia fazer. A doutrina
entendia que se devia respeitar o
contraditório.
 TPB – entendia que havia lacuna no código,
mas dizia que a situação era semelhante à do
358º/Nº1 – devia-se aplicar por analogia.
 = A AQJ pode estar sujeita ao regime
de AF mas não é AF, é uma realidade
diferente.
 Podia-se, então, colocar outro EJ para
os mesmos factos.
 FD – a situação já estava prevista no próprio
358º/Nº1 por ser uma AQJ = no fundo, não é
uma alteração substancial de factos, donde
será remetida para essa norma.
o Acórdão deu razão a TPB:
 Não está previsto, mas tem de ser tratado
como matéria sujeita a contraditório.
 Legislador, em 1998, resolveu o problema através da alteração da lei 358º/Nº3:
 A matéria não é alteração de factos, mas está sujeita ao
mesmo regime.
 Assim = pode alterar-se a qualificação jurídica, mas tem de se
dar oportunidade à defesa para se pronunciar:
o Se o fizer, altera livre e legalmente a qualificação
jurídica.
o Se não, viola o contraditório e incorre numa nulidade.
Para FCP:
 Temos de fazer uma interpretação atualista do 379º/Nº1/b):
 A CRP estabelece que o PP respeita todas as garantias de defesa:
 Não distingue entre a matéria de facto e a de direito.


+ O contraditório faz-se em relação a questão de factos e
questões de direito.
Por isso a solução do 359º/Nº3 é correta:
 A AQF não é completamente livre, tem de ser sujeita a
contraditório.
 Caso contrário = nulidade por violação do 358º e por violação
do 379º/Nº1/b)
Resumo
A alteração da qualificação jurídica é livre, porém, não obstante, é condicionada em
certas fases:
o No inquérito – livre, mas com os efeitos referidos seguidamente.
 Há uma maior liberdade, do ponto de vista genérico.
o Na instrução – AQJ condicionada:
 303º/Nº5 – contraditório.
 Efeito de não haver contraditório:
 309º/Nº1 – não contempla a AQJ:
o Então, se for ASF, tem de ser sujeita ao contraditório;
o Se for AQJ, e não for sujeita ao contraditório, é uma
mera irregularidade.
 118º - mera irregularidade.
o No julgamento – AQJ condicionada:
 358º/Nº3 - o tribunal concede o tempo estritamente necessário para a
defesa.
 = Necessidade de Contraditório – é a oportunidade da defesa
se pronunciar.
 379º - temos de fazer uma interpretação extensiva atualista.
 =Efeito será a nulidade, se se violar o regime do contraditório.
Efeitos da Alteração da Qualificação Jurídica – Consequências Jurídicas


Temos 4 temas.
Conclusão = há liberdade de alteração da qualificação jurídica no inquérito, mas isso
não quer dizer que não haja efeitos dessa alteração.
Competência do Tribunal

Se muda a qualificação jurídica, pode passar-se para um crime com pena mais grave, o
que pode mudar a competência do tribunal.
Admissibilidade das Medidas de Coação


Pode mudar o regime das medidas de coação porque estas medidas dependem do
crime que for imputado - se se muda a qualificação jurídica dos factos pode deixar de
existir o crime que era imputado e que justificava a medida de coação.
Isso acontece sempre que há um catálogo:
o Exemplo – prisão preventiva:



O catálogo do 202º evidencia os crimes que justificam essa medida.
Se a qualificação jurídica passar a ser outra que não consta do
catálogo pode deixar de se justificar a medida de coação.
+ Quando se muda a qualificação jurídica no inquérito, pode estar-se a
pôr em causa as medidas de coação aplicadas pelo que têm de ser
imediatamente revistas.
Admissibilidade de Certos Meios de Prova

Exemplo – escutas telefónicas – 187º:
o Apenas são admissíveis em relação a certos crimes que correspondem a um
catálogo.
o Igualmente aqui, se se muda a qualificação jurídica, pode estar a mudar-se
completamente a admissibilidade do regime de certos meios de provas, se já
não corresponderem a crimes do ‘catálogo’.
Exigência de Pressupostos Processuais (queixa, prazos de prescrição)

Exemplo – Caso em que se se alterar a qualificação jurídica, pode passar-se de um
crime público para um crime semipúblico:
o Se passarmos para um crime SP, sem queixa o processo não poderá continuar.
+ Posição de Germano Marques da Silva sobre a AQJ



Considera que a AQJ é particularmente significativa e gera limitações à competência
decisória do tribunal do julgamento.
Porquê?
o Dantes, referia que a AQJ implicaria sempre uma alteração dos factos.
o Agora refere que a AQJ implica alterações da competência do tribunal,
possível recurso ao júri e possibilidade de confissão.
o + Sempre que o tribunal altera a qualificação jurídica, fica limitado pela pena
do crime anteriormente imputado:
 Leitura semelhante à do 16º/Nº3 - mecanismo de reenvio dos
processos do tribunal coletivo para o tribunal singular.
 Exemplo:
 Imaginemos uma tentativa de homicídio privilegiado (133º
CP, 22º CP) em que depois, o tribunal na fase de julgamento
considera que é uma tentativa de homicídio simples (131º CP
+ 22º CP).
 Para GMS, o facto de uma série de pressupostos processuais
se terem desencadeado com base nesse crime limita a
competência decisória do tribunal de julgamento.
o = Não poderia decidir para além da pena do
homicídio privilegiado.
 Poderia imputar na forma simples, mas estaria
limitado pelo enquadramento anterior que
levou o arguido a julgamento.
Visão crítica:
o É um argumento interessante que reforça as garantias de defesa, mas que
não tem qualquer base legal.
o

Na nossa lei esta limitação aos poderes decisórios do tribunal teria de estar
explicita/expressa:
 (como está, e.g, a proibição de reformation in pejus ou do 16º/Nº3).
PORTANTO uma AQJ pode sim levar à aplicação de uma pena mais grave do que o
crime inicialmente imputado.
o Única exigência = que se respeite o contraditório.
o + Razão mais substancial:
 Entre nós, o julgamento é a fase central de atribuição da
responsabilidade = a acusação é meramente indiciária.
 Não é possível limitar os poderes decisórios do tribunal com
base numa imputação meramente indiciária.
 Para que isso fosse possível, teria de haver lei expressa.
+ Entendimento da Católica


Têm uma perspetiva diferente da ideia defendida por GMS, criticada por TPB:
o Ideia original de GMS - sempre que se alterava a qualificação jurídica, se altera
os factos.
 + A consciência da ilicitude enquanto pressuposto da culpa tinha uma
certa cristalização.
 Quando se imputa crime, tem de haver consistência da ilicitude.
 Se se muda o crime, altera-se factos.
 Na verdade, o GMS mistura consciência do tipo com consciência de
ilicitude:
 CI é que o facto contraria a ordem jurídica, e não de um tipo
em concreto.
 + A consciência da ilicitude tanto pode ser efetiva como pode ser
elegível, permite um juízo de censura.
 + A consciência de ilicitude não é um facto empírico, o agente não tem
consciência da ilicitude, mas deveria ter.
 -> Com isto, TPB neutralizou o argumento de GMS e regressou
à questão de que se pode ter AQJ sem se ter uma alteração
dos factos.
A questão tem surgido de maneira diferente nos profs da UCP:
o Ideia de que quando se altera o tipo incriminador está-se a produzir uma
decisão que independentemente da questão da consciência da ilicitude, pode
ser uma situação que é desfavorável ao arguido.
 Tem de haver limites de consciência desta alteração quando essa
alteração puser em causa o direito de defesa.
o Os da UCP vão mais longe:
 Se a acusação tem de estabelecer um certo EJ e o TJulg quiser alterar
ele pode mas prevê-se limitação decisória.
 Exemplo:
 A acusação era por HP e a pena máxima era 5 anos.
 Se o MP fez uma acusação e depois o TJ altera, então o
tribunal pode fazê-lo mas está limitado pela pena mais grave
que vier da acusação.
o Pena HP até 5 anos, a do HS até aos 16.
o

O Tjulg pode alterar a qualificação jurídica de HP para
HS MAS não pode condenar por pena superior a 5
anos.
 Isto não é assim tão estranho = o mesmo acontece com o
16º/Nº3.
Ora TPB e FCP pronunciam-se contra:
o 1º - Não se pode fazer comparação com 16º/Nº3 e Nº4:
 Aqui não temos comparação totalmente explícita.
o 2º - Isto, do ponto de vista processual e substancial não é admissível = esta
doutrina está-nos a dizer que deixa de aplicar o 133º e começa a aplicar 131º
com a norma do 131º, violando o princípio da legalidade.
o 3º - Isto é um absurdo, porque o tribunal deixa de aplicar um crime e aplica
uma norma de sanção e depois …
Regime das Variações do Objeto do Processo
Nota Prévia

Ocorrendo uma alteração, há 2 tipos de problemas:
o Saber o que acontece aos novos factos, às alterações:
 Regime das variações do objeto do processo;
 Saber se se trata de uma alteração do 358º (ASF) ou do 359º
(ANSF)
o Isto verifica-se pelo efeito da alteração:
 Se der origem a uma pena mais grave ou a um
crime diverso = é substancial.
 Se não = é não substancial.
o Isto é essencial = porque depois os regimes são
diferentes.
 Quando é que os novos factos são autonomizáveis;
o Saber o que acontece ao processo em que os factos surgem:
 Efeitos das alterações substanciais de facto;
Alteração Não Substancial dos Factos – 358º

Temos uma ANSF quando não se gera uma pena mais grave nem é um crime mais
grave.
➔ Se for respeitado o contraditório, a alteração é lícita



358º/Nº1 - havendo uma ANSF, o tribunal tem de respeitar o contraditório:
o Tem de dar um prazo à defesa para se pronunciar sobre a alteração.
Se for cumprida essa exigência, legitima-se a alteração, independentemente do que a
defesa diga:
o Mesmo que a defesa discorde, se oponha ou não diga nada deixando passar o
prazo sem se pronunciar, a alteração é lícita.
Resumo:
o
Se cumprida a exigência de dar um prazo para preparação da defesa, o
processo incorpora legalmente os novos factos que consubstanciam uma
ANSF.
➔ Se não for respeitado o contraditório, a alteração é ilícita e não pode ser conhecida


Se o tribunal conhecer uma alteração de factos fora do regime do contraditório, a
decisão é ilícita e dá origem a uma nulidade parcial nessa parte – 379º/Nº1/b).
V. 358º/Nº1 - Exige o prazo para o exercício do contraditório.
➔ Se os factos foram apresentados pelo arguido, não é necessário o contraditório



Estes factos podem ser apresentados durante a contestação ou durante a própria
audiência do julgamento.
= Os factos apresentados pelo arguido entram automática e licitamente no objeto do
processo - não é necessário contraditório.
o Ou seja, entendemos que a lei só exige que seja dado contraditório quando o
arguido não conhece o facto.
+ Não está previsto o contraditórios dos outros sujeitos processuais:
o A norma só refere o contraditório do arguido, não fala do contraditório do
MP ou do assistente.
 Não há qualquer nulidade, nem sequer há irregularidade, se não for
dado ao MP ou a assistente para se pronunciar.
 Isto vem do facto do legislador ter de respeitar o especial valor, dado
ao processo, relativo às garantias de defesa do arguido.
o Isto quer dizer que não se pode exigir que seja dado prazo ao MP ou ao
assistente enquanto condição legal do conhecimento.
Alteração Substancial dos Factos – 359º

ASF = se gera uma pena mais grave ou um crime mais grave.
➔ Se existir acordo o processo continua com as alterações substanciais



359º/Nº3 e Nº4 – prevê o “caso julgado de consenso”.
Admite-se que, se existir uma ASF no processo, é possível reformular
substancialmente o objeto do processo se houver um acordo entre todos os sujeitos
processuais, tribunal, MP, assistente, arguido e defensor do arguido.
o Limite desta faculdade de acordo:
 Não pode determinar a incompetência do tribunal.
 E.g:
 Se o caso estiver num tribunal singular, e a consideração da
ASF alterar para passar a ser da competência do tribunal
coletivo, deixa de ser possível o acordo.
o Não existe para factos completamente novos, apenas para ASF.
Note-se que um acordo entre todos os sujeitos processuais é algo muito difícil de
conseguir:
o Pouco provável que o arguido e o seu defensor aceitem alargar o objeto do
processo substancialmente.
➔ Se os novos factos tiverem autonomia, será instaurado um novo inquérito



359º/Nº1 e Nº2 - estabelecem o regime geral que se deve seguir nestes casos.
Regime:
o Perante novos factos autonomizáveis que alterem substancialmente o objeto
do processo, o tribunal não os pode conhecer:
 Tem de extrair certidão + será instaurado novo inquérito.
 A comunicação da alteração substancial de factos ao MP vale como
denúncia para ele proceda pelos novos factos se eles forem
autonomizáveis – 303º/Nº4.
Regra geral (e excetuando quando há acordo) há uma proibição de conhecimento dos
factos que geram uma ASF.
o = É por isto que dizemos que o regime do DRT PT, especialmente a partir de
2007, é tendencialmente rígido = pouco provável que no processo em curso
se façam ASF.
➔ Se os novos factos não tiverem autonomia, não podem ser tomados em conta pelo tribunal
para efeito de condenação (ou ficam preteridos (PPA) ou são usados para determinar a sanção
(FCP))



A solução deste caso, dos novos factos sem autonomia que não podem ser enviados
para outro processo, é uma grande dúvida na doutrina e na lei.
359º/Nº1:
o Estabelece que não podem ser tomados em conta para efeito de condenação
no processo em curso.
Interpretações:
o PPA:
 Os factos ficam esquecidos, não são considerados, ficam preteridos.
 Se eles saem do processo e tribunal não os pode conhecer, então não
se pode motivar um novo caso em função desse crime = esses factos
não poderão motivar uma condenação por crime.
o FCP:
 Pelo contrário, defende que podem ser conhecidos para efeito de
determinação da sanção.
 Discorda da interpretação do PPA - esclarece que esta está associada à
reforma de 2007:
 O 359º/Nº1 acrescentou a expressão “nem implica extinção
da instância”.
o Isto foi importante, porque havia quem entendesse
que no caso de alteração substancial de factos, o
melhor era terminar o processo e iniciar um novo
com que contemplasse todo o complexo factual (os já
existentes e os novos).
o Tal não seria admissível porque quando começa o
julgamento só podemos ter 2 decisões - condenação
ou absolvição.
 = A suspensão da instância ou outras decisões
formais do mesmo género não existem no PP.



Quer isto dizer que os factos ou ficam ou
saem, mas em qualquer das situações o
processo prossegue.
o Assim, pelo exposto, não deve ser aceite esta
interpretação que vai no sentido de preterir os factos
novos sem autonomia, pelo facto da sua
contemplação ter de provocar uma suspensão da
instância, hipótese que foi excluída pela reforma de
2007.
o A interpretação de PPA não só não tem apoio em
termos históricos (1º) como:
 2º - Não tem apoio na letra da lei:
 Não significa uma proibição de
conhecimento como critério de
determinação da pena.
 3º - O 71º/Nº2 CP tem um sistema aberto de
atenuantes e agravantes pelo que qualquer
circunstância de facto pode ser tida em conta
para determinação da pena.
 Não faz qualquer sentido o direito
substancial penal ser mais rígido que o
direito substantivo.
Assim, para FCP, a solução correta quando há ASF sem autonomia é
que não são alterações substanciais do objeto, mas meras alterações
de factos para ponderação da medida da pena.
 = Vai-se usar esse facto para determinar a pena concreta.
As variações de factos de determinação da pena concreta nunca
foram tratadas como alteração do objeto do processo porque o
sistema de agravantes e atenuantes é um sistema aberto.
 Esta solução é a correta porque gera uma maior congruência
entre o DP e o DPP e respeita a evolução histórica do preceito.
Quando é que os novos factos são autonomizáveis?


Depende de 2 requisitos:
1º - Tem de ser um facto que tenha por si tipicidade:
o Se o novo facto não corresponde a um tipo de crime, não tem autonomia
funcional = não pode motivar a abertura de inquérito.
o Exemplos:
 1 - Imaginemos que, num crime de homicídio, surge uma
premeditação ou um motivo fútil, ou uma relação de parentesco:
1. Estes factos não são autónomos porque não têm tipicidade.
 2 – Caso em que é imputado ao arguido um crime de furto simples,
mas comprova-se em julgamento que é um furto agravado pela
introdução em casa alheia.
1. Este facto novo que surge no processo (introdução em casa
alheia) corresponde por si a um tipo autónomo = justifica a
abertura de novo inquérito, sai do processo.
o


Se o facto tiver tipicidade pode sair do processo e dar origem a outro
inquérito, se puder constituir uma ‘matéria autónoma do inquérito’.
2º - Os factos não têm autonomia se implicarem uma alteração do objeto que está em
curso:
o Ou seja, o facto (para ter autonomia) tem de ser capaz de sair do processo
sem perturbar ou alterar o objeto do processo.
 = Se o alterar, é porque está intrinsecamente ligado e não é
autónomo.
o Exemplo – Tortura:
 Se nós pegarmos na tortura como facto de um homicídio, ficamos com
2 processos em que num se discute o homicídio e noutro a tortura –
isto iria descaracterizar o objeto do processo.
 (assim, para FCP, o facto não pode sair e é utilizado como elemento de
averiguação da situação concreta).
 -> Num caso como estes, o julgamento deve-se fazer com base no
131º + a tortura funciona como circunstancia agravante concreta.
Resumo:
o Os factos, para serem autonomizáveis, têm de ter autonomia própria perante
a lei e autonomia perante o objeto que já existe.
o Verificados estes 2 requisitos, o objeto do processo é cindível.
o + Consideração extra – um regime tendencialmente rígido obriga a que seja
cumprido o princípio da acusação:
 Não há julgamento sem acusação prévia.
 Uma vez feita a acusação, o MP não pode nem a retirar nem a
modificar substancialmente.
1. = Não há uma desistência do MP como há para os crimes
particulares e semipúblicos.
 Lado perverso deste sistema = o MP acusa por excesso, para permitir
variações para baixo:
1. E.g – o MP raramente acusa pelo homicídio privilegiado, acusa
antes pelo homicídio simples e, se for caso disso, depois
altera-se para baixo.
Efeitos das Alterações Substanciais de Factos sobre o Processo em curso

Esta questão está simplificada desde 2007:
o Até 2007, era a doutrina que dava a resposta.
 Houve várias interpretações que ficaram ultrapassadas pela evolução
da lei.
o Ou seja, sabemos que saem os factos, mas precisamos de saber o que é que
acontece ao processo.
o Opiniões:
 Havia quem entendesse que o processo se suspendia - ficava a
aguardar nova acusação com tudo.
 Havia quem entendesse que essa mesma solução se aplicava à
audiência de julgamento que ficava suspensa a aguardar a
reformulação do objeto que vinha doutro processo,
 + Havia quem entendesse que isso só se podia aplicar na instrução e
não no julgamento.

o Em 2007 - o legislador veio acabar com essa incerteza.
Notas Prévias:
o 1º - A questão sobre os efeitos no processo só se coloca para as alterações
substanciais não autonomizáveis:
 As autonomizáveis saem do processo + legislador estabelece que não
há extinção da instância (359º/Nº1) – o 1º processo continua, e se os
factos tiverem autonomia, mais tarde se faz um outro processo.
o 2º - Os efeitos variam consoante a fase processual.
Efeitos - Fases


No inquérito:
o Não há problema de existir uma variação factual porque o inquérito não está
cristalizado e pode incorporar todas as vicissitudes contratuais.
 = O inquérito tem capacidade jurídica para absorver as ASF
autonomizáveis.
 Tem possibilidade de gerar outros inquéritos autónomos.
 No fundo, as ASF são normalmente incorporadas no inquérito,
gerando apenas um alargamento da investigação.
Na instrução:
o O problema já tem uma certa complexidade.
 Especialmente porque já houve uma cristalização de factos.
 Se forem ASF autonomizáveis – 303º - devem sair do processo.
o Atentemos no regime antes de 2007 - Exemplo:
 Imagine-se que há uma acusação pelo crime de homicídio simples
(131º CP) e durante a instrução começam a revelar-se factos que
apontam para o homicídio qualificado (132º/Nº2 CP), que causariam
agravante.
 (Não houve constituição de assistente e os factos começaram
a surgir na instrução.)
 Como esta é um fase preliminar:
 Havia quem entendesse que o processo pelo homicídio
simples se suspendia, havia um novo processo pelo homicídio
qualificado com novo inquérito e nova acusação mais
complexa, que se juntavam os dois processos e seguiam para
o julgamento.
o Esta tese, de que o primeiro se suspendia e aguardava
a reformulação que vinha de um segundo processo,
era especialmente complexa = significava que havia
dois processos dentro do mesmo processo, duas
acusações com o mesmo objeto, e levantava
problemas de prazos de prescrição.
o -> O legislador acrescentou, e bem, na parte final do
303º/Nº3 que “nem implica extinção do processo”,
arrumando este assunto.
 Desde 2007 = não há absolvições da instância
nem suspensões de instância.
o Soluções – ASF não autonomizáveis:



303º/Nº3 - elas não podem sair.
Soluções:
 Acordo dos Sujeitos Processuais – 359º/Nº3 por analogia:
o Pensamento de que se os sujeitos processuais podem
acordar a reformulação do objeto do processo na
fase do julgamento (359º), então, por maioria de
razão, também o podem fazer na fase da instrução.
 + Se o juiz de instrução conhecer uma ASF que não podia
conhecer = nulidade da pronúncia que tem de ser arguida em
8 dias, 309º/Nº2 contrario sensu:
o Depois desse prazo, se ninguém denúncia, a nulidade
já não pode ser arguida e portanto, sana-se por
decurso do prazo.
 = Então, a inércia dos sujeitos processuais
pode levar à reformulação do processo.
o Há, aqui, uma convalidação da pronúncia que
conheceu de forma ilícita uma alteração substancial
de factos não autonomizáveis e que, por inércia dos
sujeitos processuais, passa a ser inatacável.
o Isto acaba por também convalidar o argumento
anterior, para dizer que é possível o acordo = se é
possível por inércia, então também é possível por
acordo.
No julgamento:
o Relembrando – casos de ASF – vai a julgamento um homicídio e surge a
premeditação, sendo esse facto não autonomizável.
o Ou há acordo = caso julgado consenso – 359º/Nº3.
o Ou então ASF são conhecidos para determinação da medida da pena (FCP) ou
são preteridos (PPA).
Resumo


A questão só é pertinente para as ASF não autonomizáveis:
o As autonomizáveis devem ser objeto de denúncia para novo inquérito ser
aberto.
Efeitos dependem das fases:
o No inquérito em curso:
 Sem problemas, porque o inquérito absorve as alterações substanciais
de factos.
o Na instrução:
 O 303º/Nº3 (após 2007) afasta todas as teses de suspensão da
instância;
 O processo pode absorver as alterações substanciais de factos não
autonomizáveis por acordo dos sujeitos processuais (359º/Nº3 por
analogia) ou por inércia destes (não arguirem nulidade no prazo de 8
dias, 309º/Nº2 a contrario sensu)
o No julgamento:

Ou há acordo (359º/Nº3) ou os novos factos (alteração substancial de
factos não autonomizáveis) ficam preteridas (PPA) ou são usadas para
determinar a sanção (FCP)
Casos da Última Aula – Objeto do Processo
Caso 1 - O MP acusa X por homicídio (131º CP) + no julgamento prova-se que houve avidez e
premeditação (132º/Nº1 e Nº2 e) e j). O que é que o TJ pode decidir?


Temos factos e depois começam a surgir factos que provam agravação.
Metodologia:
o 1º - Em rigor, deviamos provar que existe uma alteração de factos:
 Isto porque se adicionam factos que não eram conhecidos até aí aos
factos que estão no processo.
 Adiciona-se às circunstâncias nas quais foi realizado o
homicídio, é um aditamento de factos aos factos principais
que estão no processo.
o 2º - A alteração de factos é substancial?
 Temos 2 critérios – qualitativo (tipo de crime) e quantitativo (pena
legal)
 Aqui, o crime não é diverso, mas é uma penal legal mais grave:
 No homicídio simples – 16 anos.
 Neste, com premeditação e avidez, passa a ser 25 anos.
 = Corresponde a ASF – 1º/f) – “agravação dos limites máximos da
pena”.
o 3º - Devemos perguntar se o tribunal pode conhecer, quando o caso vai a
julgamento – matéria dos efeitos da ASF:
 Estamos perante reformulação legalmente permitida do objeto do
processo.
 Por parte do assistente:
 Como estamos perante uma ASF, temos de ir pelo RAI do
287º.
o O 284º permite que o assistente pode aditar factos
mas só pode ser ANSF.
 Estamos perante ASF não autonomizáveis:
 Tribunal pode conhecer os factos da acusação e do RAI:
o Para PPA, os factos seriam preteridos.
o Para FCP, os factos devem ser utilizados para
determinar a sanção.
o
O RAI reforma o objeto do processo, passa a incluir a
factualidade do 131º e circunstância do 132º, a
pronúncia pode ser feita pelo 132º.
Caso 2 – O MP acusa X de homicídio (131º CP)
Caso 3 - O MP acusa X de ter no seu estabelecimento máquinas de jogo ilegais (108º DL 422/98). As
máquinas são ilegais (jogos de fortuna e azar) de acordo com uma perícia para onde a acusação remete.
O Tribunal na sentença condena X por jogo ilegal e descreve como factos na sentença os factos que
estão na perícia (mas não na acusação). Porque sem os factos da perícia, não se poderia concluir que as
maquinas são ilegais. Os factos relevantes para a decisão são tanto os que estão presentes na acusação
como na perícia. A questão que se coloca é se a sentença é ou não legal por estar a usar factos que não
estão na acusação.


283º - Temos de ver o que é que é obrigatório constar da acusação:
o b) – a narração dos factos sintética:
 Percebemos que esta narração não tem de ser exaustiva.
Resolução do Tribunal:
o Decidiu que a acusação não era ilegal, porque a narração que a lei exige é
uma narração sintética.
o Ao mesmo tempo, disse que era um método pouco aconselhável mas possível:
 Mas percebeu-se pela sentença que o tribunal não gostou da forma
como a acusação geriu aqueles factos, apesar de considerar que
estava respeitada a acusação - entendendo que a remissão da
acusação para a perícia incorporava como factualidade aquilo que
estava descrito.
Caso 4 – O MP acusa X de homicídio privilegiado por compreensível emoção violenta (133º CP). O
Tribunal considera que não está provado o estado emotivo e que, a existir, não seria compreensível, e
condena X por homicídio simples (131º CP). Pode fazê-lo? Ao dizer que não aplica HP, o passo seguinte
numa relação de especialidade entre as normas seria passar para condenação por homicídio simples. O
problema aqui é que o crime tem pena até 5 anos e sai com um crime imputado com pena de 8 a 16.



Isto é um caso de alteração de qualificação jurídica.
Pode condenar por homicídio simples?
o Pode, respeitando o contraditório – 359º/Nº4.
o Tem de informar os SP desta nova alteração de qualificação jurídica e dar
tempo para se pronunciar.
Mas Escola da Católica:
o Se o MP fez uma acusação e depois o TJ altera, então o tribunal pode fazê-lo
mas está limitado pela pena mais grave que vier da acusação = 5 anos.
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