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Patologia Dentária em Mamíferos Exóticos: Dissertação de Mestrado

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA
Faculdade de Medicina Veterinária
PATOLOGIA DENTÁRIA EM MAMÍFEROS EXÓTICOS
PAULA JOÃO SANTOS FILIPE FARIA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA VETERINÁRIA
CONSTITUIÇÃO DO JÚRI
ORIENTADOR
Dr. Rui Filipe Galinho Patrício
Doutor João José Martins Afonso
Doutor Mário António Pereira da Slva Soares de Pinho
Dra. Sandra de Oliveira Tavares de Sousa Jesus
CO-ORIENTADOR
Doutor José Henrique Duarte Correia
2009
LISBOA
The Fremen were supreme in that quality the ancients called Spannungsbogen –
which is the self-imposed delay between desire for a thing
and the act of reaching out to grasp that thing.
--from ‘The Wisdom of Muad'Dib’ by the Princess Irulan,Dune, Frank Herbert
i
ii
To Uzi Saghi, b.19-10- 1976, d. 26-12-04
.‫ הרבה הכרת תודה‬,‫ הרבה כמיהה‬,‫עם הרבה אהבה‬
Face of an angel, soul of an archangel convention,
and the sense of humour of a minor demon flock.
I guard the memory trunks, Tig, penguins and all.
And to Luiz Vaz,
he of the butterflies and silky headbutts.
iii
iv
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao Dr. Rui Patrício o ter-me aceite como estagiária, ajudando-me a concretizar um
sonho antigo com profissionalismo e dedicação, e ao Doutor José Henrique Correia a
inestimável ajuda na estruturação da tese. Estendo os meus agradecimentos ao Dr. Rui
Ferreira de Almeida e ao Dr. Luís Chambel, sempre dispostos a responder a questões, e que
me ajudaram a alargar o meu conhecimento sobre clínica de pequenos animais; e às Dras.
Susana Vítor e Beatriz Sinoga pela simpatia.
Agradeço a todos os professores, colegas e auxiliares que, ao longo dos anos, se mostraram
sempre dispostos a ajudar-me a colmatar as lacunas advindas de um currículo académico não
formatado para Medicina Veterinária e que, ao tornarem estes anos de estudo menos
penosos, me ajudaram a encontrar o meu lugar na Faculdade.
Ao Dr. D. Crossley, Dr. D. Malley, Dra. F. Harcourt-Brown, Dr. B. Holmberg, Dra. A. Lennox,
Lisa Brandon, Dra. M. Gracis, Anne Mäkinen e Dr. P. Flecknell agradeço a disponibilidade para
o envio de artigos; à Dra. F. Harcourt-Brown agradeço ainda a extrema simpatia de ter
autorizado a reprodução de uma figura sua; a Ingrid Rice e ao Dr. L. Legendre agradeço a
correspondência, e as respostas às muitas questões colocadas; a Ingrid Rice agradeço, ainda,
a generosidade no envio de fotografias do chin sling.
Agradeço às minhas amigas da faculdade, Inês Veiga e Joana Silva, as minhas meninas (e
agenda electrónica infalível), e Sabrina Teixeira, a cumplicidade, o apoio e os lembretes ao
longo dos anos. Sem vocês tudo teria sido infinitamente mais difícil e menos memorável. À
Ana Queimado e Joana Coutello agradeço a partilha de ideias felizes, e o muito riso e
desespero na execução das mesmas; e ao meu padrinho, Tiago Santos, agradeço o ter-me
mostrado, na prática, como duas ou três pessoas conseguem, de facto, mudar o estabelecido.
Não sei como o fazem os outros antropólogos-etólogos que, vindos de Letras, decidem tornarse veterinários, mas eu não o teria conseguido sem o apoio dos Mais, os meus pais, com
quem aprendi que se pode, tudo, e com rectidão. Se sobrevivi a um mundo que requer a
navegação de cosenos, logaritmos e grupos amina, a eles o devo.
Agradeço à Teresa e à Cristina, médicas e professoras in excelsis e amigas mais que
extraordinárias, cujo conhecimento combinado seguramente altera o eixo da terra e cimentou o
meu; à Becas, o apoio, a ternura e os inesquecíveis dias ao sol cheios de riso e bichos numa
aldeia remota do Portugal quase profundo; ao Pedro, o zen e uma amizade antiga e solarenga;
à Comunidade Beit Israel, as memórias dos Onegei Shabbat e Kabbalot Shabbat (...ve'higyanu
v
lezman hazeh) e o carinho e compreensão durante as ausências frequentes; e ao Marsi o
tentar tornar compreensível o inexplicável, e todos os artigos.
Naomi, my closet Anglo, who gave me literal access to the fountain of knowledge and always
cheeps when life churps plaphorously at me, where would I be without our transatlantic
sessions and your boundless empathy? The Ancestral Chicken is far more fun with you.
Manuela, my glamourous Canadian diva and goddess of shoes, who unexpectedly erupted into
my life with such generosity and exuberance. I will forever be chuffed that you did. Thank you
for all the laughter and explaining, Bertie. Aaron, my mate who’s a boy who’s a girl at times, my
gentle soul wrapped in Thunderdome who should have lived in the fifties amongst the broads
and the gangsters and the B&W, intensely enunciated thunderous nights, thank you for the
shoulder and all the cheering on. All hail 8-hour phone conversations. John [!], thank you for
your binary approach to my intuitive life, for all the books and book-mad conversations, for
having allowed me to walk underwater. We shall always geek for England.
Lila, co-keeper of memories, of her birthday, who thus afforded me some respite to work when
none was to be had, who was my safe harbour in the 90’s and is a safe harbour still, and
remains the only Israeli I know whose pass photo grin bursts out of a soldier ID card, birds will
always come easy with you. The Saghi family, who always made me feel welcome and make
me feel welcome still. It will never be the same but your home remains my home after all this
time and for that I am grateful. Huh haia kessem, be’emet. And Liliana, neshikot gam lach.
And to all of you who gave me Gabriel wings when the unfathomable happened and I lost all
breath, who forged aqualungs in brimstone, blue and hope and held them in place for years,
unwaveringly, unquestioningly, who generously remembered when memories seemed most
perishable, who still remember now that it has been proven they are not; to all of you who kept
me from throwing myself in the river every time I looked at a new exam schedule – and
shocker, that happened quite a lot, who helped me buck up trough academic insomniac nights,
blurry days and the unrelenting boning up, whose faith in me never wavered, to all of you who
accompanied me on this almost quest, who repeatedly told me I could, and eventually would,
slay the dragons, I lay them at your feet. For I have, and words will never be enough.
vi
PATOLOGIA DENTÁRIA EM MAMÍFEROS EXÓTICOS
Resumo
O estágio curricular no qual se baseia esta dissertação decorreu na Clínica Veterinária
VetOeiras, sob a orientação científica do Dr. Rui Patrício. Na primeira parte deste trabalho é
apresentada a casuística resultante do acompanhamento das actividades médico-cirúrgicas
durante os cinco meses do estágio curricular. Na sequência destas actividades e do interesse
pessoal na área foi efectuada, na segunda parte deste trabalho, uma revisão bibliográfica
sobre patologia dentária em pequenos mamíferos, nomeadamente coelho, porquinho da Índia,
chinchila, cão da pradaria e miomorfos.
É cada vez mais comum a escolha de pequenos mamíferos como animais de estimação. Os
dentes elodontes aumentam a susceptibilidade a problemas dentários tais como má oclusão,
sobrecrescimento dentário e abcessos odontogénicos, agravados pela ausência de controlo
estrito dos reprodutores, deficiências de maneio alimentar e ocorrência de patologia
secundária concomitante. Embora a compreensão da fisiologia oral e os meios de diagnóstico
actualmente ao dispôr permitam delinear planos terapêuticos apropriados, que visam restaurar
a normalidade da anatomia e função dentárias, e controlar a inflamação e infecção associadas,
os tratamentos permanecem maioritariamente paliativos.
A apresentação clínica da patologia dentária é extremamente diversificada, ocorrendo variação
inter e intraespecífica. Este quadro é complicado pelo facto de espécies-presa tenderem a
dissimular sinais de doença, a sintomatologia ser frequentemente discreta, e os proprietários
raramente se aperceberem da existência de problemas dentários.
Dada a recorrência e progressão típicas da patologia dentária, a educação dos proprietários é
fulcral para a prevenção da mesma, bem como para a aceitação das propostas terapêuticas e
seu sucesso e a monitorização regular dos animais. De igual importância é a educação do
médico veterinário no campo da medicina dentária de pequenos mamíferos, e a partilha de
informação entre colegas para o estabelecimento de protocolos terapêuticos e de diagnóstico
eficazes.
Na terceira parte deste trabalho serão apresentados seis casos clínicos: sobrecrescimento dos
incisivos num hamster russo, braquignatismo maxilar e sobrecrescimento dos molariformes
num coelho, sobrecrescimento dos molariformes atípico num porquinho da Índia,
sobrecrescimento e reabsorção dos molariformes e hipermotilidade intestinal secundária numa
chinchila, um abcesso infraorbital numa ratazana, e um abcesso infraorbital e outro retrobulbar
num coelho. Estes casos foram escolhidos por serem representativos não apenas da
casuística, como também do que se conhece da patologia dentária até à data.
Palavras-chave: pequenos mamíferos, patologia dentária, patologia dentária adquirida, má
oclusão, sobrecrescimento dentário, abcessos odontogénicos, educação, casos clínicos.
vii
Dental Pathology in Small Mammals
Abstract
The internship upon which this dissertation is based took place in the VetOeiras veterinary
clinic, under the scientific supervision of Dr. Rui Patrício. In the first part of this work the
data gathered regarding all medical and surgical procedures during the five-month internship
will be presented. As a consequence of said procedures and personal interest, a bibliographical
review of dental disease in small mammals, i.e. rabbit, guinea pig, chinchilla, prairie dog and
myomorphs, was undertaken.
The choice of small mammals as pets is increasingly common. Elodont teeth have
high susceptibility to dental problems such as malocclusion, teeth elongation and odontogenic
abscesses, made worse through lack of strict control of breeders, husbandry deficiencies and
the occurrence of simultaneous secondary pathology. Although an understanding of oral
physiology and currently available diagnostic means allow for the devisal of therapeutic plans to
restore normal dental anatomy and function, and to control associated infection and
inflammation, for the most part treatment remains palliative.
The clinical presentation of dental disease is extremely diverse, displaying inter- and intraspecific variation. This is further complicated by the fact that prey species tend to mask signs of
disease, symptoms are often mild and owners are rarely aware of dental problems.
In view of the recurrence and progression typical of dental disease, owner education is pivotal
both for prevention and for acceptance and effectiveness of therapeutic plans, as well as
regular monitoring of the animals. Equally important is the education of veterinarians in the field
of small mammal dentistry, and the sharing of information amongst colleagues towards the
establishment of effective diagnostic and therapeutic protocols.
In the third part of this work six clinical cases will be presented: incisor overgrowth in a Russian
hamster, maxillary brachygnathism and cheek teeth malocclusion in a rabbit, atypical cheek
teeth overgrowth in a guinea pig, cheek teeth overgrowth and resorption and secondary
intestinal hypermotility in a chinchilla, an infraorbital abscess in a rat, and both an infraorbital
and a retrobulbar abscess in a rabbit. These cases were chosen due to their being
representative of the data gathered, as well as reflecting what is known about dental disease
up to the present.
Keywords: small mammals, dental disease, acquired dental disease, malocclusion,
teeth elongation, odontogenic abscesses, education, clinical cases.
viii
Pág.
ÍNDICE GERAL
Dedicatória ........................................................................................................................................
i
Agradecimentos ................................................................................................................................
v
Resumo ............................................................................................................................................
vii
Abstract ............................................................................................................................................
viii
Índices ..............................................................................................................................................
ix
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................
1
PARTE I – BREVE DESCRIÇÃO DA CLÍNICA E ACTIVIDADES DESENVOLVIDAS NO
ESTÁGIO CURRICULAR .................................................................................................................
3
PARTE II – PATOLOGIA DENTÁRIA EM MAMÍFEROS EXÓTICOS .............................................
8
1. Anatomia e fisiologia ..................................................................................................................
8
1.1. Estrutura dentária .....................................................................................................................
10
1.2. Coelho .......................................................................................................................................
11
1.3. Roedores ...................................................................................................................................
13
2. Fisiopatologia .............................................................................................................................
15
2.1. Coelho – patologia dentária congénita .................................................................................
16
2.2. Coelho – patologia dentária adquirida ..................................................................................
17
2.2.1. Incisivos ........................................................................................................................
17
2.2.2. Molariformes .................................................................................................................
21
2.3. Roedores – patologia dentária congénita .............................................................................
24
2.4. Roedores – patologia dentária adquirida .............................................................................
25
2.4.1. Incisivos ........................................................................................................................
25
2.4.2. Molariformes .................................................................................................................
29
3. Apresentação clínica ..................................................................................................................
35
4. Métodos complementares de diagnóstico ...............................................................................
38
5. Prognóstico .................................................................................................................................
45
6. Terapêutica ..................................................................................................................................
47
6.1. Tratamento médico e maneio ....................................................................................................
47
6.2. Tratamento cirúrgico .............................................................................................................
50
7. Abcessos odontogénicos ..........................................................................................................
52
7.1. Etiologia e fisiopatologia .......................................................................................................
52
7.2. Diagnóstico e prognóstico .....................................................................................................
53
7.3. Tratamento médico e cirúrgico ...............................................................................................
54
PARTE III – CASOS CLÍNICOS .......................................................................................................
58
1. Hamster russo ‘Deckard’............................................................................................................
58
2. Coelha ‘Buffy’...............................................................................................................................
59
3. Porquinha da Índia ‘Trinity’........................................................................................................
61
4. Chinchila ‘Atreides’.....................................................................................................................
63
5. Ratazana ‘Korben Dallas’ ...........................................................................................................
64
6. Coelho ‘Captain Mal’ ..................................................................................................................
67
7. Discussão dos casos clínicos....................................................................................................
73
CONCLUSÃO....................................................................................................................................
80
BIBLIOGRAFIA.................................................................................................................................
82
ix
ÍNDICE DE ANEXOS
Anexo 1: Especificidade da sintomatologia de patologia dentária.
93
Anexo 2: Exames complementares de diagnóstico recomendados por espécie.
94
Anexo 3: Chin sling.
95
Anexo 4: Classificação, tratamento e prognóstico de abcessos odontogénicos.
97
ÍNDICE DE TABELAS
Pág.
Tabela 3.
Total de espécies animais presenciadas (número e frequência relativa).
Motivo de consulta em pequenos animais e animais exóticos (número e
frequência relativa).
Taxonomia.
8
Tabela 4.
Fórmulas dentárias.
8
Tabela 5.
Dentição de lagomorfos e roedores - semelhanças e diferenças.
9
Tabela 6.
Etiologias mais comuns de patologia dentária em lagomorfos e roedores.
15
Tabela 7.
Sinais e sintomas característicos de patologia dentária por espécie.
35
Tabela 8.
Procedimentos cirúrgicos e modalidades de tratamento de patologia dentária.
51
Tabela 9.
Diferentes abordagens cirúrgicas e tratamentos de abcessos odontogénicos.
57
Tabela 10.
Especificidade da sintomatologia de patologia dentária.
93
Tabela 11.
Exames complementares de diagnóstico recomendados por espécie.
94
Tabela 12.
Tipos de abcessos, tratamento e prognóstico.
97
Tabela 1.
Tabela 2.
ÍNDICE DE GRÁFICOS
5
7
Pág.
Gráfico 2.
Relação entre o total de pequenos animais e animais exóticos presentes à
consulta (frequência relativa).
Espécies exóticas mais frequentemente presentes à consulta (frequência relativa).
4
Gráfico 3.
Distribuição do total de motivos de consulta (frequência relativa).
6
Gráfico 4.
Comparação entre a distribuição do total de motivos de consulta e a distribuição
de motivos de consulta de pequenos animais e exóticos (frequência relativa).
7
Gráfico 1.
ÍNDICE DE FIGURAS
4
Pág.
Figura 1.
Secção transversa de um molariforme maxilar (a) e de um molariforme mandibular
(b). (Reproduzida por cortesia de Ingrid Rice.)
10
Figura 2.
Esporão no PM1 mandibular. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
22
Figura 3.
Esporões maxilares. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
22
Figura 4.
Figura 5.
Figura 6.
Figura 7.
Figura 8.
Figura 9.
Wave mouth, projecção LL esquerda. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
Patrício.)
Porquinho da índia - má oclusão dos incisivos. (Reproduzida por cortesia do Dr.
Rui Patrício.)
Porquinho da índia - fractura dos incisivos. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
Patrício.)
Elodontoma bilateral, projecção LObl direita. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
Patrício.)
Porquinho da Índia – esporão no PM1 maxilar esquerdo. (Reproduzida por cortesia
do Dr. Rui Patrício.)
Chinchila – esporão no PM1 maxilar esquerdo. (Reproduzida por cortesia do Dr.
Rui Patrício.)
23
26
26
28
31
31
Figura 10.
Porquinho da Índia – ponte dentária. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
31
Figura 11.
Mandíbula de chinchila, vista lateral. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
32
x
Figura 12.
Cáries em molariformes de chinchila – mandíbula, vista dorsal. (Reproduzida por
cortesia do Dr. Rui Patrício.)
32
Figura 13.
Maxila de chinchila – vista ventral. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
32
Figura 14.
Figura 15.
Figura 16.
Figura 17.
Figura 18.
Figura 19.
Cáries e lesões reabsorptivas em molariformes de chinchila – projecção LObl
direita. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
Coelho - anatomia normal, projecção LL esquerda. (Reproduzida por cortesia do
Dr. Rui Patrício.)
Porquinho da Índia – má oclusão dos incisivos, projecção LL esquerda. (Reproduzida por
cortesia do Dr. Rui Patrício.)
Chinchila – má oclusão dos incisivos e molariformes, projecção LL esquerda. (Reproduzida
por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
Porquinho da Índia – anatomia normal pós-redução coronal, projecção RCd. (Reproduzida
por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
Porquinho da Índia – projecção RCd. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
Patrício.)
Figura 20.
Chinchila – projecção RCd. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
Figura 21.
Coelho - anatomia normal, projecção VD. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
32
41
41
41
41
42
42
Patrício.)
Sobrecrescimento do incisivo maxilar esquerdo. (Reproduzida por cortesia do Dr.
Rui Patrício.)
Relação entre dimensão relativa do paciente e dimensão da porção de dente
removida. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
42
Figura 24.
Prognatismo mandibular relativo. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
59
Figura 25.
Projecção LL esquerda. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
59
Figura 26.
Projecção LObl esquerda. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
59
Figura 27.
Projecção RCd. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
60
Figura 28.
Projecção VD. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
60
Figura 29.
Projecção LL pós-cirurgia. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
61
Figura 30.
Projecção Rcd pós-cirurgia. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
61
Figura 31.
Estrutura anómala caudal. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
62
Figura 32.
Ampliação da estrutura. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
62
Figura 33.
Cavidade oral após redução coronal do terceiro molar mandibular direito.
(Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
62
Figura 34.
Projecção LL esquerda. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
63
Figura 35.
Projecção LObl direita. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
63
Figura 36.
Projecção RCd. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
64
Figura 37.
Projecção VD. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
64
Figura 38.
Projecção RCd. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
65
Figura 39.
Projecção VD. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
65
Figura 40.
Projecção LL direita. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
65
Figura 41.
Extensão da ferida cirúrgica após limpeza do abcesso. (Reproduzida por cortesia
do Dr. Rui Patrício.)
Aspecto da ferida cirúrgica após marsupialização. (Reproduzida por cortesia do Dr.
Rui Patrício.)
Figura 22.
Figura 23.
Figura 42.
58
58
66
66
Figura 43.
Projecção RCd pós-cirurgia. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
66
Figura 44.
Projecção LL - 2007. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
67
xi
Figura 45.
Projecção LObl - 2007. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
67
Figura 46.
Projecção VD - 2007. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
68
Figura 47.
Projecção RCd - 2007. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
68
Figura 48.
Abcesso odontogénico maxilar externo. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui
Patrício.)
68
Figura 49.
Incisão da cápsula do abcesso. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
68
Figura 50.
Marsupialização da ferida cirúrgica. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
69
Figura 51.
Fístula oral. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
69
Figura 52.
Projecção LObl pós-extracção. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
69
Figura 53.
Exoftalmia – olho direito. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
70
Figura 54.
Panoftalmia. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
70
Figura 55.
Preparação do campo cirúrgico. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
70
Figura 56.
Cantotomia lateral. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
71
Figura 57.
Cantotomia lateral. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
71
Figura 58
Incisão da conjuntiva bulbar. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
71
Figura 59.
Incisão da conjuntiva bulbar. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
71
Figura 60.
Remoção do globo ocular. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
72
Figura 61.
Cavidade orbitária após remoção do globo ocular. (Reproduzida por cortesia do Dr.
Rui Patrício.)
72
Figura 62.
Sutura das pálpebras. (Reproduzida por cortesia do Dr. Rui Patrício.)
72
Figura 63.
Figura 64.
Figura 65.
Figura 66.
Porquinho da Índia ‘Willie’ usando o primeiro protótipo em neoprene do Chin Sling,
criado por Ingrid Rice e Dr. Loïc Legendre – vista lateral. (Reproduzida por cortesia
de Ingrid Rice.)
Porquinho da Índia ‘Willie’ usando o primeiro protótipo em neoprene do Chin Sling
– vista dorsal. (Reproduzida por cortesia de Ingrid Rice.)
Porquinho da Índia ‘Ruby’ com o recém-colocado Chin Sling (modelo actual).
(Reproduzida por cortesia de Ingrid Rice.)
Chin sling - Instruções para mensuração da cabeça do paciente pré-fabrico. É
requerida garantia de acompanhamento veterinário. (Reproduzida por cortesia de
Ingrid Rice.)
xii
95
95
95
96
ÍNDICE DE ABREVIATURAS E SÍMBOLOS
AB
Ab
AINES
BID
CE
CHI
cm
CO
CP
Cx
DNL
Dta.
DOM
Dto.
DV
Dx
Esq.
EXOT
Fx
g
Kg
LL
LObl
MLF
mm
mm-aa
MM
MO
PA
PDA
PI
PM
PO
p.r.n.
PTH
QID
RC
RCd
SBC
SC
Sx
TAC
TSA
Tx
VD
Antibioterapia
Antibióticos
Anti-inflamatórios não esteróides
Bis in die
Corpo estranho
Chinchila
Centímetros
Coelho
Cão da pradaria
Cirúrgico(a)
Ducto nasolacrimal
Direita
Doença óssea metabólica
Direito
Dorsoventral
Diagnóstico
Esquerdo(a)
Exóticos
Fractura(s)
Grama
Quilograma
Laterolateral
Lateral oblíqua
Molariforme(s)
Milímetros
Meses-anos
Molares
Má oclusão
Pequenos animais
Patologia dentária adquirida
Porquinho da Índia
Pré-molar(es)
Per os
Pro re nata
Parathormona
Quater in die
Redução coronal
Rostrocaudal
Sobrecrescimento
Subcutâneo(a)
Sintomatologia
Tomografia axial computorizada
Teste de sensibilidade aos antibióticos
Tratamento(s)
Ventrodorsal
xiii
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
INTRODUÇÃO
Os mamíferos exóticos são cada vez mais procurados em todo o mundo como animais de
estimação, desafiando os médicos veterinários a melhorar constantemente a qualidade dos
serviços médicos e cirúrgicos oferecidos (Capello & Gracis, 2005).
Os dentes de crescimento contínuo de lagomorfos e roedores são a característica mais
importante destas ordens para a Medicina Veterinária (Harcourt-Brown, 2002b; Capello &
Gracis, 2005; Crossley, 2003c). Embora dentes de crescimento contínuo garantam
longevidade dentária, têm como desvantagem a susceptibilidade aumentada a problemas
dentários de desenvolvimento, constituindo a principal razão para a elevada frequência de
patologia dentária nestes animais (Crossley, 2003c). As suas dentições e necessidades
dietéticas altamente especializadas estão na origem de doenças secundárias que
frequentemente constituem estímulo iatrotrópico (Capello & Gracis, 2005).
A apresentação clínica da patologia dentária é extremamente diversa (Capello, 2004a),
ocorrendo variação inter e intraespecífica (Crossley, 2003a). Este quadro é, ainda, complicado
pelo facto de, por um lado, espécies-presa tenderem a dissimular sinais de doença (Capello &
Gracis, 2005) e a sintomatologia ser frequentemente discreta, excepto nos estadios mais
avançados da patologia dentária (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005; Brenner, Hawkins,
Tell, Hornof, Plopper & Verstraete, 2005); e, por outro, os proprietários raramente se
aperceberem da existência de problemas dentários (Harcourt-Brown, 1995; Capello, 2004a;
Capello & Gracis, 2005; Mullan & Main, 2006).
A
medicina
dentária de
mamíferos
exóticos
encontra-se
na fase
inicial
do seu
desenvolvimento. A compreensão da fisiologia oral subjacente e os meios de diagnóstico
actualmente disponíveis permitem a criação de planos terapêuticos apropriados para a maioria
dos problemas dentários. Muito embora a sua natureza signifique, frequentemente, que o
tratamento não é curativo, na maioria das vezes é possível controlar a progressão da patologia
dentária e permitir a manutenção da qualidade de vida do animal (Crossley, 2003c).
As opções terapêuticas visam restaurar a normalidade da anatomia e função dentárias dentro
do possível, e controlar a inflamação e infecção associadas (Capello, 2004a). A delineação de
planos terapêuticos promissores, individualizados e sofisticados, particularmente no caso de
infecções periapicais e abcessos, é possibilitada pelo enorme progresso da medicina dentária
de mamíferos exóticos nos últimos anos, especialmente nas áreas de diagnóstico e
tratamento, com recurso a técnicas imagiológicas como endoscopia e TAC (Capello & Lennox,
2008).
1
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Dada a recorrência e progressão típicas da patologia dentária, a educação dos proprietários é
fulcral para a sua prevenção, bem como para a aceitação das propostas terapêuticas e seu
sucesso, e para a monitorização regular dos animais (Capello, 2004a; Crossley, 2003c).
Na primeira parte desta dissertação será feita uma breve descrição das actividades
desenvolvidas durante o estágio curricular. Posteriormente, proceder-se-á a uma revisão
bibliográfica dos diferentes aspectos da patologia dentária em mamíferos exóticos,
nomeadamente coelho, porquinho da Índia, chinchila, cão da pradaria, ratazana e hamster,
que são algumas das espécies que com maior frequência recorrem aos serviços do médico
veterinário. Finalmente, na terceira parte serão apresentados seis casos clínicos que resultam
dos dados recolhidos durante o estágio curricular: sobrecrescimento dos incisivos num
hamster russo, braquignatismo maxilar e sobrecrescimento dos molariformes num coelho,
sobrecrescimento dos molariformes atípico num porquinho da Índia, sobrecrescimento e
reabsorção dos molariformes e hipermotilidade intestinal secundária numa chinchila, um
abcesso infraorbitário numa ratazana, e um abcesso infraorbitário e outro retrobulbar num
coelho. Estes casos são representativos não apenas da casuística, como também do que se
conhece da patologia dentária até à data.
2
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
PARTE I. BREVE DESCRIÇÃO DA CLÍNICA E ACTIVIDADES
DESENVOLVIDAS NO ESTÁGIO CURRICULAR
O estágio curricular em que se baseia esta dissertação decorreu na Clínica Veterinária
Vetoeiras, em Oeiras, sob a orientação científica do Dr. Rui Patrício, entre 29 de setembro de
2008 e 1 de Março de 2009, com a duração de cinco meses.
A Clínica Veterinária VetOeiras dedica-se à clínica e cirurgia de pequenos animais e animais
exóticos, sendo um centro de referência nas áreas de cirurgia ortopédica, oftalmologia e
medicina e cirurgia de exóticos, recebendo pacientes encaminhados por colegas para a
realização de consultas de segunda opinião, exames complementares de diagnóstico e
intervenções cirúrgicas. A equipa médico-veterinária é constituída pelo Dr. Rui Ferreira de
Almeida (Director Clínico), Dr. Luís Chambel, Dr. Rui Patrício, Dra. Susana Vítor e Dra. Beatriz
Sinoga. Na clínica trabalham, ainda, três auxiliares.
A clínica encontra-se aberta ao público de Segunda-feira a Sexta-feira das 10.00 às 20.00, e
ao Sábado das 10.00 às 19.00, com intervalo para almoço entre as 13.00 e as 15.00. A
estagiária acompanhou o horário do orientador científico na clínica, tendo-o também
frequentemente acompanhado em horário não laboral a consultas e cirurgias nas clínicas
Hospital dos Animais, na Ramada, e SOS Vet, na Cova da Piedade. A estagiária acompanhou,
ainda, em regime de fins de semana alternados, o clínico escalonado no Sábado em horário
normal e no Domingo das 10.00 às 12.00, tendo permanecido, durante a semana ou ao fim de
semana, para além do horário normal de funcionamento sempre que o médico veterinário
necessitou de assistência.
Ao longo de todo o estágio, para além da sua prestação diária, o estagiário é também avaliado
oralmente pelo orientador sobre temas previamente estudados em casa. No internamento, são
funções do estagiário a limpeza e desinfecção de jaulas e mudança de camas, o passeio dos
cães, a alimentação dos pacientes internados, a monitorização da temperatura, a preparação e
administração de medicação e, quando solicitado, a realização de procedimentos e
tratamentos médicos como limpeza de abcessos, algaliação, fluidoterapia, colheita de sangue
e análises clínicas, e ainda a remoção de pensos e sistemas de venoclise aquando da alta
médica. Durante as consultas, o estagiário observa a realização da anamnese e exame físico
e, quando solicitado, auxilia na contenção e preparação de medicações e na realização de
meios complementares de diagnóstico, efectuando análises clínicas ou testes rápidos de
diagnóstico e exames radiográficos (como operador ou auxiliando à contenção); presencia
ecografias e ecocardiografias; e realiza procedimentos como banhos medicamentosos,
fluidoterapia e administração de medicação. É ainda sua responsabilidade a limpeza e
desinfecção da sala entre pacientes. Na cirurgia, são funções do estagiário, quando solicitado,
a preparação do paciente e da sala de cirurgia, a preparação e administração da prémedicação, a sua colaboração como ajudante de cirurgião, de anestesista ou circulante, e,
3
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
ocasionalmente, a realização de destartarizações e castrações. Procede, ainda, à
administração de medicação e à monitorização pós-cirúrgica do paciente, e participa nos
exames radiográficos, como operador ou auxiliando na contenção, quando necessário. É
também responsabilidade do estagiário a limpeza e desinfecção da sala de cirurgia e material
cirúrgico no final de cada intervenção. Foi também possível observar necrópsias de pequenos
animais e exóticos, bem como realizar necrópsias de animais exóticos; e treinar
venipuncuntura, procedimentos ortopédicos como inserção de cavilhas e outros (por exemplo,
extrusão de pénis em répteis e fluidoterapia intraóssea) em cadáveres de animais exóticos.
No total foram presentes a consulta 462 animais, dos quais 274 pequenos animais (cão e gato)
e 188 animais exóticos. O gráfico 1 ilustra a predominância das consultas de pequenos
animais:
Pequenos animais
Animais exóticos
41%
59%
Gráfico 1. Relação entre o total de
pequenos animais e animais exóticos
presentes à consulta (frequência relativa).
Dentro dos animais exóticos, o coelho foi a espécie mais observada (35%), seguido pelo
porquinho da Índia (21%), piriquito (10%), chinchila (8%), papagaio cinzento (7%), agapornis
(6%), hamster (5%) e caturra e tartaruga da Flórida (4%), como se pode ver no gráfico 2:
4%
4%
5%
Coelho
6%
35%
Porquinho da Índia
Piriquito
Chinchila
7%
Papagaio cinzento
Agapornis
Hamster
8%
Caturra
Tartaruga da Flórida
10%
21%
Gráfico 2. Espécies exóticas mais frequentemente
presentes à consulta (frequência relativa).
4
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Os 462 animais observados representam um total de 35 espécies. Destas, o cão representa
33,1% dos animais mais commumente observados, seguido pelo gato (26,2%) e pelo coelho
(10,2%), como se pode visualizar na tabela 1:
Espécie
(Nº)
(%)
Cão
Gato
Coelho
Porquinho da Índia
Piriquito
Chinchila
Papagaio cinzento
Agapornis
Hamster
Caturra
Tartaruga da Flórida
Furão
Iguana
Ouriço-cacheiro
Papagaio do Senegal
Hamster Russo
Papagaio da Amazónia
Ratazana
Canário
Conure
Jacinta
Tartaruga greca
Cágado
Camaleão
Dragão-barbudo
Esquilo
Guaxinim
Petauro
Tartaruga carbonaria
Papagaio Ecletus
Cobra
Gueko
Javali
Rola
Sagui
153
121
47
27
13
10
9
8
7
5
5
4
4
4
4
3
3
3
3
3
3
3
2
2
2
2
2
2
2
1
1
1
1
1
1
33,1
26,2
10,2
5,8
2,8
2,2
1,9
1,7
1,5
1,1
1,1
0,9
0,9
0,9
0,9
0,6
0,6
0,6
0,6
0,6
0,6
0,6
0,4
0,4
0,4
0,4
0,4
0,4
0,4
0,2
0,2
0,2
0,2
0,2
0,2
Total
462
Tabela 1. Total de espécies animais presenciadas
(número e frequência relativa).
Foi possível presenciar um total de 647 intervenções médico-veterinárias, correspodendo a
460 em pequenos animais (71%), e 187 em animais exóticos (29%).
5
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Analisando o total de consultas, ilustrado pela gráfico 3, a maioria das intervenções médicoveterinárias diz respeito a profilaxia médica (18,7%), seguida por patologia do aparelho
digestivo (14,4%), tratamentos médicos (11,9%), medicina dentária (10,2%) , pele e anexos
(8,3%), e, finalmente, doenças infecciosas e parasitárias (6,2%) e patologia dos sistemas
renal e urinário (6,2%).
20,0%
18,0%
P ro filaxia médica
16,0%
Tratamento s médico s
14,0%
P ele e anexo s
12,0%
D. infeccio sas e parasitárias
10,0%
M edicina dentária
Repro duto r
Digestivo
Renal/Urinário
Lo co mo to r
Respirató rio
8,0%
Oftalmo ló gico
6,0%
Nervo so
4,0%
D. metabó lica
2,0%
Sexagem
Cardio vascular
Co mpo rtamento
P o stura
0,0%
Motivo de consulta
Gráfico 3. Distribuição do total de motivos de consulta (frequência relativa).
No entanto, estes resultados sofrem algumas alterações se forem discriminados por grupo,
nomeadamente pequenos animais e animais exóticos, como visualizável na tabela 2 e gráfico
3 (p.8). A profilaxia médica permanece, globalmente, o motivo de consulta mais frequente,
sendo os pequenos animais o grupo com maior frequência de consultas por este motivo (22%).
Neste grupo, outros motivos frequentes foram patologia do aparelho digestivo (16,7%) e
tratamentos médicos (10,2%). Nos animais exóticos, o motivo de consulta mais prevalente foi
a medicina dentária (23%), seguida dos tratamentos médicos (16%) e patologia da pele e
anexos (10,7%).
É de referir ainda que, em relação à totalidade das consultas, foram realizadas 11,3%
intervenções cirúrgicas.
6
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
PA
EXOT
Motivo de consulta
(Nº)
(%)
(Nº)
(%)
Profilaxia médica
Digestivo
Tratamentos médicos
Renal/Urinário
Pele e anexos
Locomotor
D. infecciosas e parasitárias
Respiratório
Medicina dentária
Reprodutor
Oftalmológico
Cardiovascular
Nervoso
Comportamento
D. metabólica
Postura
Sexagem
102
77
47
36
34
30
25
25
23
17
13
12
12
3
0
0
0
22,2
16,7
10,2
7,8
7,4
6,5
5,4
5,4
5,0
3,7
2,8
2,6
2,6
0,7
0,0
0,0
0,0
19
16
30
4
20
1
15
7
43
3
5
0
3
7
8
6
7
10,2
8,6
16,0
2,1
10,7
0,5
8,0
3,7
23,0
1,6
2,7
0,0
1,6
3,7
4,3
3,2
3,7
Total
460
187
647
Tabela 2. Motivo de consulta em pequenos animais e animais exóticos (número e
frequência relativa).
25,0%
20,0%
15,0%
% PA
10,0%
% EXOT
% TOTAL
5,0%
Tra
Pro
fi la
x ia
mé
dic
a
Dig
tam
est
en
i vo
tos
mé
di c
Re
os
na
l /U
r
i
n
Pe
ár i
le
o
ea
D.
ne
i nf
x
ecc
os
Lo
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co
as
m
ep
oto
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r
si tá
r
i
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Re
sp
Me
ir a
tór
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io
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de
n tá
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pr o
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Of
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talm
o
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Ca
i co
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Ne
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Co
so
mp
o rt
am
en
D.
to
me
ta b
óli c
a
Po
s tu
ra
Se
xa
ge
m
0,0%
Gráfico 4. Comparação entre a distribuição do total de motivos de consulta e a distribuição de
motivos de consulta de pequenos animais e exóticos (frequência relativa).
7
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
PARTE II. PATOLOGIA DENTÁRIA EM MAMÍFEROS EXÓTICOS
1. ANATOMIA E FISIOLOGIA
Durante muito tempo, os dentes incisivos dos lagomorfos, anatómica e funcionalmente em
tudo semelhantes aos dos roedores, fizeram com que fossem taxonomicamente considerados
uma sub-ordem dos roedores (Crossley, 2003c; Capello, 2005). Embora partilhando na sua
filogenia um antepassado herbívoro, diferenças na dentição, relação entre mandíbula e maxila
e padrões de mastigação sugerem processos evolutivos separados (Capello, 2005).
Actualmente, o coelho pertence à ordem Lagomorpha, e os roedores à ordem Rodentia.
Zoologicamente, esta pode, com base nas diferenças anatómicas e funcionais do músculo
masséter, ser dividida em três sub-ordens (Capello, 2004a, 2008b):
HISTRICOMORPHA/
CAVIOMORPHA
Semelhantes ao porco-espinho
Porquinho da Índia (Cavia porcellus), chinchila (Chinchilla
lanifera), degus (Octodon degus)
MIOMORPHA
Semelhantes ao ratinho
Hamster chinês (Cricetulus griseus), h. dourado
(Mesocricetus auratus); h. russo (Phodopus spp.); gerbilo
(Meriones unguiculatus), ratazana (Rattus spp.), ratinho
(Mus musculus), duprasi (Pachyuromys duprasi)
SCIUROMORPHA
Semelhantes ao esquilo
Cão da pradaria (Cynomy ludovicianus), esquilo siberiano
(Tamias striatus), citellus europeu (Citellus citellus)
Tabela 3. Taxonomia.
A fórmula dentária das diversas ordens e sub-ordens é:
MOLARIFORMES
INCISIVOS
TOTAL
PM
MM
TOTAL
LAGOMORFOS
2/1
3/2
3/3
6/5 = 22
28
HISTRICOMORFOS
1/1
1/1
3/3
4/4 =16
20
MIOMORFOS
1/1
0/0
3/3
3/3 = 12
16
SCIUROMORFOS
1/1
1-2/1
3/3
4-5/4 = 16-18
20-22
Tabela 4. Fórmulas dentárias (adaptada de Capello & Gracis, 2005).
Para uma comparação entre as características gerais da dentição destas duas ordens, ver
tabela 5 (Hirschfield, Weinreb & Michaeli, 1973; Westerhof & Lumeij, 1987; Lobprise & Wiggs,
1991; Crossley, 1995a; 1995b; Verstraete, 2003; Harcourt-Brown, 2002b; Capello & Gracis,
2005; Lobprise, 2007b; Gracis, 2008; Van Caelenberg, Rycke, Hermans, Verhaert, van Bree &
8
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Gielen, 2008). A porção visível do dente, supragengival, denomina-se coroa clínica; a porção
subgengival denomina-se coroa de reserva; o seu conjunto forma a coroa anatómica. Esta
nomenclatura foi desenvolvida para descrever acuradamente a dentição específica dos
verdadeiros herbívoros, cujos dentes de crescimento contínuo não possuem raízes anatómicas
(Wiggs & Lobprise, 1997; Crossley, 2003a; Capello & Gracis, 2005; Meredith, 2007). Com
efeito, uma raíz é definida como qualquer parte da estrutura dentária que não possui esmalte,
interna ou externamente (Sainsbury, Kountouri, DuBoulay & Kertesz, 2004). Durante muito
tempo, na ausência de nomenclatura específica, chamou-se raízes às coroas de reserva. No
entanto, e apesar de este termo continuar em uso por alguns autores, neste trabalho utilizarse-ão apenas os termos acima descritos. Por razões práticas, denomina-se por ápice a
terminação subgengival do dente, muito embora esta seja perfeitamente cilíndrica e não sofra
qualquer alteração de diâmetro (Harcourt-Brown, 2006; 2007a).
LAGOMORFOS
•
SEMELHANÇAS
•
•
•
•
•
•
•
•
•
DIFERENÇAS
•
ROEDORES
Bocas compridas e estreitas
Heterodontes (dentes com forma e função diferentes) e hipsodontes
(coroa clínica longa)
Incisivos elodontes/arradiculares
Incisivos cobertos por espessa camada de esmalte labial
Superfície de oclusão dos incisivos em bisel
Ausência de caninos
Molariformes com cristas de esmalte e sulcos de dentina
Grande diastema divide 2 unidades funcionais: incisivos e molariformes
Na zona do diastema, a porção interna dos lábios apresenta pelos
Articulação temporo-mandibular dorsal à linha de oclusão
Movimentos de preensão e corte dorso-ventrais (incisivos); movimentos
de moagem laterais (PM/MM)
Difiodontes (duas dentições)
Monodontes (uma dentição)
Duplicidentata: dois pares de incisivos
maxilares; par secundário caudal ao 1º
Simplicidentata: um par de incisivos maxilares
Incisivos maxilares com
vertical
Incisivos não-pigmentados
Incisivos maxilares sem sulco labial
sulco
labial
Incisivos amarelos/alaranjados
Incisivos de menor dimensão relativa
Incisivos de maior dimensão relativa
Em descanso, incisivos em oclusão
(mandibulares entre pares maxilares)
Em descanso, retrognatismo mandibular
PM/MM elodontes
PM/MM anelodontes
MM hipsodontes
MM braquiodontes
Superfície de oclusão em ziguezague
(perfil)
Superfície de oclusão plana (perfil)
Anisognatismo: maxila mais larga que
mandíbula
Anisognatismo: mandíbula mais larga que
maxila, em geral
Movimentos
mastigatórios
laterais
consideráveis, rostrocaudais reduzidos
Movimentos mastigatórios laterais reduzidos,
rostrocaudais consideráveis
Tabela 5. Dentição de lagomorfos e roedores - semelhanças e diferenças.
9
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Em lagomorfos e roedores, os pré-molares e molares de cada quadrante formam uma unidade
funcional utilizada na moagem dos alimentos e são indistinguíveis, sendo por isso, no seu
conjunto, denominados molariformes (Capello, 2008b).
1.1. Estrutura dentária
Os dentes de lagomorfos e roedores apresentam os componentes estruturais comuns a outras
espécies, i.e., dentina, esmalte, cimento e polpa.
Cada alvéolo é rodeado por uma lâmina dura. A lâmina dura é uma camada de osso alveolar,
com um teor superior ao normal de substância fixadora altamente calcificada, aliada a fibras
periodontais. Devido à maior calcificação, surge à radiografia como uma linha mais radiopaca
que delimita o alvéolo. O esmalte e a dentina são continuamente formados por ameloblastos e
odontoblastos, respectivamente. A rede capilar do espaço periodontal fornece nutrição aos
ameloblastos. O padrão estrutural do esmalte sofre variação interespecífica (Harcourt-Brown,
2006).
Figura 1. Secção transversal de um molariforme maxilar (a) e mandibular (b) de
coelho (Harcourt-Brown, 2006).
A maior parte do dente é formada por dentina, composta por cristais de hidroxiapatite similares
aos do osso mas com maior densidade. Estes cristais encontram-se embebidos numa matriz
de colagénio também semelhante ao osso, mas sem osteócitos, osteoclastos, osteoblastos ou
vasos sanguíneos. A dentina é nutrida por uma camada de odontoblastos que reveste a
superfície interna da cavidade pulpar, e é tanto mais espessa quanto mais próxima da
superfície da oclusão se encontrar (Harcourt-Brown, 2002b).
A taxa de crescimento de dentes normais e a morfologia da cavidade pulpar são reguladas
pela taxa de erupção. Os mecanismos que lhe estão subjacentes não são, ainda,
completamente compreendidos (Crossley, 2003a). A taxa de erupção, por sua vez, é regulada
10
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
pela taxas de desgaste ou atrição 1 (Harcourt-Brown 2006; Crossley, 2003a) e abrasão
(Harcourt-Brown, 2006). No coelho, a atrição é afectada pela ingestão de plantas e ervas ricas
em fitolitos de silicato, celulose e lenhina, para além dos contaminantes do solo, naturalmente
abrasivos (Harcourt-Brown, 2006). No entanto, desgaste natural por contacto com substâncias
abrasivas não é o mesmo que abrasão dentária 2 ; esta ocorre tipicamente fora da zona de
oclusão e em dentes que não contactam durante a mastigação. A abrasão é caracterizada por
marcas e irregularidades na superfície dentária, ao contrário da atrição dentária, que se
caracteriza pela formação de facetas polidas (Harcourt-Brown, 2002b, 2006).
Os dentes são inervados por ramos sensitivos e motores do nervo trigémeo. Fibras nervosas
(mielinizadas e não mielinizadas) penetram no dente pelo forâmen apical, organizando-se
algumas em plexo abaixo da camada odontoblástica, e outras em túbulos na dentina (Byers,
1984).
Em secção transversal, os incisivos apresentam uma única cavidade pulpar que sofre
estreitamento progressivo; os molariformes são compostos por subunidades que se fundem,
criando uma única cavidade pulpar no topo (Harcourt-Brown, 2006; 2002b; Crossley, 2003a).
Na chinchila, dentes saudáveis apresentam cavidades pulpares longas e estreitas com uma
estrutura interna uniforme; pelo contrário, dentes sobredimensionados apresentam cavidades
pulpares encurtadas e com grande variação interna (Crossley, 2003a).
Dentes elodontes possuem a capacidade de compensar pequenas alterações na taxa de
atrição, variando as taxas de crescimento e erupção dentro dos limites fisiológicos, sem
alterações significativas na altura das coroas clínicas. Uma redução na taxa de atrição abaixo
do limiar da capacidade de compensação fisiológica leva ao aumento em altura das coroas
clínicas (Crossley, 2003a).
A taxa de deposição parece manter-se constante, não sendo afectada por alterações da taxa
de erupção, mas a direcção da deposição torna-se perpendicular às paredes da cavidade
pulpar. Consequentemente, quanto mais lentamente o dente sofrer erupção, mais curta se
torna a cavidade pulpar, e vice-versa (Crossley, 2003a).
Os dentes são altamente resistentes aos efeitos da hipocalcémia, sendo o seu crescimento
privilegiado em relação ao crescimento ósseo durante períodos de deficiência moderada a
grave (Rasmussen, 1972; 1977).
1.2. Coelho
Lagomorfos (e histricomorfos) possuem uma morfologia rostral típica dos verdadeiros
herbívoros, e semelhante à dos equinos, bovinos e pequenos ruminantes (Crossley, 2003c).
1
Atrição dentária é definida como “o desgaste fisiológico da superfície de oclusão de um dente, em resultado do contacto dente a
dente durante a mastigação” (Harcourt-Brown, 2006, p.12, tradução livre).
2
Abrasão dentária é definida como “o desgaste anormal de substância dentária devido a processos mecânicos, tais como o roer
de pedras ou grades.” (Harcourt-Brown, 2006, p.12, tradução livre).
11
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Como referido na tabela 5, a sua dentição é igualmente típica, com incisivos, pré-molares e
molares elodontes, sem raízes anatómicas e de crescimento contínuo (Capello & Gracis, 2005;
Harcourt-Brown, 2002b).
A primeira dentição é substituída in utero ou logo após o nascimento pela dentição definitiva,
sendo raramente observada. A dentição permanente erupciona durante as primeiras cinco
semanas de vida (Capello & Gracis, 2005; Harcourt-Brown, 2002b). Há evidência de bruxismo
neonatal, e mesmo adultos rangem os dentes ocasionalmente. Os movimentos de
aplanamento são característicos do coelho e roedores e denominam-se tegose. Este tipo de
bruxismo, silencioso, ocorre com o animal em descanso e na ausência de alimento na
cavidade oral, nunca se confundindo com o bruxismo audível causado por dor e associado a
grande agitação (Harcourt-Brown, 2002b).
Os incisivos devem a sua terminação em bisel não apenas ao padrão de deposição de esmalte
labial (Hirschfield et al., 1973) mas também ao corte de alimento e outros materiais, havendo
um equilíbrio entre crescimento e atrição. O tipo de alimento é importantíssimo, uma vez que o
desgaste dentário é afectado pela natureza abrasiva da dieta (Crossley, 1995a; HarcourtBrown, 2002b).
A função principal dos incisivos é cortar e reduzir o tamanho do alimento, embora possam
também ser utilizados para roer, morder, limpeza (grooming) e lutas (Harcourt-Brown, 2006).
Os incisivos secundários podem encontrar-se ausentes (Lobprise & Wiggs, 1991; Capello &
Gracis, 2005). Alguns autores pensam que estes dentes protejam o palato do bordo aguçado
dos incisivos mandibulares (Capello & Gracis, 2005), outros consideram a sua existência
insignificante (Lobprise & Wiggs, 1991). Os molariformes trituram o alimento (Capello & Gracis,
2005), não existindo espaços interdentários significativos entre eles. Coelhos silvestres e
animais alimentados com feno, erva ou vegetação natural podem apresentar as coroas clínicas
manchadas de castanho-escuro devido aos pigmentos de clorofila e porfirina, especialmente
nos molariformes (Harcourt-Brown, 2002b; 2006). A diferença funcional entre incisivos e
molariformes é clinicamente relevante quando se ponderam extracções definitivas (Capello &
Gracis, 2005).
O coelho é capaz de movimentos mandibulares laterais, de amplitude considerável; e
rostrocaudais, caudorostrais e dorsoventrais, de amplitude reduzida. Em repouso, a mandíbula
encontra-se posicionada a meio da sua amplitude de movimentos rostrocaudais (Capello &
Gracis, 2005; Reiter, 2008). A subluxação mandibular está, normalmente, associada a má
oclusão dos incisivos (Crossley, 1995a; Capello & Gracis, 2005; Reiter, 2008).
Estudos sobre a taxa de erupção no coelho e roedores de tamanho médio revelaram que os
incisivos maxilares erupcionam mais lentamente (Crossley, 2003a). Estão descritas taxas de
crescimento de 12,7 cm/ano e 2 mm/semana para os incisivos maxilares; e de 20,3 cm/ano e
2,4 mm/semana para os incisivos mandibulares. O crescimento é determinado pela taxa de
erupção versus taxa de atrição, bem como pelas forças de oclusão. Alterações na oclusão
aceleram a taxa de erupção (Harcourt-Brown, 2006)
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O processo contínuo de crescimento e atrição requer uma reserva permanente de cálcio e
outros minerais e nutrientes para a formação de dentina e esmalte. As taxas de crescimento e
atrição sofrem variação individual, sendo afectadas pela idade, gestação e dieta (HarcourtBrown, 2002b; 2006).
1.3. Roedores
Existem mais de 1700 espécies de roedores. Num extremo encontram-se herbívoros
especializados, no outro omnívoros. Os seus habitats naturais vão desde o deserto à selva
tropical, variando o seu peso entre alguns grama e mais de 50 quilograma. Esta enorme
diversidade resultou numa grande variação da anatomia dentária (Legendre 2003). Apenas
cinco espécies possuem uma dentição totalmente elodonte, incluindo o porquinho da Índia e a
chinchila (Legendre, 2002).
Do ponto de vista da anatomia e fisiologia dentárias podem ser divididos em dois grupos: 1) os
sciuromorfos e miomorfos têm uma alimentação altamente energética e não especialmente
abrasiva (sementes, raízes e tubérculos); consequentemente, possuem incisivos de
crescimento contínuo, e molariformes 3 braquiodontes, com coroas pequenas e raízes
verdadeiras, que só crescem até terminada a erupção; 2) os histricomorfos provêm de áreas
montanhosas a grande altitude na América do Sul, ingerindo vastas quantidades de vegetação
fibrosa e abrasiva; este grupo possui, como já referido, uma dentição fisiologicamente similar à
dos lagomorfos (Crossley, 1995b; Legendre, 2003; Capello, 2008b).
Os dentes brancos do porquinho da Índia constituem uma excepção entre a maior parte dos
roedores. Alguns roedores apresentam despigmentação, que, embora frequentemente
presente em dentes estruturalmente normais (Crossley, 2003a; Capello & Gracis, 2005), pode
estar associada a patologia dentária (Crossley, 2001b). Roedores silvestres e animais
alimentados com matéria vegetal fresca podem apresentar as coroas clínicas manchadas de
castanho-escuro (Crossley, 2003a).
Regra geral, os incisivos dos roedores são maiores e mais fortes que os dos lagomorfos
(Capello, 2004a). No porquinho da Índia, os incisivos mandibulares são três vezes maiores do
que os maxilares (Capello, 2008b). Existem diferenças intraespecíficas: os dentes de
chinchilas selvagens são mais pequenos e mais uniformemente gastos que os de espécimens
de jardim zoológico ou domésticos (Crossley, 2003a), sendo os seus crânios também menores
(Crossley & Del Mar Miguelez, 2001).
Os incisivos crescem mais rapidamente que os restantes dentes, especialmente nas espécies
mais pequenas (Legendre, 2003). No porquinho da Índia, a taxa é de 1,9 e 2,4 mm/semana
para incisivos maxilares e mandibulares, respectivamente (Osofsky & Verstraete, 2006). No
Reino Unido, foram observadas taxas de crescimento em chinchilas em cativeiro e de criação
3
Ou apenas molares, no caso dos miomorfos.
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de 2,0 e 3,0 mm/semana para incisivos maxilares e mandibulares, respectivamente (Crossley,
2003a). Os incisivos normalmente são desgastados tão depressa quanto crescem. Tal como
no coelho, devem a sua terminação afiada ao facto de haver deposição de esmalte labial mas
não lingual e aos movimentos de mastigação de alimento abrasivo (Legendre, 2003).
Na chinchila, há retrognatismo mandibular em repouso, ficando os incisivos separados
(Capello & Gracis, 2005). No porquinho da Índia e chinchila, em repouso, os molariformes
permanecem em oclusão. As coroas clínicas no porquinho da Índia são bastante menores que
as de reserva, quando comparadas com as do coelho (Capello, 2008b). Nesta espécie, há
uma marcada divergência dos dentes rostro-caudalmente, não se encontrando estes dispostos
em fileiras paralelas (Crossley, 1995b). Estruturalmente, os molariformes do porquinho da
Índia possuem uma peculiaridade com relevância clínica: as coroas clínicas mandibulares
curvam medialmente e as de reserva lateralmente; as coroas clínicas maxilares curvam
lateralmente, e as de reserva medialmente. Isto traduz-se por plano de oclusão oblíquo, com
uma inclinação de cerca de 30º, cuja alteração tem consequências importantes no diagnóstico
e tratamento de patologia dentária nesta espécie (Capello, 2003; Capello, 2004a; Capello &
Gracis, 2005; Capello, 2008b). Os molariformes encontram-se cobertos pelo processo
zigomático, dificultando o seu exame e o acesso cirúrgico lateral às coroas de reserva
maxilares. Em descanso, os incisivos mandibulares encostam-se aos maxilares (Capello &
Gracis, 2005).
Os miomorfos possuem uma cavidade oral mais larga e curta que a de histricomorfos e
lagomorfos. Em repouso, os molares permanecem em oclusão. O hamster dourado possui
dentição bunodonte: os molares apresentam cúspides cónicas (Capello & Gracis, 2005).
A cavidade oral do cão da pradaria é mais larga e curta que a de histricomorfos e lagomorfos.
Os incisivos são muito dimensionados, especialmente os maxilares. A relação entre as coroas
de reserva destes últimos e a cavidade nasal são um factor etiológico importante na doença
dentária distrófica. Ao contrário do que é por vezes descrito, os molares e pré-molares são
braquiodontes; apresentam raízes múltiplas e cúspides bunodontes, sendo estruturalmente
similares aos dentes dos primatas. Uma vez que não sofrem crescimento permanente, má
oclusão não é uma preocupação clínica nesta espécie. Embora estes dentes variem em
tamanho e número de raízes têm um aspecto semelhante, pelo que são também denominados
molariformes. Encontram-se muito próximos, e as arcadas mandibulares esquerda e direita
são perfeitamente paralelas. O anisognatismo característico desta espécie é idêntico ao dos
lagomorfos: a maxila é mais larga que a mandíbula, pelo que em repouso não há contacto
entre as superfícies de oclusão (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005; Capello, 2008b).
Nalgumas espécies (como porquinho da Índia, chinchila) a mastigação é realizada
predominantemente por movimentos rostrocaudais com acção propalinear: a mandíbula é
repetidamente movida rostralmente e em direcção ao lado que não está a ser utilizado,
fazendo deslizar a superfície de oclusão dos molariformes mandibulares a dos molariformes
maxilares, com posterior separação dos dentes no retorno à posição anterior. Há, assim,
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movimentos laterais e rostrocaudais simultâneos (ou seja, diagonais) (Crossley, 2003a;
Capello, 2005; Reiter, 2008).
Sciuromorfos e miomorfos apresentam uma grande amplitude de movimentos mandibulares
rostrocaudais, fazendo frequentemente subluxação durante movimentos fisiológicos da
mandíbula (Capello, 2005; Reiter, 2008).
2. FISIOPATOLOGIA
Os dentes elodontes têm a vantagem de não permitirem o desgaste com a idade,
característico de herbívoros anelodontes como equinos, bovinos e pequenos ruminantes. No
entanto, tal torna-os susceptíveis a doença dentária em qualquer idade, uma vez que os
dentes se encontram em permanente formação e as coroas de reserva em constante erupção.
A patologia dentária nestas espécies apresenta, assim, características diferentes das
observadas em carnívoros domésticos (Crossley, 2003c; Capello, 2004a).
A patologia dentária em lagomorfos e roedores é extremamente comum, originando sintomas e
sinais clínicos complexos relacionados primariamente com a função e secundariamente com
outros órgãos e sistemas (Capello, 2004a; Capello, 2008b). Embora a etiologia possa estar
associada a braquignatismo, trauma, corpo estranho ou neoplasia, a maioria dos problemas
dentários no coelho faz parte de uma síndrome de evolução progressiva, que afecta a
morfologia, posição e estrutura dentárias. Esta síndrome de patologia dentária adquirida pode
ser estadiada clínica e radiologicamente. As alterações sofridas podem não envolver todos os
dentes simultaneamente (Capello, 2004a; Harcourt-Brown, 2006; 2007a).
Apesar das semelhanças anatómicas e fisiológicas entre o coelho e roedores, a patologia
dentária adquirida apresenta, neste último grupo, características particulares em termos de
diagnóstico, prognóstico e terapêutica. A crença comum de que roedores não são mais do que
coelhos em miniatura é profundamente errada e potencialmente danosa (Capello & Gracis,
2005).
PATOLOGIA DENTÁRIA CONGÉNITA
Incisivos
Molariformes
PATOLOGIA DENTÁRIA ADQUIRIDA
Braquignatismo/prognatismo
Outras malformações congénitas
Trauma
Atrição inadequada por nutrição deficiente
DOM
Braquignatismo/prognatismo
Outras malformações congénitas
Trauma
Atrição inadequada por nutrição deficiente
DOM 4
Patologia dentária congénita dos incisivos
Patologia dentária adquirida dos incisivos
Tabela 6. Etiologias mais comuns de patologia dentária em lagomorfos e roedores
(adaptada de Capello & Gracis, 2005; Lennox, 2008d).
4
Excepto roedores, ver 2.4.1. Incisivos.
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Qualquer processo que interfira com a erupção ou atrição normais dos dentes causa patologia
dentária mas, no geral, o sobrecrescimento dentário de incisivos e molariformes elodontes é a
sua principal causa no coelho e roedores (Capello, 2004a). As causas mais comuns de
patologia dentária em lagomorfos e roedores encontram-se esquematizadas na tabela 6.
2.1. Coelho – patologia dentária congénita
Estão descritas agenésia palatina, fendas palatinas, má nutrição materna, exposição a
teratogéneos (Crossley, 2003c; Capello, 2004a), acromegália, anomalias da calote craniana e
mutações esqueléticas (Lobprise & Wiggs, 1991), mas são consideravelmente raras (Capello,
2004a). Desconhece-se a incidência real de incisivos secundários supranumerários, mas
pensa-se que sejam frequentemente hereditários. Dentes supranumerários que eclodem entre
os incisivos secundários originais são geralmente mais dimensionados e de transmissão
recessiva (Lobprise & Wiggs, 1991). A patologia dentária congénita restringe-se, normalmente,
a má oclusão dos incisivos, afectando ocasionalmente molariformes (Lennox, 2008d). A má
oclusão dos incisivos é considerada por alguns autores a apresentação clínica mais comum de
patologia dentária, sendo um estímulo iatrotrópico frequente, ao contrário do que acontece na
má oclusão de molariformes. No entanto, esta última representa, possivelmente, um
diagnóstico clínico mais frequente. Tal explicar-se-á pelo facto de os proprietários não se
aperceberem de problemas em dentes que, por razões anatómicas, não se encontram visíveis
(Capello & Gracis, 2005).
A má coaptação congénita da maxila/mandíbula pode ser devida a braquignatismo maxilar ou
prognatismo mandibular, e constitui a principal causa de sobrecrescimento, desvio e má
oclusão dos incisivos (Capello & Gracis, 2005). Frequentemente, fala-se em prognatismo
mandibular quando, na realidade, é a maxila que se encontra diminuída, existindo
braquignatismo maxilar (Fox and Crary, 1971; Lobprise & Wiggs, 1991; Crossley, 1995a; Roux,
2005; Verstraete & Osofsky, 2005; Lobprise, 2007a). Este, de origem genética, afecta
especialmente coelhos-anões de raça pura (Harcourt-Brown, 1997; Legendre, 2002; Crossley,
2003c; Capello & Gracis, 2005, Meredith, 2007), verdadeiramente braquicefálicos, e de peso
inferior a um quilo (Harcourt-Brown, 1997; Legendre, 2002; Capello & Gracis, 2005; Meredith,
2007).
No retrognatismo/prognatismo, os molariformes mandibulares posicionam-se rostralmente aos
maxilares (cross bite) e o primeiro molariforme mandibular não oclude com os dois primeiros
molariformes maxilares. Dado que os movimentos rostrocaudais têm amplitude limitada e a
retracção da mandíbula requer um esforço consciente considerável, esta posição não é
passível de correcção em repouso. Desta forma, ocorre sobrecrescimento dos incisivos
secundário a um desgaste dentário incorrecto. O sobrecrescimento, aliado às forças que
afectam a oclusão, agrava a má oclusão já existente. Os incisivos mandibulares projectam-se
rostralmente aos maxilares, com curvatura dorsorostral. Os incisivos maxilares, de maior
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curvatura, não sofrem desgaste mas o seu contacto com os mandibulares mantém a pressão
de oclusão, pelo que tendem a alongar em direcção ao palato. Com a perda do plano de
oclusão normal o corte e a preensão dos alimentos tornam-se progressivamente mais difíceis,
embora alguns animais aprendam a compensar, introduzindo alimento na boca pelo diastema.
O pelo apresenta-se menos cuidado e não são incomuns tufos presos aos incisivos (Capello &
Gracis, 2005).
O retrognatismo maxilar e o prognatismo mandibular relativo afectam também a oclusão dos
molariformes, sendo uma causa de patologia dentária adquirida nestes dentes. O desgaste
deficiente leva ao sobrecrescimento do pré-molar de cada ramo da mandíbula. Quando o
aumento em altura das coroas clínicas atinge um nível crítico, os movimentos verticais de
mastigação, já de si limitados, tornam-se insuficientes para que ocorra oclusão, mesmo com
grande retracção mandibular. Os ligamentos da articulação temporomandibular e os músculos
da mastigação adaptam-se à má oclusão, e a mandíbula assume permanentemente uma
posição prognata (Legendre, 2002).
2.2. Coelho – patologia dentária adquirida
2.2.1. Incisivos
Traumatismos
A fractura da sínfise mandibular é a lesão acidental mais comum (Meredith, 2007). É também
relativamente comum o coelho roer as grades da jaula e assim traumatizar as estruturas orais.
São ainda frequentes quedas, especialmente em animais não castrados/esterilizados, mais
quezilentos e de maneio e contenção mais difíceis (Capello & Gracis, 2005). O traumatismo
pode lesionar o tecido germinativo dos incisivos e afectar o seu crescimento, o que
frequentemente causa má oclusão. Fracturas dos incisivos com exposição da polpa podem
provocar pulpite e abcedação (com sofrimento considerável do animal) e são tipicamente
iatrogénicas, ocorrendo quando o corte dos dentes é desnecessário e/ou efectuado com
ferramentas inadequadas (Capello, 2004a). Quando a exposição pulpar é reduzida e a
vascularização da polpa permanece intacta pode não ser necessário tratamento, mas a
maioria dos casos requer a intervenção de especialistas para pulpectomia parcial. Casos não
tratados resultam frequentemente em necrose pulpar, com formação de abcessos periapicais
desde dias até meses após o trauma (Meredith, 2007).
Dieta e atrição inadequados
David Crossley é o grande proponente da atrição dentária insuficiente ou inadequada como
causa principal de patologia dentária no coelho, com base nas diferenças substanciais entre a
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dieta dos animais silvestres e a dos domesticados: quase 100% dos proprietários oferece uma
dieta incorrecta aos seus animais, por exemplo, pellets e grãos; quase 100% dos coelhos
domesticados desenvolve patologia dentária, ainda que subclínica (Capello & Gracis, 2005;
Crossley, 2005).
Animais com dietas probres em fibra e ricas em hidratos de carbono apresentam, de facto,
uma atrição dentária reduzida (Crossley, 2005; Meredith, 2007; Reiter, 2008). Animais com
dietas constituídas por concentrado ou cereais pobres em fibra tendem a esmagar o alimento
com movimentos dorsoventrais, ao invés dos movimentos de moagem laterais requeridos por
dietas com alto teor de fibra (Capello & Gracis, 2005; Crossley, 2005; Meredith, 2007; Reiter,
2008). Com a alteração do padrão de atrição, os incisivos sofrem desvio e, em repouso, os
incisivos mandibulares deixam de ocludir entre o par de incisivos maxilares. Alguns autores
consideram que a primeira alteração sofrida é a perda da terminação em bisel do dente,
seguida do aumento em profundidade e altura, e deformação das coroas de reserva e clínicas.
O subsequente agravamento do grau de má oclusão predispõe para fractura, pulpite e
infecções periapicais (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005).
Com crescimento anómalo dos incisivos maxilares pode haver lesões dos tecidos moles
(lábios em particular, língua, palato duro e nariz); os incisivos mandibulares raramente causam
lesões tecidulares (Capello, 2004a; Capello & Gracis 2005). As lesões e a própria má oclusão
podem ser discretas, pelo que é necessário observar os incisivos de todos os ângulos (Capello
& Gracis, 2005).
O sobrecrescimento pode levar ao aumento de tamanho do sistema pulpar, sendo possível
vislumbrar a polpa rosada no interior da coroa clínica. Nestes casos é necessário um cuidado
especial aquando de redução coronal dos incisivos para evitar expôr a polpa, o que leva
inevitavelmente a pulpite e causa dor profunda (Capello & Gracis, 2005; Crossley, 2003b;
2003c).
Má oclusão dos incisivos e dos molariformes podem ocorrer isoladamente, ainda que tal não
seja muito frequente. Embora a má oclusão dos incisivos seja frequentemente secundária a ou
concomitante com má oclusão dos molariformes, especialmente no coelho geriátrico (HarcourtBrown, 1997; Verstraete & Osofsky, 2005) e na chinchila (Harcourt-Brown, 1997), pode, ela
própria, causar má oclusão secundária dos molariformes (Harcourt-Brown, 2002b; Capello &
Gracis, 2005; Reiter, 2008).
Curiosamente, animais com dietas à base de pellets demonstraram as maiores diferenças
entre a taxa de atrição e a de erupção; a duração da alimentação parece, assim, ser mais
determinante do que a dureza do alimento (Harcourt-Brown, 2002b).
O plano de oclusão pode manter-se normal mesmo quando alterações profundas do ápice e
coroas de reserva determinam a curvatura anormal dos incisivos. No estadio final da má
oclusão dos incisivos a deformação é de tal ordem que se assemelha ao elodontoma do cão
da pradaria (Capello & Gracis, 2005).
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Coelhos com dietas inapropriadas (misturas pobres em fibra, grão, sementes e frutos secos)
apresentam maior risco de desenvolverem patologia dentária, correspondendo, com efeito, à
maioria dos pacientes observados (Capello & Gracis, 2005; Lennox, 2008a). Apesar disto,
muitos animais alimentados incorrectamente nunca desenvolvem patologia dentária, o que
sugere a existência de outros factores etiológicos igualmente importantes (Harcourt-Brown,
2002b; Capello & Gracis, 2005; Lennox, 2008a).
Doença óssea metabólica (DOM)
Num estudo em 40 coelhos Harcourt-Brown (1995) verificou que má qualidade dentária e
óssea constituíam um factor etiológico de patologia dentária mais importante do que a
presença de má oclusão. Propôs DOM como causa de patologia dentária adquirida em
coelhos domésticos, englobando doenças como hipovitaminose D, osteoporose, oestodistrofia
nutricional e hiperparatiroidismo nutricional secundário (Harcourt-Brown, 2002b).
A proposta de DOM como causa predisponente para patologia dentária adquirida é baseada
nos seguintes factos: pacientes afectados apresentam desmineralização generalizada dos
ossos do crânio e exames radiográficos consistentes com doença osteodistrófica progressiva
dos ossos cranianos e dentes; pacientes com patologia dentária adquirida (e sem acesso a luz
natural) apresentam níveis séricos de cálcio total diminuídos, níveis de vitamina D
indetectáveis e níveis de PTH muito elevados; e o aumento dos níveis de cálcio na dieta de
pacientes com sintomatologia precoce de DOM causa a reversão de algumas lesões
(Harcourt-Brown 1996; 2002b; 2006; Harcourt-Brown & Baker, 2001; Capello & Gracis, 2005).
O metabolismo do cálcio no coelho apresenta particularidades muito específicas, sendo os
seus mecanismos homeostáticos menos rígidos que os da maioria dos mamíferos. Os valores
de cálcio total normais variam num intervalo considerável, sendo 30-50% superiores aos dos
demais mamíferos. O cálcio é absorvido passivamente no intestino, sendo o total absorvido
directamente proporcional ao total ingerido, sem relação com necessidades metabólicas
(Harcourt-Brown & Baker, 2001; Redrobe, 2002; Harcourt-Brown, 2004; 2006; Eckerman-Ross,
2008). No coelho - e demais lagomorfos (Redrobe, 2002) – a homeostase do cálcio é mantida
através da regulação da sua excreção renal e não da absorção intestinal, pelo que as
concentrações de cálcio sérico e urinário podem reflectir fisiologicamente o seu aporte
dietético (Harcourt-Brown & Baker, 2001; Harcourt-Brown, 2006). A absorção intestinal não
está, normalmente, dependente de vitamina D3 (Redrobe, 2002; Harcourt-Brown, 2004; 2006;
Eckerman-Ross, 2008), excepto quando a dieta é deficiente em cálcio (Harcourt-Brown &
Baker, 2001; Redrobe, 2002; Harcourt-Brown, 2006). A vitamina D3 influencia a excreção renal
do cálcio e do fósforo (Harcourt-Brown & Baker, 2001; Redrobe, 2002), diminuindo aquela em
caso de hipovitaminose D (Redrobe, 2002).
A secreção de PTH e calcitonina responde rapidamente a alterações dos níveis séricos de
cálcio iónico, não sendo permitidas grandes variações na sua concentração; alterações na
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PTH ocorrem apenas a níveis muito elevados (mas ainda normais) de cálcio, o que sugere que
a paratiróide responda a alterações no cálcio iónico mantendo as suas concentrações dentro
do intervalo fisiológico da espécie (Redrobe, 2002; Eckerman-Ross, 2008). Em pacientes com
patologia dentária adquirida as concentrações séricas de PTH e cálcio encontram-se,
respectivamente, elevadas e diminuídas, quando comparadas com animais domésticos
saudáveis de vida livre (Harcourt-Brown & Baker, 2001).
A eficácia da absorção passiva de cálcio está associada à dentição elodonte; durante a atrição
dentária normal o cálcio vai sendo continuamente libertado, engolido e reabsorvido no intestino
delgado. Durante períodos de grande aporte de cálcio o rim compensa aumentando a
excreção fraccional de cálcio na urina; da mesma forma, há reabsorção tubular durante
períodos de privação de cálcio. O cálcio excretado precipita como carbonato de cálcio na
urina, tornando-a turva (Redrobe, 2002; Harcourt-Brown, 2004; Eckerman-Ross, 2008). A
concentração urinária de cálcio depende do seu aporte, tornando-se a urina límpida quando a
excreção diminui, ou seja, em períodos de maior exigência metabólica como crescimento,
gestação e patologia metabólica (Harcourt-Brown, 2002c; 2006; Redrobe, 2002; EckermanRoss, 2008); em pacientes anoréxicos ou com dietas deficientes em cálcio; e ocasionalmente
em caso de insuficiência renal (Harcourt-Brown, 2006).
Apesar da ausência de mecanismos homeostáticos rígidos, a hipocalcémia é rara mesmo na
presença de graves deficiências em cálcio, havendo relatos de animais com normocalcémia
até pouco tempo antes da sua morte, apesar da profunda descalcificação esquelética
(Redrobe, 2002). Ainda assim, está descrita tetania de lactação (Harcourt-Brown, 2006). Tal
como nas demais espécies, o hiperparatiroidismo afecta principalmente a deposição mineral
mandibular. O hiperparatiroidismo nutricional secundário manifesta-se pela perda de osso
alveolar, o que permite sobrecrescimento dentário e aumento da mobilidade dentária. Os
dentes ainda em crescimento sofrem alterações estruturais, havendo diminuição da produção
de esmalte e enfraquecimento geral, que pode conduzir a fractura das coroas clínicas. Os
ossos do crânio sofrem desmineralização, podendo todo o esqueleto ósseo ser afectado, em
particular a coluna vertebral (Harcourt-Brown, 2004).
O coelho alimenta-se selectivamente, preferindo normalmente o grão da ração aos legumes e
feno fornecidos. A maioria das vitaminas e minerais nas rações comerciais encontra-se nos
pellets, frequentemente rejeitados devido à sua baixa palatibilidade, pelo que convém ter
presente que acesso a fontes vitamínicas não significa, necessariamente, a ingestão das
mesmas (Harcourt-Brown, 1996; Redrobe, 2002). Por outro lado, o coelho necessita de
exposição a radiação UV para a síntese de vitamina D3, sendo a sua concentração
especialmente baixa na Primavera (ou seja, final do Inverno) e em animais com pouco ou
nenhum acesso a luz solar, exercício e pastagem (grazing) (Fairham & Harcourt-Brown, 1999).
A DOM predispõe para defeitos de oclusão nos incisivos, que resultam em sobrecrescimento e
formação de estrias horizontais no esmalte dos incisivos maxilares primários (Harcourt-Brown,
1996).
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Assim, parece claro que a etiologia da síndrome da patologia dentária adquirida não é ainda
totalmente compreendida, desconhecendo-se se é devida a factores genéticos, dietéticos ou
metabólicos – ou, possivelmente, a combinações de dois ou mais factores. A relação
fisiopatológica entre lesões ortodônticas, endodônticas e periodontais tão pouco está
esclarecida (Verstraete & Osofsky, 2005).
2.2.2. Molariformes
A má oclusão primária dos molariformes é uma das causas mais comuns de patologia
dentária. A patologia dentária adquirida destes dentes apresenta várias gradações, podendo
ser feito o seu estadiamento com recurso a radiografias e, sobretudo, a endoscopia. Uma
avaliação e diagnóstico correctos são tanto mais importantes quanto é frequente a subtileza ou
até ausência de sintomatologia clínica. O diagnóstico precoce é vital para o tratamento e
resolução de lesões dos tecidos moles, bem como para travar a progressão da doença
dentária (Capello & Gracis, 2005).
No coelho, a atrição insuficiente por consumo de alimento inadequado é considerada por
alguns autores a etiologia mais importante de patologia dentária adquirida dos molariformes
(Capello, 2004a; Crossley, 2005). Os movimentos verticais predominantes e acentuados
diminuem o desgaste dos planos de oclusão, particularmente na porção lingual dos
molariformes mandibulares e na porção bucal dos molariformes maxilares. Aumenta a pressão
exercida sobre os molariformes, resultando em desvio do eixo e alterações na curvatura das
coroas clínicas, e agravamento da má oclusão pré-existente (Capello & Gracis, 2005;
Crossley, 2005). O sobrecrescimento é, até certo ponto, contrariado pela força dos músculos
envolvidos na mastigação, mas esta aposição de forças acentua o encurvamento anómalo dos
molariformes em crescimento. Os pré-molares e molares mandibulares tipicamente encurvam
medialmente, apresentando convexidade lateral; os maxilares sofrem o processo oposto. Este
encurvamento é anómalo no coelho, cujo plano de oclusão normal é horizontal (Capello, 2003;
Legendre, 2003; Capello & Gracis, 2005). A má oclusão impede o desgaste dentário das
coroas clínicas entre a porção lingual mandibular e a porção bucal maxilar. Como resultado,
surgem esporões e espículas dentários afiados, que podem causar lesões e ulcerações da
língua (molariformes mandibulares) (fig. 2) e da mucosa da bochecha (molariformes maxilares)
(fig. 3) (Harcourt-Brown, 2002b; Capello & Gracis, 2005; Lobprise, 2007b).
A erupção diminui apenas quando a pressão de oclusão da mandíbula em repouso iguala a
pressão eruptiva. No entanto, o crescimento dentário não é interrompido, continuando em
sentido apical com intrusão dos ápices e do tecido germinativo (Crossley, 2005), e resultando
em alterações irreversíveis dos ápices, tecido germinativo, e osso alveolar cortical mandibular
e maxilar (Crossley, 2005; Capello & Gracis, 2005). Ocorre, simultaneamente, atrofia nas
inserções musculares, especialmente em zonas de inserções musculares no ramo da
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mandíbula. Nestes locais, o osso pode apresentar-se tão fino que seja quase transparente, ou
encontrar-se perfurado (Meredith, 2007).
Figura 2. Esporão no PM1 mandibular.
Figura 3. Esporões maxilares.
O primeiro molariforme apresenta um esporão
na face lingual, que causou já alguma
ulceração da língua (zona medial escura).
Os molariformes maxilares estão
sobredimensionados, apresentando os
primeiros três esporões na face bucal.
Na DOM dos molariformes há deformação do osso cortical submandibular, e encurvamento e
rotação dos molariformes nos alvéolos. Estas alterações conduzem a má oclusão, tendo como
resultado um desgaste anómalo da coroa clínica (Capello & Gracis, 2005). Alterações nas
coroas de reserva e curvatura dos dentes levam ao aumento dos espaços interdentário e
periodontal, permitindo, ainda, acumulação de alimento e constituindo um factor predisponente
para abcedação periapical importante (Capello, 2004a; Meredith, 2007).
De acordo com alguns autores, a exposição à luz solar e a correcção da dieta podem melhorar
a integridade dentária e óssea em caso de deficiências vitamínicas e minerais (Kamphues,
1991; Harcourt-Brown, 1995; 1996; 1997). No entanto, não há unanimidade em relação à
importância dos níveis dietéticos de cálcio na patologia dentária. Os dentes não funcionam
normalmente como fonte de cálcio na regulação homeostática (Rasmussen, 1972; 1977),
sendo necessário um período prolongado de deficiência extrema para que o crescimento e
desenvolvimento dentários sejam afectados (Van Caelenberg et al., 2008). Não obstante, um
aporte nutricional de cálcio deficiente parece aumentar a progressão de lesões reabsortivas
(Harcourt-Brown, 1996) e Harcourt-Brown (2006) sugere que os valores de cálcio na dieta
rondem os 0,6-1%.
As alterações patológicas mais frequentes da patologia dentária adquirida são abcedação
periapical e osteomielite; ocorrem também fracturas longitudinais, perda do ancoramento
ósseo, acumulação de alimento e fístulas. Na osteomielite, a infecção óssea pode localizar-se
no ápice de um dente ou afectar outros dentes, bem como a maxila e a mandíbula (Bennet,
1999; Crossley, 2003c; Capello, 2003; 2004a; Legendre, 2003).
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Outras alterações do plano de oclusão incluem boca em escada, na qual os molariformes
crescem a velocidades diferentes, havendo grande disparidade na altura das coroas clínicas; e
boca ondulada (fig. 4), na qual o plano de oclusão é ondulado devido a diferenças de alguns
milimetros entre as mesmas (Capello, 2004a; Capello, 2004b; Crossley, 2003c). Normalmente,
estas alterações não são acompanhadas de esporões ou esporões ósseos, que caracterizam
um estadio de doença dentária mais avançado. Os sinais e sintomas são discretos, podendo
até encontrar-se ausentes, enfatizando a necessidade de um exame dentário completo ainda
que o paciente não apresente queixas (Capello & Gracis, 2005).
Figura 4. Boca ondulada, projecção LL esquerda.
É visível a ligeira diferença de comprimento entre os
molariformes maxilares.
O sobrecrescimento das coroas clínicas dos molariformes (pré-molares em particular) pode
causar prognatismo mandibular funcional. Inicialmente, o sobrecrescimento impede a aposição
normal da maxila e mandíbula rostralmente, forçando a boca a permanecer aberta e causando,
como primeira alteração patológica, má oclusão dos incisivos. O sobrecrescimento dentário
pode ser mascarado pelo concomitante aumento em altura das gengivas (Capello, 2004a).
Como já referido, o problema não é exclusivamente intraoral uma vez que existe aumento em
profundidade das coroas de reserva, com alterações apicais e periapicais (Crossley, 1995a).
Harcourt-Brown (2007a) sugere, com base na análise de 175 crânios preparados e 315
radiografados, que na síndrome da patologia dentária adquirida o sobrecrescimento apical seja
a primeira alteração sofrida, precedendo todas as outras, incluindo o sobrecrescimento
coronal; à medida que a patologia progride, surgem alterações na forma, estrutura e posição
dos dentes, levando a má oclusão e deformações coronais visíveis.
O crescimento apical provoca remodelação tecidular em torno dos ápices, eles próprios
deformados, que se traduz por tumefacções submandibulares. O sobrecrescimento das coroas
de reserva maxilares afecta o processo zigomático e pavimento da órbita, causando
sintomatologia ocular; o osso maxilar propriamente dito raramente é afectado (Crossley,
1995a). O crescimento apical provoca estiramento do periósteo e, não raramente, a sua
perfuração (Capello, 2004a; Meredith, 2007).
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A acumulação de placa dentária, a doença periodontal primária e as cáries em herbívoros
elodontes são consideradas raras por muitos autores (Crossley, 2003c; Capello, 2004a) 5 . No
coelho, ainda assim, a doença periodontal é comum, uma vez que o ligamento periodontal é
estruturalmente frágil e, como tal, predispõe para acumulação de alimento (Meredith, 2007),
que constitui a causa de doença periodontal primária mais frequente no coelho. Não obstante,
a doença periodontal é mais frequentemente secundária a diminuição ou interrupção da
erupção (Crossley, 2003c), provocando perda da condição corporal e debilidade (Legendre,
2003).
O sobrecrescimento dentário, especialmente dos molariformes, é um factor significativo, visto
causar o aumento dos espaços interdentários. A infecção periodontal, frequentemente com
envolvimento de bactérias anaeróbias (por exemplo, Fusobacterium spp., Staphylococcus spp.
e Streptococus spp.), pode alcançar o ápice, causando lesões endodônticas à medida que a
polpa é afectada. Abcessos odontogénicos resultam frequentemente deste tipo de infecção ou
de lesões mucosas por esporões dentários. Infelizmente, a maioria dos abcessos provoca
alterações profundas nos tecidos circundantes, incluindo o osso alveolar, pelo que, mesmo
após o seu tratamento bem sucedido, permanecem sequelas (Meredith, 2007).
Lesões reabsortivas foram reconhecidas em várias espécies, como o homem, chimpanzé, cão,
gato, coelho, chinchila e ratazana, e o coelho não constitui excepção (Crossley, Dubielzig &
Benson, 1997; Legendre 2003). Acredita-se que sejam uma extensão da remodelação óssea
para o interior da dentina, podendo ser induzidas por inflamação devida a infecção periodontal,
ou traumatismo físico/químico do ligamento periodontal (Crossley et al., 1997). As cáries
também podem constituir um factor importante: dietas ricas em hidratos de carbono, atrição
reduzida e erupção interrompida predispõem para cáries, que podem destruir as coroas
clínicas e progredir subgengivalmente, estimulando a reabsorção. Se o paciente sobreviver
tempo suficiente, a reabsorção dentária pode causar o desaparecimento da maioria dos
molariformes. Coelhos afectados adaptam-se geralmente bem a uma dieta liquidificada
(Meredith, 2007).
2.3. Roedores – patologia dentária congénita
Em roedores, a patologia dentária congénita é ainda menos frequente que no coelho (Capello,
2008b). Em roedores silvestres estão documentados incisivos e molares ou molariformes
supranumerários, anodontia, variação no tamanho dos molares e padrão das cúspides e,
ainda, no número e posição das raízes (Sainsbury et al., 2004).
A má oclusão primária dos incisivos é rara. No entanto, estão descritos desvio congénito e má
oclusão primária em hamsters, ratazanas e esquilos. A distinção entre desvio congénito e má
oclusão por traumatismo repetido pode ser difícil, dado que os proprietários raramente se
5
Ver pp. 33-34 para análise da pertinência desta afirmação em roedores.
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apercebem da fractura original (Capello, 2008b). Em histricomorfos, a má oclusão congénita é
considerada rara uma vez que não estão descritos prognatismo mandibular ou braquignatismo
maxilar, apesar de relatos anedóticos no hamster (Capello, 2008b). Uma possível explicação
para tal é o facto de a grande amplitude de movimentos rostrocaudais permitir compensar uma
má coaptação ligeira (Capello & Gracis, 2005).
2.4. Roedores – patologia dentária adquirida
2.4.1. Incisivos
Não têm sido efectuados estudos sobre a etiologia de patologia oral em roedores silvestres,
restringindo-se geralmente os relatos a descrições das lesões encontradas. Anomalias da
erupção, oclusão e atrição são provavelmente mais comuns em roedores em cativeiro
(Sainsbury et al., 2004).
A má oclusão é a patologia oral mais comum em roedores, quer resulte do sobrecrescimento
dos incisivos quer, como é característico desta ordem, do sobrecrescimento de todos os
dentes (fig. 5) (Legendre, 2003). Má oclusão adquirida e desvio acentuado dos incisivos
ocorrem frequentemente após traumatismo repetido e fracturas (fig. 6) (Capello, 2008b). Uma
correcção atempada de qualquer das causas mais frequentes - dieta inadequada, traumatismo
ou patologia congénita – pode oferecer um controlo eficaz, embora apenas a primeira seja
passível de cura completa desde que diagnosticada precocemente (Legendre, 2003). Em
dentes de crescimento constante a má oclusão inicial é, segundo alguns autores,
caracterizada pela perda da terminação em bisel dos incisivos mandibulares, seguida por
sobrecrescimento e deformação das coroas clínicas e de reserva, aumentando a gravidade da
má oclusão e predispondo para fracturas, pulpite e infecções periapicais (Capello, 2004a).
No porquinho da Índia e chinchila, a má oclusão dos incisivos é normalmente secundária a
patologia dentária adquirida dos molariformes, e menos frequente que no coelho. O padrão de
má oclusão difere também do observado nesta espécie: normalmente, os incisivos maxilares
não sofrem o mesmo encurvamento extremo e raramente causam lesões dos tecidos moles; e
os incisivos mandibulares não sofrem um desvio que os posiciona rostralmente aos maxilares.
Em oclusão, pode haver braquignatismo mandibular e a mandíbula pode sofrer desvio lateral
(Capello & Gracis, 2005).
No porquinho da Índia, os dois padrões de má oclusão mais comuns são sobrecrescimento
das coroas clínicas dos incisivos mandibulares e plano de oclusão oblíquo com um desvio de
aproximadamente 45º. Na chinchila, pode haver crescimento dos incisivos maxilares em
direcção ao palato duro mas, como referido, num grau muito menos acentuado do que no
coelho (Capello, 2008b).
As longas coroas clínicas dos incisivos no porquinho da Índia levam frequentemente clínicos
com menos experiência nesta espécie a diagnosticar sobrecrescimento, apesar da ausência
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de anomalias do eixo de crescimento, especialmente se o estímulo iatrotrópico foi anorexia. A
correcção de incisivos normais agrava o quadro clínico pré-existente, podendo mesmo causar
nova patologia, como fractura ou pulpite (Westerhof & Lumeij, 1987; Capello & Gracis, 2005).
Em pacientes com má oclusão é comum ocorrer acumulação de alimento e pelos. Westerhof e
Lumeij (1987) mencionam a acumulação de pelos no sulco gengival, com prurido secundário a
ácaros, como causa de anorexia no porquinho da Índia.
Figura 5. Porquinho da índia – má
oclusão dos incisivos.
Figura 6. Porquinho da índia - fractura
dos incisivos.
A má oclusão dos incisivos é indicativa
de má oclusão dos molariformes
subjacente. Este paciente apresenta a
face, pescoço e peito molhados devido
a ptialismo.
Todos os
incisivos
apresentam
terminações irregulares, bem como
comprimento díspar intra-par, com
perda do plano de oclusão normal.
Traumatismo
Alguns roedores, como o cão da pradaria, tipicamente roem as grades da jaula, causando
lesão de tecidos moles (Capello, 2003). As quedas também são frequentes, sendo mais
comuns as fracturas dos incisivos, especialmente em pacientes geriátricos (Capello, 2008b),
do que as da mandíbula ou maxila (Legendre, 2003). Outros roedores, como o porquinho da
Índia, possuem temperamentos mais tranquilos, normalmente não roendo grades ou tendo por
hábito trepar ou saltar (Capello & Gracis, 2005). Apesar disto, tanto o porquinho da Índia como
a chinchila apresentam diversos padrões de fractura dos incisivos (Capello, 2008b); a chinchila
parece, de resto, especialmente atreita a fracturas destes dentes (Capello & Gracis, 2005).
Encontram-se desde fracturas simples com separação da sínfise até fracturas maxilares
expostas com envolvimento dentário. Na chinchila e no porquinho da Índia ocorrem facilmente
fracturas iatrogénicas (Capello, 2004a).
O hamster dourado apresenta frequentemente patologia dentária dos incisivos secundária a
fractura e infecção periapical ou pulpite. Estes dentes não são facilmente observados pelos
proprietários, pelo que o diagnóstico só é possível quando ocorrem complicações secundárias
graves. O padrão de má oclusão mais comum envolve um grande sobrecrescimento e
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encurvamento dos incisivos, frequentemente com lesões secundárias dos tecidos moles. O
hamster russo apresenta frequentemente má oclusão e fracturas, possivelmente por tentar
ingerir alimentos demasiado grandes e duros (Capello & Gracis, 2005).
O cão da pradaria apresenta frequentemente uma patologia dentária altamente específica.
Nesta espécie têm sido descritas grandes massas associadas aos ápices dos incisivos
maxilares (fig. 7), denominadas odontomas (Wagner, Garman & Collins, 1999; Phalen, Antinoff
& Fricke, 2000; Capello, 2002). Estes odontomas foram igualmente diagnosticados em cães,
ratinhos, vacas, cavalos e um elefante (Boy & Steenkamp, 2006). No cão da pradaria a
natureza destas massas é displástica, não se tratando de verdadeiras neoplasias. Por esta
razão, alguns autores consideram mais correcto o termo pseudo-odontoma (Legendre, 2003;
Capello, 2007).
No entanto, esta denominação tão pouco é completamente adequada. Os odontomas são os
tumores odontogénicos mais comuns em humanos, não havendo concordância quanto à sua
natureza; são considerados neoplasias por alguns autores e hamartomas por outros (Finkel,
Lombard, Staffeldt & Duffy, 1979; Wagner et al., 1999; Greenacre, 2004; Boy & Steenkamp,
2006). Um hamartoma é definido como um tumor benigno, causado pela proliferação
exagerada do tecido maduro característico da zona afectada, de forma desorganizada e com
predominância frequente de um elemento. A indefinição que rodeia a natureza destas massas
(isto é, hamartomosa versus neoplásica) nos dentes braquiodontes, e o crescimento contínuo
com especialização dos botões apicais dos dentes elodontes, sugerem a necessidade de se
encontrar um termo independente para a descrição de lesões com características histológicas
semelhantes nestes dentes. Foi proposto o termo elodontoma, que se refere a lesões
hamartomatosas do maxilar e mandíbula de espécies com dentes elodontes. Um elodontoma
será, assim, um hamartoma do tecido odontogénico e osso alveolar em desenvolvimento
constante no botão periapical do dente elodonte (Boy & Steenkamp, 2006). Por esta
terminologia ser muito clara e específica, será a adoptada neste trabalho.
Histologicamente, os elodontomas são caracterizados por ramificações da coroa de reserva do
dente afectado, seguida por proliferação expansiva de tecido dentário desorganizado,
resultando numa massa que ocupa o seio nasal (Greenacre, 2004). Tal como os odontomas,
podem ser divididos em compostos – estruturas similares a dentes em miniatura múltiplos - ou
complexos - um aglomerado de tecido odontogénico composto por tecidos moles e duros
(Finkel et al., 1979; Said-Al-Naief, 2005; Boy & Steenkamp, 2006).
Os diagnósticos diferenciais para a presença de áreas de maior opacidade na cavidade nasal
incluem infecção granulomatosa crónica com calcificação secundária (bacteriana ou fúngica),
reacção inflamatória devido a corpo estranho, polipos nasais, má formação dos turbinados
congénita ou adquirida, hamartoma e neoplasia (Jekl, Hauptman, Skoric, Jeklova, Fictum, &
Knotek, 2008), em particular o osteosarcoma, embora raríssimo (Mouser, Cole & Lin, 2006).
A fisiopatologia dos elodontomas em roedores não é clara, tendo sido propostas algumas
hipóteses, tais como reabsorção óssea diminuída e desorganização da remodelação da matriz
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extracelular, que implicam derivar a sua formação do confinamento do tecido odontogénico e
não da sua proliferação excessiva. A reduzida reabsorção óssea leva à penetração do tecido
germinativo recém-formado por trabéculas ósseas, causando a destruição de cordões
epiteliais e formação de células-filhas germinais que funcionam como ilhéus epiteliais
odontogénicos e sofrem um processo de maturação independente (Boy & Steenkamp, 2006).
No cão da pradaria o traumatismo repetido (devido ao constante roer de grades, fracturas por
queda ou redução coronal incorrecta) tem sido sugerido como causa de elodontomas (Phalen
et al., 2000; Capello, 2004a; 2007). O tipo e gravidade da patologia variam com a sua causa.
Um traumatismo crónico ligeiro, advindo do roer de grades, pode causar anomalias
anatómicas (tais como irregularidades na deposição do esmalte na face labial). Em
traumatismos mais graves o próprio processo de regeneração óssea pode levar à destruição
indirecta dos cordões epiteliais pelas trabéculas ósseas (Phalen et al., 2000). Nesta espécie, a
prevenção do trauma é uma medida importante de profilaxia e maneio de elodontomas
(Wagner et al., 1999). Legendre (2003) sugere ainda como etiologia possível uma dieta
insuficientemente dura, sugerindo como prevenção alimentos que permitam um desgaste
dentário de 1 mm/dia (como ervas e raízes ainda sujas de solo), que representa a atrição típica
da espécie.
A deformação sofrida pelos incisivos mandibulares é semelhante mas há crescimento intrusivo
da estrutura dentária deformada (Legendre, 2003; Capello, 2007).
Os elodontomas podem afectar um ou ambos os
incisivos (Phalen et al., 2000). A intrusão apical
aumenta a pressão sobre o tecido germinal, que
sofre distorção e ruptura. A taxa de crescimento
diminui gradualmente e a erupção acaba por cessar,
após o que a cura é completamente impossível. Em
geral, os incisivos maxilares são afectados primeiro.
Figura 7. Elodontoma bilateral, projecção
LObl direita.
São visíveis as alterações dos ápices dos
incisivos maxilares (setas vermelhas) e a
grande redução do diâmetro da cavidade nasal
(seta azul). O incisivo mandibular apresenta
perda da terminação em bisel (seta branca).
Uma vez que a taxa de atrição não sofre alterações
inicialmente,
as
coroas
clínicas
tornam-se
progressivamente mais curtas, podendo terminar
subgengivalmente.
Dependendo do tipo de dieta, o paciente pode ou não apresentar sintomatologia. A gravidade
das lesões observáveis no palato duro nem sempre têm correlação com a gravidade do quadro
clínico (Wagner et al., 1999). Nos casos mais graves, o elodontoma funciona como uma massa
obstrutiva que bloqueia progressivamente a porção medial ou caudal das vias nasais,
causando a típica sintomatologia respiratória (Phalen et al., 2000; Legendre, 2003; Capello,
2007; Jekl et al., 2008). A dispneia pode ser agravada pela presença de rinorreia (Phalen et
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al., 2000; Jekl et al., 2008). Nos casos mais avançados, as dificuldades respiratórias podem
ser tão grave que conduzam à morte (Boy & Steenkamp, 2006).
Dieta e atrição inadequados
Há poucos estudos sobre os requisitos dietéticos de muitas espécies exóticas. A observação
de chinchilas silvestres indica que se alimentam de sementes, folhas, caules e cascas de
várias plantas cuja disponibilidade depende da estação, mas desconhece-se o alcance da sua
variedade ou quantidade relativa de ingestão de cada planta. Ainda que, em cativeiro, os
histricomorfos se alimentem maioritariamente de feno ou ervas frescas, estas provêm de
pastagem não montanhosa, possuindo um teor de silicatos muito inferior ao da dieta natural
(Crossley, 1995b).
Assim, a dieta típica de cativeiro é não apenas mais concentrada e calórica, como bastante
menos abrasiva, diminuindo a atrição dentária (Crossley, 1995b; Crossley & Del Mar Miguelez,
2001). O conteúdo nutricional óptimo, ao contrário do que acontece com a dieta natural,
permite a mineralização dentária máxima, aumentando a resistência ao desgaste (Crossley &
Del Mar Miguelez, 2001). Finalmente, a forma do alimento (pellets, alimento pré-moído) altera,
por sua vez, o padrão de mastigação, diminuindo a sua duração e privilegiando movimentos de
esmagamento, ao invés de movimentos de moagem. A taxa de atrição diminui, assim,
substancialmente (Crossley & Del Mar Miguelez, 2001; Legendre, 2002; Meredith, 2007;
Reiter, 2008).
Doença óssea metabólica (DOM)
A MBD como causa subjacente de doença dentária não foi ainda especificamente estudada
em roedores (Capello, 2004a; Capello, 2007). No entanto, na chinchilla não parece haver
correlação entre anomalias do metabolismo do cálcio e problemas dentários (Crossley, 2003a).
2.4.2. Molariformes
Nos roedores herbívoros, a má oclusão é mais frequentemente causada pelos molariformes
que pelos incisivos. O sobrecrescimento das coroas clínicas é menos frequente e exuberante
que em lagomorfos. Nos histricomorfos, a etiologia mais importante de patologia dentária
adquirida nestes dentes é a atrição insuficiente por consumo de alimento inadequado. Em
sciuromorfos e miomorfos, pelo contrário, os mesmos dentes podem sofrer alterações
patológicas maioritariamente devido a infecções e abcedação resultantes de cáries e fracturas
(Capello,
2004a).
Suspeita-se
que
possa
existir
uma
componente
genética
no
sobrecrescimento dos molariformes no porquinho da Índia (Crossley, 1995b) e na chinchila
(Crossley, Jackson, Yates & Boydell, 1998).
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A hipovitaminose C ocorre muito raramente (Capello, 2004a). No porquinho da Índia, o
sobrecrescimento dos molariformes pode ser ser devido a factores metabólicos ou deficiências
nutricionais (Crossley, 1995b). A hipovitaminose C (Capello, 2004a) e o excesso de selénio
(Crossley, 1995b) interferem com o metabolismo do colagénio, sendo uma causa
predisponente de patologia dentária nesta espécie (Crossley, 1995b; Capello, 2004a; Lobprise,
2007b).
Dentes cuja erupção não é contrariada continuam a crescer. Nos histricomorfos, tal como no
coelho, é comum o sobrecrescimento das coroas clínicas dos molariformes causar
prognatismo mandibular funcional, que é frequente e erroneamente diagnosticado como
congénito (Capello, 2004a).
O encurvamento dos molariformes é anómalo na chinchila mas mimetiza a anatomia normal no
porquinho da Índia, pelo que o seu reconhecimento precoce é mais difícil nesta espécie
(Capello, 2003; Legendre, 2003).
Em muitos casos, a gengiva e o osso alveolar também aumentam em altura, tendendo a
mascarar o sobrecrescimento dentário durante o exame visual. Há variação intraespecífica no
grau de resposta ao sobrecrescimento das coroas clínicas (Crossley, 2003a). No porquinho da
Índia, a divergência rostrocaudal e o plano de angulação tendem a empurrar a mandíbula
rostralmente, podendo causar má oclusão dos incisivos (Crossley, 1995b). O porquinho da
Índia e a chinchila podem apresentar alterações do plano de oclusão semelhantes à boca
ondulada e boca em escada do coelho (Capello & Gracis, 2005).
É necessário recorrer a exames radiográficos para o diagnóstico, especialmente nos estadios
iniciais, porque o sobrecrescimento das coroas clínicas não é detectável (Crossley, 1995b). É
mais frequente reflectir-se no aumento em altura das coroas clínicas no porquinho da Índia do
que na chinchila (Crossley, 2003a). Ainda que seja normalmente acompanhado pelo
sobrecrescimento das coroas de reserva, pode ocorrer apenas crescimento das coroas de
reserva (Capello, 2004a).
O aumento em altura das coroas clínicas reduz a eficácia alimentar, embora muitas vezes com
sintomatologia discreta (Legendre, 2003; Reiter, 2008). Uma maior susceptibilidade ao stress
de oclusão (ou seja, forças de intrusão aplicadas aos dentes e sua duração) parece ser o
principal factor no desenvolvimento de alterações apicais (Crossley, 2003a). Forças intrusivas
superiores ao normal podem fazer cessar o crescimento das coroas clínicas, mas o
crescimento apical continua, especialmente na chinchila (Crossley, 1995b; Capello, 2003;
Legendre, 2003). Há remodelação tecidular em torno dos ápices, eles próprios deformados. A
projecção do ápice para os tecidos periapicais causa, nos histricomorfos, tumefacções
mandibulares mais lateralizadas do que no coelho, com envolvimento da bula alveolar. A
projecção de ápices para o interior da órbita, no caso dos dentes maxilares, pode causar
obstrução do ducto nasolacrimal. É frequente ocorrer sintomatologia ocular, epífora e/ou
corrimento ocular, por exemplo (Crossley, 1995b; 2003a; Legendre, 2003; Meredith, 2007;
Reiter, 2008).
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As alterações na curvatura dentária podem originar esporões dentários (figs. 8 e 9) e aumento
dos espaços interdentários, que permitem acumulação de alimento e predispõem para
abcedação periodontal, clinicamente óbvia, com diminuição da condição corporal e debilidade
associadas (Crossley, 1995b; Crossley, 2003a; Legendre, 2003; Meredith, 2007; Reiter, 2008).
Nos roedores, os esporões dentários são menos frequentes, de menor comprimento e menos
afiados, podendo não lesionar os tecidos moles (Capello, 2003; 2004a; 2004b; Crossley,
2003b; Legendre, 2003).
Figura 8. Porquinho da Índia – esporão no
PM1 maxilar esquerdo.
Figura 9. Chinchila – esporão no PM1
maxilar esquerdo.
A face, pescoço e peito dos pacientes encontram-se molhados devido a ptialismo.
No porquinho da Índia, a anatomia da língua e a convergência das arcadas dentárias
molariformes levam à formação de uma ponte dentária sobre a língua que impede a preensão
e deglutição normais, correspondendo a um estadio de má oclusão avançado (fig. 10)
(Legendre, 2003; Capello, 2003; 2004a; Capello & Gracis, 2005; Lobprise, 2007b).
Figura 10. Porquinho da Índia –
ponte dentária.
A língua encontra-se aprisionada,
impedindo a alimentação normal.
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Em chinchilas, ocorre sobrecrescimento dentário óbvio apenas nos estadios finais da patologia
dentária (Capello, 2004a; Brenner et al., 2005). Os estadios iniciais da patologia dentária,
incluindo desgaste dentário, são caracterizados por um elevado grau de simetria bilateral; a
presença de doença avançada aumenta a probabilidade de assimetria (Crossley, 2003a).
O sobrecrescimento dentário parece estar envolvido na patogénese de doença periodontal dos
molariformes por acumulação de alimento (Crossley, 2001b). Na chinchila, pode haver
perfuração do osso cortical com exposição dos ápices (fig. 11); apesar disto, esta espécie
parece menos predisposta para desenvolver abcessos periapicais, infecção de tecidos moles e
osteomielite do que o coelho (Capello & Gracis, 2005; Capello, 2008b). O aumento das coroas
clínicas dos molariformes maxilares é frequentemente acompanhado por hiperplasia gengival
(Capello, 2008b).
Figura 11. Mandíbula de chinchila, vista lateral.
Figura 12. Cáries em molariformes de chinchila –
mandíbula, vista dorsal.
São visíveis as deformações ósseas apicais
lateralizadas (setas vermelhas) e a perfuração do
osso cortical (seta azul)
São visíveis as cavidades de coloração castanhoclara características de cárie (setas brancas).
Figura 13. Maxila de chinchila – vista
ventral.
Figura 14. Cáries e lesões reabsortivas em
molariformes de chinchila – projecção LObl direita.
São visíveis uma cárie de oclusão (seta
branca), esporões por sobrecrescimento
dos molariformes com desvio bucal (setas
azuis), espaços interdentários aumentados
do lado direito. O MM4 direito encontra-se
ausente.
São visíveis cáries de oclusão e interdentárias (setas
vermelhas), e zonas radiolucentes compatíveis com
lesões reabsortivas (setas azuis).
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Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
A doença dentária em roedores é caracterizada pelas mesmas entidades que afectam os
demais mamíferos: cáries (figs. 12-14), fracturas e doença periodontal (Legendre, 2003).
Como atrás referido, as cáries e a doença periodontal são consideradas raras por vários
autores (Capello, 2004a), devido a uma combinação inibitória de baixo pH da saliva, dieta
pobre em açúcares (Crossley et al., 1997; Sainsbury et al., 2004), ausência de microbiota
cariogénica (Sainsbury et al., 2004) e anatomia dentária (Crossley et al., 1997).
Porém, existe um estudo que contesta esta afirmação. Sone, Koyasu, Tanakab e Oda (2005)
estudaram a patologia dentária em crânios de museu de animais silvestres de diferentes locais
da América Central e do Sul, recolhidos ao longo de 110 anos. Os crânios representavam
cinco géneros de histrocomorfos, divididos, consoante o tipo de ecologia e dieta, em frugíveros
e grazers 6 . Todos os histricomorfos possuem a mesma fórmula dentária mas nos frugíveros os
pré-molares são difiodontes, sendo substituídos pelos dentes definitivos à medida que o
animal cresce. Os molares da capivara são elodontes, os das demais espécies anelodontes
(Sone et al., 2005).
Colyer 7 (citado por Sone et al., 2005) investigou a ocorrência de cáries em 3800 crânios de
museu de vários roedores silvestres, não tendo encontrado evidência da sua existência.
Concluiu, assim, que as cáries são raras em roedores silvestres. Sone et al. (2005), utilizando
os critérios anteriormente estabelecidos por Colyer para a definição de cárie, encontraram
cárie e doença periodontal em todas as espécies de grazers e frugíveros examinadas, com
maior prevalência neste último grupo. A maioria das lesões encontrava-se nos estadios
iniciais, embora nos frugíveros algumas se apresentassem mais avançadas. Sone et al. (2005)
concluiram que as cáries ocorrem naturalmente roedores silvestres, não representando uma
patologia rara.
A cárie é um processo de desmineralização dentária iniciado pelos metabolitos acídicos
bacterianos, estando normalmente associada a acumulação de placa bacteriana na superfície
do dente e à disponibilidade de hidratos de carbono facilmente digeríveis (Legendre, 2003).
Sone et al. (2005) postularam que a sua grande incidência se devesse ao consumo de frutos
frescos, dado que os açúcares da fruta são hidratos de carbono fermentáveis. A capivara foi a
única espécie pouco afectada por cáries, tendo este facto sido atribuído aos seus molares
elodontes, sujeitos a atrição permanente e com fissuras pouco profundas.
Em cativeiro, a doença periodontal tem sido associada a uma componente genética, infecções
e/ou geriatria (Sainsbury et al., 2004). Segundo o estudo de Sone et al. (2005), a doença
6
Grazers: capivara (Hydrochaeris hydrochaeris), coypu (M. Coypus); frugíveros: agouti (Dasyprocta leporina, D. fuliginosa e D.
Unctata), acouchi (Myoprocta acouchi) e paca (Agouti paca).
7
MILES, A.E.W. & GRIGSON, C. (1990). Colyer’s variation and diseases of the teeth of animals. Cambridge, UK: Cambridge
University Press.
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Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
periodontal parece ser mais comum em animais silvestres do que a cárie. Todos os grazers
apresentavam doença periodontal moderada (especialmente a capivara) mas, entre os
frugíveros, apenas duas espécies de agoutis se encontravam afectadas. A amostra analisada
pelos autores provinha de diversas localidades, sem ter havido ocorrência localizada da
doença, o que parece pôr de parte a hipótese de determinação genética.
Em laboratório tem sido facilmente induzida doença periodontal em roedores através da
introdução de uma dieta rica em açúcar ou amido, promovendo a acumulação de placa
bacteriana e sobrecrescimento de bactérias patogénicas. Porém, a sua fisiopatologia em
histricomorfos, herbívoros estritos, é substancialmente diferente, estando associada à
acumulação de alimento fibroso entre os dentes com lesão da margem gengival e invasão
bacteriana. Deste modo, o alimento fibroso poderá contribuir para a doença periodontal em
histricomorfos, o que parece ser corroborado pelo facto de, neste estudo, e ao contrário do
observado na cárie, quase não ter sido encontrada doença periodontal nos roedores frugíveros
(Sone et al., 2005).
Por outro lado, a chinchila foi descrita como sendo naturalmente resistente a cáries, mas
animais alimentados com suplementos ricos em sacarose demonstram maior predisposição
para o seu desenvolvimento, principalmente se a alimentação for acompanhada de diminuição
da mastigação e da produção de saliva (Crossley et al., 1997). Em relação à doença
periodontal, Crossley encontrou evidência desta patologia em 63% das chinchilas examinadas.
Chinchilas saudáveis apresentavam pouca placa bacteriana, ao contrário de animais com
aumento apical das coroas de reserva, sendo a acumulação de alimento mais comum em
dentes cujos espaços interdentários sofreram aumento (Crossley, 2003a). Em miomorfos, os
molares braquiodontes são particularmente vulneráveis a desgaste excessivo, cáries e
fracturas (Capello & Gracis, 2005). Animais com dietas ricas em sacarose e amidos refinados
apresentam um maior risco de desenvolvimento de cáries (Legendre, 2003). A ratazana é
frequentemente utilizada como modelo para o estudo da cárie humana, devido ao facto de as
lesões em dentes braquiodontes serem similares às que afectam humanos (Legendre, 2003).
Finalmente, o coelho e o porquinho da Índia são há muito utilizados como modelos
laboratoriais para a gengivite e doença periodontal humanas (Lennox, 2009).
As enormes diferenças em termos de conclusões dos dois estudos acima citados, bem como
os factos atrás referidos, apontam para a necessidade de uma investigação mais aprofundada
para esclarecer a prevalência real de cáries e doença periodontal em roedores silvestres.
A reabsorção dentária é, também, uma patologia importante nalguns roedores. Como
anteriormente referido, foram reconhecida lesões reabsortivas dentárias em várias espécies.
Muito comuns no gato, são também frequentemente observadas em roedores (Legendre,
2003), sendo frequentemente identificadas à necrópsia ou radiografia na chinchila (fig. 14). As
lesões tendem a situar-se em zonas afectadas por inflamação e doença periodontal ou, menos
frequentemente, encontram-se associadas a displasia ou deformação apical consideráveis
(Crossley, 2003a). Muitas das lesões reabsortivas sem etiologia óbvia parecem ter origem no
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Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
cimento, sendo possível que a presença de cimento vascular seja responsável por este padrão
de reabsorção dentária atípico (igualmente observado no coelho), fornecendo uma outra via de
entrada no dente (Crossley, 2003a).
3. APRESENTAÇÃO CLÍNICA
As diversas espécies apresentam sintomatologia característica, esquematizada na tabela 7:
MOLARIFORMES
INCISIVOS
COELHO
P. DA ÍNDIA
CHINCHILA
MIOMORFOS
Estrias horizontais nos
incisivos maxilares
primários, Tumefacção
facial, dor à palpação
periorbitária, epífora,
dacrocistite, impactação
perianal de cecotrofos,
anorexia
Sem Sx notável; ligeira
dificuldade na preensão
de alimento
Sem Sx notável; ligeira
dificuldade na
preensão de alimento,
ptialismo, espirros
Anorexia, perda de
peso, ptialismo,
tumefacção mandibular
Anorexia e disfagia, perda
de peso, epífora, ptialismo,
exoftalmos, tumefacção
facial, mau estado do pelo,
bruxismo, dacrocistite, dor
à palpação periorbitária e
das bochechas, alterações
das fezes, alterações
gastrointestinais,
impactação perianal de
cecotrofos
Anorexia, perda de
peso, dor à
mastigação, ptialismo,
tumefacção mandibular
por abcedação
Anorexia, perda de
peso, alterações
gastrointestinais,
dor à mastigação,
ptialismo, bater na
face, tumefacções à
palpação
Anorexia, perda de
peso, tumefacção por
abcedação, dor à
mastigação, ptialismo
Tabela 7. Sinais e sintomas característicos de patologia dentária por espécie (adaptada de Capello,
2003; Meredith, 2007, Harcourt-Brown, 1997; 2007a; Lobprise, 2007a; 2007b).
Os incisivos elodontes são bons indicadores de padrões de mastigação anómalos, dado que
muitas vezes reflectem anomalias dos molariformes (Capello & Gracis, 2005). Todavia, é
importante referir que incisivos normais, per si, não podem ser encarados como indicadores de
saúde dentária (Harcourt-Brown, 1995; 1997). Tumefacções faciais são um indicador
importante de fraca qualidade óssea. A dacrocistite é um bom indicador precoce de patologia
dentária (Harcourt-Brown, 1997; 2007a), bem como dor à palpação da face e zona periorbitária
(Harcourt-Brown, 1997).
No coelho, a sintomatologia dentária é menos específica do que em roedores, reflectindo
frequentemente processos patológicos secundários (Capello, 2007). Tipicamente, observa-se
sobrecrescimento dos incisivos, anorexia, disfagia e/ou abcessos faciais. Estiramento e
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
deformação do periósteo produzem diferenças interespecíficas subtis mas importantes,
traduzindo-se no coelho por tumefações submandibulares. Deformações do periósteo e ápice
dos dentes maxilares predispõem para oclusão do ducto nasolacrimal, exoftalmia e abcedação
retrobulbar (Capello, 2004a). O ptialismo justifica que estes animais fossem, na antiga
terminologia anglo-saxónica, conhecidos como slobbers (Pollock, 1951).
No porquinho da Índia, as manifestações clínicas são mais discretas mas de início mais rápido
do que no coelho, e com elevado grau de dor (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005). Esta
espécie apresenta sinais consistentes com patologia dentária, como disfagia e anorexia. A
anorexia é frequentemente descrita como aguda uma vez que são particularmente sensíveis a
patologia dentária, mesmo que ligeira (Capello, 2004a; 2007). O aumento em profundidade
das coroas de reserva dos molariformes parece ser menos comum do que na chinchila, com
predomínio de sobrecrescimento intraoral. Desta forma, ao exame clínico é mais frequente a
detecção de coroas clínicas sobredimensionadas do que de tumefacções submandibulares. A
incapacidade
de
encerrar
a
boca
e/ou
a
subluxação
mandibular
podem
indicar
sobrecrescimento das coroas clínicas. No entanto, a subluxação é difícil de avaliar com o
paciente consciente devido à grande latitude de movimentos mandibulares em roedores
(Crossley, 1995b).
Qualquer pequena alteração do plano de oclusão dos molariformes é suficiente para
desencorajar a mastigação, ao passo que um ligeiro sobrecrescimento das coroas de reserva
interfere com os movimentos linguais e a deglutição. Em lares com vários animais mantidos
juntos, é frequente o proprietário não se aperceber da inapetência, sendo a perda de peso o
único estímulo iatrogénico. A má oclusão dos incisivos apresenta-se como comprimento
excessivo ou desvio lateral das coroas clínicas dos incisivos mandibulares. Tendo em conta
que má oclusão primária dos incisivos é rara, todos os molariformes devem ser
cuidadosamente examinados (Capello, 2007).
Quando ocorre, o sobrecrescimento das coroas de reserva no porquinho da Índia envolve
aumento em profundidade dos ápices e deformação do osso cortical submandibular tal como
no coelho, mas, ao contrário do que acontece nesta espécie, a pressão exercida sobre os
nervos infra-alveolares parece causar causar uma dor muito mais intensa. As alterações
sofridas são mais discretas que no coelho e, logo, mais difíceis de diagnosticar precocemente.
Tal é especialmente desafortunado nesta espécie, tendo em conta que a redução coronal pode
não causar alívio uma vez instalada deformação apical e do osso cortical (Capello & Gracis,
2005).
Na chinchila normalmente ocorrem grandes deformações das coroas de reserva e perfuração
do periósteo (fig. 11) (Crossley et al., 1998; Crossley, 2001b; Crossley & Del Mar Miguelez,
2001), mas a sintomatologia é ainda mais discreta e as alterações sofridas aparentemente
menos dolorosas que no porquinho da Índia (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005). Ao
contrário do que acontece naquela espécie, o ptialismo é mais frequente e mais facilmente
reconhecível (Crossley, 1995b). Podem não sofrer alterações de apetite (Capello, 2004a;
36
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
2007), embora perda de peso e emaciação sejam uma consequência comum de patologia
dentária. Muitas vezes o proprietário não se apercebe do estado do animal devido ao pelo
espesso, da mesma forma que sobrecrescimento dos incisivos não constitui um estímulo
iatrotrópico comum (Capello, 2007). A chinchila pode também apresentar diminuição de
actividade e do volume de fezes. Mau estado do pelo e bater na boca são também comuns
(Capello, 2007). Os crânios de animais afectados são mais pesados, longos e largos devido a
mineralização e crescimento dentários excessivos (Baranowski, Wojtas, Cis, Musiał,
Wróblewska & Sulik, 2008).
Tal como no porquinho da Índia e coelho, o sobrecrescimento dos incisivos está normalmente
associado a doença dentária dos molariformes. Uma vez que a chinchila, regra geral, só exibe
sintomatologia clínica nos estadios avançados de doença dentária, aquando da maioria dos
diagnósticos a doença dentária é já irreversível (Capello, 2008b). A excepção parecem ser
bolsas periodontais profundas: os animais afectados, normalmente adultos jovens,
apresentam-se debilitados e com grande perda de condição corporal rápida. Tal sugere que a
chinchila consiga adaptar-se a sobrecrescimento dentário e má oclusão moderados, mas seja
altamente susceptível a qualquer tipo de infecção oral, ainda que localizada. No entanto, este
tipo de alteração só é normalmente detectado à necrópsia (Crossley, 2003a).
Há, ainda assim, dois sinais precoces de doença dentária que podem ajudar o clínico a fazer
um diagnóstico um pouco menos tardio: epífora e deformação do osso cortical submandibular,
consequência do alongamento das coroas de reserva dos molariformes maxilares e
deformação do ápice dos molariformes mandibulares, respectivamente. Como já mencionado,
apesar de não ser rara a perfuração do osso cortical com exposição do ápice, a chinchila
desenvolve menos frequentemente abcessos periapicais, infecção dos tecidos moles e
osteomielite do que o coelho. No entanto, o diagnóstico neste estadio tão pouco permite a
restauração da anatomia e função normais. Por isso, é recomendada nesta espécie a
realização de exames dentários minuciosos e regulares a partir dos dois anos de idade,
possibilitando o diagnóstico de patologia dentária antes do aparecimento de sintomatologia
(Capello, 2008b).
No porquinho da Índia, a hipovitaminose C causa doença periodontal, hemorragia gengival e
aumento da mobilidade dentária (Legendre, 2003). O excesso de selénio causa fragilidade do
ligamento periodontal, podendo levar a aumento de mobilidade dentária e alterações da
erupção (Crossley, 1995b).
As apresentações mais comuns em miomorfos são a má oclusão dos incisivos, e tumefacções
faciais devidas a abcedação e infecção periapical (Capello, 2003) que podem ocasionalmente
afectar as estruturas oculares e perioculares. Os miomorfos apresentam frequentemente má
oclusão óbvia dos incisivos, mas que passou despercebida ao proprietário; o estímulo
iatrotrópico é, assim, a diminuição de actividade ou ingestão, emaciação e, por vezes,
ptialismo (Capello, 2007). Regra geral, esta sub-ordem não apresenta sintomatologia
relacionada com patologia dos molariformes (Capello, 2008b).
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No cão da pradaria, como já referido, são comuns as fracturas dos incisivos (Capello, 2003;
Wagner et al. 1999). A fractura pode ocorrer ao longo da coroa clínica, resultando num dente
de altura visivelmente diminuída, ou ao longo da coroa de reserva, a nível subgengival. Neste
último caso, o dente apresenta maior mobilidade (Capello, 2008b).
Os pacientes com elodontoma são, tipicamente, animais de meia idade que apresentam
depressão, anorexia, diminuição do volume de fezes e respiração anormal. O estímulo
iatrotrópico é normalmente a dispneia, acompanhada por um som característico desta
patologia - reverse sneezing. Os sintomas e sinais respiratórios estão associados às
alterações distróficas e deformação apical dos incisivos maxilares, características do
elodontoma. Perda de peso e emaciação são, também, característicos desta patologia. São
comuns fractura e má oclusão dos incisivos, embora frequentemente não detectados pelos
proprietários. No caso de elodontomas complexos é frequente a atrição patológica dos
incisivos maxilares, apresentando estes um desgaste em V (Wagner et al., 1999; Phalen et al.,
2000; Capello, 2002; 2008b; Legendre, 2003; Capello & Gracis, 2005). Há, inclusivé, relatos
anedóticos de proprietários que crêem ser normal os animais renovarem os dentes desta
forma (Capello, 2008b).
4. MÉTODOS COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO
O exame dentário deve ser precedido por uma história clínica detalhada, incluindo a dieta
(Meredith, 2007), e acompanhado por uma avaliação sistémica do paciente para despiste de
patologia subjacente ou secundária (Osofsky & Verstraete, 2006). A anamnese não é fácil de
obter, visto que os proprietários raramente detectam sinais de patologia dentária (HarcourtBrown, 1995). O exame físico propriamente dito deve incluir palpação facial, avaliação do grau
de movimento mandibular lateral, exame da altura, qualidade e oclusão dos incisivos, e exame
dos molariformes (Meredith, 2007). Espécies-presa como o coelho frequentemente mascaram
sinais de doença, pelo que a ausência dos mesmos não deve ser entendida como ausência
real de problemas (Lennox, 2008c).
É necessário determinar a causa da patologia, o que implica métodos complementares de
diagnóstico exaustivos (Legendre, 2002). Para um diagnóstico correcto é indispensável um
bom conhecimento da anatomia e fisiologia da espécie examinada (Capello & Gracis, 2005;
Legendre, 2003; Brenner et al., 2005), bem como das suas variações intraespecíficas
(Legendre, 2003), havendo vários meios à disposição 8 . É necessário realizar um exame
completo de incisivos e molariformes, podendo a sua ausência levar a diagnósticos errados ou
omissões. É útil a introdução de um dedo na boca para despiste dos esporões afiados
(Harcourt-Brown, 1997; Capello, 2004a) mas esta técnica é apenas complementar do exame
8
Ver Anexo 2. Exames complementares de diagnóstico recomendados por espécie.
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oral, não o substituindo (Capello, 2004a). A língua deve ser exteriorizada e examinada
(Harcourt-Brown, 1997). Embora alguns autores considerem que a parca informação obtida
não compensa o stress a que o animal é sujeito (Klaphake, 2006), a maioria recomenda que o
exame oral inicial seja efectuado com otoscópio com fonte de luz própria (Capello, 2006a) ou,
preferencialmente, um espéculo nasal humano (Capello, 2004a), que tem um maior campo de
visão (Graham, 2006).
No entanto, o exame oral apresenta algumas deficiências. É dificultado pela abertura reduzida
da cavidade oral (Zeman & Fielder, 1969; Lobprise & Wiggs, 1991; Crossley, 1995a; Crossley
et al., 1998; Legendre, 2003; Gracis, 2008), abundância de tecido bucal e estrutura da
articulação temporomandibular (Crossley, 2003c). Nalgumas espécies, como o porquinho da
índia e a chinchila, a presença permanente de alimento na boca dificulta a visualização dos
dentes e mucosas. A par disto, é possível observar as coroas clínicas mas as coroas de
reserva, o osso alveolar e as estruturas apicais permanecem inacessíveis (Gracis, 2008;
Mackey, Hernandez-Divers, Holland, & Frank, 2008). Uma vez que alterações das coroas de
reserva podem preceder o sobrecrescimento das coroas clínicas, o exame oral pode levar a
subdiagnósticos (Mullan & Main, 2006; Bennett 2008).
O problema não se prende apenas com sobrecrescimento dentário apical. Em 1969, Zeman e
Fielder alertavam já para a importância de se realizar o exame oral sob anestesia e esta
recomendação continua a ser válida actualmente. Em média, com o paciente consciente são
detectadas duas vezes menos lesões orais (especialmente bolsas periodontais, má oclusão,
ulceração das mucosas e cáries) do que em pacientes anestesiados; e três vezes menos
lesões do que à necrópsia (Crossley, 2003a). Para além disso, muitas espécies reagem
negativamente a manipulação, pelo que em animais como o cão da pradaria, a ratazana e
roedores de menores dimensões um exame com o paciente consciente é impraticável
(Capello, 2006a). Ratazanas e hamsters dourados excepcionalmente calmos podem permitir
um exame completo consciente, mas tal é raro (Capello, 2004a).
Nos casos em que não haja alternativa ou existam lesões prévias que requeiram cirurgia é
possível realizar uma bucotomia. Nestes casos, é necessária analgesia pós-operatória e a
cura será retardada, uma vez que é impossível prevenir a contaminação e conseguir a
imobilização da área afectada (Crossley, 1995a).
A imagiologia é uma componente crítica da avaliação de patologia dentária e suas
complicações no coelho e em algumas espécies de roedores (Capello & Caudurro, 2008). A
utilização eficaz dos meios de diagnóstico abaixo descritos requer, por parte do clínico, uma
técnica impecável, um sólido conhecimento prévio da anatomia normal da espécie em questão
e experiência na interpretação das imagens recolhidas (Capello, 2004a; Capello & Caudurro,
2008; Hernandez-Divers, 2008; Lennox, 2008c). A posse de crânios normais para comparação
pode também revelar-se útil (Brenner et al., 2005; Osofsky & Verstraete, 2006; Meredith,
2007).
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O exame radiográfico é essencial para uma avaliação dentária completa (Bellows, 1993),
sendo actualmente o principal meio de diagnóstico (Gracis, 2008). Permite o estadiamento da
doença e a elaboração do tratamento e prognóstico (Meredith, 2007; Gracis, 2008). Permite,
ainda, diferenciar estruturas dentárias normais das anómalas (Capello & Gracis, 2005) mas
não a avaliação de alterações nos tecidos adjacentes; patologia inicial ou moderada é, por
vezes, não reconhecida. De igual modo, o exame radiográfico permite identificar mas não
delimitar zonas de osteólise ou osteomielite, porque é impossível isolar áreas do crânio sem
sobreposição de outras estruturas ósseas ou tecidos moles (Capello & Caudurro, 2008;
Mackey et al., 2008).
É recomendada a utilização de filme de alta resolução para garantir detalhe adequado nos
pacientes de menores dimensões (Gracis, 2008; Capello, 2006a; 2008b). O bom
posicionamento e a boa qualidade do filme são vitais, especialmente em roedores, devido ao
seu tamanho frequentemente diminuto (Capello, 2003; Lennox 2009). Exames radiográficos de
contraste são úteis na avaliação da distorção óssea e obstrução do ducto nasolacrimal
(Meredith, 2007).
As opiniões dividem-se quanto às projecções consideradas indispensáveis para o diagnóstico:
o
Cinco projecções: laterolateral (LL), lateral oblíqua (LObl) esquerda e direita, ventrodorsal
(VD) ou dorsoventral (DV), rostrocaudal (RCd) (Capello, 2004a; Lennox, 2008a)
o
Quatro projecções: laterolateral, lateral oblíqua esquerda e direita, ventrodorsal (Osofsky
& Verstraete, 2006; Gracis, 2008)
o
Três-quatro projecções: laterolateral, dorsoventral, rostrocaudal, talvez lateral oblíqua
após avaliação das primeiras para isolar zonas sobrepostas com interesse (Meredith,
2007)
o
Três projecções: laterolateral, dorsoventral, rostrocaudal (Crossley, 1995b; Legendre,
2003)
o
Duas projecções: laterolateral, rostrocaudal (Legendre, 2002)
A projecção laterolateral permite avaliar a forma, curvatura, comprimento, padrão de atrição,
oclusão e ápices dos incisivos, devendo ser obtida com a boca fechada (figs. 15-17). Permite,
ainda, avaliar as coroas clínicas e de reserva dos molariformes (figs. 15-17) (Legendre, 2003;
Gracis, 2008). No coelho e na chinchila é útil para a avaliação do alinhamento da superfície de
oclusão dos molariformes (figs. 15 e 17) (Capello, 2003; Legendre, 2003; Gracis, 2008), mas
não permite avaliar esporões dentários (Harcourt-Brown, 1997).
A projecção lateral oblíqua esquerda e direita permite avaliar o sobrecrescimento dos
molariformes (Capello, 2003), nomeadamente, das coroas de reserva e ápices mandibulares
de um lado, e maxilares do lado oposto. Permite também uma melhor visualização dos ápices
dos incisivos do que a projecção laterolateral (Gracis, 2008). Realça deformações do osso
cortical mandibular, sendo essencial para a avaliação deste osso e dos ápices no porquinho da
Índia (Capello & Gracis, 2005).
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Figura 15. Coelho - anatomia normal, projecção LL
esquerda.
Figura 16. Porquinho da Índia – má oclusão dos
incisivos, projecção LL esquerda.
São visíveis o padrão de oclusão em ziguezague (seta
rosa), a sobreposição perfeita das bulas timpânicas
(círculo verde), ramos da mandíbula (seta vermelha) e
margens orbitais rostrais (seta branca), os ápices dos
incisivos (círculos brancos) e os incisivos secundários
(‫ א‬amarelo).
São visíveis a perda da terminação em bisel do
incisivo maxilar e o sobrecrescimento do incisivo
maxilar, com avanço rostral anómalo (setas azuis), e
a perda do plano de oclusão normal dos molariformes
(seta vermelha).
Figura 17. Chinchila – má oclusão dos
incisivos e molariformes, projecção LL
esquerda.
Figura 18. Porquinho da Índia – anatomia
normal pós-redução coronal, projecção
RCd.
São visíveis a perda da terminação em bisel
dos incisivos, o sobrecrescimento do incisivo
mandibular e a alteração da angulação do
incisivo maxilar (setas azuis), a perda do plano
de oclusão normal dos molariformes (seta
vermelha), o sobrecrescimento do ápice (seta
verde) e uma lesão reabsortiva (seta amarela)
do PM1.
É visível a peculiaridade da angulação
dentária nesta espécie (setas azul e
vermelha). O desvio mandibular é um
artefacto de posicionamento.
41
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
A projecção rostrocaudal (figs. 18-20) pode ser difícil de
obter,
particularmente
se
houver
sobrecrescimento
dentário (Gracis, 2008). Permite avaliar a altura e
curvatura das coroas, o ângulo das superfícies de
oclusão, presença de esporões (Legendre, 2003; Gracis,
2008), a articulação temporomandibular (Legendre,
2003) e se existe perfuração do osso cortical (Gracis,
2008). É única verdadeiramente útil para a avaliação da
Figura 19.
Porquinho da Índia –
projecção RCd.
É visível a perda do plano de oclusão
normal por sobrecrescimento extremo
dos molariformes mandibulares (setas
azuis). Os molariformes maxilares
apresentam um tamanho reduzido (setas
vermelhas). O desvio mandibular é um
artefacto de posicionamento.
superfície de oclusão dos molariformes no porquinho da
Índia, devido à angulação fisiológica dos dentes (figs. 1819), e especialmente importante para avaliar o típico
sobrecrescimento apical na má oclusão na chinchila (fig.
20) e a (Capello, 2003).
Figura 20. Chinchila - projecção RCd.
Figura 21.
Coelho - anatomia
normal, projecção VD.
É visível a perda do plano de oclusão normal
por sobrecrescimento dos molariformes
maxilares (setas vermelhas) e mandibulares
(setas azuis). O incisivo mandibular direito
apresenta
assimetria
estrutural
(seta
amarela).
Requer posicionamento perfeito.
Para além das estruturas descritas,
é possível avaliar o perfil ósseo da
mandíbula (‫ א‬vermelho) e maxila, e
da articulação temporomandibular
(seta azul).
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As projecções ventrodorsal/dorsoventral (fig. 21) permitem avaliar a relação entre a mandíbula
e o crânio, e a integridade dos bordos maxilares e mandibulares. Podem ser visíveis
sobrecrescimento extremo dos molariformes, e perfuração e deformação ósseas (Gracis,
2008). Ocasionalmente, podem reconhecer-se coroas de reserva que penetraram a bula
alveolar. Uma aparência indistinta e a perda da anatomia radiográfica normal em coroas de
reserva indicam a presença de reacção perióstea e a possível interrupção do crescimento
dentário. Não permitem diagnosticar a presença de esporões dentários (Harcourt-Brown,
1997). São consideradas as mais difícil de avaliar por Harcourt-Brown (1997), dado haver
sobreposição da mandíbula e maxila.
Películas de menores dimensões para exames radiográficos intraorais podem ser utilizadas
para obter projecções mais localizadas dos incisivos e molariformes do coelho (Capello,
2004a), mas o seu posicionamento é dificultado nos pacientes de menores dimensões
(Crossley, 1995b; Legendre, 2003). Podem ser úteis em animais maiores (Lennox, 2009).
A endoscopia optimiza o exame oral, especialmente em pacientes de dimensões menores
(Capello, 2004a; 2004b; 2006a; 2008b; Capello & Gracis, 2005; Lennox, 2008a; 2008d). Muitos
clínicos consideram o endoscópio rígido de 2,7 mm ideal (Capello, 2004a; 2004b; 2006a;
Hernandez-Divers, 2008; Lennox, 2009), devido à sua versatilidade e variedade de acessórios
disponíveis (Capello, 2006a; Hernandez-Divers, 2008).
Considerada muito útil no coelho, a endoscopia é absolutamente vital em roedores e outros
mamíferos exóticos de pequenas dimensões (Capello, 2006a). Para além da melhor
visualização por magnificação da imagem (Capello, 2004b; 2008b; Martínez-Jiménez et al.,
2007; Lennox, 2008d), permite recolher dados para comparação posterior e educação do
proprietário (Capello, 2004b; 2008b; Lennox, 2008d), não requer especialização do operador e
permite a partilha dos dados obtidos com colegas (Capello, 2004b). Possibilita também o
reconhecimento de padrões típicos de patologia dentária adquirida e de patologia secundária
envolvendo tecidos moles e ósseos, permitindo o estadiamento da doença. A avaliação e
diagnóstico por endoscopia são especialmente importantes no caso de má oclusão, dado que
a sintomatologia pode ser discreta ou inexistente (Capello, 2004b). A técnica endoscópica
mais utilizada é intraoral (Hernandez-Divers, 2008). A avaliação pré-anestésica deve incluir o
exame físico e, sempre que possível, hemograma, análises bioquímicas e urianálise. A prémedicação e anestesia geral seguem as recomendações para cada espécie e, apesar de o
jejum não ser normalmente necessário, é recomendado um jejum de 1-2 horas para reduzir a
quantidade de alimento na cavidade oral (Verstraete & Osofsky, 2005; Hernandez-Divers,
2008).
A TAC é um complemento extremamente útil da radiografia tradicional (Capello & Caudurro,
2008; Gracis, 2008; Lennox, 2008d; Mackey et al., 2008), possibilitando uma avaliação das
alterações dentárias muito mais completa do que a conseguida pela combinação da
informação fornecida por várias projecções radiográficas (Crossley et al., 1998). Embora ainda
43
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pouco prática (Capello, 2004a), as melhorias recentes nas tomografias helicoidais em termos
de redução de tempo de scanning e maior resolução tornam-na útil mesmo em pacientes
exóticos de pequenas dimensões (Capello & Caudurro, 2008; Mackey et al., 2008). A TAC
permite a visualização de estruturas internas sem sobreposição (Mackey et al., 2008), melhora
o contraste entre os diversos tecidos (Capello & Caudurro, 2008) e permite a detecção e
avaliação precoces de lesões de tecidos moles e ósseos em toda a sua extensão (Crossley,
2003a; Capello & Gracis, 2005; Mackey et al., 2008; Van Caelenberg et al. 2008), incluindo
tecidos moles orbitais e proximidade das coroas de reserva, e abcessos (Meredith, 2007;
Lennox, 2009). Permite, também, a detecção de fístulas com abertura medial (Capello, 2008a)
e a realização de reconstruções tridimensionais (Crossley, 2003a; Bennett 2008; Capello &
Caudurro, 2008; Mackey et al., 2008), incluindo distorção apical e penetração do osso
circundante (Crossley, 2003a). Clarifica a informação obtida radiograficamente (Crossley et al.,
1998) e possibilita a exclusão de maus candidatos cirúrgicos (Capello, 2007; 2008a). Foi
considerada especialmente útil na chinchila e no coelho (Crossley et al., 1998; Gracis, 2008), e
num porquinho da Índia com um abcesso periapical inoperável na modalidade de micro-TAC,
que aumenta a resolução em pacientes de tamanho diminuto, com um campo visual de até
110 mm x 110 mm e possibilidade de cortes com 0,077 mm de espessura (Souza, Greenacre,
Avenell, Wall & Daniel, 2006).
São necessários mais estudos para o estabelecimento de protocolos de recolha e avaliação de
dados (Mackey et al., 2008). É considerado vantajoso o recurso a ressonância magnética
quando possível (Bennett, 2008; Gracis, 2008). Tendo em conta que há suspeita de
predisposição genética para sobrecrescimento dentário em espécies como a chinchila,
porquinho da Índia (Flecknel, 1990; Crossley et al., 1998), coelho e algumas estirpes de
ratazana (Flecknel, 1990), é de esperar que as novas técnicas de imagiologia possam, num
futuro próximo, ajudar a identificar os animais afectados, permitindo a sua eliminação enquanto
reprodutores e assegurando, assim, a existência de animais mais saudáveis (Crossley et al.,
1998).
É aconselhável realizar hemograma e bioquímicas nos pacientes com patologia dentária
(Capello & Gracis, 2005). O hemograma pode ser especialmente útil se existirem
complicações secundárias da patologia dentária (Capello & Gracis, 2005), permitindo avaliar a
gravidade da inflamação (Osofsky & Verstraete, 2006). Um estudo em coelhos sugere uma
correlação entre patologia dentária adquirida e anemia e linfopénia, embora o eventual papel
do stress nesta última não possa ser descartado (Harcourt-Brown & Baker, 2001). A anemia
pode ser explicada pelo aumento da PTH em pacientes com patologia dentária adquirida, dado
que esta hormona aumenta a fragilidade osmótica dos eritrócitos, especialmente em animais
jovens (Redrobe, 2002). Num estudo em chinchilas realizado por Crossley (2003a) não foram
encontradas diferenças sorológicas entre as bioquímicas de animais clinicamente saudáveis e
de animais com patologia dentária inicial. Em animais com patologia dentária óbvia houve, não
obstante, diferenças significativas nas concentrações de ureia, sódio e total de leucócitos.
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Cultura bacteriana e TSA são importantes em caso de infecção e abcedação resultantes de
doença dentária 9 . A histopatologia pode ser útil nalguns casos, principalmente se houver
suspeita de neoplasia óssea ou displasia dentária (Capello, 2004a).
No elodontoma do cão da pradaria há aumento difuso dos ruídos pulmonares à auscultação,
mas a auscultação traqueal confirma a sua origem nas vias respiratórias superiores. Pode não
haver rinorreia, ou esta ser serosa ou purulenta; a sua cultura revela normalmente populações
mistas bacterianas por sobrecrescimento da microbiota saprófita nasal. Em muitos destes
animais cessou o crescimento de um ou de ambos os incisivos, e a coroa apresenta-se
desgastada ao nível gengival. Há assimetria das colunas de ar, ou mesmo ausência total de
fluxo nasal, comprovadas facilmente colocando um pedaço de algodão em frente a cada
narina. Nos casos mais avançados, o animal respira pela boca (Phalen et al., 2000).
A radiografia é o método de diagnóstico utilizado. Segundo alguns autores, embora as
projecções laterolateral e ventrodorsal permitam muitas vezes o diagnóstico, a projecção DV é
frequentemente a mais reveladora, sendo a única que permite o diagnóstico de elodontomas
de pequenas dimensões. Na projecção laterolateral é possível visualizar o espessamento do
osso periodontal e margens alveolares, bem como espessamento e hipermineralização da raíz
proximal. No caso de elodontomas de maiores dimensões, é visível uma massa globular e
irregular de radiodensidade idêntica à do tecido dentário junto da raíz do incisivo,
assemelhando-se a uma extensão desta. Outro achado radiográfico comum é a superfície de
oclusão do incisivo maxilar em V invertido, devido à diminuição do crescimento deste dente,
que vai sendo desgastado pelo incisivo mandibular ipsilateral. Tal pode contribuir para o
progresso do elodontoma, dado que a aposição estreita impede ainda mais o crescimento
normal dos incisivos maxilares (Phalen et al., 2000). Alguns clínicos recomendam, para efeitos
de diagnóstico e determinação do dente afectado no caso de elodontoma unilateral, a
projecção lateral oblíqua a 60º-70º (R. Patrício, comunicação pessoal, Junho 3, 2009).
Como já referido, o objectivo do tratamento dentário é restaurar a função normal do paciente.
Todavia, tal nem sempre é possível, sendo necessário educar os proprietários no sentido de
que pode não ser possível mais do que oferecer cuidados paliativos ou tentar travar a
progressão inevitável da doença (Capello, 2008b).
5. PROGNÓSTICO
Um prognóstico correcto de patologia dentária no coelho e roedores deve basear-se nos
resultados do processo de diagnóstico detalhado. O prognóstico é expresso em termos de
gravidade da doença, idade e estado do paciente, nível de cuidados continuados estimado,
probabilidade de adesão à terapêutica do proprietário e custos esperados. A resolução da
doença é possível, mas é mais frequente o maneio para o resto da vida. Em geral, o
9
Ver II.7. Abcessos odontogénicos.
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prognóstico para roedores com patologia dentária é mais reservado do que no coelho, devido
a particularidades anatómicas e fisiopatológicas, bem como à dificuldade relativa de
intervenções cirúrgicas. No entanto, uma vez que as várias espécies diferem nos padrões
patológicos apresentados, o prognóstico deve ser avaliado caso a caso (Capello, 2004a).
Pacientes que apresentam apenas dificuldades na mastigação apresentam o melhor
prognóstico. O tratamento envolve o restabelecimento do plano de oclusão normal e a
alteração da dieta para impedir recorrências. Pacientes prognatas requerem extracção total
dos incisivos para eliminar a má oclusão. Pacientes com anisognatismo marcado ou ausência
de excursão lateral apresentam o pior prognóstico; a reposição do plano de oclusão normal é
apenas um meio de controlo, não uma cura. O seu efeito é temporário, e o tratamento tem que
ser repetido frequentemente. Uma dieta composta por alimento grosseiro ajuda igualmente a
aumentar a atrição e o intervalo entre tratamentos (Legendre, 2002).
O encurvamento das coroas clínicas e alterações apicais anunciam, a partir desse momento, a
impossibilidade de restabelecer a função normal. Alterações deste tipo são mais frequentes
nos histricomorfos do que no coelho, causando grandes diferenças no prognóstico em caso de
patologia dentária adquirida avançada (Capello, 2004a). A hiperplasia gengival está associada
a um grande desconforto e pior prognóstico (Capello, 2008b). As fracturas dos incisivos
apresentam melhor prognóstico do que as da mandíbula ou maxila. As fracturas dos incisivos
sem compromisso da polpa têm melhor prognóstico (Legendre, 2003). O prognóstico para
patologia dentária dos molariformes no estadio final é sempre mau (Capello, 2008b).
Excepto nos casos em que o paciente apresente má condição corporal, o prognóstico para o
tratamento de má oclusão dos molariformes no porquinho da Índia é satisfatório ou bom
(Capello, 2008b). Na má oclusão avançada dos molariformes no porquinho da Índia e chinchila
os ápices encontram-se normalmente sobredimensionados e deformados, com estiramento
grave do osso cortical. Por esta razão, a redução das arcadas dentárias para um plano de
oclusão normal pode ser parcial ou completamente insatisfatória devido à ausência de alívio
da dor (Capello, 2004a).
Ao contrário do coelho, o porquinho da Índia pode não sofrer melhoria imediata após
tratamento dentário, devido ao estiramento dos músculos associados à mastigação, com dor e
inflamação associadas. Os pacientes anoréxicos podem não conseguir atrição suficiente para
prevenir novo sobrecrescimento dentário. Estes pacientes podem requerer tratamentos
adicionais até que os tecidos moles sarem e o paciente se encontre capaz de ingerir alimento
fibroso10 (Capello, 2008b; Legendre, 2002). O prognóstico na chinchila depende do
estadiamento aquando do diagnóstico. Como já mencionado, a patologia dentária grave é
frequentemente diagnosticada na primeira consulta. Em muitos casos, os tratamentos
repetidos não são mais do que paliativos, tendo em conta que a restauração da anatomia
10
Ver Chin Sling, tabela 8 e anexo 3.
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normal é impossível. Tal como o coelho, e ao contrário do porquinho da Índia, a chinchila
tolera patologia dentária adquirida avançada extraordinariamente bem (Capello, 2008b).
O prognóstico para má oclusão simples dos incisivos em miomorfos e sciuromorfos é
relativamente bom. O prognóstico para doença dos molariformes é reservado a mau devido ao
tamanho dos pacientes e às dificuldades associadas a abordagens cirúgicas (Capello, 2008b).
O prognóstico no caso de elodontoma no cão da pradaria é sempre reservado a mau (Phalen
et al., 2000, Capello, 2008b) devido ao facto de ser necessária a extracção do dente afectado
e do próprio elodontoma, complicada pela deformação dos ápices e presença de anquilose
alveolar (Capello, 2004a), e a intubação, anestesia e cirurgia serem notoriamente difíceis nesta
espécie (Phalen et al., 2000). Depende de vários factores: se é unilateral ou bilateral, estadio
da doença aquando do diagnóstico, impacto da doença no tracto respiratório e estado geral do
paciente (Capello, 2008b).
Nos casos mais graves, com mau prognóstico, e em que nem os cuidados paliativos podem
minorar o sofrimento do animal, a eutanásia é uma opção justificada e eticamente responsável
(Crossley, 2003b; Capello, 2008b).
6. TERAPÊUTICA
O objectivo do tratamento dentário é restaurar a função, aproximando-a tanto quanto possível
do normal; controlar infecções (incluindo abcessos) e dor; e tratar afecções concomitantes ou
subjacentes (Lennox, 2008a). Tal como o diagnóstico, o tratamento adequado de patologia
dentária requer um conhecimento profundo da anatomia e fisiologia normais (Capello & Gracis,
2005; Crossley, 1995b; Legendre, 2003).
6.1. Tratamento médico e maneio
Muito embora o tratamento médico seja inadequado isoladamente, é um complemento
essencial da terapêutica cirúrgica (Capello, 2004a).
Os mamíferos partilham mecanismos neurofisiológicos, tendo capacidade de sentir dor de
forma similar. Como já referido, lagomorfos e roedores domésticos mantêm a fisiologia e
comportamentos de espécies-presa, pelo que, frequentemente, tendem a permanecer imóveis
quando ameaçados como forma de evitar a detecção por predadores. Fora do seu ambiente
natural, as espécies-presa tendem, ainda, a dissimular sinais de desconforto. Uma visita ao
veterinário é uma experiência inquietante, pelo que podem mascarar dor ou até a resposta a
estímulos dolorosos. Uma anamnese detalhada é absolutamente fundamental, dado que
apenas os proprietários podem avaliar o comportamento do animal num meio onde se sente
seguro (Brown, 2001).
A utilização de analgesia nos últimos 15 anos tem resultado num aumento dramático de
tratamentos bem sucedidos nestes animais (Brown, 2001). É essencial para a recuperação em
47
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caso de doença, e a patologia dentária não é excepção, sendo fulcral para o seu correcto
maneio e não apenas numa perspectiva do bem-estar animal; a dor pós-operatória reduz a
ingestão de alimento e água, pelo que o processo de cura é atrasado (Legendre, 2003), e
pode também provocar íleo paralítico (Osofsky & Verstraete, 2006). A analgesia é, ainda,
importante na prevenção da anorexia devido a dor (Capello, 2004a). Depressão e letargia nos
estadios iniciais de patologia dentária podem ser revertidas com administração de analgesia,
tendo algum valor de diagnóstico (Crossley, 1995b).
A capacidade de avaliação dos sinais subtis de dor por parte do clínico depende da sua
familiarização com o animal e seus comportamentos normais (Kelleher, 2008a). A avaliação da
dor no coelho pode ser mais difícil do que noutras espécies porque normalmente não
vocalizam. Em vez disso, o animal pode manter-se agachado no fundo da jaula, exibindo
bruxismo e parecendo alheado do que se passa em seu redor (Graham, 2006). Caso o clínico
não se sinta capaz de discernir a necessidade de analgesia ou o seu grau requerido,
recomenda-se que seja administrada sempre que o paciente esteja a recuperar de um
procedimento ou sofra de uma patologia para o qual o próprio clínico requeresse alívio da dor,
e no mesmo grau (Johnson-Delaney, 2006). É recomendada analgesia pré-cirúrgica sempre
que possível (Flecknell, 1998; Verstraete & Osofsky, 2005; Graham, 2006).
Deve iniciar-se antibioterapia sistémica apenas na presença de infecção (Crossley, 2003b),
dependendo a sua duração da localização e origem da mesma (Verstraete & Osofsky, 2005;
Osofsky & Verstraete, 2006). A escolha da antibioterapia deve basear-se em cultura e TSA
para aeróbios e anaeróbios (Capello, 2004a; Lennox, 2009) de material recolhido da cápsula e
centro do abcesso (Tyrrell, Citron, Jenkins & Goldstein, 2002), do ducto nasolacrimal ou de
corrimento nasal (Verstraete & Osofsky, 2005; Osofsky & Verstraete, 2006). Deve levar-se em
consideração as recomendações e restrições específicas para lagomorfos e roedores (Capello,
2004a; Lennox, 2009). Está especialmente indicada antibioterapia pré- e pós-operatória em
intervenções traumáticas como extracções dentárias e infecções periapicais 11 devido à
magnitude da doença pré-existente (Verstraete, 2003). Tem sido utilizado gel de doxiciclina
(Doxirobe Gel®, Pharmacia and Upjohn Animal Health Limited, Corby, UK) no preenchimento
de defeitos após tratamento periodontal e extracções dentárias sem quaisquer efeitos
adversos. O gel liberta uma quantidade de doxiciclina eficaz, em níveis não-tóxicos, ao longo
de vários dias. A dose total administrada é baixa, minimizando efeitos sistémicos. O gel
funciona, ainda, como uma barreira física protectora durante 2-4 semanas (Crossley, 2003).
Pode ser necessária fluidoterapia (Legendre, 2003; Johnson-Delaney, 2006; Capello, 2006b;
2006c; 2008b; Lennox, 2009).
No elodontoma do cão da pradaria são necessários antibióticos para tratar infecções
secundárias oportunistas (Wagner et al., 1999; Greenacre, 2004), devendo ser respeitadas as
recomendações para lagomorfos e roedores. Corticosteróides e descongestionantes oferecem
11
Para antibioterapia em caso de abcesso ver II.6.1. Tratamento médico e cirúrgico.
48
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também algum alívio (Wagner et al., 1999). Estão ainda recomendados sedativos no caso de
dispneia grave e grande agitação; e a administração intrarectal profilática de probióticos
suspensos em soro fisiológico (Johnson-Delaney, 2006).
É importante educar os proprietários sobre a natureza crónica da patologia dentária, a relativa
eficácia dos tratamentos e a necessidade da sua repetição frequente, e os sinais e sintomas
indicadores de problemas dentários (como deixar cair alimento, anorexia, ptialismo) (Osofsky &
Verstraete, 2006). O clínico deve, ainda, educar os proprietários em relação ao que constitui
uma dieta saudável e adequada para cada espécie (Harcourt-Brown, 1997).
O porquinho da Índia pode requerer suplementação de ácido ascórbico, uma vez que é
incapaz de sintetizar vitamina C (Crossley, 2003a; Legendre, 2003; Osofsky & Verstraete,
2006). No caso de excesso de selénio, a correcção da dieta é normalmente curativa, desde
que diagnosticado precocemente (Legendre, 2003). Deve ser assegurado um suprimento
adequado de cálcio e vitamina D3, sendo mais seguro ajustar a dieta do que fornecer
suplementos vitamínicos e minerais, para evitar urolitíase. Alguns autores sugerem que o feno
seja oferecido separadamente, para garantir que o animal tenha apetite quando é oferecido
(Harcourt-Brown, 1997).
O paciente deve regressar rapidamente a uma dieta mais volumosa, abrasiva e pobre em
energia (Legendre, 2003). Na patologia dentária inicial, uma dieta adequada pode reduzir a
sua progressão; em casos mais avançados pode não ser possível a introdução de uma dieta
normal, devendo encontrar-se uma alternativa tão equilibrada quanto possível (Osofsky &
Verstraete, 2006). Uma dieta rica em fibra é importante para a manutenção da motilidade
gastrointestinal, mas pacientes com problemas dentários graves têm dificuldade em se
alimentarem. Podem ser oferecidas alternativas como relva fresca, vegetais e plantas
(Harcourt-Brown, 2007b) ou pellets humedecidos (Flecknel, 1990; Harcourt-Brown, 2007b). Os
alimentos devem ser fraccionados (Harcourt-Brown, 2007b; Meredith, 2007) ou, inclusivé,
ralados (Harcourt-Brown, 2007b).
Os animais anoréxicos devem ser encorajados a comer tão cedo quanto possível, estando
disponíveis papas especiais que facilitam a ingestão e a alimentação forçada, e são altamente
nutritivas (por exemplo, Critical Care for Herbivores®, Oxbow Enterprises) (Capello, 2004a;
2006b; 2006c). Caso não esteja disponível, pode ser improvisada uma dieta adequada
liquefazendo pellets (Osofsky e Vertsraeta, 2006), ou vegetais (Flecknel, 1990; Crossley,
2003b). Se tiver havido trauma substancial, pode ser fornecida nutrição suplementar através
de um tubo nasogástrico até o apetite e ingestão retornarem ao normal. O animal deve ser
pesado diariamente para garantir que não ocorre perda de peso (Meredith, 2007).
Quando internados, lagomorfos e roedores devem estar tão afastados de cães, gatos e outros
predadores quanto possível (Crossley, 2003c; Kelleher, 2008a).
Idealmente, os animais devem poder fazer exercício diário ao sol. Tal permite-lhes sintetizar
vitamina D3 e, nas casas com jardim, faculta acesso a uma dieta mais variada e com teor
49
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adicional em fibra, e funciona também como enriquecimento ambiental (Harcourt-Brown,
2007b).
6.2. Tratamento cirúrgico
Uma intervenção cirúrgica é, frequentemente, a única garantia de resolução total dos
problemas dentários. Da interpretação de todos os dados anteriormente recolhidos dependerá
a escolha do tratamento cirúrgico, cujas abordagens mais comuns estão descritas na tabela 8
(adaptada de Burling, Murphy, Curiel, Koblik & Bellhorn, 1991; Lobprise & Wiggs, 1991;
Crossley, 1995b; 2001a; 2003a; 2003b; Gorrel, 1996; Niehogen & Ostle, 1996; Newcombe,
1997; Divers, 1996; Graham-Jones, 1996; Malley, 1996; Harcourt-Brown, 1997, 2001, 2002a,
2002b, 2002d; Johnston, 1997; Wagner et al., 1999; Phalen et al., 2000; Wagner & Jonhson,
2001; Capello, 2002; 2004a; 2004b; 2006a; Legendre, 2002; 2003; comunicação pessoal, Maio
9, 2009; Greenacre, 2004; Sainsbury et al., 2004; Capello & Gracis, 2005; Roux, 2005;
Klaphake, 2006; Osofsky & Verstraete, 2006; Lobprise, 2007a; 2007b; Meredith, 2007;
Williams, 2007; Lennox, 2008a, 2009; I. Rice, comunicação pessoal, Abr. 25, 2009,):
50
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Corte esporões
Requer alicate de cabo longo. Apenas temporariamente correctivo.
Redução
coronal dos
incisivos
Correcção total da MO apenas quando possível restaurar altura e plano de oclusão; normalmente
paliativo; frequentemente necessária extracção. Por vezes não necessária sedação. Importante utilizar
apenas material especializado para evitar lesões iatrogénicas. Importante proteger tecidos moles e
confirmar localização do canal pulpar.
Redução
coronal dos
molares ou
molariformes
Requer anestesia geral e equipamento especializado. Importante proteger tecidos moles. Efectuar
exames radiográficos pós-correcção. Correcção total da MO apenas quando possível restaurar altura e
plano de oclusão; normalmente paliativa; frequentemente necessária extracção, músculos podem
permanecer atrofiados inicialmente.
Cáries
Tx por redução coronal se diagnóstico precoce e correcção da dieta. Bolsas periodontais >3mm de
profundidade difícieis de limpar. Frequentemente associadas a abcedação, requerendo extracção.
Requerem equipamento especializado.
Extracção
dentária
Plano terapêutico, anestesia, limpeza do campo operatório, incisão da ligação gengival, corte do
ligamento periodontal, alargamento do alvéolo, remoção e exame do dente, curetização do tecido
®
germinativo, preenchimento do alvéolo facultativo (com, por exemplo, gel Doxirobe ), exames
radiográficos. Curetagem e desbridamento do alvéolo necessários se infecção. Requer equipamento
especializado.
1. Incisivos
Necessária remoção total para correcção definitiva de MO, Tx de abcedação periapical e Fx. Fx
iatrogénica da coroa de reserva/não remoção do tecido germinativo requerem nova extracção.
Hemorragias graves raras excepto se Fx do osso alveolar. Frequente no CO, menos frequente na CHI,
rara no PI, muitas vezes impossível em miomorfos e sciuromorfos. Boa adaptação, excepto no esquilo.
2. Molariformes
Indicação se Fx, aumento de mobilidade e/ou abcedação periapical. Intra ou extraoral, normalmente
difícil. Frequentemente impossível em miomorfos, mas boa resposta a AB.
2.1. Intraoral
Abcedacção facial é indicação mais comum. Difícil excepto se grande aumento de mobilidade dentária,
complicada se sobrecrescimento das coroas de reserva ou anquilose. Fx iatrogénicas frequentes
mesmo com luxação adequada. Gengiva deve ser suturada para prevenir acumulação de alimento e
infecção; alvéolo pode ser preenchido com gel Doxirobe®. Difícil no PI e CHI.
2.2. Extraoral
Necessária se anquilose, dificultada em pacientes pequenos. Requer perícia e cuidados pósoperatórios intensivos. Acesso através de janela no bordo ventrolateral da mandíbula, dente e
fragmentos removidos ou empurrados para cavidade, onde removidos. Gengiva suturada em redor do
defeito para minimizar contaminação, ou deixada aberta para drenar.
Extracção de
dentes apostos
Pode ser necessária para evitar deslocamento dos dentes adjacentes e predisposição para MO, doença
periodontal e boca em escada se movimentos normais e redução coronal regular não suficientes.
Padrão de aposição dentária nem sempre permite resolução mesmo com extracção; crioterapia apical e
apicoectomia permitem interromper o crescimento dentário.
Elodontoma –
estabilização
Rinotomia unilateral para criação de via aérea com inserção de catéter na orofaringe rostral, caudal ao
tumor. Traqueostomia possível mas patência da via aérea difícil.
Elodontoma –
extracção de
incisivos
Possivelmente o único tratamento eficaz. Anestesia complicada por dispneia secundária; pode requerer
traqueostomia. Elodontomas pequenos: extracção similar à de incisivos simples (requer bucotomia
bilateral, com incisão paramediana na mucosa do lado do dente afectado). Elodontomas avançados:
deformação grave das estruturas envolvidas, presença de adesões e anquilose do osso alveolar.
Preferível rinotomia, com abordagem dorsal através das fossas e conchas nasais.
Restauração da
patência do
DNL
Para Dx ou Tx, por flushing ou canulação com SF ou SF + fármacos mucolíticos e/ou AB. Base dos
incisivos e curva maxilar são localizações mais prováveis de obstrução. Lavagem consciente bem
tolerada com anestesia tópica; sob anestesia requer entubação para protecção das vias aéreas.
Canulação retrógada possivelmente mais eficaz. Antibióticos oculares (eficazes contra Pasteurella
multocida) podem ser úteis a curto prazo; em estadios avançados pode ser necessária antibioterapia
parenteral para alívio da sintomatologia.
Chin sling –
Desenvolvida por L. Legendre e I. Rice para corrigir atrofia dos músculos da mastigação adaptados a
estiramento anómalo. Paciente ideal: MO ligeira secundária a dieta inadequada, sem sobrecrescimento
das coroas de reserva, abcessos ou periodontite, ou imediatamente após redução coronal. Também
indicada para pacientes com patologia cardíaca avançada, anoréxicos e demasiado fracos para se
alimentarem; ou com doença prolongada e alimentados a papa, com perda do tónus muscular
Recomendado uso diário (até 12h consecutivas). Boa adaptação do animal. Valor de Dx: intolerância
aponta para patologia não diagnosticada, (por exemplo, abcessos ou sobrecrescimento das coroas de
reserva). Se Dx precoce pode conseguir-se a cura, eliminando recorrências e necessidade de novos Tx.
cinta facial
Eutanásia
12
Sempre que impossível restaurar a função normal e prolongar a vida do animal implique condená-lo a
sofrimento. Necessário educação dos donos atempada. Idealmente, seguida de necrópsia.
Tabela 8. Procedimentos cirúrgicos e modalidades de tratamento da patologia dentária.
12
Ver Anexo 3. Chin Sling.
51
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
7. ABCESSOS ODONTOGÉNICOS
O coelho é a espécie mais frequentemente afectada por abcessos odontogénicos, localizados
na cabeça e focinho (Harcourt-Brown, 2002a). Consistem em massas normalmente firmes e
não dolorosas, geralmente submandibulares ou laterais (Capello, 2004a; 2008a). Também
afectam roedores (Capello, 2004a; 2008a), constituindo, a par com o sobrecrescimento dos
incisivos, a apresentação mais comum em miomorfos. Neste grupo, afectam normalmente os
incisivos (Sainsbury et al., 2004).
Um estudo efectuado em coelhos por Mullan e Main (2006) revelou que a maioria dos
proprietários não se apercebe da existência de doença dentária. Desta forma, é frequente,
aquando da consulta, o animal apresentar já um quadro clínico avançado, normalmente
complicado por infecção perapical, abcessos dos tecidos moles e/ou osteomielite (Capello,
2008b). Por outro lado, a ausência de estímulos iatrotrópicos típicos de patologia dentária tão
pouco significa a sua ausência real (Lennox, 2008d), da mesma forma que não há correlação
directa entre o grau de osteomielite e a sintomatologia (Capello, 2007).
A maioria dos abcessos provoca alterações profundas nos tecidos circundantes, incluindo o
osso alveolar, pelo que, mesmo após o seu tratamento bem sucedido, permanecem sequelas
(Meredith, 2007). São tipicamente difíceis de tratar, sofrendo frequentemente recidivas
(Harcourt-Brown, 2002a; Capello & Gracis, 2005; Ward, 2006; Taylor, Beaufrère, Mans, &
Smith, 2008), e o tratamento é normalmente caro, de longa duração e sem garantia de
sucesso (Harcourt-Brown, 2002a; Capello & Gracis, 2005). Lancetar e lavar abundantemente
(flushing) a ferida raramente é curativo, mesmo quando acompanhado de antibioterapia
agressiva (Harcourt-Brown, 2002a; Capello, 2008a). Assim, é especialmente importante a
validação dos vários protocolos terapêuticos utilizados através de estudos que forneçam dados
concretos sobre resultados a longo prazo. O tamanho diminuto dos ossos do crânio e as
características anatómicas dos dentes dificultam, ainda, o acesso e tratamentos (Taylor et al.,
2008).
7.1. Etiologia e fisiopatologia
No coelho os abcessos estão, regra geral, associados à síndrome de patologia dentária
adquirida, caracterizada, como já descrito, por deterioração dentária, má oclusão adquirida e
sobrecrescimento da coroa de reserva (Harcourt-Brown, 1997). Abcessos e osteomielite são a
alteração patológica mais frequente desta síndrome (Capello, 2004a).
Os abcessos periapicais de molariformes são os mais frequentes, especialmente os
mandibulares. Os dentes elodontes dos lagomorfos e a associação entre a coroa clínica e os
ossos alveolares mandibular e maxilar permitem a disseminação rápida da infecção periapical
(Capello, 2008a). Sem tratamento, ou perante tratamento ineficaz, infecções periapicais
conduzem a osteomielite e/ou microabcessos ósseos (Harcourt-Brown, 2002a; Capello,
52
Paula João Faria
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2008a), apresentando sempre um mau prognóstico (Hinton, 1978; Harcourt-Brown, 2002a;
Capello, 2008a). A osteomielite pode estar localizada no ápice de um dente, ou envolver osso
mandibular ou maxilar (Capello, 2004a).
A fisiopatologia dos abcessos odontogénicos no coelho ainda é, em grande medida
desconhecida, diferindo muito da das demais espécies. Estes abcessos não provocam pirexia,
mesmo na presença de verdadeira infecção bacteriana; normalmente não afectam a preensão
e mastigação dos alimentos (Capello, 2006b; 2006c; 2008a); raramente causam dor,
especialmente nas fases iniciais (Harcourt-Brown, 2002a; Capello, 2006b; 2006c, 2008a); por
norma desenvolvem-se lentamente, podendo assumir dimensões extraordinárias quando
comparados com o tamanho relativo do animal (Capello, 2006b; 2006c; Harcourt-Brown,
2007b), mas podem sofrer crescimento rápido (Bennett, 1999); o animal frequentemente
apresenta apetite e bom estado geral, especialmente nas fases iniciais (Harcourt-Brown,
2002a; Capello, 2008a); o pus é caseoso, sendo impossível a drenagem a que tipicamente se
recorre em outras espécies (Blackwell, 1999; Bennett, 1999; Capello, 2006b; 2006c; HarcourtBrown, 2007b); a cápsula é extremamente espessa (Bennett, 1999; Capello, 2006b; 2006c;
2008a; Harcourt-Brown, 2007b); e tendem a destruir progressivamente os tecidos envolventes
(Capello, 2006b; 2006c; 2008a; Harcourt-Brown, 2007b).
Os abcessos odontogénicos em roedores possuem características idênticas (Capello & Gracis,
2005).
7.2. Diagnóstico e prognóstico
Quando há suspeita de abcessos odontogénicos é vital uma história clínica completa (Van
Caelenberg et al., 2008), com exame da cavidade oral (mucosas, incisivos, molares e prémolares) minucioso. Neoplasias e quistos são diagnósticos diferenciais.
Ao exame físico é possível detectar tumefacções no bordo mandibular, flutuantes ou
aderentes, causadas por sobrecrescimento das coroas de reserva ou abcessos periapicais
(Harcourt-Brown, 1999; Capello, 2004a).
Surgem conjuntivite, epífora e exoftalmos quando há envolvimento do processo zigomático
maxilar e do pavimento da órbita, e estes sinais são frequentemente acompanhados de
ptialismo grave (Crossley, 1995a; Reiter, 2008). A conjuntivite primária é rara no coelho, mas é
comum existir corrimento purulento com origem no ducto nasolacrimal (Harcourt-Brown, 1995).
A epífora pode ser devida ao aumento da produção lacrimal, constituindo uma resposta reflexa
a dor na mucosa ou óssea, ou, mais raramente, a obstrução do ducto nasolacrimal (Crossley,
1995a; Reiter, 2008). A resposta à analgesia permite diferenciar a causa (Crossley, 2003a).
Num estudo efectuado em chinchilas, Crossley (2003a) verificou que a presença de epífora
estava associada à compressão ductos nasolacrimais ou sua obliteração pela intrusão dos
ápices dos pré-molares ou primeiro molar maxilares. O sobrecrescimento das coroas de
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Paula João Faria
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reserva raramente causa obstrução da drenagem lacrimal, mas a abcedação dos pré-molares
fá-lo frequentemente (Crossley, 1995a).
Como anteriormente descrito nos métodos complementares de diagnóstico, a radiologia é
essencial no diagnóstico e determinação da causa de abcessos, e na avaliação das lesões
ósseas (Harcourt-Brown, 2002a; Verstraete, 2003; Capello & Gracis, 2005; Van Caelenberg et
al., 2008). Os abcessos da cavidade nasal são detectáveis radiograficamente, embora
necessitem de endoscopia para diagnóstico definitivo. O animal pode apresentar rinorreia
purulenta, respiração ruidosa ou ruídos respiratórios superiores. Pasteurelose e corpos
estranhos são diagnósticos diferenciais. Tumefacções da proeminência zigomática são
facilmente palpáveis, podendo eventualmente ocorrer ruptura e drenagem espontânea do
abcesso (Harcourt-Brown, 2002).
No coelho, é necessário realizar hemogramas e bioquímicas para avaliação do estado geral e
despiste de patologia concomitante ou subjacente (Harcourt-Brown & Baker, 2001).
Na ausência de compromisso ósseo, Harcourt-Brown (1999; 2002a) refere que, no coelho, o
prognóstico depende maioritariamente da extensão da patologia subjacente, e não tanto da
antibioterapia escolhida ou do tipo de bactérias presentes. Outro factor que condiciona o
prognóstico é o tipo de abcesso. Abcessos retrobulbares, por exemplo, notoriamente mais
difíceis de tratar, têm pior prognóstico que os mandibulares (Capello, 2004a). A abcedação dos
2º e 3º molares mandibulares, embora rara, tem pior prognóstico que nos restantes
molariformes. O ramo da mandíbula é extremamente frágil, nem sempre sendo possível o
desbridamento completo do osso infectado e havendo maior risco de fractura intraoperatória. A
inserção da porção caudal do músculo masséter ao longo da mandíbula dificulta também o
acesso cirúrgico (Capello, 2007; 2008a). Os abcessos periapicais maxilares são menos
frequentes que os mandibulares mas acarretam maior dificuldade de tratamento cirúrgico
(Capello, 2007). Não são palpáveis, excepto na presença de graves alterações ósseas, e
podem obstruir o ducto lacrimal e causar epífora e dacrocistite crónicas (Harcourt-Brown 1999;
Harcourt-Brown, 2002c). Os abcessos retrobulbares são frequentes no coelho porque a bula
alveolar inclui na sua estrutura as coroas de reserva e ápices do último pré-molar e dos três
molares; no caso de infecção periapical de um ou mais dentes a bula fica repleta de
fragmentos de alimento, osso e pus (Capello, 2007; 2008a). Mais raramente, é possível aspirar
o abcesso inserindo uma agulha no espaço periorbitário (Harcourt-Brown, 2002a). Devido ao
diagnóstico normalmente tardio, requerem frequentemente enucleação (Capello, 2008a).
O prognóstico para miomorfos com abcessos odontogénicos é sempre reservado a mau,
sendo especialmente difíceis o diagnóstico precoce e a excisão e extracção dentárias
(Capello, 2004a).
Outro factor que afecta o prognóstico é a ausência de adesão à terapêutica médica
domiciliária. Os cuidados pós-operatórios são tão importantes quanto a cirurgia, sendo
importante avaliar o nível esperado de adesão à terapêutica por parte dos proprietários, já que
estes pacientes requerem consultas de seguimento frequentes, por vezes para o resto da vida,
54
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e cuidados domiciliários moderadamente intensivos. É também necessário educar os
proprietários em relação ao aspecto desagradável do paciente como resultado de algumas
opções cirúrgicas (Capello, 2006b; 2006c; 2008a). Em caso de fraca adesão à terapêutica,
patologia dentária avançada ou complicações secundárias graves deve ser considerada a
eutanásia (Capello, 2006b, 2006c).
7.3. Tratamento médico e cirúrgico
O maneio é similar ao de outros problemas dentários 13 . A terapêutica está dependente de
vários factores, sendo um dos mais importantes a existência ou não de osteomielite (HarcourtBrown, 2002a). O tratamento médico deve incluir antibioterapia para controlar e ajudar a
debelar infecções sistémicas ou locais, de tecidos moles e ósseos (Tyrrell et al., 2002; Capello,
2004a), e analgesia (Capello, 2006b; 2006c; Bennett, 2008).
Rosenfield (2000) relata sucesso na erradicação de abcessos crónicos com a administração
de Penicilina G benzatínica/procaínica. Foi realizado um estudo sobre a microbiota dos
abcessos odontogénicos em 12 coelhos, tendo as espécies isoladas sido uma combinação de
bastonetes anaeróbios gram-negativos (por exemplo, Fusobacterium spp); bastonetes não
formadores de esporos anaeróbios gram-positivos (por exemplo, Actinomyces spp.); e coccus
gram-positivos aeróbios do grupo do Streptococcus milleri. Curiosamente, P. multocida e S.
aureus não foram isolados das lesões (Tyrell et al., 2002).
Muitos autores recomendam a parede da cápsula do abcesso como o melhor local de cultura,
alegando que o centro do abcesso é estéril (Bennettt, 1999; Harcourt-Brown, 2002a; Capello,
2006c). No entanto, Tyrell et al. (2002) verificaram que, em metade dos casos estudados,
amostras colhidas do centro do abcesso continham mais organismos e em maior variedade do
que amostras colhidas da margem, pelo que parece aconselhável recolher amostras de ambos
os locais.
A selecção antibiótica deve ser baseada em cultura aeróbia e anaeróbia e TSA, levando em
linha de conta as restrições de administração das diversas espécies (Tyrell et al., 2002;
Capello, 2004a). Isto é particularmente importante tendo em conta que, na maior parte dos
casos, não só não há dados microbiológicos que permitam escolher a antibioterapia mais
correcta como a colheita é feita incorrectamente (Tyrell et al., 2002). O maneio de abcessos
odontogénicos requer frequentemente antibioterapia prolongada ou, inclusivé, para o resto da
vida, em doses baixas (Bennett, 1999).
Devido à presença de uma cápsula espessa, tecido necrótico mole, dentário e/ou ósseo, e
osteomielite, estes abcessos raramente respondem a antibioterapia isolada, sendo necessário
tratamento cirúrgico agressivo para limpeza do abcesso e remoção dos dentes afectados
(Capello, 2006b; 2006c; 2008a; Harcourt-Brown, 2007b). Na tabela 9 estão descritos alguns
13
Ver II.6.1. Tratamento médico e maneio.
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procedimentos cirúrgicos e modalidades de tratamento, maioritariamente após remoção da
cápsula e desbridamento do abcesso (Tobias, Schneider & Besser, 1967; Stellar, 1980; Chirife,
Scarmato & Herszage, 1982; Triplett, Branham, Gillmore & Lorber, 1982; Hinshaw, Herrera,
Lanzafame & Pennino, 1987; Juri & Palma, 1987; Zumla & Lulat, 1989; Friedman, Rotstein &
Bab, 1992; Remeus e Verbeek, 1995; Bennett, 1999, 2008; Blackwell 1999; Gunnarsson, Rotta
& Steinhorn, 1999; Harcourt-Brown, 1999, 2002a, 2007b; Molan, 1999; 2001; Steenkamp &
Crossley, 1999; Dunford, Cooper, Molan & White, 2000; Kelleher 2000; Rosenfield, 2000;
Eduardo & Gow-Soares, 2001; Mathews & Binnington, 2002a; 2002b; Crossley 2003b; 2003c;
Taylor, 2003; Sharma, 2003; Langlois, 2004; Capello & Gracis, 2005; Verstraete & Osofsky,
2005; Capello, 2006a, 2006b, 2007, 2008a; Johnson 2006; Kemmer, Stein & Hierholzer, 2006;
Mans, Sunohara-Neilson, Higginson, Smith & Taylor, 2006; Mathieu, Linke & Wattel, 2006;
Mathieu & Wattel, 2006; Ward, 2006; Holmberg, 2007; Martínez-Jiménez, 2007; Capello,
2008a; Lennox, 2008d; Sakhavar & Khadem, 2008; Taylor et al., 2008; Visigalli, Cappelletti &
Nuvoli, 2008; Crowe, s.d.).
Nem todos os proprietários estão dispostos a dispender quantias elevadas em tratamentos
sem garantia de sucesso. Quando o plano de tratamento cirúrgico é recusado, alguns autores
recomendam que o abcesso não seja aberto, uma vez que isso criará uma fístula que vai
impedir a cura. Nestas circunstâncias, muitos pacientes continuam a apresentar boa qualidade
de vida e ausência de desconforto, sendo possível, embora altamente improvável, a resolução
espontânea do abcesso. Estes pacientes beneficiam de terapêutica anti-inflamatória e
antibioterapia (Harcourt-Brown, 2007b).
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PROCEDIMENTO
VANTAGENS
DESVANTAGENS
Nenhum
Não oneroso
Ineficaz, recidivas frequentes
Encerramento cirúrgico
Menos invasivo
Ineficaz, recidivas frequentes
Extracção dentária,
desbridamento ósseo
Remove dentes afectados e seus fragmentos,
controlando a infecção
Traumática, especialmente se extraoral
Marsupialização
Lavagem, desbridamento e tratamento tópico fáceis,
monitorização directa
Enucleação
Último recurso em abcessos retrobulbares: acesso à
bula alveolar
Desbridamento e
lavagem por
endoscopia intraoral
Alternativa à enucleação: acesso à bula alveolar com
preservação do olho; menos traumático
Recuperação demorada; necessária
adesão total à terapêutica; aspecto
desagradável do paciente
Traumática, recuperação prolongada;
exposição do nervo e forâmen ópticos;
aspecto alterado do paciente
Requer monitorização longa,
estomatoscopias seriadas, adesão à
terapêutica rigorosa e exames
radiográficos craniais e ecografias
oftálmicas para avaliação
Implantação de contas
impregnadas com Ab
Eluição bifásica, libertação local em altas
concentrações, absorção e efeitos sistémicos
reduzidos
Empacotamento com
gaze impregnada com
Ab
Alternativa a dissecção da cápsula e remoção do
abcesso; início da terapêutica antes dos resultados de
cultura e TSA (penicilina/ampicilina); substituição do
penso apenas semanal; se defeitos ósseos reduzidos,
pode ser única técnica utilizada
Após algum tempo somente tecidos
num raio de 3 mm recebem
concentrações elevadas; eluição
errática; escolha de AB reduzida;
podem funcionar como CE
Requer anestesia geral para
substituição do penso; defeitos ósseos
de grandes dimensões requerem outra
técnica subsequente (contas, por
exemplo)
Empacotamento com
açúcar
Barato; bactericida; diminui edema; potencia
granulação e epitelização; reduz necessidade de
desbridamento cirúrgico; reduz dor
Mudanças de penso no mínimo SID;
necessária adesão total dos
proprietários à terapia
Empacotamento com
mel
Barato; bactericida (incluindo bactérias resistentes a
AB); diminui edema; potencia granulação e
epitelização; reduz necessidade de desbridamento
cirúrgico; permite substituição de peso sem anestesia
Mudanças de penso no mínimo SID;
necessária adesão total dos
proprietários à terapia
Empacotamento com
hidróxido de cálcio
pH 12, bactericida, supostamente não tóxico para
tecidos
Reportada necrose de tecidos
saudáveis nalguns casos
Aplicação de Ab locais
Formação de tecido de granulação saudável
- Doxixiclina gel
®
Sucesso no Tx de abcessos inoperáveis (incluindo
retrobulbares) após limpeza.
Enzimas proteolíticas
Desbridamento da ferida e remoção dos tecidos
infectados e necróticos; alternativa se mau candidato
cirúrgico ou desbridamento cirúrgico inviável
Cerâmicas bioactivas
Preenchimento de espaços mortos; promoção da
regeneração óssea; propriedades antibacterianas;
porosidade permite imbebição com antibióticos
─
Podem lesionar tecidos saudáveis se
usadas incorrectamente
─
Terapia hiperbárica
Adjunta; eficaz na osteomielite crónica; bactericida
(anaeróbios e aeróbios) em tecidos hipóxicos;
potencia fagocitose e acção de aminoglicosídeos;
corrige hipóxia (aporte de 20% mais O2), diminuição
de edema e inflamação (efeito prolongado);
aparentemente não tóxico para pulmões (coelho)
Ainda pouco viável ou testada;
possivelmente onerosa; efeitos
secundários pouco estudados;
convulsões auto-limitantes
(especialmente no cão)
Laser de CO2
Bisturi e vaporizador de tecidos; desbridamento
eficaz; esteriliza tecidos infectados, incluindo dentina;
acção rápida, atraumática; hemostase altamente
controlável nos tecidos; sem efeito à distância ou
acção tóxica; redução da infecção e tempo cirúrgico
Possível aumento de custos, possível
lesão de tecidos saudáveis ou operador
Tabela 9. Procedimentos cirúrgicos e modalidades de tratamento de abcessos odontogénicos.
57
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PARTE III. CASOS CLÍNICOS
Nesta secção serão apresentados seis casos clínicos, correspondentes a patologia dentária
em cinco espécies: coelho (2), porquinho da Índia (1), chinchila (1), ratazana (1) e hamster (1).
Estes casos clínicos são representativos da patologia dentária observada durante o estágio
curricular, e também da patologia dentária descrita na literatura.
1. HAMSTER RUSSO ‘DECKARD’
O hamster russo ‘Deckard’, macho inteiro, 1 ano, apresentou-se a uma primeira consulta em
Outubro de 2008 por anorexia. Não apresentava antecedentes clínicos relevantes. O exame
clínico de admissão revelou bom estado geral, e sobrecrescimento extremo do incisivo maxilar
esquerdo, que tinha já penetrado o palato duro e a pele, encontrando-se enrolado sobre a
porção rostral da face (figs. 22 e 23). Este sobrecrescimento tinha passado despercebido à
proprietária. O diagnóstico provisório foi sobrecrescimento do incisivo maxilar esquerdo..
Figura 22. Sobrecrescimento do incisivo Figura 23. Relação entre dimensão
do paciente e dimensão da porção
maxilar esquerdo.
de dente removida.
É visível o sobrecrescimento extremo do incisivo maxilar esquerdo, especialmente
quando comparado com o tamanho da cabeça.
O plano terapêutico consistiu na redução do incisivo sobredimensionado. O paciente foi
submetido a intervenção cirúrgica no próprio dia, tendo a porção excedentária do incisivo
maxilar esquerdo sido cortada e removida sem dificuldade. Os restantes dentes examinados
apresentavam-se normais, sendo confirmado o diagnóstico de sobrecrescimento do incisivo
maxilar esquerdo. As lesões dos tecidos moles não necessitaram de tratamento. O paciente
recuperou rapidamente da anestesia, tendo regressado a casa poucas horas depois.
Perante esta patologia, foi possível a abordagem terapêutica correcta através do corte dentário
do incisivo sobredimensionado, que se considera um acto curativo.
58
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2. COELHA ‘BUFFY’
A coelha ‘Buffy’, fêmea não ovariohisterectomizada, 6 meses, apresentou-se a uma consulta
de primeira vez em Fevereiro de 2009 por anorexia, letargia e sobrecrescimento dos incisivos.
Não apresentava antecedentes clínicos relevantes.
O exame clínico de admissão revelou bom
estado geral, e sobrecrescimento extremo dos
incisivos maxilares e mandibulares, resultando
em má oclusão grave dos incisivos (figs. 2428). Os incisivos mandibulares tinham perdido
a sua curvatura fisiológica, crescendo quase na
vertical; o incisivo maxilar direito apresentavase encurvado em sentido caudodorsal; o
encurvamento caudolateral do incisivo maxilar
Figura 24. Prognatismo mandibular relativo.
É visível a disparidade acentuada entre a
mandíbula e a maxila.
esquerdo tinha já resultado em lesão da
mucosa oral. Ao exame oral com otoscópio foi
também
detectado
sobrecrescimento
dos
molariformes.
O diagnóstico provisório foi má oclusão dos incisivos secundária a prognatismo mandibular
relativo, com má oclusão concomitante dos molariformes.
Não foram consideradas necessárias análises bioquímicas. Foram efectuados exames
radiográficos nas projecções laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua esquerda e direita,
rostrocaudal e ventrodorsal:
Figura 25. Projecção LL esquerda.
Figura 26. Projecção LObl esquerda.
São visíveis a perda do plano de oclusão dos molariformes (verde) e o sobrecrescimento das coroas de
reserva (setas amarelas). O sobrecrescimento das coroas de reserva mandibulares causou deformação
periapical com perfuração do osso cortical (setas azuis) e aumento dos espaços periodontais (setas
vermelhas).
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Os exames radiográficos revelaram braquignatismo maxilar, confirmando o diagnóstico
presuntivo, e revelaram alterações apicais importantes dos molariformes (figs. 25-28).
O plano terapêutico consistiu na extracção de todos os incisivos e redução coronal dos
molariformes, tendo sido marcada a intervenção cirúrgica para daí a quatro dias; e numa
terapêutica médica consistindo em AINES (meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) e um opióide
(cloridrato de tramadol, 10 mg/Kg PO BID) durante uma semana em ambulatório, e papa
Critical Care for Herbivores®.
Figura 27. Projecção RCd.
Figura 28. Projecção VD.
São visíveis a alteração do plano de
oclusão entre molariformes, e as alterações
apicais mandibulares com penetração do
osso cortical (setas amarelas).
Há perda de definição estrutural, não
sendo possível visualizar com detalhe os
PM1 maxilares (vermelho), nem os seus
espaços periodontais ou lamina dura. Há
deformação apical óbvia dos quatro
incisivos maxilares (setas azuis).
A ‘Buffy’ apresentou-se no dia da cirurgia com bom estado geral. Procedeu-se, inicialmente, à
extracção dos incisivos segundo o protocolo anteriormente descrito (ver tabela 8).
Seguidamente, foi efectuada a redução coronal dos molariformes com Dremel®. A boca foi
mantida aberta com o auxílio de fitas de gazes atadas à maxila e mandíbula, mantidas in situ
durante a cirurgia pelo assistente. Após a cirurgia foram feitos novos exames radiográficos nas
projecções atrás referidas, para garantir que havia sido efectuada a redução correcta e não
permaneciam fragmentos dentários nos alvéolos (figs. 29-30).
A paciente recuperou bem da cirurgia, tendo demonstrado apetite passadas poucas horas.
Regressou a casa no próprio dia, mantendo os AINES em ambulatório durante mais três dias.
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Figura 29. Projecção LL pós-cirurgia.
Figura 30. Projecção Rcd póscirurgia.
São visíveis a normalização relativa do plano de
oclusão (verde), e a ausência de fragmentos
dentários alveolares.
Normalização relativa do plano de
oclusão entre os molariformes
maxilares (contorno vermelho) e os
mandibulares (contorno azul).
Perante esta patologia, foi possível a abordagem terapêutica correcta da patologia dentária
dos incisivos através da sua extracção, que resultou numa recuperação funcional e se
considera um acto curativo. No entanto, as alterações apicais irreversíveis que caracterizam a
patologia dentária dos molariformes na ‘Buffy’ significam que, embora o acto terapêutico tenha
sido o correcto, foi apenas paliativo. O sobrecrescimento dos molariformes acompanhado por
alterações irreversíveis tem indicação para monitorização regular e eventuais tratamentos
médico-cirúrgicos adicionais, tendo a proprietária sido devidamente informada.
3. PORQUINHA DA ÍNDIA ‘TRINITY’
A porquinha da Índia ‘Trinity’, fêmea não ovariohisterectomizada, 2 anos, apresentou-se a uma
primeira consulta em Janeiro de 2009 por anorexia e emagrecimento desde há cerca de uma
semana. Não apresentava antecedentes clínicos relevantes. Ao exame clínico de admissão a
paciente foi considerada magra, pesando 640 g. Encontrava-se parasitada por piolhos
(Gliricola porcelli). O exame oral com otoscópio revelou ausência de alimento na cavidade oral,
tendo sido detectado sobrecrescimento das coroas clínicas dos molariformes, particularmente
óbvio no terceiro molar mandibular direito.
Não foram consideradas necessárias análises bioquímicas. Foram efectuados exames
radiográficos nas projecções laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua esquerda e direita,
rostrocaudal e ventrodorsal, que confirmaram o sobrecrescimento dos molariformes. O plano
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
terapêutico consistiu no tratamento da infecção parasitária com selamectina (6 mg/Kg tópica),
administração de AINES (meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) e papa Critical Care for Herbivores®,
e redução coronal dos dentes afectados.
A ‘Trinity’ apresentou-se no dia seguinte para a redução coronal. Aquando do exame oral sob
anestesia geral foi encontrado alimento na cavidade oral. Após limpeza da mesma tornou-se
visível uma estrutura inicialmente não identificável, do lado direito da porção caudal da
cavidade oral, não sendo claro, mesmo após exploração, de que tipo de estrutura se tratava. A
redução coronal dos molariformes maxilares e primeiros molariformes mandibulares com
Dremel® permitiu uma melhor visualização da estrutura anómala (figs. 31-32):
Figura 32. Ampliação da estrutura.
Figura 31. Estrutura anómala caudal.
É visível a grande dimensão da estrutura não-identificada.
Tentou-se a minimização da estrutura com Dremel®,
constatando-se ser esta parte integral do 3º molar
mandibular direito, correspondendo a sobrecrescimento
atípico dorsal da face distal do dente. Foi realizada
uma redução coronal normal (fig. 33).
A paciente recuperou rapidamente da anestesia, tendo
regressado a casa poucas horas depois. No dia
Figura 33. Cavidade oral após
redução coronal do terceiro molar
mandibular direito.
seguinte, uma conversa telefónica com o proprietário
Após remoção da porção dentária
excedentária, tornou-se visível
alguma ulceração da mucosa oral
bucalmente.
anorexia, tendo sido possível a sua reversão com a
revelou
que
a
‘Trinity’
apresentava
novamente
administração domiciliária de um opióide (cloridrato de
tramadol, 10 mg/Kg PO BID) durante dois dias.
Perante a patologia apresentada, foi possível a abordagem terapêutica correcta através de
terapêutica médica adequada e redução coronal dos molariformes sobredimensionados, que
resultou numa recuperação funcional. No entanto, a redução coronal dos molariformes é
frequentemente apenas paliativa devido às alterações apicais associadas, pelo que não se
62
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
considera a intervenção um acto curativo. O sobrecrescimento dos molariformes,
principalmente se acompanhado de componentes pouco usuais como no caso da ‘Trinity’, tem
indicação para monitorização regular e eventuais tratamentos médico-cirúrgicos adicionais,
tendo o proprietário sido devidamente informado.
4. CHINCHILA ‘ATREIDES’
A chinchila ‘Atreides’, macho inteiro, 2 anos, 560g, apresentou-se a uma primeira consulta em
Dezembro de 2008 por alterações da motilidade intestinal (diarreia). Não apresentava
antecedentes clínicos relevantes. Com uma condição corporal má ao exame clínico de
admissão,
encontrando-se
magro,
ao
exame
oral
com
otoscópio
foi
detectado
sobrecrescimento das coroas clínicas dos molariformes maxilares, e dimensão reduzida das
coroas clínicas dos molariformes mandibulares. O diagnóstico provisório foi má oclusão dos
molariformes por sobrecrescimento dos molariformes maxilares, reabsorção dentária dos
molariformes mandibulares, e hipermotilidade gastrointestinal secundária.
Não foram considerados necessários hemograma ou análises bioquímicas. Foram efectuados
exames radiográficos nas projecções laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua esquerda
e direita, rostrocaudal e ventrodorsal (figs. 34-37). Estes exames confirmaram o
sobrecrescimento dos molariformes maxilares e a diminuição das coroas clínicas dos
molariformes mandibulares, e revelaram a presença de alterações apicais maxilares e
mandibulares e de uma lesão reabsortiva no pré-molar mandibular direito.
O plano terapêutico consistiu em anti-inflamatórios (meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) e papa
Critical Care for Herbivores®, e na redução coronal dos dentes afectados, tendo a intervenção
sido marcada para o dia seguinte.
Figura 34. Projecção LL esquerda.
Figura 35. Projecção LObl direita.
São visíveis a irregularidade do plano de oclusão (seta rosa), a diminuição das coroas clínicas
mandibulares (amarelo), o sobrecrescimento do PM1 (setas laranja), o sobrecrescimento das
coroas de reserva com alterações apicais (setas azuis), o aumento dos espaços interdentários
(setas vermelhas) e uma lesão reabsortiva (círculo verde).
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Figura 37. Projecção VD.
Figura 36. Projecção RCd.
São visíveis o sobrecrescimento das
coroas
clínicas
maxilares
e
mandibulares (setas vermelhas), e
das coroas de reserva maxilares
(setas azuis).
São visíveis as deformações
apicais
dos
molariformes
mandibulares (setas azuis) e o
sobrecrescimento das coroas
clínicas
dos
molariformes
maxilares (setas vermelhas).
A redução coronal decorreu sem problemas e o ‘Atreides’ recuperou rapidamente da
anestesia, tendo regressado a casa no próprio dia. O paciente apresentou-se novamente à
consulta em Fevereiro de 2009, com epífora e perda de peso. O exame clínico revelou
emaciação, pesando o ‘Atreides’ apenas 360g, o que corresponde a uma perda de peso de
26% em seis semanas. O exame oral com otoscópio revelou sobrecrescimento dos
molariformes maxilares, tendo sido instituída terapêutica médica com um opióide (cloridrato de
tramadol, 10 mg/Kg PO BID), que conduziu à recuperação do paciente.
Perante a patologia apresentada, foi possível a abordagem terapêutica correcta através de
terapêutica médica adequada e da redução coronal dos molariformes sobredimensionados,
que resultaram numa recuperação funcional. No entanto, as alterações apicais e reabsorção
dentária irreversíveis, bem como o novo sobrecrescimento dentário passadas apenas seis
semanas, não permitem que a redução coronal possa ser considerada um acto curativo. A
patologia dentária neste paciente tem indicação para monitorização e tratamentos médicocirúrgicos regulares, tendo a proprietária sido devidamente informada.
5. RATAZANA ‘KORBEN DALLAS’
A ratazana ‘Korben Dallas’, macho inteiro, 4 anos, apresentou-se a uma primeira consulta em
Novembro de 2008 por prostração e anorexia desde há alguns dias. Não apresentava
antecedentes clínicos relevantes. O exame físico revelou desidratação; o exame oral revelou
má oclusão dos incisivos por sobrecrescimento e desvio. Não foram considerados necessários
hemograma ou análises bioquímicas. Iniciou-se a terapêutica médica com antibiótico
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(enrofloxacina 10 mg/Kg PO BID) e AINES (meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) em ambulatório,
tendo o proprietário sido instruído a voltar daí a três dias.
No consulta seguinte, o ‘Korben Dallas’ apresentava já uma massa facial infraorbitária, com
características compatíveis com um abcesso odontogénico. Foram efectuados exames
radiográficos nas projecções laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua esquerda e direita,
rostrocaudal e ventrodorsal. Estes exames permitiram visualizar o sobrecrescimento dentário
dos incisivos e revelaram a existência de fractura nos dois primeiros molares mandibulares
(fig. 40); permitiram, ainda, o diagnóstico presuntivo de abcesso e revelaram a presença de
zonas de ostemielite (figs. 38-39):
Figura 38. Projecção RCd.
São
visíveis
zonas
de
osteomielite (setas verdes) e um
abcesso (vermelho.
Figura 39. Projecção VD.
São visíveis um abcesso
(seta vermelha), zonas de
osteomielite (setas verdes)
e proliferação óssea (seta
azul).
O proprietário foi instruído a manter a terapêutica
médica em ambulatório e a regressar para
reavaliação do paciente daí a uma semana. Uma
semana depois o ‘Korben Dallas’ não apresentava
melhoria
clínica,
tendo
o
plano
terapêutico
consistido na limpeza cirúrgica do abcesso. O
proprietário
foi
devidamente
informado
dos
Figura 40. Projecção LL direita.
cuidados pós-operatórios requeridos e do aspecto
São visíveis sobrecrescimento, má oclusão
e perda da terminação em bisel dos
incisivos (setas vermelhas), e fractura dos
1º e 2º molares (seta verde).
do paciente após a intervenção. O paciente foi
intervencionado no mesmo dia.
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Foi incidida a pele sobre o abcesso, com o intuito de se efectuar a dissecção da cápsula e
remoção do abcesso por inteiro. Tal não foi, no entanto, possível, devido a aderências, à
extensão da lesão e à osteomielite e osteólise presentes, tendo sido necessário abrir a
cápsula. Foi efectuada a limpeza do abcesso e remoção da cápsula, bem como o
desbridamento de osso infectado e a limpeza da cavidade óssea, com lavagem abundante da
mesma (fig. 41).
Figura 41. Extensão da ferida
cirúrgica após limpeza do abcesso.
Figura 42. Aspecto da ferida cirúrgica após
marsupialização.
A marsupialização permite a monitorização e lavagem agressiva da ferida cirúrgica.
A ferida cirúrgica foi marsupializada através da sutura interrompida da pele, tecido subcutâneo
e fáscia com fio não absorvível (fig. 42). Após a cirurgia foram efectuados novos exames
radiográficos nas projecções atrás mencionadas, que confirmaram a ausência de fragmentos
dentários alveolares, e a gravidade das lesões de osteomielite e osteólise visualizadas durante
a limpeza cirúrgica do abcesso (fig. 43).
Foi considerado necessário o internamento do paciente,
para garantir os cuidados intensivos diários requeridos
pós-marsupialização. A terapêutica médica consistiu em
antibioterapia (azitromicina 3,5 mg/Kg SC BID), AINES
(meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) e limpeza agressiva da
ferida com hipoclorito de sódio bi-diária. O estado clínico
do ‘Korben Dallas’ continuou a agravar-se nos dias
subsequentes. Dado o mau prognóstico devido à
Figura 43. Projecção RCd póscirurgia.
São visíveis a extensão da
osteólise (rectângulo vermelho)
e lesões de osteomielite (seta
verde).
gravidade das lesões existentes e à não resposta à
terapêutica, cinco dias após a cirurgia foi recomendada
a eutanásia ao proprietário. A recomendação foi aceite,
tendo-se procedido à eutanásia no próprio dia.
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Perante esta patologia foi possível a abordagem terapêutica correcta através da instituição de
uma terapêutica médica adequada, da limpeza cirúrgica do abcesso e de cuidados pósoperatórios atempados e intensivos. No entanto, estas medidas não constituíram um acto
curativo, tendo a extensão e gravidade das lesões de osteólise e osteomielite requerido a
eutanásia do paciente.
6. COELHO ‘CAPTAIN MAL’
O coelho ‘Captain Mal’, macho inteiro, 4,5 anos, 1,600 Kg, apresentou-se a consulta em
Dezembro de 2008 por anorexia, tumefacção facial e corrimento nasolacrimal purulento.
Apresentava como antecedentes clínicos problemas dentários desde Novembro de 2006,
tendo, desde então, sido submetido a três reduções coronais, um corte de esporões dentários,
uma limpeza cirúrgica de um abcesso infraorbitário e à extracção de nove molariformes
maxilares e dois molariformes mandibulares (figs.44-47). Havia, ainda, sofrido de uma rinite,
uma infecção fúngica e uma descamação seca de cotovelos e calcanhares.
Figura 44. Projecção LL esquerda (2007).
Figura 45. Projecção LObl (2007).
São visíveis a deformação das coroas clínicas com
boca em escada dos molariformes maxilares (seta
rosa), sobrecrescimento e deformação das coroas de
reserva com perfuração do osso cortical (setas azuis)
e aumento dos espaços interdentários (setas
vermelhas).
São visíveis a alteração da angulação normal do incisivo
maxilar (seta amarela), sobrecrescimento e deformação
das coroas de reserva com perfuração do osso cortical
(setas azuis), aumento dos espaços interdentários
(setas vermelhas), zonas de radiolucência compatível
com reabsorção dentária (setas verdes) e uma zona de
reacção inflamatória óssea (seta laranja).
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Figura 46. Projecção VD (2007).
Figura 47. Projecção RCd (2007).
São visíveis zonas de osteomielite
(setas verdes), deformação óssea
mandibular (seta azul) e um
abcesso (seta vermelha).
São visíveis sobrecrescimento e alterações dos
molariformes maxilares e mandibulares (setas
vermelhas), alterações na angulação dos
incisivos maxilares (setas amarelas), alterações
na forma dos incisivos mandibulares (círculos
laranja) e zonas de osteomielite (setas verdes).
O exame físico revelou ter a massa facial características compatíveis com um abcesso
odontogénico, e sobrecrescimento dentário dos molariformes maxilares comprovado por
exames radiográficos nas projecções laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua esquerda
e direita, rostrocaudal e ventrodorsal. Os exames radiográficos revelaram também alguma
alteração da angulação normal do incisivo maxilar, grave deformação das coroas clínicas com
presença de boca ondulada, e sobrecrescimento e deformação das coroas de reserva com
perfuração e alterações graves do osso cortical mandibular.
Figura 48. Abcesso odontogénico maxilar
externo.
Figura 49. Incisão da cápsula do
abcesso.
A dimensão dos abcessos periapicais não é
o factor mais importante para o prognóstico.
É visível o pus caseoso característico de
abcessos do coelho e roedores.
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O plano terapêutico consistiu na limpeza cirúrgica do abcesso e extracção dos três restantes
molariformes maxilares, e numa terapêutica médica consistindo em antibioterapia (penicilina G
benzatínica/procaínica 80.000 UI/kg SC q48h), AINES (meloxicam 0,2 mg/Kg PO BID) e papa
Critical Care for Herbivores.
O ‘Captain Mal’ apresentou-se dois dias depois para cirurgia. Foi efectuada a limpeza do
abcesso e marsupialização da ferida cirúrgica (figs. 48-50), tal como descrito no caso clínico 5.
Os três molariformes maxilares foram extraídos intraoralmente segundo o protocolo
anteriormente descrito (ver tabela 8); a sua remoção revelou a existência de uma fístula com
abertura para o interior da cavidade oral (fig. 51).
Figura 50. Marsupialização da ferida
cirúrgica.
Extensão da ferida cirúrgica
marsupialização.
Figura 51. Fístula oral.
após
Aspecto da cavidade oral fistulizada
após extracção dos molariformes.
Após a cirurgia foram efectuados novos
exames radiográficos nas projecções atrás
mencionadas, que confirmaram a ausência de
fragmentos dentários alveolares (fig. 52).
Figura 52. Projecção LObl pós-extracção.
São visíveis a alteração da angulação normal do
incisivo maxilar (seta vermelha), a ausência total
de molariformes maxilares, a deformação das
coroas clínicas com boca ondulada (verde), e o
sobrecrescimento e deformação das coroas de
reserva com perfuração grave do osso cortical
mandibular (seta azul). A comparação com os
exames anteriores (figs. 44-45) permite avaliar a
gravidade e progressão da patologia.
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Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Com bom estado geral e apetite normal, o ‘Captain Mal’ teve alta dois dias após a cirurgia,
tendo os donos sido instruídos em relação aos cuidados diários de limpeza domiciliários.
Quatro dias após a alta o paciente regressou à
consulta com exoftalmia do olho direito, conjuntivite
e epífora (fig. 53). O diagnóstico provisório foi
abcesso
retrobulbar,
confirmado
por
exames
radiográficos nas projecções LL esquerda e direita,
LObl esquerda e direita, RCd e VD. Foi considerado
necessário o internamento do ‘Captain Mal’, tendo o
plano terapêutico consistido na manutenção da
Figura 53. Exoftalmia – olho direito.
São visíveis a exoftalmia do olho direito,
conjuntivite e o pelo húmido característico
de epífora.
terapêutica médica anteriormente instituída e na
limpeza cirúrgica do abcesso.
Esta foi efectuada no próprio dia, tendo sido observado pouco pus no interior da cavidade oral.
Foram adicionados corticosteróides em dose anti-inflamatória (prednisolona 0,5 mg/kg SC
q12h 3 dias) à terapêutica médica.
O paciente permaneceu internado para permitir uma monitorização mais acurada, e efectuouse o tratamento do olho afectado com lágrima artificial QID e antibioterapia tópica
(ciprofloxacina, 1 gota, QID) e a alimentação forçada com a papa Critical Care for Herbivores®.
Não houve melhoria substancial e, com evolução para panoftalmia, ao fim de seis dias foi
decidida a enucleação do olho afectado.
Figura 54. Panoftalmia.
Figura 55. Preparação do campo cirúrgico.
É visível a enorme pressão a que o globo ocular se encontra sujeito, especialmente na figura 55.
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Foi usada uma abordagem cirúrgica transconjuntival devido ao grande plexo venoso
retrobulbar característico do coelho. A cirurgia foi iniciada por cantotomia lateral (figs. 56-57).
Figura 56. Cantotomia lateral.
Figura 57. Cantotomia lateral.
A cantotomia permite o acesso ao globo ocular.
Figura 58. Incisão da conjuntiva bulbar.
Figura 59. Incisão da conjuntiva bulbar.
Incisão da conjuntiva bulbar para libertação do globo ocular.
Foi efectuada uma peritomia de 360º, deixando apenas alguns milímetros da conjuntiva bulbar para
permitir a sua manipulação (figs. 58-59). A incisão foi feita tão junto ao globo quanto possível para
evitar a perfuração do plexo venoso localizado dorsomedialmente. As inserções dos músculos
extraoculares foram cortadas. O nervo óptico e vasos associados foram seguidamente laqueados
com uma pinça hemostática e os tecidos laqueados com fio de sutura, após o que o nervo óptico e
tecidos associados foram cortados proximalmente à laqueação. O globo ocular foi removido (figs.
60-61). A membrana nictitante foi então excisada, bem como o restante das conjuntivas bulbar
e palpebral.
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Figura 60. Remoção do globo ocular.
Figura 61.
enucleação.
Cavidade
orbitária
pós-
Fase final da enucleação.
Procedeu-se, em seguida, à limpeza extensiva da cavidade orbitária, com remoção de material
purulento.
A
cavidade
orbitária
foi
subsequentemente
preenchida com esponja de colagénio, sendo
posteriormente efectuada a aposição do tecido
subconjuntivo com fio de sutura absorvente.
Foram
excisionadas
as
margens
palpebrais
(aproximadamente 2 mm) ao longo de toda a sua
circunferência, incluindo a pele, carúncula e
ligamento cantal medial, e removida a glândula de
Harder. Finalmente, as margem palpebrais foram
Figura 62. Sutura das pálpebras.
É visível o material de preenchimento da
cavidade orbitária.
apostas utilizando fio não absorvível e suturas
interrompidas (fig. 62).
O ‘Captain Mal’ recuperou bem da cirurgia, embora tenha permanecido anoréxico e sido
submetido diariamente a alimentação forçada com papa nos dois dias que se seguiram à
intervenção cirúrgica. Na manhã do terceiro dia, foi inesperadamente encontrado morto na
jaula.
Perante esta patologia, foi possível a abordagem terapêutica correcta através da instituição de
uma terapêutica médica adequada e da realização de intervenções cirúrgicas correctas e
atempadas, seguidas de cuidados pós-operatórios intensivos. No entanto, estas medidas não
conseguiram travar a progressão da doença, tendo a infecção óssea e, possivelmente, o
trauma cirúrgico, levado à morte do paciente.
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7. Discussão dos casos clínicos
A má oclusão é a patologia dentária mais comum em roedores, resultando do
sobrecrescimento dos incisivos apenas (maioria das espécies) ou de todos os dentes
(roedores herbívoros) (Legendre, 2003). Em miomorfos, a apresentação mais comum é a má
oclusão dos incisivos por sobrecrescimento (Sainsbury et al., 2004), representada neste
trabalho pelo hamster russo ‘Deckard’. No hamster, o padrão de má oclusão mais comum é o
sobrecrescimento dorsocaudal, com frequentes lesões nos lábios, língua e/ou palato duro
(Capello, 2008b), correspondendo ao observado neste paciente. O sobrecrescimento dos
incisivos no hamster é maioritariamente secundário a fractura ou infecção periapical/pulpar,
embora existam relatos anedóticos de braquignatismo maxilar congénito (Capello, 2008b). A
sintomatologia é normalmente discreta, sendo o diagnóstico frequentemente apenas possível
quando complicações graves constituem estímulo iatrotrópico (Capello & Gracis, 2005).
Este caso vai de encontro ao descrito na literatura, visto que o sobrecrescimento dentário,
embora exuberante, tinha passado despercebido à proprietária (Capello & Gracis, 2005;
Mullan & Main, 2006; Capello, 2008b). O prognóstico na má oclusão dos incisivos é
normalmente bom (Legendre, 2003) mas a má oclusão é totalmente corrigível através de
redução coronal apenas se for possível restaurar por completo a altura das coroas clínicas e o
plano de oclusão (Capello & Gracis, 2005). Neste caso, a intervenção atempada através do
corte do incisivo, tal como recomendado na literatura, e a ausência de complicações
secundárias permitem pensar que o tratamento tenha sido, de facto, curativo.
Os casos clínicos seguintes ilustram a necessidade de exames complementares de
diagnóstico na patologia dentária. O exame radiográfico é indispensável para uma avaliação
dentária completa (Bellows, 1993), permanecendo o principal meio de diagnóstico (Gracis,
2008). Tal como referido na literatura, permitiu estadiar a patologia, elaborar um plano de
tratamento e prognóstico (Meredith, 2007; Gracis, 2008), diferenciar estruturas dentárias
normais de estruturas anómalas (Capello & Gracis, 2005) e identificar zonas de osteólise ou
osteomielite (Capello & Caudurro, 2008; Mackey et al., 2008). É recomendada a utilização de
filme de alta resolução (Gracis, 2008; Capello, 2006a; 2008b), sendo o bom posicionamento e
qualidade do filme essenciais, especialmente em roedores (Capello, 2003, Lennox 2009).
Estes critérios foram respeitados em todos os casos, tendo sido considerada essencial a
realização de cinco projecções radiográficas: laterolateral esquerda e direita, lateral oblíqua
esquerda e direita, ventrodorsal e rostrocaudal (Capello, 2004a; Capello & Gracis, 2005;
Lennox, 2008a).
Na patologia dentária do coelho e roedores, um prognóstico preciso baseia-se nos dados
recolhidos durante o processo de diagnóstico, sendo expresso em termos da gravidade da
doença, idade e estado do paciente, nível de cuidados continuados estimado, probabilidade de
adesão à terapêutica pelos proprietários e custos esperados. A resolução da patologia dentária
73
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Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
é possível, mas, tal como ilustrado pelos cinco casos em discussão, é mais comum ser
necessário o maneio da mesma para o resto da vida (Capello, 2004a).
O prognóstico para roedores com patologia dentária complexa é geralmente mais reservado
do que no coelho devido a particularidades anatómicas e à dificuldade relativa de intervenções
cirúrgicas. No entanto, a extrema variabilidade das apresentações clínicas requer avaliação
caso a caso (Capello, 2004a).
A patologia observada no caso clínico 2 (coelha ‘Buffy’), prognatismo mandibular relativo por
braquignatismo maxilar congénito, é considerada a patologia congénita mais comum nesta
espécie. É causada por má oclusão esquelética congénita, com posicionamento dos
molariformes mandibulares rostral aos molariformes maxilares devido à redução do
comprimento da maxila.
A redução do comprimento da maxila e os movimentos rostrocaudais de amplitude reduzida
impedem a retracção da mandíbula; o subsequente sobrecrescimento dos incisivos agrava a
má oclusão, sendo este quadro posteriormente agravado pela alteração das forças de oclusão.
O corte e preensão dos alimentos tornam-se progressivamente mais difíceis (Harcourt-Brown,
2002b; Capello & Gracis, 2005). A curvatura mais acentuada dos incisivos maxilares causa
sobrecrescimento dorsocaudal, que pode originar lesões dos tecidos moles (lábios em
particular, língua, palato duro e nariz); os incisivos mandibulares raramente causam lesões
tecidulares, dado sofrerem crescimento rostrodorsal (Capello, 2004a; Capello & Gracis 2005;
Verstraete & Osofsky, 2005).
O braquignatismo maxilar afecta principalmente animais de raças anãs, com menos de um ano
de idade (Harcourt-Brown, 2002; Capello & Gracis, 2005; Verstraete & Osofsky, 2005; Reiter,
2008; Van Caelenberg et al., 2008; Verstraete, 2003). O caso apresentado desvia-se do
padrão clássico: embora a paciente tivesse apenas 6 meses, tratava-se de um animal
relativamente grande. Os pacientes braquignatas apresentam má oclusão persistente e
recorrente, sendo quase sempre impossível restaurar a função normal. O tratamento de
eleição é, assim, a extracção de todos os incisivos (Capello, 2004a; Osofsky e Verstraete,
2006; Meredith, 2007; Lennox, 2009), tendo sido este o acto terapêutico adoptado para a
paciente. O coelho adapta-se com facilidade à ausência de incisivos, utilizando a língua e
lábios para preensão do alimento (Legendre, 2003; Capello, 2004a; Lennox, 2008c). A
abordagem terapêutica resultou, no caso dos incisivos, numa recuperação funcional, tendo a
solução proposta corrigido o problema.
A ‘Trinity’, bem como o paciente do caso clínico 4, a chinchila ‘Atreides’, apresentavam má
oclusão dos molariformes, com sobrecrescimento das coroas clínicas e de reserva. O
sobrecrescimento dos molariformes é extremamente frequente no coelho (Capello & Gracis,
2005), ocorrendo também na chinchila mas de forma menos óbvia (Capello, 2008b).
No coelho, a patologia dentária adquirida pode dever-se maioritariamente a DOM, atrição
insuficiente por dieta inadequada ou trauma, ou a uma combinação destes factores (HarcourtBrown, 2006; Capello & Gracis, 2005; Van Caelenberg et al., 2008). Na chinchila, não parece
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haver correlação entre anomalias do metabolismo do cálcio e patologia dentária, sendo o
trauma e, principalmente, uma dieta inadequada os principais factores etiológicos (Crossley,
2003a).
Embora no caso da coelha ‘Trinity’ o sobrecrescimento dos incisivos se devesse claramente a
má oclusão congénita, tal não garantia que tivesse precedido o sobrecrescimento dos
molariformes. Com efeito, embora raro, podem ocorrer isoladamente; mais frequentemente, a
má oclusão dos incisivos é secundária a ou concomitante com má oclusão dos molariformes,
especialmente em coelhos mais velhos (Harcourt-Brown, 1997; Verstraete & Osofsky, 2005) e
na chinchila (Harcourt-Brown, 1997), ou vice-versa (Harcourt-Brown, 2002b; Capello & Gracis,
2005; Reiter, 2008).
Sofrendo o efeito de forças intrusivas superiores ao normal, o crescimento apical causa
alterações periapicais, frequentemente acompanhadas por perfuração do osso cortical e
aumento dos espaços interdentários (Harcourt-Brown, 2002b; Capello, 2004a; Capello &
Gracis, 2005; Meredith, 2007). Tal foi o observado nestes dois pacientes, ‘Trinity’ e ‘Atreides’.
A chinchila sofre frequentemente deformação apical e perfuração do periósteo, assumindo
estas formas especialmente graves (Capello, 2004a; 2008a), tal como observado no paciente
‘Atreides’. Apesar disto, a chinchila apresenta menor predisposição para infecções periapicais
e osteomielite do que o coelho (Capello, 2008a). Esta espécie tipicamente não apresenta
sinais clínicos até estadios avançados da patologia dentária, sendo o seu diagnóstico precoce
ainda mais premente que no coelho (Capello, 2004a). A única forma de garantir um
diagnóstico preventivo é realizar exames dentários regulares a partir dos dois anos de idade,
precedendo o início da sintomatologia (Capello, 2008b).
O objectivo do tratamento da má oclusão de molariformes é a redução em altura das coroas
clínicas e o restabelecimento da morfologia normal. Existem algumas limitações: a
irreversibilidade das alterações apicais significa que o tratamento deverá ser repetido a
intervalos regulares; no caso específico do coelho, é impossível replicar o padrão em
ziguezague do plano de oclusão fisiológico. A necessidade de redução coronal varia não
apenas de animal para animal, como também no mesmo animal ao longo do tempo (Lennox,
2008c), devendo, por isso, ser avaliada individualmente.
O ‘Atreides’ apresentava, ainda, redução em altura das coroas clínicas mandibulares,
provavelmente devida a reabsorção dentária generalizada, e uma lesão reabsortiva localizada
no pré-molar mandibular direito. Lesões reabsortivas foram reconhecida em várias espécies,
incluindo a chinchila (Crossley et al., 1997; Legendre 2003), crendo-se que representem uma
extensão da remodelação óssea para o interior da dentina (Crossley et al., 1997). Neste
paciente,
o
pré-molar
afectado
apresentava
deformação
apical
considerável
e,
presumivelmente, inflamação, o que está de acordo com a localização e associações típicas
de lesões reabsortivas descritas na literatura (Crossley, 2003a). No coelho, um aporte
nutricional de cálcio deficiente parece aumentar a progressão de lesões reabsortivas
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(Harcourt-Brown, 1996), mas não há evidência de que tal aconteça na chinchila (Crossley,
2003a).
Finalmente, a chinchila ‘Atreides’ apresentou-se a consulta sofrendo de alterações
gastrointestinais. Estas são uma sequela comum de patologia dentária adquirida nesta espécie
(Capello & Gracis, 2005), sendo corrigíveis pela introdução de uma dieta com um teor de fibra
óptimo (Ososfky & Verstraete, 2006).
Apesar da adopção das medidas terapêuticas correctas, as alterações dentárias irreversíveis
sofridas por ambos os pacientes preconizam a necessidade de novos tratamentos, que apenas
poderão ser considerados paliativos, tendo as proprietárias sido devidamente informadas e
aconselhadas a trazer a ‘Trinity’ e o ‘Atreides’ à consulta regularmente para avaliação dentária
adequada e atempada.
No caso clínico 5 foi apresentada a patologia dentária da ratazana ‘Korben Dallas’. Os
roedores são afectados por abcessos odontogénicos com frequência (Capello, 2004a; 2008a),
sendo estes considerados por alguns uma das apresentações clínicas mais comum em
miomorfos (Sainsbury et al., 2004). Na bibliografia estão descritas tumefacções faciais
relacionadas com infecção periapical e abcedação como o sinal mais comum de patologia
dentária dos molariformes (Capello, 2008b). Tal foi, com efeito, o observado neste paciente.
No caso clínico 6 é apresentado um abcesso odontogénico maxilar num coelho, o ‘Captain
Mal’. O coelho é a espécie mais frequentemente afectada por abcessos odontogénicos
(Harcourt-Brown, 2002a). Os abcessos maxilares são menos frequentes que os mandibulares,
e mais difíceis de tratar cirurgicamente (Capello, 2007).
No coelho, abcessos odontogénicos raramente afectam a preensão e mastigação dos
alimentos (Capello, 2006b; 2006c; 2008a) ou causam dor (Harcourt-Brown, 2002a; Capello,
2006b; 2006c, 2008a); desenvolvem-se lentamente e assumem grandes dimensões (Capello,
2006b; 2006c; Harcourt-Brown, 2007b); o paciente frequentemente apresenta apetite e bom
estado geral, especialmente nas fases iniciais (Harcourt-Brown, 2002a; Capello, 2008); o pus é
caseoso, impossibilitando a drenagem simples (Blackwell, 1999; Bennett, 1999; Capello,
2006b; 2006c; Harcourt-Brown, 2007b); possuem cápsulas extremamente espessas (Bennett,
1999; Capello, 2006b; 2006c; 2008a; Harcourt-Brown, 2007b); e tendem a destruir
progressivamente os tecidos envolventes (Capello, 2006b; 2006c; Capello, 2008a; HarcourtBrown, 2007b). O mesmo ocorre em abcessos odontogénicos em roedores (Capello & Gracis,
2005).
No coelho, estes abcessos estão, regra geral, associados à síndrome de patologia dentária
adquirida, caracterizada por deterioração dentária, má oclusão adquirida e sobrecrescimento
das coroas de reserva (Harcourt-Brown, 1997). A osteomielite também constitui uma
consequência frequente desta síndrome (Capello, 2004a). A maioria dos abcessos no coelho e
roedores provoca alterações profundas nos tecidos circundantes (incluindo osso alveolar),
permanecendo sequelas mesmo após tratamentos bem sucedidos (Meredith, 2007). Estes,
porém, são raros, sendo as recidivas frequentes (Harcourt-Brown, 2002a; Capello & Gracis,
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2005; Ward, 2006; Taylor et al., 2008). O tratamento de abcessos odontogénicos é sempre
caro, de longa duração e sem qualquer garantia de sucesso (Harcourt-Brown, 2002a; Capello
& Gracis, 2005).
Tal como recomendado na literatura, o tratamento médico incluiu antibioterapia para controlar
e debelar a infecção local ou sistémica (Rosenfield, 2000; Tyrrell et al., 2002; Capello, 2004a),
e analgesia (Capello, 2006b; 2006c; Capello & Gracis, 2005; Bennett, 2008), tendo respeitado
as restrições de cada espécie (Tyrell et al., 2002; Capello, 2004a). Ambos os proprietários
encontravam-se informados sobre a probabilidade de a antibioterapia ser longa (Bennett,
1999).
No entanto, a espessura da cápsula e a extensão dos tecidos necróticos e da osteomielite
significam que estes abcessos raramente respondem a antibioterapia isolada, sendo
necessária pelo menos uma intervenção cirúrgica agressiva para limpeza e remoção dos
dentes afectados e seus fragmentos (Capello, 2006b; 2006c; 2008a; Harcourt-Brown, 2007b).
Embora existam várias modalidades de tratamento cirúrgico (ver tabela 9), a abordagem
cirúrgica preferida por vários autores, e a utilizada no tratamento cirúrgico dos abcessos
odontogénicos do ‘Korben Dallas’ e do ‘Captain Mal’, consistiu na limpeza cirúrgica agressiva
do abcesso, com remoção da cápsula, desbridamento ósseo e remoção de dentes afectados e
seus fragmentos, seguida de marsupialização e posterior limpeza e desbridamento frequentes
da ferida cirúrgica, com aplicação de antisépticos locais (Capello & Gracis, 2005; Lennox,
2009).
A marsupialização implica um pós-operatório mais longo e difícil e o aspecto desagradável do
paciente, mas permite a observação fácil e a limpeza e tratamento da ferida cirúrgica sem
necessidade de anestesia geral até ocorrer cicatrização por segunda intenção (Capello,
2008a). Esta opção requer que os proprietários estejam esclarecidos sobre o que esperar após
a cirurgia, não só em termos do aspecto do animal e morosidade da sua recuperação, mas
também da sua participação nos tratamentos diários intensivos requeridos, e nas consultas de
monitorização futuras. Em ambos os casos, os proprietários encontravam-se devidamente
esclarecidos e preparados para a adesão à terapêutica recomendada.
A dimensão do abcesso não permite, por si só, estabelecer um prognóstico (Capello & Gracis,
2005). Em roedores com doença dentária, o prognóstico é geralmente menos favorável do que
em lagomorfos devido às suas características anatómicas e fisiopatológicas, bem como à
dificuldade de intervenção cirúrgica em animais com um tamanho tão pequeno. Na presença
de infecção periapical e osteomielite, como no caso da ratazana ‘Korben Dallas’, o prognóstico
é sempre reservado a mau (Capello, 2004a; 2008a).
No coelho, os molariformes elodontes e a associação entre coroas clínicas e o osso alveolar
permitem a disseminação rápida da infecção periapical (Capello, 2008a), que facilmente evolui
para osteomielite (Harcourt-Brown, 2002a; Capello, 2008a), com focos de infecção apicais ou
envolvimento ósseo maxilar/mandibular (Capello, 2004a). Na presença de deformação óssea
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considerável e osteomielite, como no caso do abcesso maxilar do ‘Captain Mal’, o prognóstico
é sempre reservado a mau (Hinton, 1978; Harcourt-Brown, 2002a; Capello & Gracis, 2005;
Capello, 2008a). A presença de uma fístula oral, que implica um atraso acrescido do processo
de cura (Capello, 2008a), veio dificultar ainda mais a recuperação do paciente.
Para além disto, o ‘Captain Mal’ sofreu, ainda, de um abcesso retrobulbar. Estes abcessos são
notoriamente difíceis de tratar (Capello, 2004a) e a sua presença diminuiu ainda mais as
hipóteses de sobrevivência do paciente. São uma sequela frequente de patologia dentária
adquirida no coelho, dado que a estrutura da bula alveolar inclui as coroas de reserva e ápices
de quase todos os molariformes, ficando repleta de fragmentos de alimento, osso e pus se
existir infecção periapical (Capello, 2007; 2008a). Estes abcessos são, por norma, apenas
diagnosticados quando a pressão resultante da acumulação de material causa exoftalmia.
A enucleação, que consiste na remoção cirúrgica do globo ocular, membrana nictitante,
conjuntiva, glândulas lacrimais e parte do nervo óptico e pálpebras, é a derradeira alternativa
em termos de tratamento ocular em pacientes exóticos (Holmberg, 2007). É bastante comum
devido ao diagnóstico tardio e presença frequente de panoftalmite (Capello, 2008a; Lennox,
2008d). É o tratamento de eleição para um olho cego e doloroso, independentemente da
causa (Holmberg, 2007), e está indicada em caso de patologia retrobulbar ou exoftalmia,
porque só assim é possível investigar a órbita (Harcourt-Brown, 2002d) e aceder à bula
alveolar para limpeza e lavagem (Kelleher, 2008b). Oferece também uma solução para a
exposição crónica secundária a exoftalmos grave (Holmberg, 2007).
A existência de um plexo venoso retrobulbar extremamente dimensionado no coelho implica a
necessidade de maior cuidado aquando da dissecção (Harcourt-Brown, 2002d; Holmberg,
2007; Williams, 2007; Kelleher, 2008b). Embora Holmberg (2007) alerte para a dificuldade de
conseguir uma hemostase eficaz e perigo de exsanguinação, muitos autores consideram que a
hemostase por pressão directa é conseguida com relativa facilidade (Kirschner, 1997;
Harcourt-Brown, 2002d; Kelleher, 2008b), devido à rapidez de coagulação nesta espécie
(Harcourt-Brown, 2002d).
A abordagem transconjuntival é a preferida em animais exóticos, dado permitir manter a
integridade do plexo venoso (Kirschner, 1997; Holmberg, 2007; Williams, 2007), tendo sido a
escolhida na enucleação do ‘Captain Mal’. Esta abordagem, a par dos cuidados acima
referidos, garantiu o sucesso da cirurgia com o mínimo de trauma possível para o paciente.
Esta intervenção possibilita o acesso cirúrgico dorsal à bula alveolar, mas aumenta o risco de
exposição do nervo e forâmen ópticos. Estes factores, aliados à profundidade da fossa
orbitária e ao facto de a maioria dos proprietários ter dificuldade em lidar com uma cavidade
orbitária vazia, fazem com que a marsupialização e desbridamento frequente desta área não
sejam recomendados (Capello, 2008a; Lennox, 2008d). Por este motivo, foi efectuada a
aposição das pálpebras do paciente no final da cirurgia.
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A eutanásia é sempre o último recurso do médico veterinário. Constitui uma opção válida, e
muitas vezes necessária, se existir fraca adesão à terapêutica por parte dos proprietários,
patologia dentária avançada ou complicações secundárias graves (Capello, 2006b; 2006c).
Apesar da adesão estrita à terapêutica, foram rapidamente esgotadas as opções de
tratamento da ratazana ‘Korben Dallas’ (caso clínico 5). A não resposta ao tratamento cirúrgico
e à terapêutica médica e a deterioração persistente do paciente levaram a que a eutanásia
fosse finalmente considerada a única opção médica e ética possível.
No caso do coelho ‘Captain Mal’ (caso clínico 6), e apesar de uma enucleação ser uma
intervenção inerentemente traumática, o sucesso da cirurgia, a ausência de complicações póscirúrgicas e a melhoria diária do quadro clínico do paciente não faziam prever a sua morte,
tendo esta sido inesperada.
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CONCLUSÃO
Looks like civilization's finally caught up with us.
Mal Reynolds, Firefly, “Bushwacked”
O objectivo de um estudo curricular é iniciar a integração entre os conhecimentos
maioritariamente teóricos adquiridos ao longo do curso de Medicina Veterinária e a sua
aplicação real. Numa perspectiva pedagógica, o estagiário é ainda, de uma forma muito
prática, confrontado com a imensidão de tudo o que não sabe, sendo este o inevitável e
necessário ponto de partida para a consolidação de conhecimento.
A escolha de patologia dentária em mamíferos exóticos como tema desta dissertação surgiu
de uma combinação de interesse pessoal e da tomada de consciência da sua importância nas
espécies exóticas mais frequentemente presentes a consulta, nomeadamente coelho,
porquinho da Índia, chinchila, cão da pradaria, ratazana e hamster.
Embora permaneça alguma incerteza quanto à etiologia da patologia dentária adquirida
(Capello, 2004a), os dados parecem apontar para uma etiologia multifactorial, sendo trauma,
nutrição e atrição inadequadas e doença óssea metabólica factores importantes, e que podem
ocorrer em simultâneo (Harcourt-Brown, 2006; Capello & Gracis, 2005; Van Caelenberg et al.,
2008).
A patologia dentária é extremamente frequente nas espécies atrás referidas, causando
anorexia e perda de peso, predisposição para patologia secundária oportunista e, inclusivé, a
morte (Crossley, 2003b). Os estímulos iatrotrópicos frequentemente correspondem a estadios
avançados de doença dentária, dificultando o seu tratamento com sucesso (Capello, 2004a;
2008b; Capello & Gracis, 2005). A resolução total da patologia dentária é, por vezes, possível
mas dentes de crescimento contínuo garantem, na maioria dos casos, a recorrência e
progressão dos problemas dentários (Crossley, 2003c). Assim, e como exemplificado pelos
casos clínicos apresentados, é mais frequente o maneio da patologia dentária para o resto da
vida do animal do que a sua cura (Capello, 2004a). A determinação da etiologia é vital,
principalmente nos casos em que a cura é possível, ou sujeitar-se-ão os animais a tratamentos
invasivos e anestesias gerais desnecessários, que os podem colocar em risco (Legendre,
2002).
A enorme variedade de apresentações clínicas de patologia dentária nas ordens Lagomorpha
e Rodentia, dos meios complementares de diagnóstico e dos tratamentos actualmente
disponíveis exigem que o médico veterinário possua não apenas conhecimentos sólidos da
anatomia e fisiopatologia de cada espécie, mas também experiência no exame clínico e
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Paula João Faria
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interpretação dos dados recolhidos ao longo do processo de diagnóstico e, ainda,
equipamento especializado (Capello, 2004a; 2006a; ). Tal requer um investimento pessoal por
parte do clínico na sua formação ainda mais intenso e consciente do que no caso dos outros
animais de companhia, porque a medicina dentária em mamíferos exóticos é uma disciplina
ainda recente e em permanente evolução. A cada clínico compete manter-se a par das últimas
publicações, mas também o treino que garanta a execução de intervenções cirúrgicas
correctas, dado que a má execução pode ser mais nociva do que a decisão de não actuar. O
treino de exames orais e procedimentos cirúrgicos em cadáveres pode ser especialmente útil
(Crossley, 2003c).
É vital a partilha de informação entre médicos veterinários, especialmente considerando que
muitos tratamentos são experimentais e não foram ainda testados num número
suficientemente grande de animais para estabelecer o seu valor terapêutico, não havendo
garantia de sucesso (Crossley, 2003c). A validação ou rejeição destes tratamentos é fulcral
para o progresso médico e segurança dos pacientes. Nesta área da medicina veterinária não é
raro, no entanto, que existam relatos contraditórios, o que mais uma vez enfatiza a
necessidade de experiência prática do médico veterinário no estabelecimento das suas
preferências terapêuticas; e a sua flexibilidade na abordagem de cada caso, dado que o
sucesso de um tratamento num caso específico não garante a sua reprodução no caso
seguinte, por maiores que sejam as semelhanças.
É também especialmente importante que o clínico consiga reconhecer as suas limitações,
enviando o paciente para um colega especializado se o caso ultrapassar as suas capacidades
clínicas, especialmente tendo em conta que a ignorância em relação às particularidades de
animais exóticos, e o seu tratamento como se de carnívoros se tratasse, pode facilmente
provocar morbilidade ou mesmo a morte.
Convém, mais uma vez, referir a importância da educação dos proprietários no maneio e,
particularmente, prevenção da patologia dentária através da não reprodução dos animais
afectados e de consultas de monitorização atempadas que permitam o diagnóstico e
tratamento precoces.
A combinação de uma dieta tão próxima da natural quanto possível, a reprodução das
condições ambientais de cada espécie, a diminuição do stress (Crossley, 2005), o respeito das
necessidades sociais específicas e o enriquecimento ambiental podem, finalmente, ajudar a
diminuir a incidência de patologia dentária em lagomorfos e roedores.
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Paula João Faria
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Anexo 1. Especificidade da sintomatologia de patologia dentária
Sinais e sintomas associados a
Achados ao exame físico indicativos de
patologia dentária
patologia dentária
Anorexia
Perda de peso/emaciação
Disorexia
Ptialismo
Disfagia
Manchas de saliva periorais
Corrimento ocular (chinchila)
Membros molhados por saliva
Perda de condição corporal
Doença de pele perioral
Mau estado do pelo
Tumefacções submandibulares
Alterações digestivas
Desconforto à palpação dos molariformes
Alterações no volume das fezes
Movimentos da boca diminuídos
Limpeza excessiva
Incapacidade de encerrar a boca
Hipersiália
Sobrecrescimento dos incisivos
Trauma
Atrição dos incisivos anómala
História prévia de patologia oral
Esporões nos molariformes
Acumulação de alimento nos molariformes
Corrimento ocular
Conjuntivite
Exoftalmos
Corrimento ocular/rinorreia purulentos
Abcedação facial
Linfadenopatia submandibular/cervical
Doença sistémica
Morte
Tabela 10. Especificidade da sintomatologia da patologia dentária (adaptada
de Legendre, 2003; Capello & Gracis, 2005).
93
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Anexo 2. Exames complementares de diagnóstico recomendados por espécie
ROEDORES
MEIO DE
DIAGNÓSTICO
COELHO
HISTRICOMORFOS
SCIUROMORFOS
MIOMORFOS
Exame dentário
sem anestesia
Sempre
Sempre; por vezes
difícil na chinchila,
impraticável no degus
Quase sempre
impraticável
Difícil (com raras
excepções)
Exame dentário
com anestesia
Sempre
Sempre
Sempre
Sempre
Rx craniano
Sempre
Sempre
Sempre
Sempre
Endoscopia
oral
Muito útil
Útil/obrigatória;
obrigatória no degu
Obrigatória para
maioria; útil no CP
Obrigatória
HG, BQ, outros
Se doença ou
complicações
de patologia
dentária
Se doença ou
complicações de
patologia dentária
Se doença ou
complicações de
patologia dentária
Se doença ou
complicações de
patologia dentária
TSA + cultura
Se infecção
periapical ou
abcedação
Se infecção periapical
ou abcedação
Se infecção periapical
ou abcedação
Se infecção
periapical ou
abcedação; menos
útil devido a mau Px
Útil nalguns
casos
Útil nalguns casos
Útil nalguns casos;
muito útil na patologia
dentária dos incisivos
no cão da pradaria
Útil nalguns casos
Possível, muito
útil, ainda
pouco prático
Possível, muito útil,
ainda pouco prático
Perspectiva futura;
sem dados publicados
Perspectiva futura;
sem dados
publicados
Histopatologia
TAC/RM
Tabela 11. Exames complementares de diagnóstico recomendados por espécie (Capello, 2004a).
94
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Anexo 3. Chin Sling
Figura 63. Porquinho da Índia ‘Willie’
usando o primeiro protótipo em neoprene
do Chin Sling, criado por Ingrid Rice e Dr.
Loïc Legendre – vista lateral.
Figura 64. Porquinho da Índia ‘Willie’
usando o primeiro protótipo em neoprene
do Chin Sling – vista dorsal.
Este paciente sofria de sobrecrescimento dentário dos molariformes e patologia cardíaca
concomitante, sendo um mau candidato cirúrgico. Após um uso diário de 12 horas
consecutivas, em três semanas os molariformes haviam-se auto-desgastado,
apresentando dimensões normais. O animal usou a cinta regularmente durante o resto da
sua vida (mais três anos) p.r.n. (Legendre, comunicação pessoal, Abr. 22, 2009; Rice,
comunicação pessoal, Abr. 25, 2009)
Figura 65. Porquinho da Índia ‘Ruby’ com o recém-colocado Chin Sling (modelo actual).
A maioria dos animais adapta-se à cinta em poucos minutos, tendo todos os porquinhos
da Índia testados demonstrado interesse em alimento após um máximo de 15 minutos
(Rice, comunicação pessoal, Abr. 25, 2009). Após colocação, a cinta deve permitir
apenas a introdução a custo de um dedo entre si e a face do animal. O animal deve ser
capaz de se alimentar com a cinta, e esta não deve obstruir os olhos. Não estão
descritos efeitos nefastos desde que bem colocada, com excepção de algum pelo que
desaparece com a fricção (Legendre, 2003; Rice, comunicação pessoal, Abr. 25, 2009).
95
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
Figura 66. Chin Sling - instruções para mensuração da cabeça do paciente pré-fabrico. É
requerida garantia de acompanhamento veterinário.
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Anexo 4. Tipos de abcessos, tratamento e prognóstico
Aparência
Localização
Causa possível
Tratamento
Prognóstico
Abcessos externos
Tumefacção SC
envolvendo
tecidos
profundos
Face
SBC coronal, PM
maxilares penetram
mucosa bucal
Opções
1. Excisão
2. Lancetamento +
expressão de pus,
desbridamento +
colocação de contas
com Ab
3. Marsupialização e Tx
tópico (como mel e
gentamicina gotas)
AB sistémica
•
•
Tumefacção SC
grande, macia e
de crescimento
rápico,
associada a
necrose cutânea
Tumefacções
firmes,
aderentes ao
osso da face
Por vezes
múltiplas
Por vezes
associadas a
outra Sx de
abcessos (como
rinorreia ou
dacrocistite)
Corrimento
sinusal de
abcessos
profundos
Face e
submandibular
Feridas penetrantes,
especialmente
causadas por dentes.
Recrudescimento de
abcessos antigos
envolvendo estruturas
profundas
Ao longo do
bordo ventral da
mandíbula
Infecções periapicais
dos PM + MM
mandibulares
Na proeminência
zigomática
Normalmente
associados a PDA
Por vezes causados
por acumulação de
alimento no espaço
periodontal
Face e
submandibular
Associado a doença
dentária como
infecção periapical ou
devida a PDA
•
•
Cultura e TSA
Drenagem Cx na fase
inicial; pode ser
necessária exploração Cx
após AB
Ab sistémicos com boa
penetração tecidular
(como cefalexina e
enrofloxacina)
Analgesia: AINES e
opióides
• Considerar eutanásia
Ou
• Radiografia craniana
• Cultura e TSA
• Exame cavidade oral
• Exploração,
desbridamento e
curetagem
• Apicectomia/extracção
• Contas Ab na cavidade do
abcesso
• Hidróxido de cálcio na
cavidade óssea
• AB sistémica com boa
penetração óssea (como
cefalexina, enrofloxacina)
Analgesia: AINES e
opióides
1. Eutanásia?
2. Excisão Cx, colocação
de contas Ab (não
curativo, prolonga
remissão)
3. Tx tópica (como mel,
clorhexidina,
iodopovidona,
gentamicina)
4. AB de longa duração
(como enrofloxacina,
oxitetraciclina)
Por vezes analgesia de
longa duração (como
meloxicam)
Cultura e TSA periódicos ?
Bom, provavelmente
necessário repetir Tx
dentário várias vezes
Variável, depende da
causa; por vezes
necessário
acompanhamento
radiográfico e novo Tx
Variável
Depende da extensão
e gravidade da
doença dentária
subjacente
Cura é possível
Recidivas comuns
Alterações no
alinhamento dentário
podem causar má
oclusão associada
Cura improvável mas
não impossível
Necessários cuidados
constantes por parte
dos proprietários
Animal pode ter vida
relativamente normal
durante mm-aa
Reavaliação periódica
para assegurar que
não há novos
problemas (como
SBC coronal)
(Tabela 12 – legenda na página seguinte)
97
Paula João Faria
Dissertação de mestrado em Medicina Veterinária, FMV-UTL
(Cont. da tabela 12)
Aparência
Localização
Causa possível
Tratamento
Prognóstico
Abcessos internos
Causados por
penetração das vias
nasais ou espaço
retrobulbar pelas coras
de reservas
sobrecredimensionadas
dos dentes maxilares
Exoftalmia,
dacrocistite
purulenta grave,
obstrução nasal,
rinorreia
PDA
Início da Sx por vezes
muito posterior ao
desenvolvimento do
abcesso
• Considerar eutanásia
Ou
• Extracção de dentes
afectados
• Cuidados de suporte, AB
e analgesia de longa
duração
• Enucleação para expôr e
drenar cavidade,
colocação de contas Ab,
mel, ou marsupialização
• Aspiração do espaço
retrobulbar, flushing,
contas Ab
• Flushing do DNL?
Mau
Geral/ associado a
doença dentária
generalizada
avançada
Abcessos na cavidade
nasal são inacessíveis
Tabela 12. Tipos de abcessos, tratamento e prognóstico (adaptada de Harcourt-Brown, 2002a).
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