TEOLOGIA SOCIOLOGIA E CULTURA Roberto Carlos de Oliveira Roberto Donato Sebastião Donizete Bazon APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA Caras (os) alunas (os), A sociologia da cultura é uma das ramificações mais importantes do pensamento sociológico. Nela poderemos encontrar elementos para refletir sobre as questões fundamentais do nosso tempo. Seu objetivo é compreender como são produzidas as nossas concepções culturais e como essas concepções interagem com as dimensões econômicas, sociais e políticas que compõem a nossa sociedade. Nesse sentido, os sociólogos da cultura estão preocupados em explicar como o processo de industrialização e urbanização da moderna sociedade capitalista influenciou o surgimento de novas concepções culturais. Estão preocupados, também, em refletir de que forma essas concepções influenciaram as transformações socioeconômicas e políticas. Para atingir esses objetivos, a sociologia da cultura inicia sua análise pelo processo de industrialização das próprias manifestações culturais. Para esses autores, o cinema, o disco, o rádio e a televisão contribuíram para o desenvolvimento de uma cultura de massa. Esse conceito, você vai perceber, é central nos nossos estudos sobre a cultura. Como sugestão, convido-os a um exercício diferente. É importante tentar relacionar os conteúdos teóricos aqui apresentados com a vida cotidiana. Assim, tentem refletir, caros (as) alunos (as), sobre o papel dos meios de comunicação no nosso mundo cotidiano, nas nossas relações pessoais, nas nossas escolas e no trabalho. Façam o importante esforço de compreender a grande influência dos meios de comunicação na nossa vida. Além de contribuir para o melhor entendimento dos conteúdos aqui desenvolvidos, esse exercício de reflexão é de fundamental importância para o desenvolvimento de um cidadão e profissional comprometido com as questões mais importantes do nosso mundo contemporâneo. Bons estudos! Roberto Donato SOCIOLOGIA E CULTURA SUMÁRIO Roberto Donato Sumário Unidade 01 ................................................................................................................................................... 1 Unidade 02 ................................................................................................................................................. 6 Unidade 03 .............................................................................................................................................. 11 Unidade 04 .............................................................................................................................................. 15 Unidade 05 .............................................................................................................................................. 20 Unidade 06 ............................................................................................................................................. 25 Unidade 07 ............................................................................................................................................. 30 Unidade 08 ............................................................................................................................................. 35 Unidade 09 .............................................................................................................................................. 40 Unidade 10 .............................................................................................................................................. 44 Unidade 11 .............................................................................................................................................. 48 Unidade 12 .............................................................................................................................................. 52 Unidade 13 .............................................................................................................................................. 57 Unidade 14 ............................................................................................................................................... 61 Unidade 15 .............................................................................................................................................. 65 Unidade 16 .............................................................................................................................................. 70 Unidade 17 .............................................................................................................................................. 74 Unidade 18 .............................................................................................................................................. 78 Unidade 19 .............................................................................................................................................. 82 Unidade 20 ............................................................................................................................................. 87 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 01 - A IDEIA DE CULTURA Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é entender os aspectos da cultura de acordo com uma visão sociológica. ESTUDANDO E REFLETINDO Você já percebeu os vários sentidos no qual utilizamos o termo cultura? Referimo-nos a ele quando discutimos teatro, cinema, dança ou música: nesse caso, relacionamos cultura à arte. Também utilizamos o termo cultura para mencionar o acesso à filosofia e à literatura, ou seja, quando desejamos discutir erudição. Além disso, quando afirmarmos que alguém “não tem cultura”, ao nos deparamos com atos que ferem os costumes e regras de comportamento, estamos pensando em educação. Todos esses sentidos referem-se à noção de cultura como o conjunto de requisitos morais para certo padrão de civilização. Todos eles nos dão a ideia de que uns tem e outros não têm cultura. Quando estamos em contato com teorias sociológicas e antropológicas, não é exatamente esse sentido que atribuímos à ideia de cultura. Apesar das muitas concepções que encontramos para o termo no interior dessas ciências, todas elas partem de um ponto de vista comum: a cultura é um fenômeno humano, que distingue o homo sapiens das demais espécies vivas presentes nas diferentes paisagens da natureza. Nosso comportamento tem pouca influência daquilo que denominamos de instinto e é determinado, em grande parte, pelo processo de aprendizagem com os outros seres humanos que nos rodeiam. Para que isso seja possível, é necessário um conjunto de características biológicas e psicológicas que nos permita articular algumas capacidades para pensar e agir no mundo. Que capacidades são essas? 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 01 - A IDEIA DE CULTURA Roberto Donato Precisamos da capacidade cerebral de processar as informações que recebemos e atribuir significados e representações a elas; é necessário, também, que essas informações sejam compartilhadas com outros seres humanos através da linguagem. Do mesmo modo, necessitamos de um conjunto de características anatômicas e corporais (coluna ereta, dedo polegar em oposição aos outros dedos para o movimento de “pinça”, cordas vocais, mandíbulas pequenas, caixa craniana relativamente grande, etc.) que nos possibilitem a utilização de instrumentos e utensílios, para criar aquilo que os arqueólogos chamam de “cultura material”. Essas características biológicas e psicológicas nos dão uma base comum para que possamos construir diferentes modos de vida. O conjunto de códigos, valores e concepções que possibilitam essas diferentes maneiras dos seres humanos estabelecerem relações entre si e com a natureza, podem ser denominados cultura. O conceito de cultura (...) sugere uma “ligação espiritual” entre os homens, mesmo que estejam separados por fronteiras político-geográficas. Essa ligação estabelecida por meio da cultura é inescapável e põe o ser humano, de modo consciente ou inconsciente, em contato com o universo social e de valores, que transcende a esfera do indivíduo. A cultura (...) ergue-se como instância propriamente humanizadora, que dá estabilidade às reações comportamentais e funciona como mecanismo adaptativo básico da espécie. Essa estabilidade caracteriza-se por não ser determinada universalmente. A humanização acontece de várias maneiras possíveis, sempre por meio de um modo de vida particular. Portanto, o que define o humano é a elaboração particular sobre uma base biológica, natural. A cultura, além de ser um instrumento de humanização, é um instrumento de comunicação, ou seja, constitui um complexo conjunto de códigos que asseguram a ação coletiva do grupo. Esses códigos que vão constituir a cultura consistem fundamentalmente em aparelhos simbólicos. A produção simbólica pode variar de sociedade para sociedade, mas, em cada uma delas, cumpre o papel de atribuir o sentido, significado e intencionalidade às ações e aos comportamentos sociais (OCADA, 2003, p. 57-58). A cultura pode, então, ser considerada como a capacidade de o ser humano produzir coletivamente regras, sentidos e significados orientadores do comportamento nas diferentes sociedades. No entanto, o autor citado acima nos oferece um dado novo, que ainda não tínhamos discutido em nossa tentativa de definição de cultura. Ele 2 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 01 - A IDEIA DE CULTURA Roberto Donato afirma que a produção de símbolos é variada entre as diferentes sociedades, mas que em todas elas tem o mesmo papel, a mesma função: atribuir sentido e intenção aos comportamentos e ações humanas e, completamos, aos fenômenos da natureza. Isso significa que todos os seres humanos – sejam europeus, africanos, indígenas– têm as mesmas capacidades mentais que possibilitam o surgimento da cultura. Ou seja, em todos nós existem princípios universais que possibilitam o surgimento das diferentes maneiras de compreensão e ação no mundo. Claude Lévi-Strauss, antropólogo, dedicou sua vida a compreender esse princípio universal formador das culturas. Para o autor, esse princípio reside no inconsciente da mentalidade humana. Se, como cremos, a atividade inconsciente do espírito consiste em impor formas a um conteúdo, e se as formas são fundamentalmente as mesmas para todos os espíritos, antigos e modernos, primitivos e civilizados – (...) – é preciso e basta atingir a estrutura inconsciente, subjacente a cada instituição ou a cada costume, para obter um princípio de interpretação válido para outras instituições e costumes (...) (LEVI-STRAUSS, 1970, p. 38-39). Falta-nos discutir uma última questão para obtermos a compreensão desse fenômeno chamado cultura. Se, como nos ensina Lévi-Strauss, a cultura tem uma matriz mental inconsciente que gera nossa interpretação sobre o mundo; e, se essa matriz é universal, presente em todos os seres humanos e culturas, o que faz as culturas diferentes entre si? Porque existem tantos modos diferentes de pensar e agir no mundo? BUSCANDO CONHECIMENTO Para responder a essas questões, temos que recorrer a Karl Marx, outro grande pensador, considerado um dos fundadores da sociologia e das ciências sociais, Marx acreditava que o ponto de partida para a formação de qualquer sociedade é as condições materiais de existência nas quais os seres humanos dispõem para construir 3 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 01 - A IDEIA DE CULTURA Roberto Donato suas vidas; ou seja, a natureza real, viva, que determinado grupo humano tem disponível para garantir sua sobrevivência. Para Marx, a relação entre os grupos humanos e as paisagens naturais é o ponto de partida para o estabelecimento dos diferentes modos de vida. Além disso, o autor enfatiza que a maneira pela qual pensam os indivíduos é determinada por essa relação entre seres humanos e naturezas. Assim, as infraestruturas sociais e econômicas (o modo de produção da existência material) determinam as superestruturas (a consciência, a religiosidade, a arte, os códigos de comportamento etc.). Se fizermos um esforço de reflexão para relacionar as contribuições de Marx e Lévi-Strauss, podemos chegar a um resultado interessante para compreender esse processo de diferenciação entre as culturas. Marx nos mostra que a experiência que os seres humanos adquirem em sua relação com a natureza gera o “conteúdo” necessário para que eles possam: (1) pensar e compreender o mundo em que vivem; e (2) criar os códigos e concepções que orientam suas ações nesse mesmo mundo. Lévi-Strauss, por sua vez, nos explica que o “conteúdo” das experiências humanas só pode ser pensado e classificado a partir das “formas” existentes no nosso inconsciente. Ou seja, o conteúdo de nossas experiências reais junto à natureza é “classificado” e “ordenado” pelos elementos mentais inconscientes de que dispomos, gerando os significados para compreensão dessas experiências. Criam-se, assim, regras e padrões de comportamento particulares a partir de cada experiência particular com a natureza. No entanto, como a capacidade humana de significar é universal, existe certa regularidade dos fenômenos e comportamentos humanos. Todo grupo humano tem uma concepção de sagrado, de religiosidade; assim como toda sociedade tem regras de parentesco, em que há proibições sexuais (tabu do incesto) entre os membros de uma mesma família. Assim, de uma base universal para pensar o mundo, a humanidade gera diferentes sociedades a partir de suas experiências com as diversas naturezas. Portanto, compreender o modo como essas sociedades se organizam economicamente 4 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 01 - A IDEIA DE CULTURA Roberto Donato e socialmente é o primeiro passo para se refletir sobre a influência da cultura na nossa vida social. 5 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA DA CULTURA UNIDADE 02 - A LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DA CULTURA Sebastião Donizeti Bazon. CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é analisar os estudos estruturais da linguagem e sua utilidade. ESTUDANDO E REFLETINDO A linguagem é formada por um sistema de signos, sendo o signo uma coisa que está no lugar de outra sob algum aspecto. Por exemplo, a lágrima no rosto de uma pessoa que pode indicar um estado de dor física ou de tristeza, mas também pode indicar um estado de felicidade ou de realização. A lágrima pode ser signo de todas essas coisas e, para decifrá-lo adequadamente, precisamos saber o contexto em que ele ocorre e ter familiaridade com a situação em que se expressa. Os números e palavras também são signos, isto é, estão no lugar das quantidades reais de objetos ou do próprio objeto. Se o signo está no lugar do objeto, ele passa a representar o objeto, sendo um objeto pode ser representado de várias maneiras, dependendo da relação que existe entre ele e o signo. Quando a relação é de semelhança, temos um signo de ícone, o desenho de um cachorro é um ícone quando apresenta semelhança com ele. Se a relação é de causa e efeito, uma relação que afeta a existência do objeto ou é por ela afetada, temos um signo do tipo índice. Por exemplo, a fumaça indica o quê? A resposta certa seria o fogo, pois aqui nós estabelecemos uma relação causal entre a o fogo (que é a causa) e a fumaça (que é o efeito do fogo), outros exemplos podem ser usados para exemplificar essa ideia, como o chão molhado que indica que choveu, estabelecendo uma relação causal de efeito (chão molhado) e causa (chuva) mostrando que a relação entre a coisa e a linguagem não precisa ser de semelhança para que ocorra uma mensagem. 6 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA DA CULTURA UNIDADE 02 - A LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DA CULTURA Sebastião Donizeti Bazon. E, por último, se a relação é arbitrária, regida simplesmente por convenção, temos o símbolo. As palavras são o melhor exemplo de símbolo, mas há muitos outros: nas culturas ocidentais, o preto é símbolo de luto: o uso da aliança no dedo anelar da mão esquerda simboliza a condição de casado: o desenho de um coração simboliza amor, amizade. Esses signos são aceitos pela sociedade como representação dos objetos de luto, casamento e sentimento de amor e mantêm-se por convenção hábito ou tradição. O ser humano cria símbolos, isto é, signos arbitrários em relação ao objeto que representam e que são convencionais: para serem usados, precisam ser aceitos por todos os membros da sociedade. Como não há relação alguma entre o signo e o objeto por ele representado, necessitando de uma convenção, aceita pela sociedade, de que aquele signo representa aquele objeto. Só a partir dessa aceitação podemos comunicar, sabendo que, ao usar o signo-símbolo, o nosso interlocutor entenderá o que estamos querendo dizer. A linguagem, portanto, é um sistema de representações aceito por um grupo social que possibilita a comunicação entre os integrantes do grupo. O laço entre representação e objeto representado é arbitrário, podendo dizer que ele é necessariamente uma construção da razão, isto é, uma invenção do sujeito para poder se aproximar da realidade. A linguagem, deste modo, é produto da razão e só pode existir onde há racionalidade. A linguagem é um dos principais instrumentos na formação do mundo cultural, porque nos permite transcender nossa experiência. No momento em que damos nome a qualquer objeto da natureza, nós o individualizamos, diferenciando-o do resto que o cerca: ele passa a existir para a nossa consciência. O nome, ou a palavra, retém na nossa memória, enquanto ideia daquilo que já não está ao alcance dos nossos sentidos: o cheiro do mar, o perfume do jasmim numa noite de verão, o toque da mão da pessoa amada, o som da voz do pai. O simples pronunciar de uma palavra representa, isto é, torna presente à nossa consciência o objeto a que ela se refere. Não precisamos mais da existência física das coisas: criamos, 7 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA DA CULTURA UNIDADE 02 - A LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DA CULTURA Sebastião Donizeti Bazon. por meio da linguagem, um mundo estável de ideias que nos permite lembrar o que já foi e projetar o que será. Através da linguagem, o ser humano deixa de reagir somente ao presente, ao imediato; passa a poder pensar o passado e o futuro e, com isso, a construir o seu projeto de vida. Só o ser humano é capaz de criar signos arbitrários, pois os animais são apenas capazes de entender ícones e índices. Os cachorros, por exemplo, utilizam o signo indicial do cheiro, sendo capazes de reconhecer o cheio do dono em uma roupa, em um lugar. O cheiro indica a presença do objeto (dono) que ele procura, ele reconhece, ainda, o tom de voz, as ações que indicam passeio, castigo ou a hora de comer. A aprendizagem dos signos se dá por meio de outros signos, inclusive misturando linguagens. Por exemplo, para explicar o signo-palavra “casa” para uma criança, podemos fazer um signo- desenho de uma casa. O desenho, nesse caso, é um segundo signo que interpreta, dá sentido ao primeiro, pela semelhança com o objeto representado. Um sinônimo explica igualmente um signo: “casa” pode também ser interpretada por meio da palavra “lar”. O segundo signo (lar) interpreta o primeiro em sentido bastante específico de “minha casa” ou “lugar onde moro e considero meu refúgio”. Existem também, outros elementos essenciais na linguagem, como a ideia de repertório, pois estamos interagindo com um sistema de signos, sendo necessária uma memorização de signos que a compõem. O repertório das linguagens verbais (ou línguas, como são chamadas) é bastante amplo e costuma ser relacionado em dicionários. Além do repertório, também é preciso que se estabeleçam as regras de combinação dos signos, pois não podemos combinar signos que tenham sentidos opostos: subir/descer, nascer/morrer, entre outros. Devemos estabelecer as regras de uso dos signos na linguagem, só quando conhecemos o repertório de signos, as regras de combinação e as regras de uso desses signos é que podemos dizer que dominamos uma linguagem. 8 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA DA CULTURA UNIDADE 02 - A LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DA CULTURA Sebastião Donizeti Bazon. Todo signo tem um significado próprio, estabelecido por convenção social. Esses são os significados que constam do dicionário, porém o signo tem mais de um significado, uma vez que seu uso foi sendo modificado ou ampliado em tempos e lugares diferentes. Logo, só podemos saber com qual significado o signo está sendo usado a partir da frase, que oferece o primeiro contexto da comunicação. A situação social na qual a frase é dita é o segundo contexto que nos auxiliará na decodificação do signo e da mensagem. Não basta, portanto, ter domínio do código para interpretar corretamente os signos e as mensagens, é preciso ter conhecimento das situações sociais, isto é, da cultura na qual a linguagem é utilizada e a comunicação ocorre. Com a contínua criação de vários tipos de linguagem que permite os seres humanos pensar as diversas formas da realidade e, também, de se expressar e de se comunicar com seus semelhantes. Os avanços tecnológicos nos obrigam a adaptar as linguagens já existentes e a criar outras, mais adequadas às necessidades da contemporaneidade. BUSCANDO CONHECIMENTO Podemos afirmar que algumas linguagens têm estrutura mais flexível do que outras, como, por exemplo, a moda e sua linguagem flexível, onde percebemos que o repertório de signos é alterado com muito mais rapidez do que os sons e as palavras que compõem uma língua. Quanto às regras de combinação, elas também são variáveis, pois ainda se baseando no exemplo da moda, podemos hoje usar botas e outros calçados pesados com roupas de tecidos leves, criando, assim, um grande contraste. A flexibilidade característica da linguagem da moda decorre do fato de que ela não se estabelece, como as línguas faladas, por meio de um processo de cristalização social. Ao contrário, ela é ditada por um pequeno grupo de costureiros, desenhistas e editores de moda que, em uma sociedade capitalista, incentivam mudanças que 9 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA DA CULTURA UNIDADE 02 - A LINGUAGEM COMO EXPRESSÃO DA CULTURA Sebastião Donizeti Bazon. estimulem o consumo. Outro exemplo que podemos utilizar são as linguagens de computador, que são fortemente estruturadas e bastante inflexíveis. Essas linguagens têm um número limitado de signos e de regras de combinação, e o computador só responderá dentro desses limites. As linguagens artísticas constituem um meio-termo. Por um lado, respeitam a especificidade de cada campo artístico; por outro, tendem a explorar esse campo e as possibilidades de cada linguagem até seu limite máximo. E é exatamente a essas explorações que devemos o desenvolvimento e a criação de novos estilos e técnicas; neste ponto, as linguagens só se desenvolvem em função de projetos. As linguagens artísticas, por serem mais flexíveis, podem se estruturar e reestruturar com base em projetos específicos. 10 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 03 - A UTILIDADE DA LINGUAGEM Sebastião Donizeti Bazon CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender a função da linguagem. ESTUDANDO E REFLETINDO Entre tantos tipos de linguagem, surge uma pergunta fundamental: para que servem as linguagens? Na tentativa de responder a essa pergunta, o linguista contemporâneo Roman Jakobson propôs uma abordagem das funções comunicativas da língua verbal bastante ampla que também pode ser usada para as demais linguagens. Após estudar a semiótica clássica, Jakobson percebeu a necessidade de firmar a linguagem como elemento de comunicação humana por excelência. O linguista, então, distingue seis fatores fundamentais na comunicação verbal que dão origem a seis funções linguísticas diferentes. Esses fatores são: contexto, emissor, mensagem, destinatário, contato e código. Gerando seis funções diferentes. Jakobson foi um dos grandes linguistas do século XX, estudando a estrutura e a utilidade da linguagem do ser humano. (Fonte: http://www.isfp.co.uk/russian_thinkers/roman_jakobso n.html) 11 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 03 - A UTILIDADE DA LINGUAGEM Sebastião Donizeti Bazon Essas funções são: a função referencial, que é orientada para o contexto da comunicação, isto é, refere-se ao que está ao nosso redor, como a afirmação: “hoje faz frio.”. A função expressiva ou emotiva: está centrada no emissor, que declara a sua atitude afetiva sobre o assunto do qual está tratando, por exemplo, a poesia lírica ou os xingamentos. A função conativa: é orientada para o destinatário, invocando-o ou dando-lhe uma ordem. A função fática: tem por objetivo estabelecer, manter ou interromper a comunicação. Na função metalinguística: a mensagem discute o uso do próprio código, esclarecendo-o, como quando perguntamos o significado de uma palavra; também pode ser o caso de uma linguagem comentar outra linguagem, como a leitura de uma obra de arte. E, por fim, a função poética, que é aquela que visa à mensagem em si, colocando em evidência a sua própria forma. A mensagem poética ou estética é sempre estruturada de maneira ambígua em relação ao código, não se manifestando claramente. Essas funções não se apresentam separadamente em cada mensagem, mas combinam-se entre si. A diversidade das mensagens depende da hierarquização das várias funções, com predominância de uma sobre as demais. Considerando a linguagem do ponto de vista funcional, Jakobson dá conta não só dos aspectos cognitivos da língua, mas também de aspectos afetivos que fazem parte de quase toda situação comunicacional. Ampliando essas funções para outras linguagens, podemos dizer que tanto a linguagem da moda quanto as obras de arte expressionistas fazem uso da função expressiva. Já os manuais técnicos e todas as obras realistas apresentam uma preponderância da função referencial. A propaganda, as preces e a arte romântica estão centradas sobre o destinatário, tendo função conativa. A introdução de qualquer peça musical ou o apagar das luzes numa encenação teatral tem o objetivo de testar ou estabelecer o contato com o destinatário, realizando, portanto, a função fática. Quando fazemos uma paródia, estamos usando a função metalinguística; o mesmo acontece 12 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 03 - A UTILIDADE DA LINGUAGEM Sebastião Donizeti Bazon quando adaptamos um texto para o teatro ou cinema. Já a função poética necessariamente está presente em todas as obras de arte. Com isso, podemos responder à pergunta sobre a utilidade da linguagem: para nos comunicarmos com os outros seres humanos de hoje, passado e futuro; para expressar nossos afetos positivos ou negativos; para falar da realidade que nos circunda; para despertar uma reação no destinatário; para discutir o código que estamos usando ou outro qualquer; para reafirmar o contato com o outro, sem o que não haverá comunicação; e para fazer arte. Assim, como existem diversos tipos de linguagem, existem também diversos tipos de pensamento. Há o pensamento concreto, que se forma a partir da percepção sensível, ou seja, da representação de objetos reais, e é imediato, sensível e intuitivo; e o pensamento abstrato, que estabelece relações (não perceptíveis), que cria os conceitos e as noções gerais e abstratas, é imediato (precisa da mediação da linguagem) e racional. Quando somamos 4+4, estamos lidando com uma noção geral de quantidade, pois não encontramos o número 4 na natureza, encontramos certa quantidade de laranjas, abacates, etc., representados abstratamente pelos números que são construção da nossa razão. Cada tipo de pensamento tem uma linguagem específica para representá-lo, como: o pensamento abstrato e conceitual, que se afasta do sensível, do individual, a língua se apresenta como condição necessária, por ser um sistema de signos simbólicos que, como já dissemos nos permite ir além do dado vivido e construir um mundo de ideias. Se cada linguagem possui uma estruturação própria quanto ao repertório e às regras de combinação e de uso, isso resulta na afirmação de que cada linguagem organiza a realidade de modo diferente de outra, pois estabelece repertório e regras diferentes. O fato importante de ser ressaltado, entretanto, é que, se uma língua tem um maior número de palavras para recortar a realidade, a existência dessas palavras leva a uma percepção diferente da realidade. A língua influencia a percepção da realidade e os níveis de abstração e generalização do pensamento, outros tipos de 13 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 03 - A UTILIDADE DA LINGUAGEM Sebastião Donizeti Bazon linguagem, entretanto, em especial as linguagens artísticas, são mais adequados ao pensamento concreto, como, por exemplo, o pintor está mais ligado ao mundo visual das cores e formas do que ao mundo dos conceitos. Além de estruturar o pensamento, a linguagem mantém estreita relação com a cultura. Se, por um lado, as várias linguagens fixam e passam adiante os produtos do pensamento sob forma de ciência, técnica e artes, elas também sofrem a influência das modificações culturais. A reestruturação da linguagem responde a mudanças de valores, de anseios e de buscas no seio da cultura de cada sociedade. A linguagem é um produto bastante sofisticado que só a razão humana pode criar, sendo a linguagem simbólica a linguagem específica do ser humano. A estrutura dessa linguagem, adequando-se à cultura dentro da qual se desenvolve apropriadamente ao tipo de pensamento que vai comunicar ou expressar. Ela permite que o ser humano vá além do mundo vivido, do presente, para o mundo das ideias, da reflexão; permite que ele ultrapasse sua realidade de vida e entre no mundo das possibilidades. BUSCANDO O CONHECIMENTO Nesta unidade, estudamos a estrutura que compõe a linguagem, como os diversos signos que constituem a base inicial para a formação simbólica que caracteriza a nossa linguagem verbal. Vimos, também, a importância do repertório linguístico e das regras de combinação, sendo que só podemos combinar a nossa linguagem literalmente se possuímos o domínio desses dois elementos. A linguagem aparece, aqui, ligada ao pensamento, gerando uma relação intrínseca entre os mais diferentes tipos de linguagem, com as diversas formas de pensamento, dando, por fim, a resposta da utilidade linguística para as nossas vidas, que é a comunicação com os humanos de hoje, do passado e do futuro, expressando as nossas diversas emoções e conhecimentos. 14 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 04 - A ARTE COMO FORMA DE CULTURA Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Neste capítulo pretendemos salientar a importância da arte como uma forma de pensamento sobre a realidade que considera não só a sensibilidade, mas também faculdades como a imaginação e a intuição. ESTUDANDO E REFLETINDO Assim como o mito e a ciência são modos de organização da experiência humana - o primeiro baseado na emoção e o segundo na razão -, também a arte vai aparecer no mundo humano como forma de organização, como modo de transformar a experiência vivida em objeto de conhecimento, desta vez através do sentimento. O entendimento do mundo não se dá somente por meio de conceitos logicamente organizados que, pelo fato de serem abstrações genéricas, estão longe do dado sensorial, do momento vivido. Ele também pode se dar através da intuição, do conhecimento imediato da forma concreta e individual, que não fala à razão, mas ao sentimento e à imaginação. A arte é um caso privilegiado de entendimento intuitivo do mundo, tanto para o artista que cria obras concretas e singulares quanto para o apreciador que se entrega a elas para penetrar-lhes o sentido. O verdadeiro artista intui a forma organizadora dos objetos ou eventos sobre os quais focaliza sua atenção. Ele vê, ou ouve, o que está por trás da aparência exterior do mundo. Por exemplo, no filme Amadeus, de Milos Forman, há uma cena que mostra didaticamente esse processo. A sogra de Mozart, emocionada e muito irritada, conta ao compositor por que a filha dela o abandonou. Mozart, que a princípio realmente procurava uma resposta para essa questão, lentamente deixa de prestar atenção às palavras para sintonizar com a melodia e ritmo do discurso. Ele ouve a musicalidade por trás do discurso inflamado e compõe uma ária para A flauta mágica. 15 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 04 - A ARTE COMO FORMA DE CULTURA Roberto Carlos de Oliveira Assim, como todo artista, Mozart percebe, pelo poder seletivo e interpretativo dos seus sentidos, formas que não podem ser nomeadas, que não podem ser reduzidas a um discurso verbal explicativo, pois elas precisam ser sentidas, e não explicadas. A partir dessa intuição, o artista não cria mais cópias da natureza, mas, sim, símbolos dessa mesma natureza e da vida humana. Esses símbolos, portanto, não são entidades abstratas, não são entes da razão. Ao contrário, são obras de arte, objetos sensíveis, concretos, individuais, que representam analogicamente, ou seja, por semelhança de forma, a experiência vital intuída pelo artista. Assim, quando apreciamos uma obra de arte, fazemo-lo através dos nossos sentidos: visão, audição, tato, cinestesia e se a obra for ambiental, até o olfato. É a partir dessa percepção sensível que podemos intuir a vivência que o artista expressou em sua obra, uma visão nova, uma interpretação nova da natureza e da vida. O artista atribui significados ao mundo por meio da sua obra. O espectador lê esses significados nela depositados. Essa "interpretação só é possível em termos de intuição e não de conceitos, em termos de forma sensível e não de signos abstratos". Podemos dizer, então, que na obra de arte o importante não é o tema em si, mas o tratamento que se dá ao tema, que o transforma em símbolo de valores de uma determinada época. Papel da Imaginação na Arte É exatamente a imaginação que vai servir de mediadora entre o vivido e o pensado, entre a presença bruta do objeto e a representação, entre a acolhida dada pelo corpo (os órgãos dos sentidos) e a ordenação do espírito (pensamento analógico). A imaginação, ao tomar o mundo presente em imagens, nos faz pensar. Saltamos dessas imagens para outras semelhantes, fazendo uma síntese criativa. O mundo imaginário assim criado não é irreal. É, antes, prerreal, isto é, antecede o real 16 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 04 - A ARTE COMO FORMA DE CULTURA Roberto Carlos de Oliveira porque aponta suas possibilidades em vez de fixá-lo numa forma cristalizada. Assim, a imaginação alarga o campo do real percebido, preenchendo-o de outros. Arte e Sentimento Na experiência estética, a imaginação manifesta, ainda, o acordo entre a natureza e o sujeito, numa espécie de comunhão cuja via de acesso é o sentimento. O sentimento acolhe o objeto, reunindo as potencialidades do eu numa imagem singular. É toda nossa personalidade que está em jogo, e o sentimento despertado não é o sentimento de uma obra, mas de um mundo que se descortina em toda sua profundidade, no momento em que extraímos o objeto do seu contexto natural e o ligamos a um horizonte interior. Este sentimento, portanto, “não é emoção, é conhecimento”. Estabeleçamos as diferenças entre sentimento e emoção. O termo emoção, etimologicamente, refere-se à agitação física ou psicológica e é reservado para os níveis profundos de agitação. Ela rompe a estabilidade afetiva. Assim, emoção designa um estado psicológico que envolve profunda agitação afetiva. O sentimento, por outro lado, é uma reação cognitiva, de reconhecimento de certas estruturas do mundo, cujos critérios não são explicitados. É percepção das tensões dirigidas, comunicadas e expressas pelos aspectos estáticos e dinâmicos da forma, tamanho, tonalidade ou altura. Essas tensões são tão perceptíveis quanto o espaço ou a quantidade. Podemos, então, dizer que o sentimento esclarece o que motiva a emoção, na medida em que são essas tensões percebidas que causam a agitação psicológica. A emoção é uma resposta, é uma maneira de lidarmos com o sentimento. A alegria expressa pelo riso, por exemplo, é o modo pelo qual lidamos com o sentimento do cômico; o medo é uma resposta ao sentimento de ameaça. 17 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 04 - A ARTE COMO FORMA DE CULTURA Roberto Carlos de Oliveira Assim, o sentimento é conhecimento porque esclarece o que motiva a emoção; esse conhecimento é sentimento porque é irrefletido e supõe certa disponibilidade para acolher o afetivo, disponibilidade para a empatia, ou seja, sentir como se estivéssemos no lugar do outro. É preciso lembrar que sempre podemos nos negar a essa disponibilidade, pois ela pressupõe certo engajamento no mundo: o objetivo não é pensá-lo, nem agir sobre ele; é, tão somente, senti-lo na sua profundidade. O sentimento, na sua função de conhecimento, alcança, para além da aparência do objeto, a expressão. A expressão é o poder de emitir signos e de exteriorizar uma interioridade, isto é, de manifestar o que o objeto é para si. Mas essa expressão, em arte, ocorre sempre através de um meio específico. O artista não escolhe o seu meio (vídeo, pintura, dança etc.) como um meio material externo e indiferente. Para ele, as palavras, as cores, as linhas, as formas e desenhos, os sons (timbre) dos diversos instrumentos não são somente meios materiais de produção. São condições do pensar artístico, momentos do processo de criação e parte integrante e constituinte da sua expressão. O projeto do artista condiciona o meio e o material, que, por sua vez, condicionam as técnicas e o estilo. Tudo isso reunido forma a linguagem da obra, sua marca inconfundível, seu significado sensível. Em virtude dessa ligação indissolúvel entre significante e significado na obra de arte é que podemos dizer que "o objeto estético é, em primeiro lugar, a apoteose do sensível, e todo seu sentido é dado no sensível". Assim, a obra de arte não pode ser traduzida para outra linguagem. Quando contamos um filme a alguém, ele perde a maior parte de seu significado, pois sua forma sensível de imagem desapareceu. A obra de arte pode, quando muito, inspirar uma outra, e então teremos um filme a partir de um livro, uma música a partir de um quadro etc. São obras diferentes, no entanto. 18 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 04 - A ARTE COMO FORMA DE CULTURA Roberto Carlos de Oliveira BUSCANDO O CONHECIMENTO A arte tem um papel fundamental no desenvolvimento de nossa sensibilidade e intuição. O mundo não é somente entendido pela lógica e a razão, seu entendimento se dá também pela sensibilidade e a arte tem o papel de possibilitar esse entendimento. O artista intui seus sentimentos e visões de mundo na obra, e resta ao apreciador captar o máximo de dados possíveis daquela obra. Deixo o link da entrevista realizada com o colecionador de artes Bernardo Paz falando da importante da arte na vida das pessoas. VÍDEO: http://www.youtube.com/watch?v=-7t_bJs-ftc 19 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 05 - FUNÇÕES DA ARTE Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é compreender as funções da arte, isto é, modos pelos quais ela se apresenta e como o tipo de conhecimento que a arte produz pode ser utilizado para propiciar não só deleite estético, bem como uma formação técnica e humanística. ESTUDANDO E REFLETINDO A função da arte, numa sociedade em que a luta de classes se aguça, difere, em muitos aspectos, da função original da arte. No entanto, a despeito das situações sociais diferentes, há alguma coisa na arte que expressa uma verdade permanente. E é essa coisa que nos possibilita-nos vermo-nos com as pinturas pré-históricas das cavernas e com canções antigas. As obras de arte nem sempre tiveram a mesma função. Ora serviram para contar uma história, ora para rememorar um acontecimento importante, ora para despertar o sentimento religioso ou cívico. Foi só neste século que a obra de arte passou a ser considerada um objeto desvinculado desses interesses não-artísticos, um objeto propiciador de uma experiência estética por seus valores intrínsecos. Assim, dependendo do propósito e do tipo de interesse com que alguém se aproxima de uma obra de arte, podemos distinguir três funções principais para a arte. Função Naturalista Refere-se aos interesses pelo conteúdo da obra, ou seja, pelo que a obra retrata, em detrimento da sua forma ou modo de apresentação. A obra é encarada como um espelho, que reflete a realidade e nos remete diretamente a ela. Em outras palavras, a obra tem função referencial de nos enviar para fora do mundo artístico, para o mundo 1 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 05 - FUNÇÕES DA ARTE Roberto Carlos de Oliveira dos objetos retratados. Assim, uma escultura de Sócrates, por exemplo, serviria, dentro dessa perspectiva, para nos remeter ao 'homem e ao filósofo, ao que ele representou num determinado momento histórico brasileiro. Essa atitude perante a arte surge bastante cedo. Ela aparece na Grécia, no século V a.C., nas esculturas e pinturas que "imitam" ou "copiam" a realidade. Essa tendência caracterizou a arte ocidental até meados do século XIX, quando surgiu a fotografia. A partir de então, a função da arte, especialmente da pintura, teve de ser repensada e houve uma ruptura do naturalismo. Os critérios de avaliação de uma obra de arte do ponto de vista da função naturalista são: a correção da representação (deve ser representado corretamente para que possamos identificá-lo); a inteireza, ou seja, a qualidade de ser inteiro íntegro (o assunto deve ser representado por inteiro); e o vigor, que confere um poder de persuasão (especialmente se a situação representada for imaginária). Como exemplo, temos os filmes criados a partir de tecnologia digital, cujas imagens são representadas com tanto realismo que ficamos convencidos da possibilidade de sua existência. Função Formalista O interesse formalista preocupa-se com a forma de apresentação da obra. Contribui decisivamente para o significado da obra de arte. Este, portanto, é o único dos interesses que se ocupa da arte enquanto tal e por motivos que não são estranhos ao âmbito artístico. Desse ponto de vista vamos buscar, em cada obra, os princípios que regem sua organização interna: que elementos entraram em sua composição e que relações existem entre eles. Não importa o tipo de obra analisado: pictórico, escultórico, arquitetônico, musical, teatral, cinematográfico etc. Todos comportam uma estruturação interna de signos selecionados a partir de um código específico. 2 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 05 - FUNÇÕES DA ARTE Roberto Carlos de Oliveira Há nessa função, uma valorização da experiência estética como um momento em que, pela percepção e pela intuição, temos uma consciência intensificada do mundo. Embora a experiência estética propicie o conhecimento do que nos rodeia, este conhecimento não pode ser formulado em termos teóricos porque ele é imediato, concreto e sensível. O critério através do qual uma obra de arte será avaliada, dentro da perspectiva formalista, é sua capacidade de sustentar a contemplação estética de um público cuja sensibilidade seja educada e madura, isto é, que conheça vários códigos e esteja disponível para encontrar na própria obra suas regras de organização. Função Pragmática ou Utilitária A arte serve ou é útil para se alcançar um fim não artístico, isto é, ela não é valorizada por si mesma, mas só como meio de se alcançar outra finalidade. Esses fins não artísticos variam muito no curso da história. Na Idade Média, por exemplo, na medida em que a maior parte da população dos feudos era analfabeta, a arte serviu para ensinar os principais preceitos da religião católica e para relatar as histórias bíblicas. Esta é uma finalidade pedagógica da arte. Na época da Contrarreforma, a arte barroca foi muito utilizada para emocionar os fiéis, mostrando-lhes a grandeza e a riqueza do reino do céu, numa tentativa de segurar os fiéis dentro da religião católica, ameaçada pela Reforma protestante. Na medida em que os argumentos racionais não conseguiam se manter de pé diante das críticas dos protestantes, a via que restava para a igreja católica era a emocional. Esse é um exemplo da arte sendo usada para finalidades religiosas. 3 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 05 - FUNÇÕES DA ARTE Roberto Carlos de Oliveira A obra “operários” representa a função pragmática da arte, onde realiza uma crítica a exploração do trabalho capitalista. (fonte: http://noticias.universia.com.br/destaque/noticia/2012/05/22/9349 79/conheca-operarios-tarsila-do-amaral.html ) No nosso século, o "realismo socialista" tem por finalidade retratar a melhoria das condições de vida do trabalhador e as principais figuras da revolução socialista como um meio para despertar o sentimento cívico e manter a lealdade da população. A própria arte engajada, que floresceu entre nós no final da década de 50 e início da década de 60, pretendia conscientizar a população sobre sua situação socioeconômica. Portanto, as finalidades a serviço das quais a arte pode estar podem ser pedagógicas, religiosas, políticas ou sociais. Nessa perspectiva, quais seriam os critérios para se avaliar uma obra de arte? Esses critérios também vão ser exteriores à obra: o critério moral do valor da finalidade a que serve (se a finalidade for boa, a obra é boa); e o critério de eficácia da obra em relação à finalidade (se o fim for atingido, a obra é boa). Como vemos, em nenhum momento, dentro desse tipo de interesse, a obra é encarada do ponto de vista estético. BUSCANDO O CONHECIMENTO A função da arte modificou-se ao longo do tempo, começando como uma representação da natureza, a arte tinha uma função naturalista, sendo a obra mais bonita aquela que representasse de forma mais fiel o objeto desenhado. A próxima etapa do desenvolvimento da arte foi à função formalista, agora a arte não está mais preocupada em representar a natureza, mas sim em contemplar uma ideia universal, a totalidade passa a ser o foco principal dessa função. 4 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 05 - FUNÇÕES DA ARTE Roberto Carlos de Oliveira A última função mencionada nessa unidade é a função pragmática, onde a arte adquire uma função de ferramenta para atingir algum objetivo específico. Por exemplo, ela pode ser usada como ferramenta ideológica para uma campanha política. Segue um link de vídeo sobre as funções da arte: VÍDEO: http://www.youtube.com/watch?v=HGYUGnNmNR8 5 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 06 - O NATURALISMO RENASCENTISTA Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender e caracterizar a estética renascentista. ESTUDANDO E REFLETINDO O Renascimento artístico, ocorrido entre os séculos XIV e XV na Europa, passa a dignificar o trabalho do artista ao elevá-lo à condição de trabalho intelectual. Consequentemente, a obra de arte assume outro lugar na cultura da época. Nesse contexto, as artes vão buscar um naturalismo crescente, mantendo estreita relação com a ciência empírica que desponta na época e fazendo uso de todas as suas descobertas e elaborações em busca do ilusionismo visual. Assim, a perspectiva científica, a teoria matemática das proporções, que possibilitam a criação da ilusão da terceira dimensão sobre uma superfície plana, as conquistas da astronomia, da botânica, da fisiologia e da anatomia são incorporadas às artes. Osborne distingue seis princípios fundamentais que dominaram o ponto de vista renascentista no terreno da estética: 1. A arte é um ramo do conhecimento e, portanto, criação da inteligência. 2. A arte imita a natureza com a ajuda das ciências. 3. As artes plásticas e a literatura têm propósito de melhoria social e moral, aspirando ao ideal. 4. A beleza é uma propriedade objetiva das coisas e consiste em: ordem, harmonia, proporção, adequação. A harmonia se expressa matematicamente. 5. As artes alcançaram a perfeição na Antiguidade clássica, que deve ser estudada. 25 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 06 - O NATURALISMO RENASCENTISTA Roberto Carlos de Oliveira 6. As artes estão sujeitas a regras de perfeição racionalmente apreensíveis que podem ser formuladas e ensinadas com precisão. Aprendemo-las pelo estudo das obras da Antiguidade. O Humanismo pode ser apontado como o principal valor cultivado no Renascimento. Baseia-se Antropocentrismo, em Hedonismo, diversos conceitos Racionalismo, associados: Otimismo e Neoplatonismo, Individualismo. O Humanismo, antes que um corpo filosófico, é um método de aprendizado que faz uso da razão individual e da evidência empírica para chegar às suas conclusões, paralelamente à consulta aos textos originais, ao contrário da escolástica medieval, que se limitava ao debate das diferenças entre os autores e comentaristas. O Humanismo afirma a dignidade do homem e o torna o investigador por excelência da natureza. Na perspectiva do Renascimento, isso envolveu a revalorização da cultura clássica antiga e sua filosofia, com uma compreensão fortemente antropocentrista e racionalista do mundo, tendo o homem e seu raciocínio lógico e sua ciência como árbitros da vida manifesta. Seu precursor foi Petrarca, e o conceito se consolidou no século XV principalmente através dos escritos de Marsilio Ficino, Erasmo de Roterdão, Pico della Mirandola e Thomas More. O brilhante florescimento cultural e científico renascentista deu origem a sentimentos de otimismo, abrindo positivamente o homem para o novo e incentivando seu espírito de pesquisa. O desenvolvimento de uma nova atitude perante a vida deixava para trás a espiritualidade excessiva do gótico e via o mundo material com suas belezas naturais e culturais como um local a ser desfrutado, com ênfase na experiência individual e nas possibilidades latentes do homem. Além disso, os experimentos democráticos italianos, o crescente prestígio do artista como um erudito e não como um simples artesão, e um novo conceito de educação que valorizava os talentos individuais de cada um e buscava desenvolver o homem num ser completo e integrado, com a plena expressão de suas faculdades 26 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 06 - O NATURALISMO RENASCENTISTA Roberto Carlos de Oliveira espirituais, morais e físicas, nutriam sentimentos novos de liberdade social e individual. Reunindo esse corpus eclético de ideias, os homens do Renascimento cunharam ou adaptaram à sua moda alguns outros conceitos, dos quais se destacam as teorias da perfectibilidade e do progresso, que na prática impulsionaram positivamente a ciência de modo a tornar o período em foco como o marco inicial da ciência moderna. Mas como que para contrapô-los surgiu uma percepção de que a história é cíclica e tem fases de declínio inevitável, e de que o homem natural é um ser sujeito a forças além de seu poder e não tem domínio completo sobre seus pensamentos, capacidades e paixões, nem sobre a duração de sua própria vida. O resultado foi um grande e rico debate teórico entre os eruditos, recheado por fatos novos que apareciam a cada momento, que só teve uma resolução prática no século XVII, com a afirmação irresistível e definitiva da importância da ciência. Por um lado, alguns daqueles homens se viam como herdeiros de uma tradição que havia desaparecido por mil anos, crendo reviver de fato uma grande cultura antiga, e sentindo-se até um pouco como contemporâneos dos romanos. Mas havia outros que viam sua própria época como distinta tanto da Idade Média como da Antiguidade, com um estilo de vida até então inédito sobre a face da Terra, sentimento que era baseado exatamente no óbvio progresso da ciência. A história confirma que nesse período foram inventados diversos instrumentos científicos, e foram descobertas diversas leis naturais e objetos físicos antes desconhecidos; a própria face do planeta se modificou nos mapas depois dos descobrimentos das grandes navegações, levando consigo a física, a matemática, a medicina, a astronomia, a filosofia, a engenharia, a filologia e vários outros ramos do saber a um nível de complexidade, eficiência e exatidão sem precedentes, cada qual contribuindo para um crescimento exponencial do conhecimento total, o que levou a se conceber a história da humanidade como uma expansão contínua e sempre para melhor. 27 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 06 - O NATURALISMO RENASCENTISTA Roberto Carlos de Oliveira A novidade renascentista não foi tanto a ressurreição da sabedoria antiga, mas sua ampliação e aprofundamento com a criação de novas ciências e disciplinas, de uma nova visão de mundo e do homem e de um novo conceito de ensino e educação. O resultado foi um grande e frutífero programa disciplinador e desenvolvedor do intelecto e das habilidades gerais do homem, que tinha origem na cultura grecoromana e que de fato em parte se perdera para o ocidente durante a Idade Média. Mas é preciso lembrar que apesar da ideia que os renascentistas pudessem ter de si mesmos, o movimento jamais poderia ser uma imitação literal da cultura antiga, por acontecer todo sob o manto do Catolicismo, cujos valores e cosmogonia eram bem diversos dos do antigo paganismo. BUSCANDO O CONHECIMENTO A Renascença foi uma tentativa original e eclética de harmonização do Neoplatonismo pagão com a religião cristã, do eros com a charitas, junto com influências orientais, judaicas e árabes, e onde o estudo da magia, da astrologia e do oculto não estavam ausentes. O pensamento medieval tendia a ver o homem como uma criatura vil, uma "massa de podridão, pó e cinza", como se lê em De laude flagellorum de Pedro Damião, no século XI. Mas quando se eleva a voz de Pico della Mirandola no século XV o homem já representava o centro do universo, um ser mutante, essencialmente imortal, autônomo, livre, criativo e poderoso, o que ecoava as vozes mais antigas de Hermes Trismegisto ("Grande milagre é o homem") e do árabe Abdala ("Não há nada mais maravilhoso do que o homem"). Esse otimismo se perderia novamente no século XVI, com a reaparição do ceticismo, do pessimismo, da ironia e do pragmatismo em Erasmo, Maquiavel, Rabelais e Montaigne, que veneravam a beleza dos ideais do classicismo, mas tristemente constatavam a impossibilidade de sua aplicação prática universal e testemunhavam o 28 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 06 - O NATURALISMO RENASCENTISTA Roberto Carlos de Oliveira deplorável jogo político, a pobreza e opressão das populações e outros problemas sociais e morais do homem real de seu tempo. Cabe notar que muitos pesquisadores consideram esta fase final não como uma etapa no grande ciclo do Renascimento, e a estabeleceram como um movimento distinto e autônomo, dando-lhe o nome de Maneirismo. Para um melhor aprofundamento da disciplina, disponibilizo dois links para um estudo sobre o tema, o primeiro link é do professor Pedro que separou imagens das principais obras do renascimento, já o segundo link é de um documentário sobre o renascimento e o iluminismo: 1°LINK: http://profpedroemfronteira.files.wordpress.com/2010/09/9_pp_arte_do_renascimento.p df 2°LINK: http://www.youtube.com/watch?v=rS8iKbcnMbw 29 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 07 - A RACIONALIZAÇÃO DA BELEZA Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Entender a relação estabelecida na modernidade entre a estética e a razão e suas representações artísticas. ESTUDANDO E REFLETINDO No Renascimento, os artistas procuram imitar o que a Natureza tem de essencial e perfeito. A concepção que prevalece a partir dessa época, e para cujo triunfo colaboraram, entre outros, um Leonardo da Vinci (1452-1519), um Giordano Bruno (1548-1600) e um Galileu (1564-1642), é que a Natureza é um todo vivo, animado, regido por leis intrínsecas, que governam o curso dos astros, a queda dos corpos, a circulação do sangue, a distribuição dos elementos, o ciclo das marés e o equilíbrio das massas. Galileu dizia que o livro da Natureza está escrito em linguagem matemática, e que as suas palavras são Círculos e outras figuras geométricas. Essas palavras também são leis, determinando as formas dos seres existentes por certas relações constantes, de ordem geométrica, essenciais à perfeição do todo, e que definem a beleza própria das coisas naturais que a arte tem por objeto representar. Verifica-se, no Renascimento, importante mudança na atitude que vinha da Idade Média, em relação à Pintura, à Escultura e à Arquitetura, então consideradas artes mecânicas, servis. Artistas como Alberti (1404-1472) e Leonardo da Vinci reivindicam para essas artes a condição de atividade intelectual, antes somente conferida à Poesia. Dá-se o reconhecimento das Belas-Artes como síntese da práxis com a imaginação, da atividade formadora com a inteligência, que se destina a patentear a beleza das formas naturais em obras que solicitem, ao mesmo tempo, a visão sensível e a contemplação intelectual. 30 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 07 - A RACIONALIZAÇÃO DA BELEZA Roberto Carlos de Oliveira Lembremos, para confirmar esse ponto, a concepção de Leonardo da Vinci, para quem a Pintura é um meio de analisar a Natureza, de produzir uma visão especulativa de suas formas regulares e inteligíveis, sujeitas às mesmas leis gerais que as ciências começariam, depois, a identificar e a traduzir em linguagem matemática. Essa análise que a visão do artista realiza e que a sua atividade transforma em obra, completa-se na síntese do quadro, da tela pintada, que permite ver, em sua beleza intrínseca, graças à perspectiva geométrica, um pedaço da realidade natural. A Natureza revela-se aos olhos dos que sabem vê-Ia e, através desse meio privilegiado que é a Pintura, torna-se visível e inteligível para os outros. O Homem Vitruviano (1492). Para os renascentistas a sensibilidade e a razão caminham juntas, sendo possível sua expressão nas artes. (fonte: http://www.infoescola.com/desenho/o-homem-vitruviano/ ) 31 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 07 - A RACIONALIZAÇÃO DA BELEZA Roberto Carlos de Oliveira Somente a Pintura é capaz de oferecer aos sentidos uma tradução sensível, sem erros, da mesma realidade perfeita que o intelecto apreende por intermédio dos conceitos gerais e do raciocínio. A função da Pintura é paralela à da ciência e da filosofia. Dada a condição especulativa atribuída a essa arte, não deve causar surpresa que Leonardo da Vinci tenha dito que são inimigos da Natureza e da filosofia aqueles que desprezam a Pintura. Pode-se ver nesse pensamento uma réplica à desvalorização platônica das "composições imitativas”. Platão dizia, ironicamente, que a propriedade da Pintura e da Escultura, para representar os mais diferentes seres - a terra, o céu, os animais e os deuses - não era diferente da propriedade dos espelhos para refletir tudo o que se põe diante deles. Se os movimentamos em todas as direções, veremos, de pronto, refletirem-se na superfície polida as imagens das coisas, e só as puras imagens, que não possuem verdadeira existência. Esse poder de criar aparências é assumido realisticamente pelos artistas do Renascimento, no que se refere à função da Pintura. Mais uma vez é Leonardo da Vinci, o intérprete dessa posição, quem diz em seu Tratado: O pintor deve ser universal, amar a solidão, considerar aquilo que vê e, raciocinando por si mesmo, escolher as partes mais perfeitas das coisas que vê. Há de fazer como o espelho que reflete todas as cores que colocamos diante dele, parecendo converter-se numa segunda natureza”. (Leonardo da Vinci, Tratado da pintura, Buenos Aires, 1952, p. 37.) Poesia e Pintura O Belo e a Natureza fundem-se num só ideal na arte do Renascimento, que empresta à Pintura e à Escultura uma dignidade teórica não alcançada na Antiguidade. A própria Poesia, a que Platão reservou um papel específico, de ordem superior, submeteu-se muito cedo, desde o século XIV, a esse ideal, que Giovanni Boccaccio (1313-1375) já aceitava, ao afirmar que o poeta é aquele que tenta fixar em versos perfeitos as formas da Natureza e as suas operações, e que fala a respeito das coisas 32 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 07 - A RACIONALIZAÇÃO DA BELEZA Roberto Carlos de Oliveira animadas e inanimadas numa linguagem vívida, de modo a torná-las presentes à imaginação. Para Philip Sidney (1554-1586), autor de famosa apologia da arte poética, há duas espécies de Natureza: uma que é exterior, a qual inspira o poeta, e uma segunda, que a sua imaginação povoa com seres míticos ou ideais, como heróis e nobres figuras, por meio dos quais os vícios e as virtudes são representados. A polêmica da dignidade das artes, que tanto interessou aos humanistas, liga-se à hegemonia que teve, a partir de então, a ideia de Natureza. Não é a Escultura a arte capaz de representar mais fielmente coisas que a Pintura só pode reproduzir, dandonos apenas a ilusão de volume? A Pintura é inferior ou superior à Poesia? Foi aceita, em princípio, a concepção sugerida por Horácio na Antiguidade e difundida por Simônides, que estabeleceu a equivalência entre as duas artes, a primeira, considerada uma espécie de poesia muda (muta póiesis), e a segunda uma pintura que fala (pictura loquens). BUSCANDO O CONHECIMENTO O Renascimento foi a retomada dos valores humanísticos cultuados pela humanidade no período antigo. Depois de um longo período de esquecimento do homem no período medieval, as artes e a estética se concentrou na adoração a Deus e na utilização das artes para evangelização e ensinamentos bíblicos para a população de maioria analfabeta. Com a retomada desses ideais esquecidos da antiguidade, o homem voltou a se concentrar mais no próprio homem, criando obras artísticas onde demonstre as qualidades da natureza humana. Por isso, os apelos lógicos e matemáticos nas obras renascentistas são tão grandes, é ressaltar a perfeição humana a finalidade do Renascimento. 33 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 07 - A RACIONALIZAÇÃO DA BELEZA Roberto Carlos de Oliveira Deixo um link de um documentário sobre a vida de Michelangelo (1475 – 1564), um dos maiores artistas e da época, propôs em suas esculturas, atingir a perfeição da natureza humana. Por seu conflito interno e externo com a religião, o artista foi responsável pela pintura da capela sistina, mostrando outra qualidade sua além da escultura. LINK: http://www.youtube.com/watch?v=S2LmU1rx7fQ 34 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 08 - A RETOMADA DA MIMESE E A BELEZA NATURAL Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Entender a retomada do sentido da imitação ou da arte enquanto mimese. Explorar aspectos da beleza natural e sua relação com os sentimentos humanos. ESTUDANDO E REFLETINDO O pressuposto filosófico da mimese é uma concepção do mundo racionalista e realista ao mesmo tempo. O homem, animal racional, vive num universo também racional, ordenado, onde o Bem é superior ao Mal e o Belo prima sobre o Feio, como a ordem sobre a desordem e a forma sobre a matéria. Há dois modos de acesso à Realidade assim concebida: o conhecimento teórico, objetivo, fundado na Razão, que apreende a essência das coisas e as leis verdadeiras que as regem, e a Arte, que, nada apreendendo no sentido do conhecimento real e verdadeiro, representa tanto as coisas que existem como aquelas que, de acordo com as leis mais gerais da Natureza, apenas são possíveis. Esta a concepção que vamos encontrar em Denis Diderot (1713-1784). Para Diderot, que aceitou e interpretou a seu modo o princípio da imitação, a Natureza, espetáculo comum, impõe-se ao artista como modelo, no qual deverá buscar não apenas os seus temas, mas o próprio senso de composição necessário à Pintura e à Escultura. Nessas artes prevalecem as duas qualidades principais que imperam em qualquer recanto natural, em qualquer parte do mundo: a verdade e a harmonia. A verdade na Arte, que combina a observação com a imaginação, a reprodução dos fatos comuns com a escolha dos excepcionais, os traços exteriores da Natureza com aqueles que a fantasia inventa, é um outro nome para a Beleza, pois que esta, segundo Diderot, não é senão o verdadeiro revelado por circunstâncias possíveis, mas CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 35 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 08 - A RETOMADA DA MIMESE E A BELEZA NATURAL Roberto Carlos de Oliveira raras e maravilhosas. (Diderot, "Obras", in Essais sur Ia peinture, Pensées Detachées, 1. 5, p. 107.) Na Ciência, a verdade é sempre geral: os seus conceitos reduzem a realidade a determinadas formas abstratas, nas quais se dissolvem os aspectos singulares dos fenômenos. Na Arte, há predominância tanto do individual como do sensível. É por isso que ela se assemelha à Verdade, traduzindo aquilo que é possível ou provável. Para Diderot, a arte serve como modelo para o homem, através das qualidades de harmonia e verdade, a natureza ensina o homem o caminho certo para o conhecimento. (Natureza morta com maçãs (1890), Paul Cézanne,) (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Natureza-morta ) Diante de uma representação artística, não nos interessa saber se o objeto representado existe ou não, mas se o artista, respeitando as leis da natureza, o tornou possível. Eis aí em que se resume o princípio, fundamental para a estética do século XVIII, do necessário acordo entre Arte e Natureza. A segunda Natureza que a Arte criaria e de que falam os principais representantes da doutrina da imitação, não é uma nova realidade que transcende a natural, mas uma multiplicação inventiva daqueles aspectos que manifestam as íntimas perfeições de um universo racional, íntegro em todas as suas partes, regido por leis imutáveis que a razão conhece. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 36 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 08 - A RETOMADA DA MIMESE E A BELEZA NATURAL Roberto Carlos de Oliveira A beleza natural e os sentimentos A Natureza é como pressupunha a concepção que desabrochou com o Renascimento, a ordem das coisas, indiferente à vontade humana e independente dela. Mas as inclinações e os sentimentos espontâneos do homem, em oposição a tudo o que é criado pela sua vontade, a tudo quanto decorre de sua ação prática, intencionalmente orientada, da qual derivam as técnicas, as convenções sociais, as leis, a organização civil e política, também fazem parte da Natureza. Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) enfatizou particularmente esse aspecto da espontaneidade dos sentimentos, quando pregou a urgente necessidade do retorno do homem ao estado natural. Essa volta seria, em parte, a recuperação da afetividade, da ordem infusa à consciência, que Pascal chamara, no século XVII, de "ordem do coração" Essa ideia fundamental de Rousseau, estimulando uma nova apreciação da beleza natural, e assinalando o início de uma nova atitude em relação à Arte, será um dos veios do movimento romântico. Implantado o sentimento da Natureza, o Belo natural confunde-se com a natureza dos sentimentos. É a fonte das emoções, dos estados afetivos espontâneos e profundos. Desse ponto de vista, a Arte, veículo da subjetividade, deverá satisfazer, sobretudo, a "ordem do coração", para tornar-se o reflexo da vida interior do indivíduo. No seu livro intitulado Discurso sobre as Ciências a as Artes, Rousseau tece uma crítica ao desenvolvimento das artes de sua época. O tema central do discurso é se as artes serviram para o aperfeiçoamento do homem, se melhorou ou não sua conduta em relação ao próximo, percebe-se que, quando Rousseau analisa as artes sob essa ótica, ele realiza uma relação entre estética e moralidade, pois a arte não é feita pelo simples fato de praticar arte, o fim não está em si mesma, a função da arte é aproximar o homem do seu estado natural, possibilitar o homem para que escute a “ordem do coração”. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 37 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 08 - A RETOMADA DA MIMESE E A BELEZA NATURAL Roberto Carlos de Oliveira Porém, as atuais formas que as artes se desenvolvem, ao invés de garantir os laços do homem com a sua natureza, estão cada vez mais o distanciando. As Artes como conhecemos hoje, é fruto de um sistema corrupto, cuja finalidade é enaltecer o egoísmo do homem civilizado. Para Rousseau, a origem de toda essa corrupção de valores está na passagem do estado de natureza para o estado civilizado: “primeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, lembrou-se de dizer isto é meu e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo”. Quando os homens começam a conviver em sociedade, mesmo em sua forma rudimentar, inicia-se uma competitividade entre os indivíduos. Os homens passam a se compararem e identificarem: o mais forte, o mais bonito, o mais hábil começa a se destacar, o ser e o parecer tornam-se diferentes. Surgem então às divergências e desigualdades entrem os homens, e as artes e a ciência vem para agravar essa situação de diferenças entre os homens. O indivíduo começa a consumir obras de arte para se sentir diferente e superior em relação daquele que não possui, desse modo, as artes vão perdendo sua função original e se torna um objeto de consumo e alienação. Para Rousseau, a arte é usada de forma errônea, pois ao invés de aproximar o homem da natureza, o corrompe distancia-o da verdade e do seu ser. (Rousseau, um dos principais filósofos do Iluminismo.) (fonte: http://www.infoescola.com/filosofia/a-filosofia-de-rousseau/ ) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 38 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 08 - A RETOMADA DA MIMESE E A BELEZA NATURAL Roberto Carlos de Oliveira BUSCANDO CONHECIMENTO A retomada do conceito de mimese no século XVIII foi de grande importância para o cenário acadêmico da época. A estética volta a se preocupar com a representação da natureza e suas contribuições para o homem e também para o conhecimento, por isso pensadores como Diderot e Rousseau investigaram profundamente as artes e suas relações com a verdade e moralidade no sujeito moderno. Para uma melhor compreensão dos conteúdos estudados, deixo o link do livro Discurso sobre as Ciências a as Artes, do filósofo Rousseau. LINK: http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/cienciaarte.html CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 39 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 09 - A EXPRIÊNCIA ESTÉTICA NA PSICANÁLISE Roberto Carlos de Oliveira CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender a ideia de experiência estética na psicanálise. ESTUDANDO E REFLETINDO O estudo da experiência estética se iniciou na antiguidade, principalmente com a noção de catarse desenvolvida por Aristóteles. O filósofo achava importante a arte de levar para o indivíduo e o público os sentimentos representados no teatro, na música ou na dança e fazê-los sentir as emoções encenadas nas peças. Todavia, Aristóteles não ampliou e não se aprofundou mais nesse assunto da experiência estética, sendo somente na modernidade, a retomada desse conceito. A arte e sua relação com a subjetividade do indivíduo, representado pelas experiências estéticas, foram discutidas pelos filósofos Kant e Schopenhauer, mas foi Sigmund Freud (1856 – 1939) quem analisou profundamente, através de uma visão psicanalítica do assunto. A visão de experiência estética de Freud se assemelha muito com a psicologia desenvolvida pelo filósofo Platão na antiguidade, pois mesmo sendo conhecido por suas visões negativas sobre a arte e o artista, Platão baseia sua crítica em bases epistemológicas, ou seja, se a arte é uma imitação da cópia existente na realidade, esse elemento afasta o sujeito de tudo aquilo que é realmente necessário para seu desenvolvimento intelectual, e assim o impede de atingir a verdade. Por esse motivo, Platão faz uma crítica moral à arte, porque ela acaba prejudicando o sujeito, levando-o para o mau caminho. A oposição moral de Platão, busca ligar a Ideia de “Bem” existente no mundo das Ideias, com a Ideia de “Beleza”, mas não essa beleza existente na sensibilidade que é transitória, mas sim a verdadeira beleza que habita no mundo inteligível, por isso se o indivíduo consegue atingir o belo 40 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 09 - A EXPRIÊNCIA ESTÉTICA NA PSICANÁLISE Roberto Carlos de Oliveira verdadeiro, ele conseguirá atingir a verdadeira bondade. Dessa forma a equação que representa sistema platônico de beleza é a seguinte: “Belo = Verdade = Bem”. Com a divisão da alma em três partes, Platão quis classificar e hierarquizar as partes da alma, afirmando a parte superior como a mais importante (escola de Atenas, 1509, Rafael.). (http://www.obeabadosertao.com.br/v3/walter-sarmento/os-valores-intrisecos-daetica_5134.html) Outra ideia que completa o entendimento da estética desenvolvida por Platão, é a noção de alma tripartida. O plano alto da alma habita a alma racional, o plano intermediário habita a alma corajosa e o plano baixo habita a alma desejante. Dessa forma, o filósofo condena a arte pelo fato dela trabalhar com “imagens” de uma forma direta ou indireta, apelando para as partes baixas da alma e não para a parte alta da alma. Nesse ponto, inicia a correlação com o pensamento de Freud, pelo fato que seu conceito de alma também é dividido em três partes: o id, o ego e o superego. O id é a parte da alma que armazena as paixões e desejos antisociais, onde vive a sexualidade e a violência. Platão e Freud concordam que essas partes baixas, devem ser controladas. O id para Freud corresponde à alma desejante de Platão, pois essas partes prejudicam a vida social e particular do homem. Para manter essa parte da alma em controle, Platão sugere que tire as artes da sociedade, para que evite a tentação de alimentá-las e depois não conseguir mais dominá-las. Freud é adepto do controle dos instintos primitivos do homem, onde existe uma luta com outra força profunda, o superego. Por 41 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 09 - A EXPRIÊNCIA ESTÉTICA NA PSICANÁLISE Roberto Carlos de Oliveira meio de uma racionalidade extrema, o superego reprime violentamente os impulsos do id, criando bloqueios para a ação do id, que tem suas energias voltadas para si. Esse retorno quando acontece de forma positiva é classificado como “sublimação”. O homem sublimado utiliza da energia sexual e violenta para a criação de obras e expressão de sua subjetividade por meio do ego, parte racional do ser humano. Freud ao invés de condenar as artes como fez o filósofo Platão, ele as utilizou como forma de representação da subjetividade e da energia libidinosa (http://www.veteranstoday.com/2013/12/24/sigmund-freud-psychoanalysis-and-thewar-on-the-west/) A diferença nítida entre o pensamento de Platão e o pensamento de Freud, é que esse último não tenta excluir as artes da cidade ou do contato com a população, Freud acredita no potencial das artes como meio de representar os conteúdos subjetivos das pessoas, através da sublimação, o indivíduo pode desviar essa energia “baixa” para expressão e criação de beleza e arte. Freud seria aquele que veio resolver esse velho problema de vinte séculos atrás, e com a colaboração da psicanálise, as artes que Platão pretendia excluir da sua república utópica, adquire um novo significado e valor. Freud não mantém uma visão tão otimista em relação a qualquer processo de sublimação, isso só funciona em alguns campos do conhecimento humano, mas tem alguns campos que ela se torna ineficaz, como por exemplo, a ciência. A arte, na visão da psicanálise, busca por fantasias que 42 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 09 - A EXPRIÊNCIA ESTÉTICA NA PSICANÁLISE Roberto Carlos de Oliveira correspondem a deleites infantis, o que dificulta o indivíduo submeter-se ao que ele chama de “princípio de realidade”. Dessa forma, se a arte não for trabalhada com o processo de sublimação, atrapalha a vida e a compreensão da realidade do sujeito. Quando a sublimação não é bem desenvolvida, resulta em um processo chamado de “repressão”. Os processos de sublimação que são desprezados por múltiplos mecanismos, levam as energias da parte baixa da alma a ficar adormecidas e, portanto, a retornar com cólera gigantesca se as condições sociais assim permitirem. BUSCANDO O CONHECIMENTO As artes foram tratadas de modos diferentes na visão de Platão e na Visão de Freud. Enquanto Platão acreditava que as artes corrompiam o homem e os afastavam cada vez mais da verdade e da autêntica beleza, Freud teve uma visão mais otimista com ideias transformadoras dessas forças negativas do sujeito. O processo de sublimação proposto por Freud busca canalizar essa energia destrutiva e transforma-la em ferramenta para a arte e para expressão da subjetividade. Assim, quando essa sublimação é bem desenvolvida, podemos expressar aquilo que habita em nosso íntimo, todavia, se ela não for bem trabalhada resulta em repressão, gerando nos indivíduos um desequilíbrio mental. No link a seguir, está disponível um diálogo sobre a relação entre arte e psicanálise produzida pela UNESP. LINK: http://www.youtube.com/watch?v=cUCRlgRDuag 43 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 10 - CULTURA E MODERNIDADE Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Propiciar conhecimentos sobre a relação entre cultura e modernidade. ESTUDANDO E REFLETINDO Na década de 1860, Karl Marx (1818-1883), um dos fundadores das ciências sociais, definiu o modelo de organização da sociedade moderna nos seguintes termos: Dentro do sistema capitalista, todos os métodos para a elevação da força produtiva social do trabalho se aplicam à custa do trabalhador individual; todos os meios para o desenvolvimento da produção se convertem em meios de dominação e exploração do produtor, mutilam o trabalhador, transformando-o num ser parcial, degradam-no, tornando-o um apêndice da máquina; aniquilam, com o tormento de seu trabalho, seu conteúdo, alienamlhe as potências espirituais do processo de trabalho na mesma medida em que a ciência é incorporada a este último como potência autônoma. (...) Mas todos os métodos de produção de mais valia1 são, simultaneamente, métodos da acumulação, e toda expansão da acumulação torna-se, reciprocamente, meio de desenvolver aqueles métodos. Segue, portanto, que à medida que se acumula capital a situação do trabalhador, qualquer que seja seu pagamento, alto ou baixo, tem de piorar. Finalmente, a lei que mantém a superpopulação relativa ou exército industrial de reserva sempre em equilíbrio com o volume e a energia da acumulação prende o trabalhador mais firmemente ao capital do que as correntes de Hefaísto agrilhoaram Prometeu ao rochedo. Ela ocasiona uma acumulação de miséria correspondente à acumulação de capital. A acumulação da riqueza num pólo é, portanto, ao mesmo tempo, a acumulação de miséria, tormento de trabalho, escravidão, ignorância, brutalização e degradação moral no pólo oposto, isto é, do lado da classe que produz seu próprio produto como capital (MARX, 1984, p. 209-210). 1 Seleciona-se aqui a síntese de Harvey sobre o conceito de mais valia, central na análise marxista: mais-valia absoluta “(...) apoia-se na extensão da jornada de trabalho com relação ao salário necessário para garantir a classe trabalhadora num dado padrão de vida. (...) Nos termos da segunda estratégia, denominada mais-valia relativa a mudança organizacional e tecnológica é posta em ação para gerar lucros temporários para firmas inovadoras e lucros mais generalizados com a redução dos custos dos bens que definem o padrão de vida do trabalho” (HARVEY, 1992, p. 174). 44 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 10 - CULTURA E MODERNIDADE Roberto Donato No momento em que estas palavras foram escritas não existiam meios de comunicação em massa, cultura de massa ou indústria cultural. No entanto, nessa passagem está sintetizado o núcleo fundamental do desenvolvimento do mundo moderno. Do ponto de vista marxista, toda a modernidade capitalista se funda nessa relação de exploração entre donos dos meios de produção (capitalistas) e os vendedores da força de trabalho (trabalhadores). A política, a esfera jurídica, a ciência e as manifestações culturais são organizadas a partir do estímulo dessa relação social de produção. No entanto, essa influência acontece também do modo inverso: essas instâncias socioculturais (superestruturas) agem sobre a organização econômica (infraestruturas) que as criaram. Essa organização implica três características fundamentais: a expansividade, a autodestruição criadora e a dessacralização do mundo. A expansividade implica um processo de gradativa absorção geográfica do mundo ao conjunto das relações capitalistas de produção. Para a obtenção de lucro, deve existir mais produção, mais mercados, mais recursos a serem aproveitados: (...) A necessidade de mercados cada vez mais extensos para seus produtos impele a burguesia para todo o globo terrestre. Ela deve estabelecer-se em toda parte, instalar-se em toda parte, criar vínculos em toda parte. Através da exploração do mercado mundial, a burguesia deu um caráter cosmopolita à produção e ao consumo de todos os países. (idem, 1977 p.24-25). Essa expansividade vem acompanhada, de uma autodestruição criadora, o eterno destruir o velho para emergir o novo. Esse traço característico não se restringe à produção industrial de mercadorias, mas, a todo o conjunto das relações sociais modernas. Ele permite que os indivíduos tornem-se consumidores eternos, na medida em que o novo deve sempre substituir os antigos produtos, as antigas relações, antigas formas de pensar. A inovação transforma-se em valor absoluto. Toda tradição perde o valor. 45 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 10 - CULTURA E MODERNIDADE Roberto Donato A burguesia não pode existir sem revolucionar continuamente os instrumentos de produção e, por conseguinte, as relações de produção, portanto, todo o conjunto de relações sociais. A conservação inalterada do antigo modo de produção era, ao contrário, a primeira condição de existência de todas as classes industriais anteriores. O contínuo revolucionamento da produção, o abalo constante de todas as condições sociais, a incerteza e a agitação eternas distinguem a época burguesa de todas as precedentes (MARX & ENGELS, 1977, p. 24). E, por fim, a sociedade moderna é atravessada por um processo de dessacralização ou desencantamento do mundo, onde as concepções, valores e normas perdem suas características mágicas e sagradas, tornado-se racionalizadas e burocratizadas. Essa dessacralização permite a autodestruição criativa, na medida em que os valores tradicionais perdem sua aura sagrada. O compromisso pela honra é substituído pelo documento, juridicamente estabelecido. A intuição é substituída pela comprovação científica dos fatos. A força dos deuses desaparece diante das leis da natureza, medidas e controladas cientificamente. Assim... Dissolvem-se todas as relações sociais antigas e cristalizadas, com seu cortejo de concepções e de idéias secularmente veneradas; as relações que a substituem tornamse antiquadas antes de se ossificar. Tudo que era sólido e estável se desmancha no ar, tudo que era sagrado torna-se profano, e os homens são obrigados finalmente a encarar com serenidade suas condições de existência e suas relações recíprocas (idem, p. 23) BUSCANDO CONHECIMENTO Apesar de Marx apresentar-se como crítico das contradições capitalistas, ele tinha certa dose de otimismo quanto à capacidade dessas contradições trazerem a sua própria solução. Ou seja, a alienação e exploração do trabalho pelos capitalistas na indústria levariam os trabalhadores a adquirir uma consciência de classe. Essa conscientização das condições de vida proletária era a condição fundamental para o aparecimento de uma postura revolucionária entre os trabalhadores: “(...) a burguesia não forjou apenas as armas que lhe trarão a morte; produziu também os homens que empunharão essas armas – os operários modernos, proletários” (ibidem, p. 32). 46 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 10 - CULTURA E MODERNIDADE Roberto Donato Essa rápida passagem pelos escritos de Marx nos possibilita compreender que, de forma geral, a modernidade é interpretada como uma experiência totalizante. Que significa essa afirmação? Apesar do caráter dinâmico, criador e destruidor da modernidade, ela é resultado de um conjunto articulado de relações que atravessam toda a sua constituição. Economia, organização social, política e cultura têm correspondências entre si e nos apresentam um mundo organizado. Essa visão também representa a ideia de que a humanidade tem condição de emancipar-se, viver uma época de redenção, pois a razão humana teria condições de desmascarar o funcionamento do mundo. Através do proletariado, a cultura ganharia uma nova forma mais humana e socializadora. (Fonte: http://professoraleonorbaiao.blogspot.com.br/) 47 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 11 - O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA DA CULTURA Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é explicitar o contexto histórico da sociologia da cultura. ESTUDANDO E REFLETINDO Qual é razão de existência de uma sociologia da cultura? Quando os sociólogos começaram a se preocupar com a cultura de modo específico? Durante o século XIX, a expressão “cultura” e a tentativa de sua análise em parâmetros científicos foram dominadas pela antropologia. No entanto, nesse momento, a antropologia dedicava grande parte do seu esforço à análise das sociedades não-ocidentais. A preocupação dos antropólogos era descrever, classificar e comparar as sociedades “exóticas”, “selvagens” e “primitivas”. Como a maior parte dos antropólogos tinha uma visão evolucionista dessas sociedades, a concepção geral era de que esses povos não tinham grande desenvolvimento econômico, se comparados às sociedades capitalistas da Europa e dos EUA, cujos saltos tecnológicos experimentados foram extraordinários 48 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 11 - O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA DA CULTURA Roberto Donato Assim, acreditava-se que essas sociedades eram, em termos civilizatórios, inferiores às sociedades modernas e capitalistas – ou seja, menos “evoluídas”. Seus aspectos econômicos eram, de forma geral, menos “interessante” do que a análise de suas concepções míticas, de suas relações de parentesco, assim como de sua religiosidade. De forma muito simplificada, podemos afirmar que a antropologia concentrou-se na análise dos aspectos culturais dos povos não ocidentais. Os termos “antropologia” e “cultura” estiveram sempre bem próximos. A sociologia, por sua vez, dedicou-se à análise da própria sociedade moderna, urbana e industrial, então florescente na Europa e América do Norte. No século XIX, os pensadores clássicos da sociologia – Karl Marx, Max Weber e Émile Durkheim – preocuparam-se fundamentalmente em fornecer uma interpretação das novas relações sociais surgidas com o processo de industrialização, urbanização e racionalização da sociedade ocidental. Isso não significa que esses autores clássicos não tenham se preocupado com aspectos culturais da sociedade moderna. As obras dos três pensadores foram profundamente marcadas, cada uma ao seu modo, pela reflexão sobre os aspectos religiosos, ideológicos e intelectuais da modernidade. No entanto, a cultura e suas manifestações não foram preocupações específicas desses três autores. Os aspectos culturais foram abordados em conjunto com as demais esferas da sociedade, na medida em que tais autores desejavam oferecer uma explicação totalizante das relações sociais. Podemos afirmar, então, que Marx, Weber e Durkheim ofereceram três paradigmas diferentes para a Sociologia. BUSCANDO CONHECIMENTO No final do século de XIX, o desenvolvimento tecnológico e científico, que já tinha revolucionado a produção industrial, chegou aos meios de comunicação. A mecanização das prensas impulsionou o aparecimento dos jornais de grande circulação. Com crescente processo de “universalização” da educação, os impressos atingiram um 49 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 11 - O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA DA CULTURA Roberto Donato número cada vez maior de pessoas. A utilização das ondas eletromagnéticas para comunicação possibilitou o aparecimento do rádio. A fotografia teve seu longo processo de construção técnica finalizado entre 1830 e 1840, mas ganhou grande popularidade a partir de 1870. O cinema surgiu como uma decorrência técnica da fotografia e atingiu notoriedade no início do século XX. Quando essas inovações técnicas chegaram à comunicação, a Europa e os EUA já tinham um processo de urbanização e industrialização estruturado, fase em que o êxodo rural já estava relativamente realizado. De 1850 a 1900, há um vertiginoso crescimento demográfico, resultado do cientificismo da medicina e da consequente disseminação das normas sanitárias. Assim, na primeira metade do século XIX, tivemos uma combinação de fatores que possibilitaram o surgimento das massas urbanas, grandes conglomerados populacionais, geralmente proletariados. Aliado a esse processo, nasceram os meios de comunicação de massa, dos quais o jornal, o rádio e, principalmente, o cinema são grandes representantes. Devido a existência de grandes massas populacionais nos centros urbanos, foi necessário reconfigurar toda a estrutura das antigas cidades europeias e investir em meios de comunicação. (Fonte: http://angelinawittmann.blogspot.com.br/2013/10/um-pouco-de-historia-antecedentes-ao.html) 50 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 11 - O CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA DA CULTURA Roberto Donato A partir da primeira metade do século XX, os sociólogos começaram a se questionar sobre o efeito desses meios de comunicação de massa sobre o conjunto de valores, normas e concepções das sociedades ocidentais. Começaram a se indagar, também, sobre as consequências desses meios de comunicação nas manifestações artísticas. Finalmente, perguntou-se sobre as consequências políticas dessa nova forma de comunicação dos países urbano-industriais. No entanto, esses questionamentos não surgiram da pura criatividade dos primeiros sociólogos da cultura. Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1919), os meios de comunicação de massa, principalmente o cinema, começaram a ser amplamente utilizados como forma de propaganda política tanto pelos nazifascistas quanto pelos socialistas soviéticos. Joseph Goebbels (1897 – 1945) utilizou os meios de comunicação e a arte para controlar grandes massas populacionais, pois sabia do poder ideológico e políticos existentes neles. (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Joseph_Goebbels ) Do mesmo modo, os governos liberal-democráticos dos EUA, impulsionados por um crescimento econômico sem precedentes, utilizaram o rádio e o cinema para disseminar o “american way of life”, o estilo de vida americano, pautado por uma euforia consumista que tinha por objetivo estimular o desenvolvimento industrial do país. As modernas técnicas de propaganda, veiculadas através dos meios de comunicação de massa, passaram a fazer parte prioritária das estratégias políticas e econômicas. 51 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 12 - A CULTURA DE Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é compreender o fenômeno da cultura de massa. ESTUDANDO E REFLETINDO Houve, no século XX, uma forte aproximação entre arte e política, a partir da emergência dos meios de comunicação de massa. Qual seria o efeito dessa junção entre arte e política? Os novos meios de comunicação teriam um papel revolucionário, libertando os trabalhadores da exploração capitalista? Ou seria uma eficiente estratégia de manipulação das massas urbanas como forma de perpetuação do capitalismo? Quais seriam os efeitos dos meios de comunicação de massa na arte? Diante do cinema, o teatro poderia desaparecer? A pintura desapareceria diante da fotografia? Finalmente, a partir dessas indagações, nasceu uma das mais fascinantes vertentes da sociologia. A sociologia da cultura. Vamos conhecê-la? Cultura de massa. Como vimos, a partir do advento da modernidade, a conjunção entre densidade demográfica, urbanização e industrialização promove um processo de proletarização das cidades europeias e norte-americanas. A grande multidão passa a ser presença constante nesse mundo urbano-industrial e, consequentemente, surgem os problemas sociais relacionados a essa presença. Desse modo, ainda no século XIX, nasce a realidade de uma sociedade de massas. De uma maneira geral, este conceito parte da ideia de que o 52 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 12 - A CULTURA DE Roberto Donato surgimento das grandes multidões força o desaparecimento das individualidades e das identidades culturais dos seus integrantes, a partir de um processo de homogeneização dos gostos e valores. Com o advento das massas, o senso crítico tenderia ao desaparecimento; nasce, assim, uma cultura de massas. A ideia de uma sociedade e cultura de massas nasce atrelada as correntes de pensamentos que apresentam uma visão negativa do fenômeno. Um exemplo é o surgimento da psicologia das massas (Matterland, 1999), que desejava compreender o comportamento coletivizado e “irracional” dessas massas a partir dos conceitos de “sugestão” e “contágio”. As greves e revoltas operárias foram o foco privilegiado de análise dessa concepção. É nítido que essas teorias contribuíram para a tentativa de controle das camadas proletarizadas da população, a partir de parâmetros cientificistas. Diante da uma ameaça coletiva potencialmente incontrolável, foi necessário o desenvolvimento de mecanismos de manipulação e controle. A medicina e a psicologia foram chamadas a contribuir para a criação desses mecanismos. As formas de arte crítica foram substituídas por culturas simples e repetitivas, o intuito disso, é afastar o proletariado de possíveis conscientizações que geraram mudanças na sociedade. (Fonte: http://cartacampinas.com.br/2014/03/teatro-de-opera-de-campinas-pode-ter-custo-anual-demanutencao-de-ate-r-10-milhoes/ ) De forma geral, o surgimento de uma sociedade de massas é interpretado como uma ameaça para a produção cultural do ocidente. As elites europeias viam as massas populares como incapazes de compreender o significado das óperas, dos clássicos da 53 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 12 - A CULTURA DE Roberto Donato literatura, dos grandes artistas da pintura e dos salões de teatro. Esse temor se “confirmou” para essas elites, com o advento da fotografia e, principalmente, do cinema. A subjetividade materializada nas telas dos grandes pintores foi fortemente ameaçada pela objetividade das lentes fotográficas. O processo reflexão contemplativa das artes tradicionais cedeu espaço para a diversão e entretenimento que saem dos mecanismos do cinematógrafo. Seria o cinema uma nova arte ou uma degeneração da arte? Qual seria a relação das massas com o cinema, com a fotografia e com discos fonográficos? As massas populares teriam condições de produzir cultura a partir dessas novas e mecanizadas técnicas? Ou, ao contrário, as massas seriam apenas manipuladas pelas elites dominantes através desses meios de comunicação? Esse questionamento foi o ponto de partida para que um conjunto de cientistas sociais alemães iniciasse uma série de pesquisas sobre a cultura de massas e da indústria cultural. Walter Benjamin, Max Horkheimer e Theodor Adorno, dentre outros, construíram análises fundamentais para a compreensão sociológica sobre esses fenômenos. Com pontos de vista diversos e até opostos entre si, esses pensadores formaram um grupo denominado genericamente de “Escola de Frankfurt”. O centro de produção intelectual dos frankfurtianos foi a Revista para a Pesquisa Social, fundada em 1933. Engajados politicamente na luta contra o nazifascismo, esse pensadores, cada um ao seu modo, utilizaram a sociologia marxista como referência para a construção das suas teorias. Essa escola de pensamento é, até hoje, umas das referências fundamentais da sociologia da cultura. BUSCANDO CONHECIMENTO A cultura de massas é um tema muito estudado pelos sociológicos da cultura, pois representa uma realidade triste da nossa atual sociedade. A ideia de cultura e artes massificadas tem como intuito, favorecer as esferas econômicas e políticas de uma 54 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 12 - A CULTURA DE Roberto Donato determinada sociedade. Controlar os gostos e ações gera nas pessoas uma passividade necessária para a manutenção do status quo1 e o controle da produção e consumo. O pensador Noam Chomsky (1928 – Atual) elegeu 10 técnicas de como os poderosos da sociedade usam para controlar as massas, elas são: 1. Estratégia de distração: Essa técnica procura distrair a população com problemas fúteis, distanciando ela dos verdadeiros problemas da sociedade. 2. Criar problemas e oferecer Soluções: Aqueles que o poder utiliza-se desta tática para ganhar apoio das massas, eles criam problemas e já tem uma solução formulada, assim, eles ganham prestigio e gratidão da população. 3. Estratégia da gradação: Para introduzir uma política considerada irracional ou que só privilegia uma classe específica da sociedade, os poderosos inserem aos poucos para a população não perceber, até estar inserida completamente. 4. Estratégia do deferido: Outra forma para a população aceitar uma decisão que só convém uma parte específica da sociedade, é fazer que eles acreditar que aquela decisão é “dolorosa e necessária” e que não existe outro caminho. 5. Tratar o público como se fossem crianças: Esse método tem como objetivo condicionar as pessoas como se fossem crianças dóceis e que aceita as coisas dos adultos. 6. Usar o emocional mais que o racional: Dar ênfase ao emocional faz as pessoas desligarem o senso crítico. 7. Manter o povo na ignorância: É dar para as camadas pobres uma educação simples e medíocre, sem acesso a conteúdos críticos. 8. Estimular a permanecer na ignorância: É acostumar o povo a gostar da ignorância. 1 Status quo se refere ao estado social onde não ocorrem mudanças nas esferas sociais, econômicas e políticas, beneficiando quem está no poder e controle. 55 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 12 - A CULTURA DE Roberto Donato 9. Reforçar a autoculpabilidade: Estimular o indíviduo que ele é o único responsável pelas coisas que acontecem com ele, por exemplo, a sua situação econômica é resultado exclusivamente dele. 10. Conhecer melhor os outros que a si mesmo: Com avanço da tecnologia e das ciências, o homem se interessou mais nos outros que a si mesmo, não conhecendo os seus limites e qualidades. 56 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - TEORIA TRADICIONAL E TEORIA CRÍTICA Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é compreender as diferenças e definir a teoria tradicional e a teoria crítica. ESTUDANDO E REFLETINDO Max Horkheimer (1885-1973) foi o pensador que desenvolveu as linhas teóricas fundamentais Escola de Frankfurt. Essa responsabilidade se deu tanto por sua posição de diretor do Instituto para a Pesquisa Social, base institucional da Escola de Frankfurt, quanto pela sua preocupação com construção de uma nova forma de teoria que fosse capaz de contribuir com a luta contra as formas de opressão. Esse esforço teórico foi denominado por Horkheimer de teoria crítica. ESTUDANDO E REFLETINDO Para definir as bases de uma teoria crítica, o autor começa com a crítica à concepção tradicional de teoria científica. A ciência, para Horkheimer, foi constituída tradicionalmente por um processo de racionalização do pensamento. Para o autor, a figura fundamental na formação da teoria tradicional foi René Descartes (1596 – 1650). O método cartesiano nasceu de um pressuposto fundamental: os sentidos humanos levam inevitavelmente à ilusão e ao erro. A subjetividade, a emoção humana, fortemente ligada a esses sentidos, deve ser desconsiderada com forma de se encontrar a verdade. A busca pela realidade das coisas deve ser empreendida pelo pensamento lógico, que desconfia de todas as intuições e sensações, apegando-se unicamente nas 57 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - TEORIA TRADICIONAL E TEORIA CRÍTICA Roberto Donato relações causa/efeito e na quantificação dos fenômenos. Ou seja, é através da dedução matemática que a explicação dos fatos ganha explicação irrefutável. Nesse sentido, a busca pela verdade científica deve ser realizada com um processo de simplificação da aparente complexidade dos fenômenos. A natureza, para o pensamento cartesiano, tem um funcionamento mecânico. Por isso, a ciência deve decompor os fenômenos em partes analisáveis, a fim de compreender seus mecanismos de funcionamento interno. Essas considerações, você deve ter percebido, fundamenta a prática científica vigente até os dias atuais e possibilitam a especialização científica tão características de nossas universidades. Horkheimer faz uma análise crítica dessas bases tradicionais do pensamento científico: Na medida em que se manifesta uma tendência nesse conceito tradicional de teoria, ela visa um sistema de sinais puramente matemáticos. Cada vez menor é o número de nomes que aparecem como elementos da teoria e partes das conclusões e preposições, sendo substituídos por símbolos matemáticos na designação de objetos observados. Também as próprias operações lógicas já estão racionalizadas a tal ponto que, pelo menos em grande parte da ciência natural, a formação de teorias tornou-se construção matemática (HORKHEIMER, 1975, p. 126-127). Para o autor, esse processo de racionalização tornou o homem incapaz de compreender a pluralidade do mundo, na medida em que o pensamento lógico tornase a via de acesso para a verdade sobre os fenômenos. Tudo o que não se enquadra à lógica matemática é considerado como falso e ilusório. Além disso, Horkheimer considera que as “verdades” cartesianas são desprovidas de construção histórica: a “verdade” está lá, imutável, e só a ciência é capaz de desvendá-la. A natureza – passiva e matematizada – pode ser assim controlada e dominada. A eficiência e a racionalidade devem estar acima de qualquer coisa, justificando, assim, os modelos de exploração da natureza e do próprio homem. Desse modo, para Horkheimer, o projeto científico tradicional dá suporte para o processo de industrialização em curso. A racionalização da produção industrial eleva a técnica como a capacidade de materialização dessa 58 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - TEORIA TRADICIONAL E TEORIA CRÍTICA Roberto Donato dominação do ser humano sobre a natureza. Assim como, da dominação da burguesia sobre o proletariado, no modelo capitalista de sociedade. O que os cientistas consideram como a essência da teoria, corresponde àquilo que tem constituído de fato sua tarefa imediata. O manejo da natureza física, como também daqueles mecanismos sociais e econômicos determinados requer a informação do material do saber, tal como é, dado em uma estruturação hierárquica das hipóteses. Os progressos técnicos da idade burguesa são inseparáveis desse tipo de funcionamento da ciência (idem, p. 129). BUSCANDO CONHECIMENTO A teoria tradicional tem para Horkheimer, por fim, o objetivo de justificar e fundamentar as relações capitalistas de produção. A teoria em sentido tradicional, cartesiano, como se encontra em vigor em todas as disciplinas especializadas, organiza a experiência à base de formulações de questões que surgem em conexão com a reprodução da vida dentro da sociedade atual. Os sistemas de disciplinas contêm os conhecimentos de tal forma que sob circunstâncias dadas, são aplicáveis ao maior número de possível de ocasiões. A gênese social dos problemas, as situações reais nas quais a ciência é empregada e nos fins perseguidos em sua aplicação são por ela mesma consideradas exteriores (ibidem, p. 163). A partir dessas críticas à concepção tradicional de teoria científica, Horkheimer tenta construir sua teoria crítica. Quais seriam as inovações necessárias ao conhecimento para a fundamentação dessa nova teoria? O autor defende a posição de que o conhecimento nunca pode ser construído sem levar em consideração a contextualização social e histórica dos fenômenos que devem ser analisados teoricamente. Ou seja, é necessário levar em consideração os interesses sociais e políticos de determinado momento histórico, para, desse modo, compreender a articulação do fenômeno observado e teorizado com as relações sociais que o produziram. 59 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - TEORIA TRADICIONAL E TEORIA CRÍTICA Roberto Donato A teoria crítica da sociedade, ao contrário, tem como objeto os homens como produtores de todas as suas formas históricas de vida. As situações efetivas, nos quais a ciências se baseia, não é para ela uma coisa dada, cujo único problema estaria na mera constatação e previsão segunda as leis da probabilidade. O que é dado não depende apenas da natureza, mas também do poder do homem sobre ela. Os objeto e espécie de percepção, a formulação das questões e o sentido da resposta dão provas da atividade humana e do grau do seu poder (idem). Se a teoria tradicional cartesiana isola os fenômenos de suas condições históricas e naturais para compreendê-los em sua “essência” matemática, a teoria crítica deseja, por sua vez, compreender os fenômenos, a partir de suas condições materiais de existência. Em outras palavras: a teoria crítica pretende, antes de tudo contextualizar os fenômenos a serem observados em suas condições históricas, atrelados às atividades humanas, que propiciam seu aparecimento. Horkheimer acredita que análises críticas das condições sociais de surgimento dos fenômenos econômicos e socioculturais é o caminho para a libertação dos homens da opressão no capitalismo. No entanto, Horkheimer, assim como Adorno, não adotam uma postura marxista pura e simples. Para esses autores, Marx oferece um ponto de partida para a teoria crítica. No entanto, sabe-se que uma formulação deve buscar inspiração em outros autores. Horkheimer não considera o desenvolvimento da civilização ocidental sobre o prisma do progresso e do contínuo aperfeiçoamento; tampouco acredita no potencial revolucionário do proletariado, tal como Marx. Horkheimer pega algumas influências do marxismo, como a divisão de classes e o capitalismo opressor, mas discorda da teoria quando ela afirma na evolução do homem e no potencial da revolução.·. (fonte: http://www.tocadacotia.com/cultura/historia/revolucao-proletaria ) 60 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - ADORNO E A INDÚSTRIA CULTURAL Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Propiciar conhecimentos sobre a Indústria Cultural ESTUDANDO E REFLETINDO A partir da teoria crítica, Horkheimer e Adorno desenvolveram sua concepção sobre os efeitos do processo de industrialização da arte e da cultura. Para os autores, esse processo de massificação não produz cultura. Produz, ao contrário, um conjunto de mecanismos de esvaziamento da criatividade humana. Os valores e concepções não são produzidos pelas massas, mas imposto a elas num processo determinado pela indústria do entretenimento. Controlada pelos que detêm o poder econômico, as técnicas de comunicação de massa colocam-se a serviço do processo de alienação. Por enquanto, a técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção em série, sacrificando o que fazia a diferença entre a lógica da obra e a do sistema social. Isso, porém, não deve ser atribuída a nenhuma lei evolutiva da técnica enquanto tal, mas à sua função na economia atual. A passagem do telefone ao rádio separou claramente os papéis. Liberal, o telefone permitia que os participantes ainda desempenhassem o papel de sujeito. Democrático, o rádio transforma-os a todos igualmente em ouvintes, para entregá-los autoritariamente aos programas, iguais uns aos outros, das diferentes estações (idem, p.114). A indústria cultural fundamenta-se, para o frankfurtianos, numa homogeneização da linguagem e dos formatos dos programas. A linguagem utilizada é uma tendência à simplificação da mensagem e está a serviço da tentativa de atingir o público de forma mais direta. Nesse sentido, não há espaço para experimentalismo. A busca é por fórmulas prontas de constituição de entretenimento. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 61 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - ADORNO E A INDÚSTRIA CULTURAL Roberto Donato O esquematismo do procedimento mostra-se no fato de que os produtos mecanicamente diferenciados acabam-se por se revelar sempre a mesma coisa. (...) não somente os tipos de canções de sucesso, os astros e a novelas ressurgem ciclicamente com invariantes fixos, mas o conteúdo específico do espetáculo ele próprio derivado deles e só varia na aparência os detalhes tornam-se fungíveis. A breve sequência de intervalos, fácil de memorizar, como demonstrou a canção de sucesso; o fracasso temporário do herói que ele sabe suportar como good Sport que é; (...) são como detalhes, clichês prontos para serem empregados aqui e ali e completamente definidos pela finalidade que lhes cabe no esquema (idem, p. 118). BUSCANDO CONHECIMENTO A indústria cultural tem por objetivo, ainda, fundir a experiência cotidiana com as imagens produzidas. Isso possibilita a repressão das capacidades criativas do espectador, assim como influencia diretamente na satisfação dos seus desejos. Adorno e Horkheimer recorrem ao pensamento freudiano para demonstrar o efeito moralizador e repressor dessa fusão sobre a sexualidade dos espectadores. Por trás do erotismo amplamente divulgado nos filmes e programas de televisão, não se constitui uma concepção de sexualidade livre de preconceitos e amarras morais. O que ocorre é um processo de paralisação repressiva dos desejos sexuais. O disponível torna-se inatingível. A indústria cultural não sublima, mas reprime. Expondo repetidamente o objeto de desejo, o busto no suéter e o torso nu do herói esportivo ela apenas excita o prazer preliminar não sublimado que o hábito da renúncia há muito mutilou reduziu ao masoquismo. Não há nenhuma situação erótica que não junte à alusão e à excitação a indicação precisa de que jamais deve ser chegar a esse ponto. (...) As obras de arte são ascéticas e sem pudor, a indústria cultural é pornográfica e puritana. A produção em série do objeto sexual produz automaticamente seu recalcamento (ibidem, p. 131). CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 62 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - ADORNO E A INDÚSTRIA CULTURAL Roberto Donato Assim temos, ao mesmo tempo, um mecanismo de controle social com uma eficácia sem precedentes e um instrumento de reprodução das relações capitalistas de produção. Ou seja, a promoção de uma passividade psicológica dos indivíduos leva-os à necessidade de satisfação de desejos imediatistas de consumo. O criar é substituído pelo consumir. Isso não acontece sem o indivíduo assumir um sentimento de impotência. Destituído de potencialidades criadoras, só resta a ele consumir aquilo que é produzido pelos meios industrializados. A indústria cultural exerce um poder sobre a atividade libidinosa dos indivíduos, moldando-os para melhor controla-los. (Fonte: http://www.mundodastribos.com/programas-de-tv-estimulam-sexualidade-em-adolescentes.html ) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 63 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 13 - ADORNO E A INDÚSTRIA CULTURAL Roberto Donato Tudo se torna mercadoria. Do chinelo ao sorriso de um ator de cinema, tudo deve promover uma (in) satisfação só acessível pelo comércio. Por isso, a dinâmica do capital monopolista se realiza plenamente na indústria cultural. A cultura é uma mercadoria paradoxal. Ela está tão completamente submetida a lei de troca que não é mais trocada. Ela se confunde tão cegamente com uso que não se mais usá-la. É por isso que ela se funde com a publicidade. (...) Os motivos são marcadamente e econômicos. (...) Ela consolida os grilhões que encadeiam os consumidores às grandes corporações. Só quem pode pagar continuamente as taxas exorbitantes cobradas pelas agências de publicidade, (...), isto é quem já faz parte do sistema ou é cooptado com base nas decisões do capital bancário e industrial, pode entrar como vendedor no pseudomercado. Os custos de publicidade, que acabam por retornar aos bolsos das grandes corporações, poupam as dificuldades de eliminar pela concorrência os intrusos indesejáveis (idem, p. 151-152). Por fim, os autores consideram o aparecimento de um obscurantismo moderno como resultado desse processo de industrialização da cultura. A racionalidade científica, supostamente desenvolvida para libertar o ser humano das amarras da ignorância e das concepções religiosas, acabou por promover uma nova fase de cegueira coletiva, de produção artificial de sentimentos e de transformação dos desejos em mercadoria. Nesse sentido, para Adorno e Horkheimer, a adoção dos valores consumistas pela democrática sociedade estadunidense da década de 1950 obedece aos mesmos princípios dos valores nazistas assumidos pela Alemanha na década 1930: ambos são frutos a industrialização da cultura. O consumo exacerbado, de acordo com Adorno e Horkheimer, seguem a mesma lógica de domínio do partido Nazista, é controlando e aprisionando o homem mentalmente é a melhor forma de controle da sociedade. (Fonte: http://magazinebrasil.blogspot.com.br/2013/12/espirito-natalino-e-consumismo.html) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 64 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - WALTER BENJAMIN (1882 – 1940) E A CRÍTICA DA REPRODUÇÃO DA ARTE Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é propiciar ao aluno, conhecimento sobre a crítica realizada do filósofo/sociólogo Walter Benjamin (1882 – 1940) a respeito da arte nas sociedades modernas. ESTUDANDO E REFLETINDO Walter Benjamin e a reprodutibilidade técnica da arte. Walter Benjamin (1882 – 1940) é atualmente considerado uns dos pensadores mais interessantes do século XX. No entanto, em vida, Benjamin foi bastante incompreendido pelo tratamento inovador aos temas pelos quais se interessava. Sua tese de livre-docência – “Origem do drama barroco alemão” – foi, por exemplo, rejeitada pela universidade de Frankfurt, pelo teor crítico em relação ao conservadorismo intelectual alemão do seu tempo. Judeu e marxista, Benjamin foi perseguido dentro e fora da Alemanha pelos nazistas. Em 1940, tentou atravessar a fronteira da França com a Espanha, para, assim, refugiar-se da perseguição nazista nos EUA. Diante das dificuldades da fuga e da possibilidade de ser preso e entregue aos nazistas pelos espanhóis, cometeu suicídio, ao tomar uma grande quantidade de morfina. Benjamin foi um dos pensadores que, na década de 1930, contribuíram para combater a tendência economicista na sociologia marxista. Até então, a produção sociológica dessa corrente estava preocupada em compreender a organização econômica da sociedade capitalista, como forma de buscar elementos teóricos que CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 65 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - WALTER BENJAMIN (1882 – 1940) E A CRÍTICA DA REPRODUÇÃO DA ARTE Roberto Donato agregassem valores à luta revolucionária socialistas dos trabalhadores. Os aspectos culturais são analisados de forma secundária por essa tendência economicista. Benjamin parte do princípio de que, a partir do século XX, a industrialização passa a produzir não somente bens materiais, mas, principalmente, bens culturais. Nesse sentido, era fundamental compreender, do ponto de vista sociológico e revolucionário, como esta industrialização dos bens culturais poderia alienar ou libertar o proletariado. Em “a obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica” (1975), escrita em 1936, Benjamim coloca a questão da seguinte forma: Na época em que Marx empreendeu sua análise, o modo de produção capitalista ainda estava em seus primórdios. Marx soube orientar sua pesquisa de modo a lhe conferir um valor de prognóstico. Remontando às relações fundamentais, pode prever o futuro do capitalismo. (...) Como as superestruturas evoluem bem mais lentamente do que as infra-estruturas, foi preciso mais de meio século para que a mudança advinda nas condições de produção fizesse sentir seus efeitos em todas as áreas culturais. Dessas constatações, devem-se extrair determinados prognósticos, menos, (...), dos aspectos da arte proletária, após a tomada de poder pela classe operária (...) do que a respeito das tendências evolutivas da arte dentro das condições atuais de produção (BENJAMIN, 1975, p. 11). Semelhante a todo bom marxista de seu tempo, Benjamin acreditava na inevitável chegada da revolução socialista como produto das contradições do próprio modo de produção capitalista. A citação demonstra, no entanto, que o autor desejava, mais do que prever como seria uma cultura socialista, compreender as potencialidades revolucionárias do processo de industrialização dos bens culturais. As tecnologias científicas trouxeram uma nova forma de produção e circulação da arte. A capacidade de reprodução em massa das manifestações artísticas seria, para Benjamin, o ponto fundamental desse processo de industrialização; por isso mesmo, é na reprodutibilidade técnica da arte que reside esse potencial revolucionário. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 66 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - WALTER BENJAMIN (1882 – 1940) E A CRÍTICA DA REPRODUÇÃO DA ARTE Roberto Donato Com o advento do século XX, as técnicas de reprodução atingiram tal nível que, em decorrência, ficaram em condições não apenas de se dedicar a todas as obras de arte do passado e de modificar de modo bem profundo os seus meios de influência, mas elas próprias se imporem como formas originais de arte (idem, p. 12). Assim, para Benjamin, a reprodução das peças artísticas tem a capacidade de transformar a relação entre artista e publico: para se contemplar “A Última Ceia”, de Leonardo da Vinci, não é mais necessário ir ao convento de Santa Maria delle Grazie, em Milão – Itália. Pode-se comprar uma reprodução do original numa papelaria; a dramatização de um ator pode ser reproduzida diversas vezes e demonstrada a diferentes públicos em diferentes países, desde que ela tenha sido cinematograficamente gravada. Esse ator não necessita estar presente para entreter seu público. Esse processo implica, ao mesmo tempo, um distanciamento e uma aproximação entre artista e seu público. Como assim? Ora, ao não ser necessário presenciar a execução de um concerto musical para escutar sua música, perde-se toda a “entrega” emocional dos músicos no momento exato da produção da sua obra de arte; desperdiça-se parte significativa da dramatização de um ator quando não estamos no mesmo ambiente de execução da arte, caso do teatro. Eis um caso de distanciamento. Por outro lado, surge certa aproximação entre artista e público, quando, graças à captação dos microfones, assimilamos certos detalhes sonoros que não seriam perceptíveis numa execução musical ao vivo. Um locutor de rádio fala a milhões de ouvintes simultaneamente, gerando a sensação de dirigir-se a cada um deles diretamente. Para Benjamin, esse processo implica a destituição de um componente essencial à arte antes de sua tecnicidade: o “hic et nunc” ou a “aura” do objeto artístico. Quanto ao primeiro: CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 67 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - WALTER BENJAMIN (1882 – 1940) E A CRÍTICA DA REPRODUÇÃO DA ARTE Roberto Donato À mais perfeita reprodução falta sempre algo: o hic et nunc da obra de arte, a unidade de sua presença no próprio local onde se encontra. (...) O hic et nunc do original constitui aquilo que se chama de sua autenticidade. (...) A própria noção de autenticidade não tem sentido para uma reprodução, seja ela técnica ou não. Pode ser que as novas condições assim criadas pelas técnicas de reprodução, em paralelo, deixem intacto o conteúdo da obra de arte; mas, de qualquer maneira, desvalorizam seu hic et nunc (idem, p.13). BUSCANDO CONHECIMENTO A desvalorização do hic et nunc – o aqui e agora – da obra de arte, implica a incapacidade de ela trazer em si o testemunho histórico daquilo que desejava representar. Explico. A reprodução de um quadro de Michelangelo torna lisa uma superfície que, no seu original, estaria marcada pelas pinceladas do mestre. Essas pinceladas trazem o testemunho sutil do momento exato no qual a obra foi executada. De alguma maneira, está contido naquela superfície o espírito da Itália renascentista, da qual Michelangelo foi um representante ilustre. Essa historicidade se perde irremediavelmente, tornando a obra radicalmente atual, passando a representar mais as condições contemporâneas de sua reprodução do que o momento no qual foi originalmente produzida. Numa bonita passagem de seu texto, Benjamin descreve esse fenômeno da seguinte maneira: Poder-se ia resumir todas essas falhas, recorrendo-se à noção de aura, e dizer: na época das técnicas de reprodução, o que é atingido na obra de arte é a sua aura. Esse processo tem valor de sintoma, sua significação vai além do terreno da arte. (...) Multiplicando as cópias, elas transformaram o evento produzido apenas uma vez num fenômeno de massas. Permitindo ao objeto reproduzido oferecer-se à visão e à audição, em quaisquer circunstâncias, conferem-lhe atualidade permanente. Esses dois processos conduzem a um abalo considerável da realidade transmitida – a um abalo da tradição, que se constitui na contrapartida da crise que passa a humanidade e a sua renovação atual. Estão em estreita correlação com os movimentos de massa hoje produzidos. Seu agente mais eficaz é o cinema. Mesmo considerado sob forma mais positiva (...) não se pode apreender a significação social do cinema, caso seja negligenciado o seu aspecto destrutivo e catártico: a liquidação do elemento tradicional dentro da herança cultural (idem, p. 14). CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 68 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - WALTER BENJAMIN (1882 – 1940) E A CRÍTICA DA REPRODUÇÃO DA ARTE Roberto Donato Para Benjamin, a reprodutibilidade das obras artísticas gera a perca da aura da obra, perde também o valor histórico contido em cada pincelada que, o apreciador não terá conhecimento. (Fonte: http://tecnogeek.com.br/onde-estara-a-monalisa-de-verdade-dna-esclarecerao-enigma/ ) CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 69 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - O CINEMA E A CONSCIENTIZAÇÃO DO PROLETARIADO Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é entender o funcionamento do cinema como ferramenta conscientizadora da classe proletária. ESTUDANDO E REFLETINDO O desaparecimento da aura pela reprodutibilidade técnica da arte trouxe para a cultura um fenômeno central no processo de modernização capitalista, que Marx denominou de “autodestruição criativa” (MARX & ENGELS, 1977, p. 24). Ou seja, uma das características da modernidade concentra-se no processo incessante de destruição do velho para a construção do novo. O carro novo torna-se velho rapidamente; precisamos, assim, de um novo carro novo. Esse “precisamos” ganha uma dupla dimensão: é uma necessidade material – a depreciação da máquina – e uma necessidade “espiritual” – o de adquirir status e respeitabilidade pela capacidade de consumir novas mercadorias. Com o cinema, a fotografia, o rádio e a imprensa mecanizada, este processo ininterrupto de atualização chega ao domínio da produção dos valores e das concepções. A obra de arte está desencantada e racionalizada. O consumidor da arte enxerga nela apenas as marcas do seu próprio tempo. Desse modo, o desaparecimento da aura implica a produção industrializada da arte e sua transformação em mercadoria. Implica, portanto, a modificação das relações sociais de produção da arte. Repetição, divisão do trabalho e alienação inserem-se na produção artística. (...) o intérprete do filme sente-se estranho frente à sua própria imagem que lhe apresenta à câmera, de início, tal sentimento se parece com o de todas as pessoas, quando se olham no espelho. Mas, daí em diante, a sua imagem no espelho separa-se do indivíduo e torna-se transportável. E aonde a levam? Para o público. Trata-se de um fato do qual o ator cinematográfico permanece sempre consciente. (...) Nesse mercado dentro do qual não vende apenas a sua CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 70 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - O CINEMA E A CONSCIENTIZAÇÃO DO PROLETARIADO Roberto Donato força de trabalho, mas também a sua pele e seus cabelos, seu coração e seus rins, quando encerra um determinado trabalho, ele fica nas mesmas condições de qualquer produto fabricado (BENJAMIN, 1975, p. 11). Benjamin interpreta esse processo de desencantamento da obra de arte de forma dúbia. A desvalorização da aura é, ao mesmo tempo, destrutiva e construtiva: perde-se a sacralidade da obra de arte, seu testemunho histórico e a capacidade de se contemplar individualmente os objetos artísticos; no entanto, a arte torna-se instrumento de politização, de reflexão crítica da coletividade diante dos problemas sociais. A fim de se estudar a obra de arte na época de sua reprodução, é preciso levar na maior conta esse conjunto de relações. Elas colocam em evidência um fato verdadeiramente decisivo e o qual vemos aqui aparecer pela primeira vez na história do mundo: a emancipação da obra de arte com relação à existência parasitária que lhe era imposta pelo seu papel ritualístico. (...) Mas, desde que o critério de autenticidade não é mais aplicável à produção artística, toda a função da arte fica subvertida. Em lugar de se basear sobre o ritual, ela se funda, doravante, sobre outra forma de práxis: a política (idem, p 17). Esse processo de politização da arte e da cultura tem condições, na perspectiva de Benjamin, de dotar as massas proletarizadas em massas revolucionárias. O cinema tem a peculiaridade de unir fruição (prazer) com senso crítico. No cinema, o público não separa crítica de fruição. Mais do qualquer outra parte, o elemento decisivo aqui é que as reações individuais, cujo conjunto constitui a reação maciça do público, ficam determinadas desde o começo pela virtualidade imediata de seu caráter coletivo. Ao mesmo tempo em que se manifestam, essas reações se controlam mutuamente (ibidem, p.23). Benjamin argumenta que esse controle das reações individuais permite o entrelaçamento do entretenimento puro e simples com o olhar crítico sobre a realidade que é representada pelas telas do cinema. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 71 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - O CINEMA E A CONSCIENTIZAÇÃO DO PROLETARIADO Roberto Donato Mas o homem que se diverte também pode assimilar hábitos; diga-se mais é claro que ele não pode efetuar determinadas atribuições, num estado de distração, a não ser que elas se tenham tornado habituais. Por essa espécie de divertimento, pela qual ela tem o objetivo de nos instigar a arte nos confirma tacitamente que o nosso modo de percepção está hoje apto a responder novas tarefas. E como, não obstante o indivíduo alimenta a tentação de recusar essas tarefas, a arte se entrega àquelas que são mais difíceis e importantes, desde que possa mobilizar as massas. É o que ela faz agora, graças ao cinema. Essa forma de acolhida pela seara da diversão, cada vez mais sensível nos dias de hoje, em todos os campos da arte, e que é também sintoma de modificações importantes quanto à maneira de percepção, encontrou, no cinema, o seu melhor terreno. Através do seu efeito de choque, o filme corresponde a essa forma de acolhida. Se ele deixa em segundo plano o valor de culto da arte, não é apenas porque transforma cada espectador em aficionado, mas porque a atitude desse aficionado não é produto de nenhum esforço de atenção. O público das salas obscuras é bem um examinador, porém um examinador que se distrai (ibidem, p.32-33). Além do aspecto negativo da perda da aura nas obras artísticas, Benjamin viu uma oportunidade de conscientizar a camada trabalhadora por meio do cinema. (Fonte: http://revistaoque.com/tempos-modernos-charles-chaplin/ ) BUSCANDO CONHECIMENTO Para Benjamin, o cinema pode orientar a construção de uma consciência de coletividade, através do hábito e da circulação de gostos em seu público. Essa consciência coletiva pode ser orientada criticamente para a formação de uma massa revolucionária, capaz de transformar a sociedade capitalista em prol de experiências socialistas. Isso significa afirmar que Benjamin tece uma interpretação positiva da cultura de massas. O ser humano proletarizado pela fábrica e massificado pela arte tecnificada é o componente essencial da revolução desejada pelos marxistas. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 72 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 15 - O CINEMA E A CONSCIENTIZAÇÃO DO PROLETARIADO Roberto Donato Finalmente, a aceitação do cinema em nosso mundo contemporâneo deve muito à interpretação progressista de Walter Benjamin. O cinema, como crítica social, como instrumento de educação ou sensibilização de modos de vida diferenciados ao nosso tem sido constantemente estimulado, como forma de amenizar a tendência hollywoodiana do entretenimento cinematográfico alienador. No entanto, essa interpretação esperançosa da obra de arte não foi totalmente aceita pela Escola de Frankfurt. Horkheimer e Adorno tinham um posicionamento muito mais crítico ao processo de industrialização da arte. Para eles, o rádio, o cinema e a disco não eram instrumentos de libertação; antes instrumentos de aprisionamento do ser humano. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 73 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 16 - A INFLUÊNCIA NIETZSCHEANA NA TEORIA CRÍTICA Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE O objetivo desta unidade é entender a crítica realizada pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche a cultura moderna. ESTUDANDO E REFLETINDO O filósofo alemão Friedrich Wilhelm Nietzsche (1844 – 1900), refletiu sobre a modernidade, enfatizando os seus aspectos destrutivos. A razão classificadora e ordenadora separou a existência em domínios distintos: humanidade e natureza, pensamento e corpo: uns sujeitos superiores, outros objetos manipuláveis. O domínio do corpo e da natureza pelo pensamento humano levou à ideia, ilusória segundo o filósofo, de que a “superioridade” humana poderia controlar todos os fenômenos. Assim, o processo de racionalização e desencantamento do mundo levaria a um processo de “coisificação”, onde tudo perderia o sentido. O sentido histórico quando reina irrefreado e traz todas as suas consequências, erradica o futuro, porque destrói as ilusões e retira às coisas sua atmosfera, somente na qual elas poderiam viver. A justiça histórica, mesmo quando é exercida efetivamente e em intenção pura, é uma virtude pavorosa, porque sempre solapa o que é vivo e o faz cair: seu julgamento é sempre uma condenação à morte. Quando por trás do impulso histórico não atua nenhum impulso construtivo, (...) então o instinto criador é despojado de sua força e seu ânimo (NIETZSCHE, 1983, p. 65). O filósofo alemão se distancia da tendência moderna do culto a razão, o seu objetivo está em destruir a imagem boa e poderosa que, desde a antiguidade vem sendo criada para justificar o uso da razão. A razão não passa de uma limitadora da vida, de um artifício para controlar os fortes por natureza, aqueles em que a vontade de viver - os instintos naturais, fala mais alto e guiam eles rumo a uma vida autêntica. Por meio da razão, comenta Nietzsche, o homem negou essa vontade e criou a filosofia e a 74 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 16 - A INFLUÊNCIA NIETZSCHEANA NA TEORIA CRÍTICA Roberto Donato religião para dominar os fortes e negar a este mundo. A origem do niilismo1 iniciou-se com Sócrates de Atenas (469 a.C. – 399 a.C.) e sua doutrina da alma, depois Platão (428 a.C. – 348 a.C) intensificou essa ideia, criando a divisão da realidade em dois mundos: o mundo das Ideias e o mundo das cópias. Para ele, o mundo sensível é um mundo falso, onde só existe imperfeição e ilusão, essa ideia serviu como base para a religião cristã e sua doutrina que condena esse mundo, condenando também a vida sensível. Essas características fundamentais de modernidade estão presentes no pensamento teóricos da sociologia da cultura que analisamos no módulo anterior. Benjamin, Horkheimer e Adorno, cada um à sua maneira, pensaram o processo de massificação da cultura a partir desses princípios de definição de um mundo moderno. Walter Benjamin, mais fiel à concepção marxista de modernidade, entendeu esse processo de massificação através da chegada da técnica industrial à arte e aos meios de comunicação. Para ele, esse processo era destrutivo e criativo. A reprodutibilidade técnica destruiu antigos vínculos da arte com a experiência sagrada – mítica ou religiosa – através da desvalorização da aura. Mas, ao mesmo tempo, o autor considerava que a diversão cinematográfica possibilitaria a circulação de posições críticas sobre a sociedade, capaz, inclusive, de estimular movimentos revolucionários. Através de sua crítica a racionalização e moralidade ocidental, Nietzsche influenciou o pensamento dos teóricos da escola de Frankfurt. (Fonte: http://en.wikipedia.org/wiki/Friedrich_Nietzsche ) 1 Niilismo significa “culto ao vazio”, isso ocorre quando o homem nega a sua realidade para viver algo que ele não tem certeza que existe. Não consegue viver nem os valores desta realidade e da outra realidade. 75 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 16 - A INFLUÊNCIA NIETZSCHEANA NA TEORIA CRÍTICA Roberto Donato A massificação da cultura poderia conter as condições de desenvolvimento de uma nova sociedade, a socialista, na qual o homem proletarizado e massificado seria o redentor. Harvey nos apresenta uma boa síntese da visão de Benjamin sobre modernidade: Os fatos dessa vida (...) tiveram mais do que uma influência passageira sobre a sensibilidade estética criada, por mais que os próprios artistas proclamassem uma aura de “arte pela arte”. Para começar, como Benjamin assinalou em seu célebre ensaio (...), a capacidade técnica mutante de reproduzir, disseminar, e vender livros e imagens a públicos em massa, e a invenção de fotografia e, depois, do filme (ao que hoje acrescentamos o rádio e a televisão), mudaram radicalmente as condições materiais de existência dos artistas e, portanto, seu papel social e político. E, sem relação com a consciência geral do fluxo e da mudança presente em todas as obras modernistas, um fascínio pela técnica, pela velocidade e pelo movimento, pela máquina e pelo sistema fabril, bem como pela cadeia de novas mercadorias que penetravam na vida cotidiana, provocou uma nova gama de respostas estéticas que iam da negação à especulação sobre especulação utópicas, passando pela imitação (HARVEY, 2007, p. 32). Horkheimer e Adorno, por sua vez, combinaram a visão marxista com a percepção nietzscheana sobre a modernidade. Essa combinação pode ser apreciada na frase anteriormente citada: “a maldição do progresso irrefreável é a irrefreável regressão” (ADORNO & HORKHEIMER, 1999, p. 54). O pessimismo dos dois autores sobre a indústria cultural expressa a ideia de que a massificação é um resultado indesejado, mas inevitável, do projeto iluminista. O século XX – com seus campos de concentração e esquadrões da morte, seu militarismo e duas guerras mundiais, sua ameaça de aniquilação nuclear e sua experiência de Hiroshima e Nagasaki – certamente deitou por terra esse otimismo. Pior ainda, há a suspeita de que o projeto do iluminismo estava fadado a voltar-se contra si mesmo e transformar a busca da emancipação humana num sistema de opressão universal em nome da libertação humana. Foi essa a atrevida tese apresentada por Horkheimer e Adorno em A dialética do esclarecimento. Escrevendo sob as sombras da Alemanha de Hitler e da Rússia de Stálin, eles alegavam que a lógica que se oculta por trás da racionalidade iluminista é uma lógica da dominação e da opressão. A ânsia por dominar a natureza envolvia o domínio dos seres humanos, o que no final só poderia levar a uma tenebrosa condição de autodominação. A revolta da natureza, na qual eles apresentavam como única saída para o impasse tinha, portanto de ser concebida como uma revolta da natureza humana contra o poder opressor da 76 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 16 - A INFLUÊNCIA NIETZSCHEANA NA TEORIA CRÍTICA Roberto Donato razão puramente instrumental sobre a cultura e a personalidade (HARVEY, 2007, p. 32). BUSCANDO CONHECIMENTO A ciência e a técnica industrializaram a consciência dos indivíduos e os entregaram ao consumo impensado, seja de mercadorias ou de ideologias políticas. Isso implica uma extensão dos elementos racionalizadores a todas as esferas da sociedade, inclusive a cultura, e, consequentemente, o ponto máximo de desenvolvimento da modernidade. Essa extensão foi demonstrada pelos frankfurtianos de forma original. Pode-se afirmar, então, que esses autores foram fundamentais para os movimentos sociais e políticos que proliferaram a partir da década de 1960. Eles deram suporte teórico para a contestação dos padrões modernos de sociabilidade. Esses autores contribuíram, finalmente, para se compreender que a modernidade chegou ao auge das suas possibilidades. E, talvez, o momento de sua superação... 77 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 17 - A CULTURA CONTEMPORÂNEA SEGUNDO MORIN E DEBORD Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Explicitar as ideias de cultura contemporânea segundo Morin e Debord. ESTUDANDO E REFLETINDO Partir da década de 1960, surgem novas concepções teóricas sobre a cultura de massas. Essas concepções tendem a compreender a massificação da cultura, não como um reflexo inevitável da dinâmica econômica do capitalismo, mas, sobretudo, como capaz de transformar e de se descolar do próprio processo econômico que lhe deu o impulso. Edgar Morin (1921 – Atual.), um dos propositores de uma nova concepção de modernidade, passa a compreender a cultura de massas como uma religião terrena. A cultura de massa é um embrião da religião da salvação terrestre, mas falta-lhe a promessa da imortalidade, o sagrado e o divino para realizar-se como religião. Os valores individuais por ela exaltados – amor, felicidade, auto-realização – são precários e transitórios; o indivíduo terrestre e mortal, fundamento da cultura de massa, é ele próprio o que há de mais precário e transitório; essa cultura está comprometida com a História em movimento, seu ritmo é o da atualidade, seu modo de participação é lúdico-estético, seu modo de consumo é profano, sua relação com o mundo é realista (MORIN, 1990, p.167). Diferentemente da concepção adorniana de que a massificação da cultura é mero reflexo da universalização do processo de industrialização, Morin encara a cultura de massa como propulsora de um novo tipo de ação humana na realidade que passa a orientar esse processo. O que constitui a originalidade, a especificidade da cultura de massa é a direção de uma parte do consumo imaginário, pela orientação dos processos de identificação, para as realizações. Nas sociedades ocidentais esse desenvolvimento do consumo imaginário provoca um aumento da procura real, das necessidades reais (elas mesmas cada vez mais embebidas do imaginário, como as necessidades de padrão social, luxo, prestígio); o crescimento econômico caminha num sentido que parecia incrível um século atrás: realizar o imaginário (idem, p.168). 78 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 17 - A CULTURA CONTEMPORÂNEA SEGUNDO MORIN E DEBORD Roberto Donato Como resultado dessa orientação da realidade pela cultura de massa, nasce um processo bifurcado, que torna a mentalidade humana ao mesmo tempo homogênea e individualizada; objetiva e subjetiva; microcósmica e macrocósmica. A promoção do individualismo é realizada partir da ideia de que esse indivíduo pode ter acesso a possibilidades cósmicas. A massificação permite que uma viagem espacial seja apropriada pelo mais simples trabalhador de uma linha de produção, afundado em seu cotidiano repetitivo. Daí essa contradição dialética que se apodera, dos homens e do universo tecnicizado. Os homens sofrem em seu próprio ser os processos de objetivação, mas, ao mesmo tempo, ficam impregnados de valores subjetivos estéticos. Assim, a dupla natureza da cultura de massa, tecnicista e contratecnicista, abstrata e concreta, objetivadora e subjetivadora, industrial e individualista encontra seu fundamento no próprio fundamento da técnica (ibidem, p. 173). Porém, diferentemente de Horkheimer e Adorno, Morin não se torna um pessimista quanto aos resultados civilizatórios da proliferação da cultura de massas. Para o autor, a valorização máxima do individualismo realizada pela massificação esconde uma semente de grandiosidade; a busca pela satisfação pessoal imediatista faz esse indivíduo massificado busca sua satisfação numa percepção universal da existência. Podemos, enfim, perceber o seguinte: há na cultura de massa, outra coisa, um aquém e um além, que a prende no devir profundo da humanidade, algo escondido, como uma semente sob o caroço dos mitos do indivíduo privado. Há, moldada, fundida, aglutinada sob a fixação individualista a espera e a busca milenar de mais bondade, mais piedade, mais amor e mais liberdade. (...) Há, no homem que parece esconder-se como um eremita, sob os estranhos objetos de sua propriedade, a cega aspiração à comunicação com o outro. Há no pequeno-burguês televisual uma relação precisamente pelo vídeo com o cosmonauta que navega pelos espaços, e é, por mais tênue que seja, uma relação de pulsação com o mundo, com o Espírito do Tempo... (ibidem, p. 180) 79 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 17 - A CULTURA CONTEMPORÂNEA SEGUNDO MORIN E DEBORD Roberto Donato BUSCANDO CONHECIMENTO A capacidade de Morin em encontrar a grandiosidade humana no exato momento de sua pequeneza, não encontra eco em outro influente pensador dos anos 1960. Guy Debord, a partir de uma crítica ácida ao que ele chama de sociedade do espetáculo, denuncia o processo de estabelecimento das relações humanas, através da proliferação de imagens alienadoras da realidade. Marx, nos anos 1860, escreveu capítulo I de O Capital: “A riqueza das sociedades onde rege a produção capitalista configuração em imensa produção de mercadorias (MARX, 1984, p.41)”. Debord, cem anos depois, escreveu no capítulo I de A Sociedade do Espetáculo: “Toda a vida nas sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente tornou-se representação.” (DEBORD, 1997, p. 13). A sociedade do espetáculo descrita por Debord revela a condição cultural do homem atual que perdeu sua autonomia e vive passivo aos veículos de comunicação (Fonte: http://www.redemegafone.com.br/mensalao-o-circo-e-nenhum-pao-por-mauro-iasi/) A partir da ideia de que a produção, circulação e consumo de imagens espetacularizadas tornaram-se o processo dominante do capitalismo contemporâneo, o autor anuncia a morte do homem que vive experiências reais. As 80 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 17 - A CULTURA CONTEMPORÂNEA SEGUNDO MORIN E DEBORD Roberto Donato imagens espetaculares passam então a mediar às relações sociais entre as pessoas. Como suas teses foram desenvolvidas no momento-auge da Guerra Fria (1965-1967), Debord considerava que a sociedade do espetáculo podia se manifestar de duas formas básicas: a difusa e a concentrada. A primeira, típica das democracias liberais do mundo capitalista, garante uma capa democrática na difusão das imagens que devem ser consumidas pela massa. A segunda forma, concentrada, está fundamentalmente presente nos regimes ditatoriais e totalitários, nos quais a construção do espetáculo está diretamente ligada aos interesses políticos do Estado. Com o fim da guerra fria, Debord atualizou seus conceitos ao afirmar que, no mundo contemporâneo, vigora o espetáculo do tipo “integrado”1: “A sociedade modernizada até o estágio do espetacular integrado se caracteriza pela combinação de cinco aspectos principais: incessante renovação tecnológica, a fusão econômico estatal, o segredo generalizado, a mentira sem contestação e o segredo perpétuo.” (DEBORD, 1997, p. 174). 1 O espetáculo integrado e suas características: “O movimento de inovação tecnológica, que já dura muito tempo, é constitutivo da sociedade capitalista (...). Mas, desde que recebeu seu mais recente impulso (logo após a Segunda Guerra Mundial), ele reforçou ainda mais a autoridade espetacular: por seu intermédio todos se veem inteiramente entregues ao corpo de especialistas, a seus cálculos e seus juízos sempre satisfeitos com esses cálculos. A fusão econômico-estatal é a tendência mais manifesta do século XX; ela se tornou o motor do desenvolvimento econômico recente. A aliança defensiva e ofensiva – firmada entre essa duas forças, a economia e o Estado, garantiu-lhes os maiores ganhos comuns em todos os domínios: pode-se dizer que cada uma das duas possui a outra (...). O segredo generalizado mantém-se por trás do espetáculo, como o complemento decisivo daquilo que mostra e, se formos ao fundo das coisas, como sua mais importante operação. (...) O fato de não ter contestação conferiu à mentira uma nova qualidade. Ao mesmo tempo, a verdade deixou de existir em quase toda a parte, ou no melhor caso ficou reduzida a uma hipótese que nunca poderá ser demonstrada. A mentira sem contestação consumou o desaparecimento da opinião pública (...). A construção de um presente em que a própria moda, do vestuário aos cantores se imobilizou e da impressão de já não acreditar no futuro, foi conseguida pela circulação incessante de informação que a cada instante retorna a uma lista bem sucedida tolices (...) (idem, p. 175-176). 81 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 18 - CULTURA E PÓS-MODERNIDADE Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Propiciar conhecimentos sobre Cultura e Pós Modernidade ESTUDANDO E REFLETINDO Passagem dos anos 1960 para os 1970 marcam um período de grandes transformações, que, de certo modo, determinam o nosso modo ser e se relacionar com o mundo na atualidade. Essas transformações ocupam o centro do debate nas ciências sociais em nossos dias. Muitos pensadores afirmam que atravessamos um período que guarda diferenças fundamentais com a sociedade nascida com a revolução industrial na passagem do século XVIII para o século XIX. Ou seja, estaríamos na passagem de um mundo moderno para um mundo pós-moderno. A modernidade é caracterizada pela autodestruição criadora, pela fé na racionalidade científica e compreensão de mundo como uma totalidade organizada, quais seriam as características fundamentais da pós-modernidade? Poderíamos tentar resolver essa difícil questão, a partir das transformações econômicas surgidas no capitalismo global entre 1960 e 1970. Para Eric Hobsbawn, o período 1945 – 1973 pode ser definido como a “era de ouro” do século XX, período no qual a reconstrução do mundo no pós-guerra teria dado grande impulso ao desenvolvimento econômico capitalista. Fundamentado no modelo fordista de produção industrial, surgiu um novo ímpeto de consumo e de cultura de massa, no qual o consumismo e individualismo tornaram-se os valores fundamentais. A derrota do nazifascismo na II Guerra Mundial (1939-1945) fez surgir um mundo geopoliticamente polarizado (a Guerra Fria) e, em termos culturais, a crença em que o mundo ocidental capitalista era a materialização dos objetivos fundamentais do já discutido projeto iluminista: bem-estar, direitos humanos e progresso econômico. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 82 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 18 - CULTURA E PÓS-MODERNIDADE Roberto Donato No entanto, esse modelo começa a apresentar sinais de enfraquecimento, no final dos anos 1960, dando abertura para uma reorganização sociocultural significativa. David Harvey coloca a questão nos seguintes termos: Aceito amplamente a visão de que o longo de período de expansão de pós-guerra, que se estendeu de 1945 a 1973, teve como base um conjunto de práticas de controle de trabalho, tecnologias hábitos de consumo e configurações de poder político-econômico, e de que esse conjunto pode com razão pode ser chamado de fordista-keynesiano. O colapso desse sistema a partir de 1973 iniciou uma rápida mudança, de fluidez e incerteza (HARVEY, 2007, p.119). Dessas transformações socioeconômicas surge um novo modelo de organização produtiva denominado de “acumulação flexível” ou “toyotismo”. Esse modelo implica um processo de incorporação de novas tecnologias no processo de trabalho que se corporificam na informatização e na robotização das indústrias. A partir dessas possibilidades tecnológicas, ocorre todo um conjunto de transformações na organização do trabalho, no qual a velha linha de produção fordista entra em decadência. O trabalhador passa a integrar uma dinâmica produtiva no qual seu braço perde importância em relação aos mecanismos robotizados de produção. A robotização e informatização agilizam o processo produtivo de tal forma que as indústrias deixam de realizar grandes estoques de mercadorias produzidas, passando a produzir unicamente para a demanda de procura de seus clientes. Ou seja, de forma geral, a produção só acontece após a “solicitação” do consumidor. A produção industrial torna-se flexível: maior demanda, maior produção; menor procura, menor produção. Esse modelo exigiu um novo modelo de relação capital-trabalho, no qual o trabalhador pode ser rapidamente contratado e demitido pelas empresas. Nasce, assim, o que chamamos em sociologia, de flexibilização das relações de trabalho. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 83 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 18 - CULTURA E PÓS-MODERNIDADE Roberto Donato A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo, ela se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e dos padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto em setores como em regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões geográficas até então subdesenvolvidas (...) (idem, p. 140). BUSCANDO CONHECIMENTO No plano sociocultural, vem ocorrendo um conjunto de movimentos e contestações ao modelo dominante de produção cultural, que acompanha esse processo de reestruturação dos padrões econômicos do capitalismo. A rejeição aos modelos de bem-comportados da família e da cultura de massa, vigentes até a década de 1960, passa a estimular a busca de novos padrões de comportamento. Inicia-se, então, um processo de reformulação dos valores culturais que fundamentaram a modernidade – nas artes, na filosofia e nas ciências – a partir de CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 84 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 18 - CULTURA E PÓS-MODERNIDADE Roberto Donato noção fundamental de que a realidade não era mais possível de ser compreendida como uma totalidade articulada. As relações de causa e efeito não seriam mais capazes de explicar a multiplicidade de fenômenos que acontecem na natureza, nas sociedades e nas culturas. Michel Foucault explica essa concepção da seguinte forma: É preciso entender por acontecimento não um tratado, um reino, ou uma batalha, mas uma relação de forças que se inverte, um poder confiscado, um vocabulário retomado e voltado contra os seus utilizadores, uma dominação que se enfraquece, se distende, se envenena e uma ou outra que faz sua entrada mascarada. As forças que se encontram em jogo na história não obedecem nem a uma destinação, nem a uma mecânica, mas ao acaso da luta. (FOUCAULT, 1984, p.28). Assim, a ideia fundamental é que a realidade pode ser considerada um conjunto de colagens, justaposições de práticas sociais, políticas e culturais dificilmente apreendidas de forma total. A cultura não teria correspondência às características socioeconômicas. A proliferação de diferentes modos de vida e a pulverização dos movimentos contestatórios passa a vigorar. O feminismo, o movimento negro, o ambientalismo, as lutas estudantis substituiriam a velha luta revolucionária entre capital e trabalho. É a pós-modernidade... Isso significa que vivemos num mundo “pós-capitalista”? A pós-modernidade não é ruptura total com o mundo moderno. A pós-modernidade radicaliza características propriamente modernas. Nesse sentido, a pós-modernidade pode ser apresentada, segundo Jameson, como a lógica cultural do capitalismo tardio. O que ocorreu é que a produção estética hoje está integrada à produção de mercadorias em geral: a urgência desvairada da economia em produzir novas séries de produtos que cada vez mais pareçam novidades (de roupas a aviões), com um ritmo de turn over cada vez maior, atribui uma posição e uma função estrutural cada vez mais essenciais à inovação estética e ao experimentalismo (JAMESON, 1996, p. 31). CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 85 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 18 - CULTURA E PÓS-MODERNIDADE Roberto Donato Nesse sentido, podemos concluir que a pós-modernidade é a saturação do processo expansão capitalista rumo à integração entre industrialização e cultura, tendência que já tinha sido pensada pelos autores clássicos estudados nessa apostila: Walter Benjamin, Adorno e Horkheimer. Pode-se afirmar, ainda, que não só os meios de comunicação de industrialização, como os próprios bens culturais se tornaram mercadorias vendáveis. Na atualidade, é muito comum afirmar que, para se ter “acesso à cultura”, é necessário estar integrado às dinâmicas de vida das grandes metrópoles, local onde as comunidades teatrais e salas de cinema acabaram por se refugiar. O “status”, em nossa sociedade, não se resume em possuir bens “palpáveis”, mas, também, de consumir bens “culturais”. CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” 86 SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 20 - TECNOLOGIA E CULTURA CONTEMPORÂNEA Roberto Donato CONHECENDO A PROPOSTA DA UNIDADE Objetivos: Compreender o relacionamento entre tecnologia e cultura nos dias atuais. ESTUDANDO E REFLETINDO A inovação tecnológica atingiu os anos 1990, a partir da proliferação de um novo e revolucionário meio de comunicação: a informatização. Sua manifestação mais impressionante, a Internet, questionou o modelo básico de massificação da informação, pautado em emissores de produção de informação para uma multidão de receptores: o rádio, o cinema e a televisão. A Internet proporciona uma comunicação interativa entre seus usuários. Com essas inovações comunicativas, Manuel Castells (1942 – Atual.) propõe o conceito de sociedade em rede: Na segunda metade da década de 90, um novo sistema de comunicação eletrônica começou a ser formado a partir da fusão da mídia de massa personalizada globalizada com a comunicação mediada por computadores. (...) o novo sistema é caracterizado pela integração de diferentes veículos de comunicação e seu potencial interativo. Multimídia, como o novo sistema logo foi chamado estende o âmbito da comunicação eletrônica para todo o domínio da vida: de casa a trabalho, de escolas a hospitais, de entretenimento a viagens (Castells, 2000, p. 387). Quais são as consequências sociais da proliferação do multimídia? Castells destaca quatro características fundamentais: Primeira: diferenciação social e cultural muito difundida levando à segmentação dos usuários/ espectadores/ leitores/ ouvintes. As mensagens não apenas segmentadas pelos mercados mediante as estratégias do emissor, mas também são cada vez mais diversificadas pelos usuários da mídia dos seus interesses (...). Segunda: crescente 87 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 20 - TECNOLOGIA E CULTURA CONTEMPORÂNEA Roberto Donato estratificação social entre os usuários, não apenas opção ficará restrita àqueles com tempo e dinheiro para o acesso (...), mas também as diferenças culturais/educacionais serão decisivas no uso e interação para o proveito de cada usuário. (...) Assim o mundo da multimídia será habitado por duas populações: a interagente e receptora de interação (...). Terceira: a comunicação de todos os tipos de mensagens no mesmo sistema (...) induz a uma integração de todas as mensagens em um padrão cognitivo comum. O acesso a notícias, educação e espetáculos audiovisuais no mesmo meio, mesmo a partir de fontes diferentes intensifica a mistura de conteúdos que já estava ocorrendo na televisão direcionada às massas. (...) Finalmente, a característica mais importante da multimídia seja de ela capta em seu domínio a maioria das expressões culturais em toda a sua diversidade (...) (idem, p. 393394). Diante dessas transformações sem precedentes na cultura de massas, Castells nos apresenta um conceito novo para determinar as características culturais de nosso mundo contemporâneo: a cultura de uma virtualidade real. A realidade é totalmente captada e significada num mundo de imagens virtuais, no qual as aparências se tornam a própria experiência. A sociabilidade entre as pessoas é totalmente mediada pela imagem que compõe suas personalidades e posicionamento expostos no mundo virtual. Ao que parece, Castells entende virtualidade, onde Debord considera espetáculo. Esse mundo do “faz de conta” virtual tem, finalmente, consequências profundas em nossa sociabilidade: O novo sistema de comunicação transforma radicalmente o espaço e tempo, as dimensões fundamentais da vida humana. Localidades ficam despojadas de seu sentido cultural, histórico e geográfico e reintegramse em redes funcionais ou em colagens de imagens, ocasionando um espaço de fluxos que substitui o espaço dos lugares. O tempo é apagado no novo sistema de comunicação já que passado, presente e futuro podem ser programados para interagir entre si na mesma mensagem. Os espaços de fluxos e o tempo intemporal são as bases principais de uma nova cultura que transcende e inclui a diversidade 88 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 20 - TECNOLOGIA E CULTURA CONTEMPORÂNEA Roberto Donato dos sistemas de representação historicamente transmitidos: a cultura da virtualidade real, onde o faz de conta vai se tornando realidade. Parece que as concepções sobre o processo de massificação da cultura nos últimos quarenta anos, através dos autores aqui apresentados, tendem a chamar nossa atenção para dois aspectos não apresentados pelos frankfurtianos: a individualização e a virtualização. Morin nos apresenta a ideia de que a cultura de massa promove o individualismo ao objeto de culto dessa “religião terrena” que é a cultura de massas. Por outro lado, Debord e Castells nos apresentam um mundo contemporâneo destituído de sua base real, no sentido de que só tem materialidade àquilo que é espetacularizado e virtualizado. Com o advento da internet, as relações e noções de espaço e tempo são abaladas profundamente, causando grandes impactos na sociedade. 89 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” SOCIOLOGIA E CULTURA UNIDADE 20 - TECNOLOGIA E CULTURA CONTEMPORÂNEA Roberto Donato BUSCANDO CONHECIMENTO Outro pensador que se interessou pelos estudos de virtualização e da condição da cultura atual, foi o filósofo francês Pierre Lévy (1956 – Atual.). Para ele, o conceito de virtual não se situa muito distante da realidade dos indivíduos, esse conceito não existe somente dentro das máquinas e dos computadores, ele se apresenta na problematização dos meios de comunicação. O virtual não faz oposição ao real, pois o virtual existe, mas como potência, por isso o antônimo de virtual seria o atual. 90 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE ARARAS “DR. EDMUNDO ULSON” – UNAR” POLOS EAD Av. Ernani Lacerda de Oliveira, 100 Bairro: Pq. Santa Cândida CEP: 13603-112 Araras / SP (19) 3321-8000 ead@unar.edu.br Rua Américo Gomes da Costa, 52 / 60 Bairro: São Miguel Paulista CEP: 08010-112 São Paulo / SP (11) 2031-6901 eadsp@unar.edu.br 0800-772-8030 www.unar.edu.br