UNIVERSIDADE DE RIO VERDE (UniRV) FACULDADE DE DIREITO MARIANA ALVES FURQUIM ALTERAÇÃO DE NOME E GÊNERO NO REGISTRO CIVIL DE TRANSEXUAIS RIO VERDE, GO 2017 MARIANA ALVES FURQUIM ALTERAÇÃO DE NOME E GÊNERO NO REGISTRO CIVIL DE TRANSEXUAIS Monografia apresentada à Banca Examinadora do curso de Direito da Universidade de Rio Verde (UniRV) como exigência parcial para obtenção do título de bacharel em Direito. Orientadora: Prof. Esp. Valéria Cristina Garcia Cabral. RIO VERDE, GO 2017 Ficha Catalográfica FURQUIM, Mariana Alves Alteração de nome e gênero no registro civil de transexuais. Rio Verde/GO. 2017. 35 f.:il: 18 cm Monografia (Graduação) apresentada à Universidade de Rio Verde – (UniRV). Faculdade de Direito, 2017. Orientador: Prof. Esp. Valéria Cristina Garcia Cabral 1. Nome. 2. Gênero. 3. Registro Civil. 4. Transexual. Bibliotecária responsável: MARIANA ALVES FURQUIM ALTERAÇÃO DE NOME E GÊNERO NO REGISTRO CIVIL DE TRANSEXUAIS MONOGRAFIA APRESENTADA À BANCA EXAMINADORA DO CURSO DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE RIO VERDE (UniRV) COMO EXIGÊNCIA PARCIAL PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE BACHAREL EM DIREITO. Rio Verde, GO.........de ....................de 2017 BANCA EXAMINADORA .............................................................................................. Prof. Esp. Valéria Cristina Garcia Cabral Universidade de Rio Verde (UniRV) .............................................................................................. Prof. (membro 1) Universidade de Rio Verde (UniRV) .............................................................................................. Prof. (membro 2) Universidade de Rio Verde (UniRV) Aos meus pais, Edivaldo e Cecilia, a minha irmã, aos meus verdadeiros amigos que me incentivaram para que eu chegasse ao fim de mais uma caminhada. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, Edivaldo e Cecilia que a quem devo agradecer pela pessoa que sou. A educação que me foi dada, por estarem sempre me acompanhando, apoiando e torcendo por minha vitória. A minha irmã Jéssica, minha companheira, que sempre me incentivou a seguir meus objetivos. A minha orientadora pela ajuda e compreensão nas horas difíceis. Aos amigos e colegas que conquistei durante a faculdade, pessoas que espero levar comigo para o resto da minha vida. Enfim, agradeço a todos que de alguma forma contribuíram para a realização desta conquista. RESUMO Os direitos de personalidade são essenciais para a proteção dos indivíduos. Dentre eles, o direito ao nome e o direito ao próprio corpo assumem papel determinante na constituição da identidade do ser humano e em sua autodeterminação. O transexual é um indivíduo inconformado com seu gênero biológico e possui reconhecimento pela identidade de gênero oposto ao seu. No que tange os transexuais, a garantia do livre exercício ao nome é ainda mais relevante. Cada vez mais, os transexuais buscam o judiciário para alterar seu e nome e gênero no registro civil, contudo não há uma lei específica que permite tal alteração, o que ocasiona diferentes entendimentos jurisprudenciais. O estudo foi realizado a partir de revisão bibliográfica e análise jurisprudencial existente sobre o tema. Considera-se relevante a realização do presente estudo, pois para que os transexuais tenham seus direitos resguardados deve-se levar em conta o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual é essencial na defesa da possibilidade de alteração do registro civil do transexual, previsto na Constituição Federal. Palavras-chave: Nome. Gênero. Registro Civil. Transexual. ABSTRACT Personality rights are essential for the protection of the individual. Among them, the right to a name and the right to own body play a determining role in the constitution of the identity of human being and in its self-determination. The transsexual is an individual who is unhappy to his / her biological gender and recognizes itself by a gender identity that is opposed to his condition. In the theme of the transgender people, the guarantee to free exercise of the right to the name is even more relevant. Increasingly, transsexuals seek the judiciary to change his name and gender in the civil registry, although there is no specific law allowing this change, which results in different jurisprudence agreements. The study was based on bibliographical review and jurisprudential analysis on the subject. It is considered relevant to carry out this study, because in order for transsexuals to have their rights protected, the principle of the dignity of the human person must be taken into account, which is essential in defending the possibility of changing the civil registry of the transsexual in the Federal Constitution. Keywords: Name. Gender. Civil Registry. Transsexual. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 9 1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS................................................................................. 10 1.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA ......................................................................................... 11 1.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ............................................. 13 1.3 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE ............................................................................ 15 2 NOME ................................................................................................................................... 17 2.1 DIREITO FUNDAMENTAL AO NOME ..................................................................... 18 2.2 DIREITO FUNDAMENTAL AO CORPO .................................................................... 20 2.3 HIPÓTESES DE ALTERAÇAO DO NOME.................................................................21 3 TRANSEXUALIDADE ....................................................................................................... 26 3.1 CONCEITO .................................................................................................................... 26 3.2 DIFERENÇA DO TRANSEXUAL E DA ORIENTAÇÃO SEXUAL.......................... 28 3.2.1 Homossexuais........................................................................................................... 28 3.2.2 Bissexuais ................................................................................................................. 28 3.2.3 Travestis ................................................................................................................... 29 3.3 CIRURGIA DE ADEQUAÇÃO SEXUAL .................................................................... 29 CONCLUSÃO......................................................................................................................... 32 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 33 9 INTRODUÇÃO O nome pode ser considerado como uma das maiores expressões dos direitos da personalidade, e está constitucionalmente protegido como direito fundamental. Encarrega-se de exprimir a inviolabilidade inerente, a intimidade, a vida privada, a honra e imagem dos indivíduos, posto que enseje a noção de autopercepção de cada indivíduo. A desarmonia entre a percepção nominal e a pessoa, a quem lhe foi conferido, propicia diversos impasses sociais e individuais. Tais episódios são constantemente vivenciados pelos transexuais, enfrentam batalhas diárias para alcançar o reconhecimento e o amparo das instituições estatais em razão da sua identidade e gênero. No Brasil há um grande número de transexuais que procuram o Poder Judiciário para adequar o nome a sua condição sexual. O ordenamento jurídico brasileiro não possui uma lei que regularize, especificamente, os direitos inerentes aos transexuais. Deste modo os transexuais se deparam com as divergências doutrinárias e jurisprudenciais quando pretendem alterar seu nome e gênero no registro civil, pois cabe ao aplicador do direito utilizar-se destes meios para tomar e fundamentar sua decisão, ficando a mercê das discordâncias jurídicas. O presente estudo procurará explorar a possibilidade dos transexuais conseguirem realizar as alterações dos seus nomes e dos sexos nos registros civis. De início serão apresentados os princípios constitucionais, sendo eles: princípio da isonomia, da dignidade da pessoa humana e da razoabilidade, aos quais são aplicados aos casos concretos, em razão de inexistirem na legislação específica. Em seguida aborda-se o direito ao nome, sua importância e proteção legal, assim como, as hipóteses legais de alteração. Por fim, trata-se sobre a transexualidade, destacando seu conceito e características, fazendo-se distinção do transexual das demais orientações sexuais existentes: homossexuais, bissexuais e travestis. Na oportunidade, também será abordado sobre a cirurgia de adequação sexual. No decorrer deste se elucidará a relação entre a possibilidade de o transexual alterar seu registro civil e a sua realização pessoal no que diz respeito a sua identidade e corpo. 10 1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS Os princípios são os alicerces do ordenamento jurídico, eles direcionam a interpretação e aplicação das normas jurídicas, sendo também uma forma de delimitação da vontade subjetiva dos juristas. Segundo Delgado (2008, p.184), os princípios são “as proposições fundamentais que se formam na consciência das pessoas e grupos sociais, a partir de certa realidade, e que depois de formadas, direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade”. Miguel Reale (2003) expõe o seguinte pensamento: Princípios são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, a aplicação e integração ou mesmo para a elaboração de novas normas. São verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis (REALE, 2003, p. 37). É notável a importância dos princípios, pois estes são o suporte de todo o ordenamento jurídico, sobretudo da Constituição. São considerados como elementos fundamentais do sistema normativo. Deste modo, são os princípios que dão parâmetros as demais normas do sistema legal. Ensina Figueiredo (2001, p. 38), princípios são “normas gerais, abstratas, não necessariamente positivadas expressamente, porém às quais todo ordenamento jurídico, que se construa, com a finalidade de ser um Estado Democrático de Direito, em sentido material deve respeito”. Os princípios constitucionais são soberanos e percursores do nosso sistema normativo apoiando as garantias e os direitos fundamentais expressos na Constituição Federal, eles propiciam a coesão do sistema jurídico. Assim elucida Barroso (1999) acerca dos princípios constitucionais: Os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui. A atividade de interpretação da constituição deve começar pela identificação do princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie [...] Em toda ordem jurídica existem valores superiores e diretrizes fundamentais que ‘costuram’ suas diferentes partes. Os princípios 11 constitucionais consubstanciam as premissas básicas de uma dada ordem jurídica, irradiando-se por todo o sistema. Eles indicam o ponto de partida e os caminhos a serem percorridos (BARROSO, 1999, p. 1499). Percebe-se que embora não estejam escritos, os princípios exercem a função de instruir o legislador e outros agentes, dando apoio ao direito e conduzindo a criação e integração de normas, jurídicas, amparados pelo ideal de justiça. 1.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA O princípio da isonomia, também denominado de princípio da igualdade, é o esteio de sustentação de todo estado democrático de direito, tal princípio aponta tratamento justo entre os cidadãos, sendo que deve ser aplicado em amplo sentido, visto que, só haverá igualdade quando houver tratamento igual entre iguais. Por se tratar de um direito fundamental, o princípio da isonomia está previsto no artigo 5°, caput da Constituição Federal: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...] (BRASIL, 1988). Silva (2006) elucida que igualdade constitucional é uma maneira digna de se viver em sociedade, afirmando que tal princípio é à base de sustentação e norteador da interpretação das normas jurídicas que compõem o sistema jurídico fundamental. A isonomia é uma igualdade formal que pode ser entendida como o tratamento justo conferido pela lei aos indivíduos, sendo também uma norma autoaplicável, que é aquela que não depende de regulamentação por outras normas, é de imediata aplicação, estando vedado que os legisladores criem ou editem leis que a violem, aplicando-se a lei em todos os casos concretos. O intérprete e a autoridade política não podem aplicar leis e atos normativos aos casos concretos de forma a criar ou ampliar desigualdades. O particular não pode basear suas condutas em atos discriminatórios, preconceituosos, racistas ou sexistas. Para Ferreira (1983) a isonomia, deve ser entendida como igualdade diante da lei vigente e da lei a ser elaborada, interpretando-a como um impedimento à legislação de promover privilégios de classes, como igualdade diante dos administradores e dos juízes. 12 O princípio da isonomia pressupõe que pessoas colocadas em situações distintas sejam tratadas de forma desigual. Conforme aponta Nery Júnior (1999, p. 42) “Dar tratamento isonômico as partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades”. A isonomia não tem o propósito de acabar com todas as desigualdades existentes entre as pessoas, ela busca identificar ocasionais diferenças havidas nas mesmas características e conceder tratamentos diferenciados de modo geral e impessoal. Enquanto princípio, a isonomia limita a atuação das autoridades públicas e dos particulares, posto que, impedem taxativamente a prática de atos discriminatórios ou preconceituosos vindo a ocasionar a responsabilização do agente que os praticou. Moraes expõe o seguinte entendimento acerca da isonomia: O princípio da igualdade consagrado pela constituição opera em dois planos distintos. De uma parte, frente ao legislador ou ao próprio executivo, na edição, respectivamente de leis, atos normativos e medidas provisórias, impedindo que possam criar tratamentos abusivamente diferenciados a pessoas que encontram-se em situações idênticas. Em outro plano, na obrigatoriedade ao intérprete, basicamente, a autoridade pública, de aplicar a lei e atos normativos de maneira igualitária, sem estabelecimento de diferenciações em razão de sexo, religião, convicções filosóficas ou políticas, raça, classe social (MORAES, 2006. p. 32). Ao criar as leis, o legislador ambiciona a redução dos conflitos sociais, almejando tutelar as pessoas de forma a dissipar as desigualdades ou pelo menos minimizá-las. Mello (2008, p. 10) entende da seguinte maneira “[...] o alcance do princípio não se restringe a nivelar os cidadãos diante da norma legal posta, mas que a própria lei não pode ser editada em desconformidade com a isonomia”. Na interpretação desse princípio deve ser considerada a existência de desigualdades, de um ângulo e de outro, as injustiças causadas por tal circunstância, para assim, existir a possibilidade de termos uma igualdade plena. A isonomia deve achar-se perante a lei, perante todo o Direito, perante a justiça, perante os propósitos sociais e políticos, ocasionando oportunidades do ser humano obter condições íntegras de vida. A prática de atos discriminatórios em virtude da raça, da classe e do gênero ofende não só a Constituição diante de seu princípio da isonomia, mas também denigre a essência do próprio ser humano, se opondo ao Estado democrático brasileiro. 13 1.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA O princípio da dignidade da pessoa humana é legitimado pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, inciso III, assim sendo um dos elementos do Estado Democrático de Direito demonstrando a relevância que tal princípio detém em nosso ordenamento jurídico atual. De acordo com Bastos e Martins (2004) a inserção do princípio da dignidade da pessoa humana sob o prisma da Constituição Federal, indica que é um dos fins do Estado propiciar as condições para que as pessoas se tornem dignas. Acerca do princípio da dignidade da pessoa humana na Constituição Federal dispõe Cavalieri Filho: Entre os superiores princípios (valores) consagrados na Constituição de 1988, merece especial destaque o da dignidade da pessoa humana, colocado como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, III). Temos hoje o que podemos chamar de direito subjetivo constitucional à dignidade. Ao assim fazer, a Constituição colocou o homem no vértice do ordenamento jurídico da Nação, fez dele a primeira e decisiva realidade, transformando os seus direitos no fio condutor de todos os ramos jurídicos. Isso é valor (CAVALIERI FILHO, 2004. p. 61). Enquanto princípio a dignidade da pessoa humana determina que ninguém poderá trespassar os direitos do homem, competindo ao Estado a proteção desses direitos e a garantia do exercício das liberdades individuais. Deste modo dispõe Moraes: A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. O direito à vida privada, à intimidade, à honra, à imagem, entre outros, aparece como consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil (MORAES, 2003, p. 129). Da mesma forma, aduz Silva: Correlacionados assim os conceitos, vê-se que a dignidade é atributo intrínseco, da essência, da pessoa humana, único ser que compreende um valor interno, superior a qualquer preço, que não admite substituição 14 equivalente. Assim a dignidade entranha-se e se confunde com a própria natureza do ser humano (SILVA, 2007, p. 146). No mesmo sentido Roxana Borges salienta da seguinte maneira sobre a autonomia do princípio em questão: A dignidade da pessoa humana não depende de estado nem de outros qualificativos jurídicos, não nasce de um contrato nem de declaração de vontade, não está ligada aos papéis ou atividades que a pessoa desempenha, não tem relação com a capacidade. […] a dignidade da pessoa humana independe, inclusive, do nascer com vida, pois o nascituro, mesmo sem ainda ter nascido, possui a qualidade de humano (BORGES, 2005, p. 16). O princípio da dignidade da pessoa humana figura em todas as ramificações do Direito, e está intimamente relacionado aos direitos fundamentais que permitem as pessoas o exercício dos direitos que lhes são inerentes pelo simples fato de serem seres humanos. Este princípio em tempo algum pode ser colocado em segundo plano, pois o propósito de proteção à dignidade concerne a qualquer ser humano, independentemente da idade, sexo, origem, cor, condição social. A dignidade humana não reside somente na garantia de que a pessoa não será alvo de ofensas ou discriminações, bem como insere a prerrogativa do pleno desenvolvimento da personalidade de cada indivíduo. Esse princípio presume o desenvolvimento sem interferências ou impedimentos externos, das ações próprias de cada homem. Segundo o entendimento de Barroso (2001), a dignidade da pessoa humana reflete a superação da intolerância, da discriminação, da exclusão social, da violência, da incapacidade de aceitar o outro, o diferente, na plenitude de sua liberdade de ser, pensar e criar. O princípio da dignidade da pessoa humana é um princípio básico, que proporciona a todos os indivíduos, indistintamente, o absoluto gozo dos direitos fundamentais, fixando limitações ao poder estatal em todo seu âmbito, protegendo o ser humano, na elaboração e aplicação das normas, bem como dos possíveis abusos do Estado que possam violar sua dignidade. O princípio da dignidade da pessoa humana cumpre um papel significativo na estrutura constitucional, visto que é fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais, e, assim, medida que dá unidade e coerência ao conjunto dos direitos fundamentais. O presente princípio abrange uma posição privilegiada no meio jurídico sua relativização só será admitida em casos específicos, nos quais a dignidade humana se 15 contradiga a algum outro princípio constitucional também de grande relevância. Assim sendo, nas demais eventualidades o princípio da dignidade da pessoa humana irá preponderar por ser uma norma garantidora de existência digna aos seres humanos, cuja aplicação é irrefutável. 1.3 PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE A razoabilidade é considerada um componente norteador da administração, que direciona o agente da administração à atuação que melhor atenda o propósito da lei e aos interesses públicos considerando-se a conveniência e a oportunidade. A administração, ao atuar seu poder de discricionariedade, terá que obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em harmonia com o que é considerado o senso comum da sociedade. Quanto ao instituto da razoabilidade elucida Di Pietro: O princípio da razoabilidade, entre outras coisas, exige proporcionalidade entre os meios de que se utiliza a Administração e os fins que ela tem que alcançar. E essa proporcionalidade deve ser medida não pelos critérios pessoais do administrador, mas segundo padrões comuns na sociedade em que vive; e não pode ser medida diante dos termos frios da lei, mas diante do caso concreto (DI PIETRO, 2001, p. 80). O princípio da razoabilidade instaura a coesão do sistema jurídico. A falta de coerência ou racionalidade de alguma lei, ato administrativo ou decisão jurisdicional ocasiona vício de legalidade, uma vez que o Direito é feito por seres racionais, para ser aplicado em um determinado local e em determinada época. Além de analisar a coerência dos atos jurídicos a razoabilidade se atenta a verificar se esses atos foram ou não editados em observância a todos os princípios e normas que compõem o ordenamento jurídico a que pertencem, ou seja, apurar se tais atos respeitam o esquema de prioridades adotado pelo nosso sistema jurídico. A Constituição Federal de 1988, não traz de forma expressa, o princípio da razoabilidade. Contudo, é possível encontrá-lo implicitamente no artigo 5º, LV, no qual está garantido o devido processo legal. Cademartori esclarece que a relação entre a razoabilidade e o devido processo legal obedeceu duas etapas, formal e substantiva: Em termos históricos, a trajetória de consolidação do princípio do devido processo legal como princípio conexo ao da razoabilidade observou duas etapas. A primeira enfatizou o caráter estritamente formal e processual 16 (procedural processo) do Direito. Numa segunda etapa, produto de um avanço paulatino, o devido processo legal assumiu um caráter substantivo (substantive due process) onde passou a ser avaliada, também, a razoabilidade e racionalidade das normas, num processo de análise baseado na verificação de compatibilidade entre o respeito pelas liberdades individuais, de um lado, e, por outro, as exigências sócio-políticas que moldam os valores constitucionais do Estado (CADEMARTORI, 2006, p. 116). Em suma, o princípio da razoabilidade é passível de ser usado em dois momentos distintos: na estática do Direito, para a compreensão do sistema jurídico; e na dinâmica do Direito, ou seja, indicando quando deverá ser aplicado, para assegurar que a representação constitucional do Estado Social e Democrático de Direito esteja devidamente consubstanciado. O princípio da razoabilidade é um importante dispositivo de proteção dos direitos fundamentais e do interesse público, pois oportuniza o controle da discricionariedade dos atos do Poder Público e indica como uma norma deve ser interpretada no caso concreto para a aplicação de uma medida justa. 17 2 NOME O nome é de grande importância para identificação dos seres humanos, ele individualiza e correlaciona às pessoas em seu meio familiar e social, perdurando durante toda a vida bem como após a morte, dado que nossos feitos persistem além da vivência física, e estarão sempre ligados a nós, através deste símbolo de identificação e individuação, assim sendo, o nome nos propaga no tempo. Segundo o entendimento de Venosa (2013) o nome pode ser visto como marca distintiva na sociedade, sendo algo que nos rotula no meio em que vivemos, até a morte. O nome é mais que simplesmente palavra escrita ou falada, ele está voltado a representar aquilo que somos e como nos sentimos perante a sociedade, externando o que se passa dentro de cada um de nós. Segundo o entendimento de Diniz (2005) o nome integra a personalidade por ser o sinal exterior pelo qual se designa, se individualiza e se reconhece a pessoa no seio da família e da sociedade. Para Ulhoa (2012, p. 428) “O nome é a identificação da pessoa natural. É o principal elemento de individualização de homens e mulheres. Tem importância não apenas jurídica, mas principalmente psicológica: é a base para a construção da personalidade”. Pode-se dizer que o nome tem duas finalidades básicas: individualizadora e identificadora, a primeira advém da necessidade de diferenciar os indivíduos que integram a sociedade, a segunda é consequência de um preceito investigativo, pois na medida em que relações sociais e econômicas se constituem é necessário ter algo que identifique os indivíduos da relação para fins de direitos e obrigações. Conforme Venosa (2013, p. 196) “Pelo lado do Direito Público, o Estado encontra no nome fator de estabilidade e segurança para identificar as pessoas; pelo lado do Direito privado, o nome é essencial para o exercício regular dos direitos e do cumprimento das obrigações”. O nome é um direito conferido pelo costume, lei, jurisprudência e doutrina, ele é um direito inerente à pessoa humana e constitui, portanto, um direito da personalidade. Nos dizeres de Amorim: A melhor doutrina atribui ao nome à natureza jurídica de direito de personalidade, na medida em que, como sinal verbal ou mesmo marca 18 do indivíduo, o identifica dentro da sociedade e da própria família e é capaz de ser tutelado erga omnes. A lei assegura o direito ao nome, assim como seu registro em local adequado, obedecidas as formalidades, criando a particularização da pessoa, no mundo jurídico. Ele faz, pois, parte integrante da personalidade (AMORIM, 2003, p. 8). Por ser um atributo da personalidade, o nome deve resguardar a identidade da pessoa, com o atributo da não patrimonialidade. Enquanto direito da personalidade, o nome guarda suas principais características: obrigatoriedade, indisponibilidade, exclusividade, imprescritibilidade, inalienabilidade, intransmissibilidade, irrenunciabilidade e imutabilidade, ressalvadas algumas exceções. A obrigatoriedade refere-se à obrigação de se ter um nome e registrá-lo perante o Cartório de Registro Civil. Também se entende como a obrigação de utilizar o nome sem alcunhas. A indisponibilidade versa sobre a incapacidade de dispor do nome sendo que uma vez registrado um indivíduo, não poderá dele se dispor. A exclusividade se apoia no fundamento do nome pertencer a uma única pessoa, é visível há a existência de homônimos, de maneira que a exclusividade é relativizada. A imprescritibilidade concerne ao fato que o titular do direito da personalidade em tempo algum perder o direito ao nome por ação ou inação. A inalienabilidade compreende que o nome da pessoa física não pode trocado por dinheiro, tampouco por qualquer outro meio. Outra característica do nome é a intransmissibilidade, ele não pode ser transferido, visto que, por ser um direito da personalidade depreende do ideal de inerência ao ser humano. A irrenunciabilidade aduz que o titular do nome não pode se opor a ele, em razão do entendimento de que os direitos da personalidade são indisponíveis. A imutabilidade é outra característica do nome, sendo que esta é relativa, haja vista as exceções da própria legislação, podendo ser encontradas no Código Civil e na Lei de Registros Públicos. 2.1 DIREITO FUNDAMENTAL AO NOME O direito ao nome é considerado como direito público subjetivo, que existe para coibir a influência do Estado aos direitos da personalidade. Pode-se compreender que o direito ao nome é considerado o mais importante direito que uma pessoa natural adquire, ao receber um nome ela passa a existir diante o meio social. 19 Como consequência natural, entende-se que todo ser humano precisa ser reconhecido enquanto tal e, assim sendo, tem o direito a ter um nome, enquanto designação que proporcione o seu reconhecimento social e o permita, na medida em que estiver inserido nos diversos âmbitos da sociedade, torná-lo capaz de ser titular de direitos e deveres nesta ordem social. O direito ao nome é um dos direitos da personalidade e está descrito no artigo 16 do Código Civil de 2002, o qual expõe que: “Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome”. O objeto de proteção não é exatamente o nome, mas o indivíduo e sua dignidade, que seriam através do nome atingidas. A Lei nº 6.015/1973 em seu artigo 54, parágrafo 4º, versa sobre o caráter obrigatório do nome dispondo que é obrigatório o registro de nascimento o nome e prenome que foi dado a criança. O registro civil é também um direito assegurado no Estatuto da Criança e do Adolescente, previsto no artigo 10, inciso IV, instituindo que hospitais e estabelecimentos de atenção à saúde devem “fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato”. No Brasil o direito ao nome se contrai antes do registro, mesmo sendo um direito obrigatório à pessoa que não for devidamente registrada. Mesmo assim, esta será identificada por algum nome no lugar em que vive. Destarte, o nome mostra-se como o componente individual em que se compreende a essência íntima de um ser humano. E se por um lado, o nome é o que antecipa, precede e aparece anunciando cada indivíduo, é a primeira impressão, é o que identifica, individualiza e torna conhecido aquele ser humano, por outro, o nome civil apresenta-se como o elemento basilar a habilitar a pessoa humana como titular de direitos e também de deveres na ordem social e por consequência na ordem jurídica. É notório que o nome é de suma importância para a formação da identidade pessoal, isto nos permite dizer que ao ser individualizado por um nome, a pessoa deve se sentir confortável e a nomenclatura precisa retratar a maneira como a pessoa se vê e como ela é vista pela sociedade. 20 2.2 DIREITO FUNDAMENTAL AO CORPO Em meio aos direitos da personalidade está o direito ao corpo, nele compreendidos os tecidos, órgãos e partes separáveis, igualmente a proteção ao cadáver. O corpo é inerente à pessoa que nasce e representa sua forma física. Assim como o nome, o corpo também tem uma função social fundamental na formação da identidade do indivíduo. Acerca do referido tema assim dispõe Gonçalves: O direito à integridade física compreende a proteção jurídica à vida, ao próprio corpo vivo ou morto, quer na sua totalidade, quer em relação a tecidos, órgãos e partes suscetíveis de separação e individualização, quer ainda ao direito de alguém submeter-se ou não a exame e tratamento médico (GONÇALVES, 2012, p. 185). No mesmo diapasão Barboza aduz que: O corpo juridificado, politizado, medicalizado, torna-se cada vez mais expressão da individualidade, em todas as suas manifestações culturais, religiosas, políticas, sentimentais, enfim de uma diversidade de aspectos que em seu conjunto constroem a identidade de cada ser humano. No corpo se inscrevem o pensar, o sentir e as diferenças sexuais, confirmadas e traduzidas nos papéis de gênero, signos que distinguem o indivíduo dos demais (BARBOZA, 2013, p. 9). O ordenamento jurídico restringe a prática de atos que comprometam o bem maior que é o direito à vida. Isto acontece basicamente por meio dos bons costumes e da lei, procurando regulamentar os limites possíveis de disposição do corpo humano. A proteção ao corpo está previsto no artigo 13 do Código Civil de 2002, o qual dispõe: Art. 13. Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes. Parágrafo único. O ato previsto neste artigo será admitido para fins de transplante, na forma estabelecida em lei especial (BRASIL, 2002). Segundo a concepção de Pereira: No conceito de proteção de integridade física, inscreve-se o direito ao corpo, no que se configura a disposição de suas partes, em vida ou para depois da morte, para finalidades cientificas ou humanitárias, subordinado, contudo a preservação da própria vida ou de sua integridade (PEREIRA, 2016, p. 212). Em uma leitura literal do conteúdo constante no artigo 13 do Código Civil de 2002, poderia se dizer que é vedado à realização de cirurgias de natureza estética, até mesmo 21 aplicações de piercings e tatuagens no corpo humano. No entanto percebe-se que o objetivo do legislador ao editar a lei era proibir atos de violência contra o próprio corpo. Para Lisboa (2010, p. 221) o “titular do direito ao corpo pode dele se utilizar conforme lhe aprouver, vedando-se o uso atentatório à vida ou à saúde física ou mental, pois estes últimos são valores mais significativos”. Ainda abordando o tema da disposição do corpo humano, em relação à transexualidade, o artigo 13 do Código Civil de 2002, já foi usado para impedir a disposição dos transexuais ao seu próprio corpo afastando assim a formação de sua identidade e dignidade, quando se proibia possibilidade de realização de cirurgia para adequação sexual. Atualmente a transexualidade ainda está elencada no rol de doenças psíquicas, em razão disto, é admitida a realização da cirurgia sob a justificativa da recomendação médica, assim retirando também a alegação de contrariar os bons costumes. O importante é que cada pessoa tem autonomia para determinar o caminho que deseja acerca da disposição do seu próprio corpo, sem olvidar que a vida humana guarda especial proteção constitucional. Embora a pessoa não possa fazer com o seu corpo o que bem entende, ela tem liberdade para dele dispor, contanto que isto não provoque ofensa ao direito à vida ou atinja os direitos de terceiros. 2.3 HIPÓTESES DE ALTERAÇÃO DO NOME A imutabilidade do nome é relativa, podendo ser afastada apenas em casos de necessidade comprovada, não apenas por não agradar o seu portador. A Lei nº 6.015/1973 prevê que para qualquer alteração no Registro Civil, é preciso autorização judicial. Na Lei de Registros Públicos está descrito no Parágrafo único do art. 55 o dever de cuidado conferido aos oficiais dos registros públicos quando levarem ao conhecimento do juiz, casos em que a escolha do nome possa ridicularizar a pessoa que será registrada. Art.55 [...] Parágrafo único. Os oficiais do registro civil não registrarão prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Quando os pais não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso, independente da cobrança de qualquer emolumento, à decisão do juiz competente (BRASIL, 1973). O termo “ridículo” pode ser conceituado como digno de riso, merecedor de escárnio e zombaria, por isso a escolha do nome deve ser baseada no bom senso. 22 Assim elucida Venosa sobre o assunto: A própria lei prevê os casos de substituição do prenome. Não só o prenome pode ser ridículo, como também, a própria combinação de todo o nome. Nesse caso, entendemos que o dever de recusa do oficial persiste. Em caso de levantamento de dúvidas pelo serventuário, deve o juiz impedir o registro de nomes que exponham seus portadores ao riso, ao ridículo e à chacota da sociedade (VENOSA, 2013, pg. 220). Quando o oficial não se opuser e posteriormente a pessoa quiser modificar o nome por entender que ele é ridículo, estará amparada pelo artigo 56 da Lei dos Registros Públicos a qual permite que o interessado “no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa”. A mudança do nome por erro de grafia, também é permitida, sendo considerada como regra geral. Conforme o entendimento de Venosa (2013), quando houver falha ortográfica no nome, pode se pedir sua retificação a qualquer momento, mas os fundamentos são os do parágrafo único do art. 58. O registro civil poderá sofrer alteração quando houver algum equívoco evidente quanto ao: gênero, a data de nascimento, ser gêmeo, nome e prenome da criança, bem como dos pais, avós maternos, paternos e testemunhas. Qualquer equívoco existente no Registro Civil deve ser alterado para substituir-se por dados adequados. As pessoas transexuais vivem permanentemente em conflito com a sua identidade de gênero e com o nome constante no registro civil. Neste caso, ao invés de cumprir a função identificadora, o nome cria certo embaraço a qualquer terceira pessoa que não saiba a maneira como deve chamar o transexual, sendo muito mais embaraçoso para esta, que se expõe cotidianamente a tais situações vexatórias. A possibilidade de o transexual que realizou ou não cirurgia de adequação alterar seu nome e sexo no registro civil não está prevista em lei, cabendo aos juízes fundamentar suas decisões em correntes doutrinarias e jurisprudências. Em razão de não existir uma lei uniforme, observa-se a ocorrência de decisões divergentes, sendo que em alguns casos ocorre a mudança do nome, entretanto no registro permanece o gênero originário, constantemente pelo fato de o transexual não ter realizado a cirurgia de adequação. 23 Muitas vezes o desejo de uma pessoa assumir uma nova identidade de gênero surge na primeira infância, momento em que ela começa a se identificar com o sexo oposto, apresentando, assim os primeiros sinais de transexualidade. A cirurgia de adequação como prerrogativa para alterar o gênero no registro civil, não se faz coerente, pois, para o indivíduo que se submete a ela, há somente uma adequação do órgão genital com o gênero que ela previamente se identificava e se apresentava. Portanto, é desnecessário vincular a alteração no registro civil com a cirurgia de adequação, pois um transexual pode se sentir satisfeito com seus órgãos genitais biológicos, e optar por não realizar a cirurgia. Para um transexual, o nome é elemento fundamental para configurar sua identidade, sendo que a grande maioria dos transexuais adota o nome social que condiz com sua aparência física. No ano de 2016 foi publicado o Decreto nº 8.727, de 28 de abril de 2016 que permite transexuais e travestis usarem seu nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais. Conforme o Decreto nº 8.727 art. 1º: Art. 1o Este Decreto dispõe sobre o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis ou transexuais no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Parágrafo único. Para os fins deste Decreto, considera-se: I - nome social - designação pela qual a pessoa travesti ou transexual se identifica e é socialmente reconhecida; e II - identidade de gênero - dimensão da identidade de uma pessoa que diz respeito à forma como se relaciona com as representações de masculinidade e feminilidade e como isso se traduz em sua prática social, sem guardar relação necessária com o sexo atribuído no nascimento (BRASIL, 2016). Dar a possibilidade ao transexual modificar o seu nome é fundamental uma vez que haveria coerência entre o nome e a maneira física que ele apresenta, contudo a alteração do gênero no registro civil ainda encontra divergências. O gênero não deve ser visto como algo imutável e sim como elemento constituinte da identidade do transexual. Como não está previsto no ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade de alteração do gênero no registro civil, os juízes que se deparam com tal situação, baseiam suas decisões em doutrinas e jurisprudências, por tal razão existem desacordos entre as decisões proferidas. 24 É comum encontrar julgados que admitem a mudança do nome, entretanto não admitindo a mudança de gênero no registro em virtude de o transexual não ter realizado a cirurgia de adequação sexual: RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL - Pedido de alteração de nome e sexo - Possibilidade apenas em relação ao nome - Pessoa que apesar de não submetida à cirurgia de transgenitalização, se apresenta na sociedade como do sexo feminino - Nome masculino que lhe acarreta constrangimentos e aborrecimentos - Admitida a alteração do nome, negada a alteração para constar ser do sexo oposto - Observância do princípio de veracidade do registro público - Recurso parcialmente provido.(TJ-SP - APL: 320109120108260602 SP 0032010-91.2010.8.26.0602, Relator: Mendes Pereira, Data de Julgamento: 28/11/2012, 7ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/12/2012). REGISTRO CIVIL. TRANSEXUALIDADE. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DE PRENOME E DE SEXO. ALTERAÇÃO DO NOME. POSSIBILIDADE. AVERBAÇÃO À MARGEM. A ALTERAÇÃO DO SEXO SOMENTE SERÁ POSSÍVEL APÓS A CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. 1. O fato da pessoa ser transexual e exteriorizar tal orientação no plano social, vivendo publicamente como mulher, sendo conhecido por apelido, que constitui prenome feminino, justifica a mudança do nome, já que o nome registral é compatível com o sexo masculino. 2. Diante das condições peculiares da pessoa, o seu nome de registro está em descompasso com a identidade social, sendo capaz de levar seu usuário a situação vexatória ou de ridículo, o que justifica plenamente a alteração. 3. Deve ser averbado que houve determinação judicial modificando o registro, sem menção à razão ou ao conteúdo das alterações procedidas, resguardando-se, assim, a publicidade dos registros e a intimidade do requerente. 4. No entanto, é descabida a alteração do registro civil para fazer constar dado não verdadeiro, isto é, que o autor seja do sexo feminino, quando inequivocamente ele é do sexo masculino, pois ostenta órgão genitais tipicamente masculinos. 5. A definição do sexo é ato médico e o registro civil de nascimento deve espelhar a verdade biológica, somente podendo ser corrigido quando se verifica erro. Recurso desprovido, por maioria. (Apelação Cível Nº 70064503675, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em... 24/06/2015).(TJ-RS - AC: 70064503675 RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Data de Julgamento: 24/06/2015, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/07/2015). Os julgamentos contrários à alteração do sexo no registro civil não observam a realidade social vivenciada pelos transexuais, utilizando como principal fundamento para a decisão denegatória o fato de o transexual não ter realizado a cirurgia de adequação sexual, o que caracteriza uma situação desconexa entre a identidade da pessoa e os dados do registro civil. A exigência da cirurgia de adequação não pode ser requisito para alteração do sexo no registro civil, pois cabe ao transexual optar por realizar ou não o procedimento, devendo 25 analisar que a cirurgia de adequação, como qualquer outra possui riscos, e essa escolha é inerente a pessoa. A cirurgia de adequação não é o que propicia a condição de transexual, assim sendo não se faz necessária à realização da cirurgia para que ocorra a retificação do sexo no registro civil. Os enunciados n° 43 e 44 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) expõem que quando for comprovada a transexualidade é possível à retificação no registro civil sem precisar da realização de cirurgia de adequação. Portanto, o direito à mudança de nome e sexo dos transexuais deve alcançar proteção, garantindo desta forma o reconhecimento da identidade que o transexual exprime para si e para a sociedade. 26 3 TRANSEXUALIDADE Neste capítulo será elucidado o conceito de transexual e as devidas distinções quanto algumas orientações sexuais que são constantemente confundidas, tais como: homossexuais, bissexuais e travestis, apresentando também os aspectos necessários para a realização da cirurgia de adequação sexual. 3.1 CONCEITO A identidade de gênero é elemento fundamental para compreender a transexualidade. Refere-se à forma como o indivíduo se sente e apresenta-se perante a sociedade na condição de homem ou mulher, ou de ambos, sem que exista relação direta com o sexo biológico originário. Portanto, a identidade de gênero trata do gênero com o qual o indivíduo se identifica, abrangendo a ideia de que gênero é uma categoria ampla que vai além da determinação biológica. Cabe ressaltar que a identidade de gênero independe da orientação sexual, sendo que o indivíduo pode ter nascido com órgãos genitais masculinos e se identificar com o gênero feminino, tendo orientação sexual heterossexual, homossexual ou bissexual. Desta maneira, não existe ligação entre a identidade de gênero e a orientação sexual. Transexual é o indivíduo que apresenta uma identidade de gênero diferente do qual foi designado no nascimento havendo dissociação entre o seu gênero biológico e o gênero que ele entende realmente pertencer. O indivíduo nasce com genitálias correspondentes ao sexo feminino ou masculino, no entanto se identifica com o sexo do gênero oposto. A transexualidade pode ser caracterizada como a convicção de pertencer ao sexo biológico oposto, o que leva o indivíduo a realizar uma série de modificações físicas e comportamentais, para se adequar ao sexo e gênero com o qual se identifica. Segundo Chaves (1994) a transexualidade, no ponto de vista patológico, seria originário de falhas cromossômicas ou desequilíbrios hormonais, que impõem uma ruptura aparentemente definitiva entre a identidade psíquica e a realidade física. A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera a transexualidade como uma doença e está catalogada na Classificação Internacional das Doenças. A Classificação 27 Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID-10) expõe os códigos e a tipificação das doenças oficialmente conhecidas, padronizando a classificação das enfermidades. Na CID-10 a transexualidade está classificada como "transtornos da identidade sexual (F64.0)” e é definida como: “um desejo imenso de viver e ser aceito como membro do sexo oposto, usualmente acompanhado por uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo anatômico e o desejo de se submeter a tratamento hormonal e cirurgia, para seu corpo ficar tão congruente quanto possível com o sexo preferido”. Para Diniz (2006), o transexualismo é confundido como mero distúrbio da sexualidade, causando resistência, no ambiente social, ao reconhecimento de sua gravidade e do verdadeiro martírio que acomete o seu portador. O transexual, psicologicamente, não se sente confortável com o sexo biológico, o que lhe provoca demasiado sofrimento, vindo a demonstrar características de inconformismo, depressão, angústia e repulsa pelo próprio corpo, principalmente os órgãos genitais. É comum que os transexuais demonstrem conflitos de identidade de gênero desde a infância. Casos em que preferem se vestir como o sexo oposto, preferem brincadeiras ou brinquedos do gênero oposto, afirmam que é ou que gostariam de ser do sexo oposto. Em contrapartida, o desejo de pertencer ao outro gênero pode surgir na adolescência ou na fase adulta. O transexual pode externar o desejo de realizar cirurgias para adequar seu corpo ao gênero com o qual se identifica, entretanto há outros que não sentem a necessidade de modificar seu corpo através da cirurgia de adequação sexual e isso não significa que não exista dissonância entre a identidade de gênero e o sexo originário. Cada pessoa transexual é chamada pelo pronome de acordo com o seu gênero: mulheres transexuais assumem nome, aparência e comportamentos femininos, e precisam ser tratadas como quaisquer outras mulheres. Homens transexuais assumem nome, aparência e comportamentos masculinos, e precisam ser tratados como quaisquer outros homens. Percebe-se que é mais coerente que a transexualidade deixe de ser elencada no rol de doenças, por todo o estigma que acarreta aos transexuais. Deve-se procurar uma maneira mais humanizada de tratar este fenômeno sob o óbice social e não patológico. 28 Em qualquer situação o transexual precisa ser tratado com respeito e dignidade, devese coibir qualquer forma de violência, sendo ela explicita ou não, levando em consideração os elevados índices de homicídio contra transexuais, em virtude de um preconceito denominado transfobia. 3.2 DIFERENÇA DO TRANSEXUAL E DA ORIENTAÇÃO SEXUAL Em razão dos costumes existentes em nossa sociedade é comum dizer que homossexuais, bissexuais, transexuais e travestis são a mesma coisa, tornando-se necessário fazer uma distinção entre eles. 3.2.1 Homossexuais Durante muito tempo, a medicina e a psicanálise consideraram a homossexualidade como doença, esta era tratada por “homossexualismo” em que o sufixo “ismo” conferia a ideia de doença. Em 1975, foi inserido na Classificação Internacional das Doenças (CID), como um transtorno sexual. Em 1985, a Organização Mundial de Saúde (OMS), publicou Circular, informando que o “homossexualismo” deixava de ser uma doença, vindo a ser considerado um desajustamento comportamental. Em 1995, o “homossexualismo” deixou de ser considerado um distúrbio psicossocial e deixou de constar no CID, sendo substituído o sufixo “ismo” pelo sufixo “dade”, que veio significar “modo de ser”. Homossexuais são os indivíduos que se sentem atraídos sexualmente emocionalmente e afetivamente por indivíduos do mesmo gênero, eles não se contrariam com seu gênero tampouco com seu corpo. De acordo com Araújo (2000, p. 26), homossexualidade “é uma anomalia sexual que consiste na prática ativa, passiva ou ambivalente, de atos libidinosos, entre indivíduos do mesmo sexo”. 3.2.2 Bissexuais O bissexual sente atração, afeto e desejo sexual com ambos os sexos, sem abrir mão de sua identidade sexual. No Manual de Comunicação LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e 29 transexuais) e bissexual está conceituado como: “Os bissexuais são aquelas pessoas que se relacionam com pessoas de ambos os sexos/gêneros”. São caracterizados pela variação de relacionamento afetivo, ora com pessoa do mesmo gênero, ora com pessoa do gênero oposto. 3.2.3 Travestis Os travestis são associados ao ato de travestir-se. Vestir-se com roupas do gênero oposto, muitas vezes sendo associado à arte, em que utilizam de vestuário e maquiagem chamativa para realização de espetáculos. Como também, alguns travestis transformam seus corpos, colocando prótese de silicone ou através de tratamentos hormonais. Segundo Gomes (1994, p. 399): “travestismo é um desvio do sexo no qual o indivíduo se sente atraído pelas vestes do sexo oposto”. Divergindo dos transexuais, por não possuírem interesse em adequar seu corpo com as vestes que usam. 3.3 CIRURGIA DE ADEQUAÇÃO SEXUAL O processo transexualizador ou cirurgia de adequação sexual é um conjunto de estratégias assistenciais para transexuais que pretendem realizar modificações físicas do corpo, motivados por um sentimento de incompatibilidade entre seu sexo biológico e seu gênero. No Brasil é permitida a realização de cirurgia de adequação sexual através do Sistema Único de Saúde (SUS) e também em hospitais particulares, sendo que os transexuais que desejam realizar a cirurgia de adequação devem encaixar sua condição nos critérios estabelecidos pela Resolução CFM nº 1.955/2010. Assim sendo, a prática da cirurgia de adequação sexual não constitui crime de mutilação. O Conselho Federal de Medicina, em seu artigo 4º, da Resolução CFM nº 1.955/2010 explana os critérios necessários para realização da cirurgia de adequação sexual: Art. 4º Que a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá à avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social, obedecendo aos critérios a seguir definidos, após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto: 30 1) 2) 3) Diagnóstico médico de transgenitalismo; Maior de 21 (vinte e um) anos; Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia. Em novembro de 2013, o Ministério da Saúde, através da Portaria nº 2.803, ampliou o processo de adequação sexual no Sistema Único de Saúde (SUS), aumentando o número de procedimentos ambulatoriais e hospitalares, incluindo também o procedimento para adequação sexual de mulher para homem. Qualquer pessoa que procurar o sistema de saúde pública apresentando incompatibilidade entre o sexo anatômico e o sentimento de pertencer ao sexo oposto ao do nascimento tem o direito de receber atendimento humanizado, acolhedor e livre de qualquer tipo de discriminação. A cirurgia de adequação sexual deve ser vista como uma opção de o transexual se assemelhar ao gênero com o qual se identifica, e não uma exigência para que posteriormente ocorra a alteração no registro civil destes indivíduos. Há julgados na direção do reconhecimento de mudança de nome e gênero no registro civil sem que seja necessária a realização da cirurgia de adequação sexual: RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. TRANSEXUAL QUE PRESERVA O FENÓTIPO MASCULINO. REQUERENTE QUE NÃO SE SUBMETEU À CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO, MAS QUE REQUER A MUDANÇA DE SEU NOME EM RAZÃO DE ADOTAR CARACTERÍSTICAS FEMININAS. POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO AO SEXO PSICOLÓGICO. LAUDO PERICIAL QUE APONTOU TRANSEXUALISMO. Na hipótese dos autos, o autor pediu a retificação de seu registro civil para que possa adotar nome do gênero feminino, em razão de ser portador de transexualismo e ser reconhecido no meio social como mulher. Para conferir segurança e estabilidade às relações sociais, o nome é regido pelos princípios da imutabilidade e indisponibilidade, ainda que o seu detentor não o aprecie. Todavia, a imutabilidade do nome e dos apelidos de família não é mais tratada como regra absoluta. Tanto a lei, expressamente, como a doutrina buscando atender a outros interesses sociais mais relevantes, admitem sua alteração em algumas hipóteses. Os documentos juntados aos autos comprovam a manifestação do transexualismo e de todas as suas características, demonstrando que o requerente sofre inconciliável contrariedade pela identificação sexual masculina que tem hoje. O autor sempre agiu e se apresentou socialmente como mulher. Desde 1998 assumiu o nome de "Paula do Nascimento". Faz uso de hormônios femininos há mais de vinte e cinco anos e há vinte anos mantém união estável homoafetiva, reconhecida publicamente. Conforme laudo da perícia médico-legal realizada, a desconformidade psíquica entre o sexo biológico e o sexo psicológico decorre de transexualismo. O indivíduo tem seu sexo definido em seu registro civil com base na observação dos órgãos genitais externos, no momento do nascimento. No entanto, com o seu crescimento, podem ocorrer disparidades entre o sexo revelado e o sexo psicológico, ou seja, 31 aquele que gostaria de ter e que entende como o que realmente deveria possuir. A cirurgia de transgenitalização não é requisito para a retificação de assento ante o seu caráter secundário. A cirurgia tem caráter complementar, visando a conformação das características e anatomia ao sexo psicológico. Portanto, tendo em vista que o sexo psicológico é aquele que dirige o comportamento social externo do indivíduo e considerando que o requerente se sente mulher sob o ponto de vista psíquico, procedendo como se do sexo feminino fosse perante a sociedade, não há qualquer motivo para se negar a pretendida alteração registral pleiteada. A sentença, portanto, merece ser reformada para determinar a retificação no assento de nascimento do apelante para que passe a constar como "Paula do Nascimento". Sentença reformada. Recurso provido. (TJ-SP - APL: 00139343120118260037 SP 0013934-31.2011.8.26.0037, Relator: Carlos Alberto Garbi; Data de Julgamento: 23/09/2014, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/09/2014). APELAÇÃO CÍVEL. RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. TRANSGÊNERO.MUDANÇA DE NOME E DE SEXO. AUSÊNCIA DE CIRURGIA DE TRANGENITALIZAÇÃO. Constatada e provada a condição de transgênero da autora, é dispensável a cirurgia de transgenitalização para efeitos de alteração de seu nome e designativo de gênero no seu registro civil de nascimento. A condição de transgênero, por si só, já evidencia que a pessoa não se enquadra no gênero de nascimento, sendo de rigor, que a sua real condição seja descrita em seu registro civil, tal como ela se apresenta socialmente DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70057414971, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS Relator: Rui Portanova, Julgado em 05/06/2014). Os entendimentos exibidos acima demonstram que ao proferirem estas decisões, levaram-se em consideração as peculiaridades do caso concreto, as informações extraídas de diversas áreas das ciências, além de uma interpretação constitucionalizada do direito, o que se faz necessário em casos como estes. 32 CONCLUSÃO O nome é um direito de personalidade, sendo vitalício, inalienável e absoluto. Além do mais, o nome é a principal identificação dos indivíduos no meio social. Observou-se que o nome é considerado imutável, havendo exceções, quais sejam: nome vexatório, erro gráfico, entre outros. Evidencia-se que a retificação do nome será realizada mediante fundamentação sólida e interferência do judiciário. Em regra, o nome separa as pessoas em sexo feminino ou masculino. Contudo, em algumas situações, o nome confronta com a identidade sexual, que é como o indivíduo se enxerga e como pretende ser visto pela sociedade da qual faz parte. Mediante o estudo realizado, foram apresentadas diversas orientações sexuais, enfatizando a transexualidade, estado em que o indivíduo vive em um corpo que entende não ser seu, ou seja, ele se identifica com o gênero oposto. Se assim optar, o transexual poderá realizar procedimentos cirúrgicos para se assemelhar ao gênero que entende pertencer, o que acarretará além da adequação física e psicológica, a redução de problemas no exercício da cidadania. O processo para alteração no registro civil do transexual é semelhante aos outros, havendo total liberdade do requerente para escolha do seu nome. No entanto, mesmo havendo inúmeros requerimentos de transexuais para alteração do registro civil, o direito brasileiro não possui legislação específica sobre o assunto. Deste modo, os transexuais ficam à mercê dos diferentes entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, utilizados pelos juristas para fundamentarem suas decisões. Ao lado disso, cabe ao Poder Judiciário assegurar que o registro civil dos transexuais possa ser alterado, o que afinal traduz o desejo objetivado pelo grupo. Ademais, a tendência esperada ser a uniformização da jurisprudência nacional permissiva em relação aos transexuais, independentemente de realizada a cirurgia de adequação sexual. Segundo considerado ao longo deste estudo deve ser conferido ao transexual o direito a dignidade da pessoa humana assim, possibilitando sua inserção na sociedade e afastando qualquer tipo de distinção ou preconceito. 33 REFERÊNCIAS AMORIM, J. R. N. Direito ao nome da pessoa física. São Paulo: Saraiva, 2003. ARAÚJO, L. A. D. A proteção constitucional do transexual. São Paulo: Saraiva, 2000. BARBOZA, Heloisa Helena . A pessoa na era da biopolítica: autonomia, corpo e subjetividade. Cadernos IHU ideias , São Leopoldo RS, n. 194, p. 9, maio. 2013. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/images/stories/cadernos/ideias/194cadernosihuideias.pdf>. Acessado em: 19 out. 2017. BARROSO, L. R. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 3. ed. 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